Sincronia escrita por Kurai


Capítulo 1
O Fim da Cantiga de Ninar


Notas iniciais do capítulo

Essa one-shot está participando de um desafio cujas três regras principais são:
1 - Ter exatamente 800 palavras
2 - Usar duas palavras-chave dentre as do Desafio de Novembro (As escolhidas foram Rugido e Livre)
3 - Usar três palavras-suporte dentre as do Desafio de Novembro (As escolhidas foram subconsciente, preparo e desalinhado).

Essa one-shot é uma continuação após cerca de três anos do final de Lullaby. Sugiro que leia! É bem curta.



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A melodia que tocava no enorme auditório era complexa e perfeitamente sincronizada, mas não era isso o que mais chamava a atenção de quem ouvia. O que tornava aquelas cadeiras lotadas completamente hipnotizadas, em silêncio para que apenas o som do piano pudesse ser ouvido, era a emoção. Cada nota, cada acorde, eram carregados de uma beleza triste, tão sublime que era impossível de ser posta em palavras, e cada espectador só podia ouvir, arrebatado, deixando que o próprio subconsciente interpretasse como achasse melhor.

A cabeça da estrela do show, a melhor pianista adolescente do mundo, também estava vazia de palavras. Tornara-se uma única entidade com o piano, enleada às notas, deixando que corpo, mente e alma se tornassem um só pela duração do concerto.

Quando tocou a última nota, encarando sem expressão alguma os próprios dedos pálidos sobre as teclas finais, o silêncio durou ainda por alguns segundos, onde se esqueceu de onde estava. Foi o rugido que a trouxe de volta. A trovoada de aplausos repentinos, altos o suficiente pra que erguesse a cabeça e olhasse ao redor.

Reconhecia muitos rostos. Afinal, tocava para sua escola. Era sua prova final, e o rugido significava que passara. Apesar do preparo mínimo que dedicara àquela avaliação, ele se encarregara, anos atrás, que seria a melhor, não importava muito a situação. Mesmo que ele não estivesse mais em sua plateia há quatro anos.

Enquanto se erguia, os olhos claros vagavam pelos rostos das primeiras fileiras: seus colegas de turma. Ela deveria estar feliz com as pessoas fofas que a apoiaram. Desprezar os feios que a magoaram. Mas naquele exato momento, sentia... Vazio.

Keiko foi a primeira que viu, apesar de a garota tentar se esconder. Sempre achara Keiko fofa. Sabia que a memorizadora era como ela; seus olhos inocentes e ar ingênuo ocultavam um profundo aprendizado sobre o lado feio do mundo, e alguém importante também fora tirado dela. Naquele momento, porém, era só uma garota assustada que fugia do mundo.

Toyo estava com ela, também tentando parecer que não estava ali. Nunca entendeu porquê o tenor se dava ao trabalho de assistir seus shows se a detestava tanto. Ele próprio dera um espetáculo tão bom quanto o dela algumas horas atrás, com um rugido tão intenso quanto. Outro covarde que fugia.

Rigardo estava com Ichiru e Noriko. Não se importava com o duelista e a crítica, mas geralmente gostava da aprovação do escravo. Em outro momento, o olhar vazio exatamente igual ao dela que o rapaz lhe retribuía teria incomodado profundamente.

Isaac estava com a namorada e não parecia feliz. O rugido os interrompera, assim como a música antes dele, mas antes disso, provavelmente brigavam outra vez. O fotógrafo aprumou a câmera, apontando a lente na direção da pianista, que normalmente sorriria em uma pose adequada, mas a expressão permaneceu impassível ao encarar, de forma altiva, o aparelho, cujo flash mal fez um som mergulhado na trovoada de aplausos.

Sera, Takatsuki, Eiha... Todos levaram apenas um breve olhar da musicista, que os cortou de seus pensamentos assim que viu Aster. O terno desalinhado e a expressão macabra no rosto do filósofo diziam-lhe mais do que quaisquer palavras. Finalmente mostrando alguma mudança de expressão, ela girou o corpo sobre o palco, o vestido dourado elegante rodopiando ao seu redor, procurando mais um rosto específico na plateia.

Não foi difícil encontrar aquele. Mesmo em meio a uma multidão, era belo acima do normal, como se sua beleza lhe desse um brilho o destacando dos demais.

Dominik sorria para ela. Não dela, ou de sua música, talento, beleza. Para ela. Como se só enxergasse a ela ali apesar da multidão, e a visse por mais do que as notas que seus dedos eram capazes de criar. Assim que o anfitrião notou que ela também o olhava, seu sorriso se alargou. Dessa vez, ganhou um tom malicioso. Alguma coisa em seu olhar definitivamente não era fofa.

Apesar de saber disso, a pianista finalmente sorriu, ouvindo o rugido finalmente começar a cessar. Sorriu, porque sabia o que aquilo queria dizer. Sorriu, porque sabia o que tinha acontecido vários metros abaixo de seus pés, para além do palco, para além do chão. Sorriu, porque sua música, uma vez mais, fora usada para seu propósito correto: não deixar que ninguém escutasse gritos.

Virou o belo rosto, ainda sorrindo, para encarar a expressão cansada e confusa de Raiden. Ela havia, já há alguns meses, se libertado dele, deixado para trás todos os grilhões que a acorrentavam ao homem com o rosto odiosamente parecido ao do neurocirurgião, livrando-se do feio sentimento que era o amor. O vazio que sentira por toda a noite era seu novo companheiro, o vazio do desespero e da liberdade.

E agora, seu melhor amigo também podia fazer isso. Assim como Eri, Dominik estava livre.


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Notas finais do capítulo

Keiko, mencionada aqui, tem uma história própria, passa lá: https://fanfiction.com.br/historia/746611/Fragil_-_Manuseie_com_cuidado/

Contexto para quem não era do rpg: Dominik se apaixona por Raiden, que é muito parecido com o antigo dono de Eri. Ela se torna amiga dele e o aconselha, mas ela é yandere e seus conselhos são meio bizarros. Então, é. Dominik mandou um psicopata (Aster) torturar a garota que o Raiden gosta.

Durante a Despair Disease, que está terminando de se instalar de vez em Eri nessa one-shot, Eri passa a amar a si mesma, vendo o amor obsessivo que sentia por seu antigo dono como algo desnecessário que lhe atrapalhava. Ela quer que Dominik enxergue isso. (Não dá muito certo.)



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