Lithromânticos: Esquecidos pela sociedade escrita por BloodWyve


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Então. Eu fiz isso em honra a eu ter, esses dias, finalmente descoberto o que eu realmente sou. Quem já passou por isso, sabe como é bom finalmente saber o que você é e saber que há mais pessoas que sentiram e sentem as mesmas coisas que você mesmo já sentiu.



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Olá. Não sei de onde você está lendo isso, mas espero que esse capítulo consiga alcançar diversos lugares - o mais longe que puder e mais distante do que eu possa imaginar que algum dia chegaria. Espalhe essa nota por todos os cantos. Espalhe como se espalha panfletos, até que inundem as ruas com a minha estória.

Meu nome não é importante por ora. Me chamarei apenas de L por este texto. Adoraria ser reconhecida por esse meio, mas tenho medo de ter o meu nome divulgado, especialmente quando se trata de um assunto tão... frágil e perigoso para muitos. Prazer, leitor desconhecido. Creio que você precisa de mais informações sobre minha pessoa para que possa se situar: Eu sou uma garota que tenho 15 anos e vivo em uma cidade pequena do interior. Também adoro estrogonoff, mas isso não é importante.

Eu venho, por meio da escrita, contar e analisar algumas experiências que eu tive enquanto descobria minha sexualidade. Todas as dúvidas, os receios, os medos... Vai que ajuda alguém que esteja precisando de um consolo, mesmo que por meio de uma pessoa anônima?

Sentem-se, arranjem uma posição confortável porque o show está prestes a começar!

Começando pelo essencial, atualmente eu me identifico como Assexual e Lithromântica. Sinto que há pessoas que possam não saber o significado desses termos, então eu mesma denominarei-os:

Assexual se trata de uma pessoa que não sente atração sexual. Alguns podem até gostar do ato sexual (Não é o meu caso), mas não sentem essa atração no quesito sexual pelo parceiro.

Lithromântico, contudo, se trata de uma pessoa que sente atração romântica por alguém, porém não deseja e/ou perde o interesse quando esse amor vira recíproco.

Assexual é um termo mais conhecido, então muitos já estão acostumados com ele. Porém eu sei, lithromântico soa estranho.

"Mas L, qual o sentido de gostar de alguém mas perder esse amor quando ela confessa esse amor de volta? Qual a graça em ter uma relação platônica?"

Não são perguntas que eu consiga responder. Ser lithromântico/sexual é algo que você sente. Pode soar estranho gostar de ter esse sentimento platônico em relação a alguém? Com certeza. Mas, no geral, o amor em si não é um sentimento estranho e confuso? Amor platônico também é uma forma de amor.

Muitos têm trauma de amores platônicos por ficarem "encalhados" muito tempo com alguém que você realmente gostava mas essa pessoa nem ligar para você. Eu não estou desmerecendo isso, nunca. Deve ser realmente frustrante para qualquer outro tipo de pessoa, assim como é frustrante receber a reciprocação para mim. Não sei o motivo, mas eu me sinto bem amando uma pessoa, mesmo sem ela nem saber ou amar de volta. Eu gosto de dividir momentos em pura e simplória amizade, ficar o máximo de tempo possível com a pessoa sem sentir que devo algo a ela, como alguma satisfação do porquê de eu estar saindo sem ela, ciúmes, etc. É bom sentir esse amor, esse cuidado pela pessoa, mas ao mesmo tempo não ter uma ligação com ela. 

"Mas L, então por que vocês perdem o interesse quando essa pessoa te ama de volta?"

Isso varia de Lithromântico para Lithromântico. Alguns não se sentem preparados, outros não querem ter essas "obrigações de casal", já outros não se sentem confortáveis em estar tendo uma relação amorosa com outra pessoa. Há também, aqueles que nem sabem explicar por que perderam essa atração. 

Muitos não considerariam como forma de amor já que se perde a atração por um "motivo tão banal", mas é uma forma de amor das mais puras que existe. Não há preocupações com inseguridade, com o "será que ela me ama mesmo?" ou "será que ela só está me usando e iludindo?" e até no sentido de ser traído. Não há traição se você nem está em uma relação com a pessoa (e nem deseja ter). 

Enfim, ser Lithromântico não é tão ruim quanto parece de primeira vista. Nós sentimos amor, nos sentimos bem com coisas simples e vivemos felizes, ajudando nosso amigo sem querer nada em troca. Pelo contrário do que parece, não somos solitários: vivemos cercados de amigos, em um círculo no qual você ama todo mundo (talvez um ou outro um pouquinho em um sentido mais amoroso) e não tem briga quase nenhuma, já que vocês se entendem super bem. 

Hoje, eu já consigo me identificar e me sentir feliz com o que eu sou. Mas antes, não era assim. Eu passei por um longo caminho até chegar aqui e olha, foi difícil se sentir um "o que sou eu exatamente?" por anos. 

Primeiramente, quando eu mal sabia o que eram as sexualidades, eu me considerava hétero. Todo mundo me falava que era isso o que eu era, então era isso o que eu deveria ser mesmo. Eu mal sabia das outras opções, só conhecia os homossexuais e pronto - eu não pensava muito nisso mesmo. 

Foi aí que chegou a idade dos namoricos. Com 11 anos, muitas das meninas da minha sala já saíam para namorar e eu só ficava "ugh" pra isso, pois eu me considerava nova demais. E foi nesse mesmo ano, que eu conheci um antigo amigo meu que eu adorava muito: chamarei-o de N. Eu não fazia amigos facilmente, porém não sei muito bem como conseguimos virar amigos tão rápido. Você podia olhar pra qualquer lugar que N estava que eu estava junto. Éramos tão inseparáveis que ninguém tinha coragem de falar conosco com medo de ignorarmos sua presença e continuarmos conversando entre si. 

E foi bem uma bela quarta que N decidiu virar um merda. Ele chegou em uma rede social e me perguntou se queria namorar comigo. Na hora, eu recusei e falei que não tinha idade ou maturidade para namorar alguém ainda e ele decidiu falar que "se eu não aceitasse, roubaria um beijo de todo jeito, não adiantava o que eu fizesse". Faltei a aula no dia seguinte. Assim que cheguei, no outro dia, ele havia mudado de lugar (ele costumava sentar na minha frente) e se recusava a conversar comigo. 

Moral da história, que ele mesmo jogou na minha cara depois: Ele foi meu amigo por todo esse tempo por interesse em mim - em querer namorar comigo. Ele fez mais um monte de coisas que fogem do assunto central do texto, mas saibam que ele foi um merda. Voltei, então, a estaca 0 de amigos. 

Depois disso, mais uns 3 garotos que eu friendzonei nunca mais conversaram comigo após eu ter recusado e deixado bem claro que ainda queria a amizade deles. Isso só me deixava mais e mais frustrada por ter que perder amizades por conta desses namoros precoces. 

Foi no começo desse ano (por volta de 25 de janeiro), no meio dessas crises de frustração, que eu decidi pesquisar mais a fundo sobre isso. Por que isso acontecia? Era óbvio que eu passei a não me sentir normal no meio disso tudo. 

A esse ponto, eu já conhecia a Assexualidade e me identificava um pouco. Nunca me senti interessada em ter relações sexuais com outra pessoa. Acho o ato até um pouco... repulsivo. Mas o Arromantismo era novo. Não sabia nem da diferença entre -sexualidade e -romantismo, mas depois de ler um pouco sobre, eu fiquei "uau, faz sentido". 

 Arromantismo é o romantismo para quem não sente atração romântica por alguém. A pessoa pode até estar em um relacionamento, mas não sente a necessidade de "fazer coisas românticas". 

Eu nunca achei que isso definia direitinho o que eu era. Mas era o mais próximo e, logo, eu adotei. Fiz um post em uma rede social de um desenho que eu havia feito com uma personagem minha segurando a bandeira e, em um dos comentários, no meio da conversa dos meus amigos, comentei que era mais para a minha família.

Não achei que alguém iria ler, mas minha mãe leu e decidiu procurar sobre. Fiquei surpresa por ela ter se interessado a ponto de procurar. E por incrível que pareça, ela não reclamou nem nada, apenas falou que "não se importava com o que eu era, contanto que eu seja feliz" (eu nunca gostei do jeito que minha mãe age, mas isso foi +200 de respeito pra ela).

Me juntei a diversas comunidades aro/ace (abreviações para arromântico e assexual, respectivamente) e fui percebendo devagar que eu não era totalmente arromântica.

Eu apenas confundia essa pequena atração que eu tinha com uma forte amizade. É, não me achem estranha, mas eu confundia amor com amizade. Já tive diversos amigos que eu gostava e só fui perceber depois. 

Falando agora, soa muito claro, mas esse sentimento foi incrivelmente confuso para mim por muitos meses. Eu madrugava pesquisando sobre, perguntando em grupos de visibilidade aro/ace (até nos gringos cheguei a perguntar), mas nenhum me dava certeza. Sinceramente, eu não achava que seria um amor platônico, realmente não esperava. 

Longos meses que passaram diversos termos na minha cabeça. Vai lá a lista de alguns:

— Gray-arromântico. É na metade entre sentir ou não atração romântica. O "gatilho" para sentir a atração muda de indivíduo para indivíduo.

— Arromântica mesmo e esse sentimento é apenas uma amizade forte.

— Demiromântica. Sente atração romântica depois de criar um forte laço com a pessoa. Na teoria, eu ainda não havia alcançado totalmente esse "laço".

— E, por último, mas não menos importante, Quoiromantic. Se trata de uma pessoa que não consegue entender o conceito de "atração romântica" e/ou não existe ainda uma sexualidade específica para o que você sente. 

De todo jeito, mesmo que tenha demorado e eu tenha ficado cada vez mais confusa, eu finalmente consegui achar o que eu sou. A parte mais difícil de se identificar com uma sexualidade tão esquecida é a falta de apoio que você acha em qualquer lugar. Você não descobre essas coisas facilmente e precisa de pesquisa mais pesada para encontrar algo. 

Porém, não desista de se encontrar! Seja sua sexualidade, romantismo ou gênero, nunca desista de achar um. E, mesmo depois de não conseguir, não é errado se identificar como Quoi/sexual/romântico/gender ou até mesmo criar e dar um nome você mesmo. Vai que há outros que se sentem como você, desesperados porque não encontram nada em lugar algum sobre o que eles são? É um sentimento desesperador, como se você não estivesse completo. 

Creio eu que vocês estejam cansados de ouvir sobre minha vida particular, mas achei que seria necessário para ilustrar a situação para quem não consegue imaginá-la. 

Então, é isso. Se você for de uma sexualidade esquecida pela sociedade ou não sabe a sua ainda, não tema. É comum ficar confuso antes de saber o que somos pois nunca fomos treinados para isso, para esses momentos. O medo de "sair do armário" também é grande e por isso muitos vivem mentiras bonitas para os outros. Nah, pra que isso? Seja você mesmo sempre que puder. Algum dia, poderemos ser nós mesmos a todo momento e isso vai ser incrível. 

Agora que você chegou ao fim e leu a minha estória, que tal passá-la para o seu amigo do lado? Ele pode estar desesperado consigo mesmo e esse pequeno texto pode servir de motivação para que ele encontre a luz no final do túnel. 


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Notas finais do capítulo

Em dedicatória a minha mãe, que sempre aceitou qualquer sexualidade que eu achava ser sem questionar qualquer nome ou opção que eu preferia (ou melhor, NÃO preferia, nesse caso).



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