Não era típico de Cedric Diggory se deixar dominar por temores irreais ao ponto de sua ansiedade acabar deixando-o insone.

    Todavia, nas circunstâncias em que ele se encontrava, aquele tipo de reação era, no mínimo, consentânea.

       Mas não era apenas a insistência de seu cérebro em atormentá-lo que o mantinha desperto naquela madrugada.

       Já deveria ser por volta das duas da manhã e todos os estudantes da Lufa-Lufa repousavam em suas camas.

       O campeão legítimo de Hogwarts caminhava de um lado para o outro freneticamente, temeroso quanto aos horrores que viria a enfrentar na tarefa final do Torneio Tribruxo logo na manhã seguinte. Talvez algumas horas de cochilo fossem essenciais para que ele conseguisse concluir a prova com a maestria que seu pai e seus colegas esperavam - era praticamente uma cobrança indireta.

       No instante em que ele havia colocado seu nome no Cálice de Fogo, estava ciente de que provavelmente seria posto de frente para a morte, cara a cara, em algum momento da competição.

       Entretanto, agora que esta ideia assustadora começava a despir-se do plano abstrato para assumir uma forma cada vez mais tangível - questão de algumas horas, apenas -, ela já não lhe parecia mais tranquila quanto antes.

       “Respire fundo, Cedric”, mentalizou, retendo as pálpebras e inspirando para tentar acalmar-se. “Não seja covarde”

       Atrás do tapete amarelo gracioso e felpudo e das poltronas de couro caramelo que compunham a decoração medieval, mas opulenta, do salão comunal de sua casa, um rosto formou-se a partir da própria brasa da lareira e a voz de Oliver Wood saiu como um sussurro animado, que imediatamente despertou Cedric de suas reflexões internas e capturou sua atenção.

       Ele virou-se, de prontidão, e se agachou diante do rosto conhecido, sorrindo ao constatar a presença do amigo.

       Oliver Wood estava viajando por toda a Europa em busca de um time que lhe acolhesse temporariamente já fazia um ano, mas isso não o impedia de conversar com seu conterrâneo durante um dia sequer.

       Ele já não tinha família. Desde a Primeira Guerra Bruxa, seus pais haviam falecido lutando bravamente ao lado de Dumbledore e da Ordem da Fênix e sua avó havia ido a óbito ainda no ano que antecedeu sua formatura, o que tornava Cedric o mais próximo que ele tinha de uma família, naquele momento.

       — Sentiu saudades? — sorriu Wood.

       — Você não tem ideia — riu-se Diggory.

       Por um momento, os olhos deles se encontraram e Cedric sentiu uma pontada perfurar seu peito. Era frustrante, tê-lo ali, diante de si, mas não poder tocá-lo. A vontade de apalpar o fogo ardente era intensa, mas ele resistiu com sensatez.

       — Preparado para amanhã? — perguntou, rompendo com o silêncio que, apesar de não ter se estendido por muito mais que alguns segundos, arrastou-se como horas na mente grifina de Wood.

       O sorriso e o olhar sereno imediatamente abandonaram o rosto alvo de Cedric. Ele maneou a cabeça negativamente, agora sério.

        — Você vai arrasar, bro — garantiu Oliver, com um sorriso encorajador.

       Cedric riu.

       — Ainda com essa mania? — Ele ergueu as sobrancelhas.

      Até onde sabia, eles haviam concordado em parar de se chamar daquela maneira. Indiretamente, pelo menos.

       — Bem, foi você quem disse que não somos um casal, não é? — acusou ele em tom de brincadeira.

       — Ah, casal parece meio brega — ponderou ele. — Você não acha?

       — Ah, depende — Wood considerou a possibilidade. — Só se você me pedir pra te chamar de “meu amorzinho”.

       E os dois riram alto, em perfeita sintonia.

       — Agora se sente preparado? — continuou Oliver, com seu sorriso sedutor cortando o horizonte das maçãs do rosto pálido.

       Ele sabia, como ninguém, como acalmar Cedric.

       — Preparado, talvez — refletiu. — Cem por cento, seguro...

       — Você vai ganhar, bro — assegurou ele. — Essa taça já é sua.

      — Nossa — corrigiu ele, sem pensar, e ambos ficaram quietos de repente. Oliver corou. — Quero dizer, e-eu...

       — Sem crise — aliviou Wood. — Nossa.

       E sorriu de novo, plenamente. Cedric pensou um pouco antes de falar, envergonhado demais para olhar diretamente para Oliver.

       — Ganharei por você. — E sorriu timidamente.

       Oliver correspondeu com um gesto semelhante.

       — E eu estarei aí de volta antes que você precise tirar o pó da nossa taça. 

      E embora ambas as promessas tivessem sido cumpridas, só um deles sobreviveu para se lembrar daquela noite.