Girls and Blood — Reimagined Twilight escrita por Azrael Araújo


Capítulo 2
One


Notas iniciais do capítulo

Olar, pessoinhas.
Eu recomendo muito essa música, que me ajudou a desenvolver o enredo da história. Prestem atenção na letra, se quiserem ouvir.

https://www.youtube.com/watch?v=nOyIAAVz0bg



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Fazia 24 graus em Phoenix quando chegamos ao aeroporto. O azul do céu parecia melancólico e tudo que eu queria era entrar no avião antes que acabasse desistindo dessa loucura.  

Respire fundo, apenas respire fundo.  

Caí o olhar rapidamente pelo retrovisor do carro, os olhos azuis me encarando com um brilho de frustração. Saí do carro, sendo seguida pela minha mãe que analisava minha passagem enquanto seu novo marido abria o porta-malas.

Meu peito se aqueceu ao observar como ela sorria para ele, como seus olhos azuis brilhavam sempre que ele a encarava. Sim, eu estava fazendo a coisa certa.

O que eram três anos, afinal?  

Logo eu me formaria no ensino médio, conseguiria uma bolsa em algum lugar razoavelmente ensolarado e teria a tranquilidade de dizer que havia passado um tempo de qualidade com meu pai.  

Não parecia tão ruim, agora. Talvez eu devesse parar de ser tão melodramática. Ou talvez a culpa seja desse estúpido céu azul-claro que eu não veria pelos próximos anos. A escolha foi minha, de qualquer forma, então eu não poderia reclamar. O que não tornava as coisas mais fáceis.  

A questão é que eu adorava Phoenix, as pessoas apressadas, o sol, o calor, a cidade grande.... E adorava morar com minha mãe.  

— Você sabe que não precisa fazer isso, certo? Pode ficar conosco, querida. — disse ela enquanto eu me encaminhava ao posto de segurança.  

Minha mãe — Renée — diz que somos tão parecidas que eu poderia usá-la como espelho. Eu sempre ri disso, apesar de saber que não é totalmente verdade — não que eu me pareça com meu pai. O queixo dela é pontudo e os lábios são grossos, bem diferente dos meus, mas temos quase os mesmos olhos. Nela, são infantis, grandes e azul-claros, o que a faz parecer minha irmã sempre que ela sorri. Em mim, o azul parece profundo, mas confuso.  Ou talvez agressivo.

Ao olhar novamente para aqueles olhos grandes e preocupados, tão parecidos com os meus, senti pânico. Éramos somente eu e minha mãe desde sempre. Ah, claro que Charlie — meu pai — me ligava a cada dois dias, pagava minhas contas médicas e aparecia aqui nos verões durante duas semanas. Mas no geral... 

Perguntei-me se eu estava mesmo fazendo a coisa certa. Se eu não estava sendo egoísta. Pareceu ser, ao menos durante os meses em que a vi oficializar sua relação com Phil até subirem ao altar.  

Mas agora parecia completamente errado.  

É claro que ela não precisa mais tanto de mim, ela tem o Phil.  

— Eu quero ir — menti.   

Ela soltou um suspiro pesado. — Diga a Charlie que mandei lembranças.  

Apenas assenti, apreciando a forma como ela acariciava meus cabelos.  

— Nos veremos logo. — prometeu ela. — Pode vir para casa quando quiser... Phil e eu voltaremos se você precisar.  

Mas eu sabia o quanto lhe custaria largar sua lua-de-mel para voltar para a filha quase-problemática-porém-não-tanto.  

— Não se preocupe comigo — insisti. — Vai ser ótimo. Eu te amo, mãe.  

Ela me abraçou com força por um minuto me empurrando em direção a Phil logo em seguida. Ele me deu um tampinha nas costas enquanto colocava seu boné de beisebol azul do Los Angeles Dodgers na minha cabeça.  

— Cuide dela. —sussurrei enquanto me afastava e ele assentiu.  

Passei pelos detectores de metal e eles sumiram.

  

De Phoenix até Seattle são três horas de voo, mais uma hora em um pequeno avião até Port Angeles, e depois uma hora de carro até Forks. Voar nunca me incomodou; a hora no carro com Charlie, porém, era meio preocupante.  

Na verdade, ele foi bem legal com tudo e parecia até feliz com o fato de que iria conviver comigo pelos próximos três anos. Já tinha feito minha matrícula na escola e falava sempre algo sobre uma surpresa para mim.  

Mas ia ser estranho. Não éramos o que se chamaria de extrovertidos, e eu me lembrava bem o quanto ele não era... Falante. De qualquer forma eu deveria me lembrar de agradecê-lo.  

Quando pousei em Port Angeles, estava chovendo e eu revirei os olhos enquanto apertava o casaco escuro e cruzava o aeroporto.  

Charlie me aguardava na radiopatrulha.   

Meu pai é o chefe de polícia Swan para o bom povo de Forks.  

Eu me perguntei, bobamente, se teria que andar pela cidade em um carro com luzes vermelhas e azuis no teto. Talvez eu devesse comprar uma bicicleta.  

Assim que me aproximei, ficamos em um minuto de confusão enquanto ele não sabia se me abraçava ou se apertava minha mão. Eu também não sabia o que fazer.  

— Hã... Então... — ele começou, constrangido e eu dei-lhe um abraço desajeitado, me afastando logo em seguida. — É bom ver você, Isabella — disse ele, sorrindo. — Você cresceu. Como está a Renée?  

— Mamãe está ótima. É bom ver você também, pai. — Eu não podia chamá-lo de Charlie na frente dele.  

— Tudo bem. — ele deu de ombros e nos curvamos para pegar minha bagagem.  

Charlie levou a maioria das malas e me deixou com as mais leves, apesar de eu insistir de que poderia carregar mais. Em todo caso, ainda que estivesse com pouco peso, minha coordenação motora não era das melhores e acabei esbarrando em alguém enquanto cruzava a porta de saída.  

— Ah, desculpe. — eu murmurei, mal olhando a garota que estava tentando entrar.  

— Desculpe? — repetiu ela, como se meu pedido de desculpas tivesse sido ofensivo.  

Ela não parecia muito mais velha do que eu em meus 16 anos e era quase da minha altura, mas veio para cima de mim com o queixo erguido. Consegui ver tatuagens nos dois lados do pescoço. Um cara esguio com o cabelo tingido de preto olhou para mim de forma ameaçadora ao lado dela.  

— Hã, é...  

E então, os dois repararam em Charlie, que estava de uniforme.  

Charlie não precisou nem dizer nada. Ele só olhou para o sujeito, que deu meio passo para trás e de repente pareceu bem mais jovem, e depois para a garota, cujos lábios vermelhos grudentos faziam beicinho. Sem dizer uma palavra, eles desviaram de mim e entraram no pequeno terminal.  

Charlie e eu demos de ombros ao mesmo tempo.  

Era engraçado como tínhamos alguns maneirismos iguais mesmo não passando muito tempo juntos. Talvez fosse genético.  

— Lembra da surpresa da qual eu falei? — anunciou Charlie quando já estávamos de cinto e a caminho de casa.  

 Assenti, olhando pela janela. 

Tudo que eu conseguia ver era verde. As árvores, o chão, os estúpidos troncos de árvores... Aquilo era um esquilo verde?

— Lembra-se de Bonnie Black?

O encarei com uma cara de tédio.

— Ela e o marido costumavam pescar conosco nos verões. — ele jogou no ar, esperando que eu tivesse algum flash de reconhecimento. — Ela está numa cadeira de rodas agora e não pode mais dirigir. — ele continuou, atraindo minha atenção de volta para si — Me ofereceu um dos carros da família. 

— Que tipo de carro? — perguntei, desconfiada. 

— Bom, é um Chevrolet Tracker 2008. A Bonnie mandou fazer algo no motor e a coisa funciona muito bem. 

A coisa, pensei comigo mesma. 

— É barata mesmo? — Afinal, essa era a parte determinante.  

— Bom, filha, já está comprada para você. Seu... presente de boas-vindas. — Charlie me olhou de lado com uma expressão esperançosa.  

Caramba. De graça.  

— Não precisava fazer isso, pai. Eu mesma ia comprar um carro.  

— Tudo bem. Quero que você seja feliz aqui.  

Ele estava olhando para a estrada à frente ao dizer isso.  

Charlie nunca ficava à vontade quando se tratava de externar as emoções em voz alta. Mais uma coisa que tínhamos em comum. Então fiquei olhando para a frente quando respondi.  

— Isso é demais, pai. Eu agradeço muito.   

— Não foi nada — murmurou ele, constrangido com minha gratidão.  

Trocamos mais alguns comentários sobre o clima até que chegamos à casa de Charlie — agora, minha casa. Ele ainda morava na casa de dois pisos que comprara com minha mãe nos primeiros tempos de seu casamento. Aqueles foram os únicos tempos que o casamento teve — os primeiros.  

Seria cômico se não fosse trágico. 

Ali, estacionado na rua na frente da casa, estava meu novo meio de transporte. Era de um azul escuro quase preto, com rodas médias e janelas limpas. 

E eu adorei. 

Eu não era o tipo de garota que curtia carros — ou que entendia —, então fiquei meio surpresa com minha própria reação. 

— Caramba, pai, é incrível! Obrigado! — eu fiquei pulando em volta do carro. 

— Que bom que você gostou — disse Charlie enquanto coçava a nunca sem graça. 

Depois de subir para meu novo quarto e desorganizadamente organizar todas as minhas coisas, me senti um pouco melhor — quase em casa. 

A sensação durou até o momento em que minhas mãos ficaram desocupadas e eu pude sentar na ponta da cama, acariciando o edredom macio. 

Fiquei olhando pela janela com vista para a floresta, o céu nublado, enquanto as lágrimas ameaçavam queimar meus olhos. Senti vontade de bater em mim mesma. 

A escolha foi sua, não é como se você tivesse sido exilada, recitei a mim mesma. 

A Forks High School tinha apenas 357 — agora 358 — alunos; em Phoenix, esse mesmo total de pessoas estava só no meu prédio. Todos os jovens daqui foram criados juntos — seus avós engatinharam juntos. Eu seria a garota nova da cidade grande, para quem todos olhariam fixamente e sobre quem cochichariam.  

Talvez, se fosse uma garota do tipo descolada, eu pudesse fazer com que isso funcionasse a meu favor. Se chegasse com jeitão de popular ou de líder de torcida... Mas não dava para esconder o fato de que eu não era esse tipo de pessoa. Minha única vantagem era ser a garota com pernas de quem devia ser boa no futebol, mas com uma coordenação motora terrível. A garota antissocial e albina, que não sabia nada sobre maquiagens ou revistas de moda e nem nada que deveria conhecer.  

Diferente das outras garotas, eu não tinha um monte de tempo livre para hobbies. Eu tinha... Meus próprios problemas. 

Ou costumava ter.  

Eu odiava o fato de não me relacionar bem com as pessoas da minha idade. Até a minha melhor amiga de infância de Phoenix não era mais tão próxima, como deveria ser... Talvez a verdade fosse que eu não me relacionava bem com as pessoas, ponto final. 

Às vezes eu me perguntava se via as mesmas coisas que o resto do mundo. Se o que eu via como verde era o que todo mundo via como vermelho. Talvez eu sentisse cheiro de vinagre quando as pessoas estivessem sentindo cheiro de coco. Talvez houvesse um problema no meu cérebro, algum parafuso solto que faz barulho quando você chacoalha. 

Mas não importava a causa. Só o que importava era o efeito. 

E amanhã seria só o começo.  

 

Acordei pela manhã bem cedo e fiquei deitada de barriga para cima, ensaiando um sorriso desanimado. 

O café da manhã com Charlie foi silencioso. Ele me desejou boa sorte na escola e saiu para proteger a boa população de Forks. 

Ainda estava chuviscando quando saí de casa. Dentro do Tracker estava agradável e seco. Alguém tinha feito uma limpeza e agora os bancos cheiravam a algo agradável e suave. Liguei o rádio enquanto saía para a rua. 

Não foi difícil encontrar a escola; como a maioria dos lugares, ficava perto da rodovia. Na verdade, eu teria passado direto pelo lugar se não houvesse uma placa de Forks High School bem na entrada. Era um conjunto de casas iguais, construídas com tijolos marrons. 

Estacionei perto do portão de entrada e segui para o prédio que me pareceu ser a secretaria. Enquanto tentava passar pela porta, esbarrei em alguém que estava saindo. Era uma garota, alguns centímetros mais alta do que eu. Os cabelos castanhos claros estavam escondidos sob o capuz do casaco, mas seus olhos grandes e afiados me fitaram por detrás de um par de óculos escuros.

— Desculpe. — eu murmurei, minhas bochechas ficando vermelhas. 

— Tudo bem. — ela sorriu, ainda me encarando — Hã... Sou Riley Biers. 

Ela me estendeu a mão e a apertei, nossos dedos frios se entrelaçando por um momento. 

— Sou Isabella. Swan. — acrescentei, sentindo um flash de reconhecimento passando por seus olhos. 

— Você é filha do chefe Swan, certo? 

Apenas assenti, suspirando. 

— Bem, deixe-me ser a primeira a te dar as boas-vindas. — ela sorriu de forma simpática e isso fez eu me sentir menos deslocada. 

Fomos interrompidas por alguém que tentava sair da sala da secretaria e só então me dei conta de que ainda estávamos paradas na entrada. Um garoto mais jovem passou por nós rapidamente e a porta se fechou. 

— Bem, eu tenho que ir... Preciso pegar meus horários. 

Ela assentiu rapidamente, seus olhos ainda me analisando, mas não de uma forma maldosa. 

— Sabe — ela começou — porque não senta comigo na hora do almoço? Posso te apresentar aos meus amigos. 

Sua voz falhou um pouco e me perguntei se ela estaria nervosa. 

— Seria ótimo. Eu não conheço ninguém aqui. 

Ela pareceu mais animada com ideia, assentindo rapidamente e abrindo a porta para que eu pudesse passar. 

— Até mais, Isabella. 

Quando entrei na salinha, um homem careca olhou para mim por cima do balcão.  

— Posso ajudá-la?  

— Sou Isabella Swan — informei-lhe, e vi o mesmo reconhecimento imediato nos olhos dele. Dessa vez, porém, foi diferente. Com a garota Riley eu não acho que seria assunto de fofoca. Com esse careca... 

— É claro — disse ele e cavucou uma pilha de documentos em uma mesa até encontrar o que procurava. — Seu horário está bem aqui e um mapa da escola. — Ele trouxe várias folhas ao balcão para me mostrar.  

Sorriu para mim e disse, como Charlie, que desejava que eu gostasse de Forks. Sorri também, da maneira mais convincente que pude.  

Quando voltei ao Tracket, outros alunos começavam a chegar. Dirigi pela escola, seguindo o trânsito. Estacionei em uma vaga aleatória e memorizei o mapa rapidamente. 

Não vai ser tão ruim, menti para mim mesma. 

Mas, falando sério, nem era uma situação de vida ou morte, era só a escola. Eu poderia me bater nesse momento. 

Peguei a mochila, fechei o casaco e saí do carro. 

Depois de chegar ao refeitório, foi fácil localizar o prédio três onde seria minha primeira aula. Um grande “3” estava pintado em preto num quadrado branco no canto leste. A sala de aula era pequena. As pessoas na minha frente pararam junto à porta para pendurar os casacos em uma longa fileira de ganchos, mas eu preferi ficar com o meu por perto. 

Entreguei a caderneta à professora, uma mulher magra com pouco cabelo cuja mesa tinha uma placa identificando-a pelo nome, “Sra. Mason”. Ela me encarou com surpresa quando viu meu nome e me mandou sentar numa carteira vazia no fundo da sala, sem me apresentar à turma. 

Era mais difícil meus novos colegas ficarem me encarando lá atrás, mas de algum jeito eles conseguiram. Mantive os olhos baixos na bibliografia que a professora me dera. 

Era bem básica: Brontë, Shakespeare, Chaucer, Faulkner. Eu já tinha lido tudo. Imaginei se minha mãe me mandaria minha pasta com os trabalhos antigos, ou se ela pensaria que isso era cola. Tive várias discussões com ela em minha cabeça enquanto a professora falava monotonamente.  

Quando tocou o sinal, uma garota magricela com problemas de pele e cabelo preto feito uma mancha de óleo se inclinou para falar comigo.  

— Você é Isabella Swan, não é? — Ela parecia direitinho o tipo prestativo de clube de xadrez.  

— Sim.  

Todo mundo num raio de três carteiras se virou para me olhar.  

— Qual é a sua próxima aula? — perguntou ela.  

Tive que olhar na mochila.  

— Hmmm, educação cívica, com Jefferson, no prédio seis.  

Para onde quer que eu me virasse, encontrava olhos curiosos. 

— Vou para o prédio quatro, posso mostrar o caminho. — Sem dúvida, superprestativa. Quase revirei os olhos. — Meu nome é Erica. — acrescentou ela.

Eu forcei um sorriso.  

— Obrigado.  

Esperei ela pegar seu casaco e fomos para a chuva, que tinha aumentado. 

— E aí, aqui é bem diferente de Phoenix, não é? — perguntou ela.  

— Muito. 

— Não chove muito lá, não é?  

— Três ou quatro vezes por ano... 

Voltamos pelo refeitório até os prédios do sul, perto do ginásio. Erica me levou à porta, embora tivesse uma placa bem evidente.  

— Então, boa sorte — disse ela enquanto eu pegava a maçaneta. — Talvez a gente tenha mais alguma aula juntas. — Ela parecia esperançosa e eu estava entediada.

Sorri para ela de um jeito que torci para que não parecesse encorajador e entrei.

O resto da manhã se passou do mesmo jeito. 

Minha professora de trigonometria, a Maldita Sra. Varner,  foi a única que me fez parar diante da turma para me apresentar. Depois de duas aulas, comecei a reconhecer alguns rostos em cada turma. Um garoto se sentou ao meu lado nas aulas de trigonometria e me acompanhou até o refeitório na hora do almoço. Era baixinho — ainda assim, mais alto que eu —, o cabelo escuro, rebelde e cacheado parecia bem cuidado. Não conseguia me lembrar do nome dele, então eu sorria e assentia enquanto ele tagarelava sobre professores e aulas. Não tentei acompanhar a falação. 

Finalmente, depois de comprar minha comida, reconheci a garota Riley acenando animadamente para mim em uma das mesas perto das janelas.

Me aproximei e ela me apresentou a vários de seus amigos. Eles pareceram achar legal ela ter me convidado. A menina da aula de inglês, Erica, acenou para mim do outro lado do salão, e Riley riu. Ergui uma sobrancelha, questionadora, mas ela apenas piscou um dos olhos e arrastou uma cadeira para sentar ao meu lado.

Foi ali, tentando conversar com sete estranhos curiosos, que eu os vi pela primeira vez.  

Estavam sentados no canto do refeitório, à maior distância possível de onde eu me encontrava no salão comprido. Eram cinco. Não estavam conversando e nem comendo, embora cada um deles tivesse uma bandeja de comida diante de si. Não me encaravam, ao contrário da maioria dos outros alunos, por isso era seguro observá-los.

Mas não foi nada disso que atraiu minha atenção.  

Eles não eram nada parecidos.

Havia três garotas; dava para ver que uma era superalta, até mesmo sentada. Provavelmente eu conseguiria medir duas de mim apenas com suas pernas. Tinha cabelo escuro e ondulado, preso em um rabo de cavalo descuidado.

Outra tinha cabelo cor de mel na altura dos ombros; não era tão alta quanto a morena, mas devia ser mais alta do que a maioria dos outros garotos da minha mesa. Havia algo de intenso nela, de ousado. Era meio estranho, mas, por algum motivo, ela me fez pensar em uma atriz que vi em um filme de ação algumas semanas antes, que matou mais de dez caras com uma machadinha. 

Ri internamente. A maníaca da machadinha. 

A última garota era menor, o cabelo era um ruivo de tom alaranjado que brilhava fortemente. Ela parecia mais nova do que as outras duas.  

Os dois garotos eram opostos. O mais alto deveria ter um metro e noventa e cinco ou até mais. O cabelo louro e liso estava preso em um coque na nuca, mas não havia nada de feminino no penteado; de alguma forma, fazia com que parecesse mais homem.  

O cara mais baixo era magro, com cabelo escuro cortado tão curto que não passava de uma sombra no couro cabeludo.  

Eram totalmente diferentes, mas, ao mesmo tempo, eram todos tão parecidos. Cada um deles era pálido como giz, os alunos mais brancos que viviam nesta cidade sem sol. 

Mais brancos do que eu, a quase-albina

Todos tinham olhos muito escuros (de onde eu estava, pareciam pretos), apesar da variação de cor dos cabelos. Também tinham olheiras – arroxeadas, em tons de hematoma. Talvez os cinco estivessem chegando de uma noitada. Ou estivessem se recuperando de um nariz quebrado. Mas os narizes, todos os seus traços, eram retos, angulosos.  

Só que não era por isso que eu não conseguia desgrudar os olhos.  

Fiquei olhando porque seus rostos, tão diferentes, tão parecidos, eram completa, arrasadora e inumanamente lindos. As garotas e os garotos, lindos. Eram rostos que não se via na vida real, só em páginas de revista ou outdoors. Ou em um museu, pintados por um antigo mestre como a face de um anjo. 

Era difícil acreditar que eles eram de verdade.  

Concluí que a mais bonita de todas era a garota menor com o cabelo ruivo, embora eu presumisse que a metade feminina do corpo estudantil votaria no sujeito louro com cara de ator de cinema. Mas elas estariam enganadas. Todos eram lindos, mas a garota era mais do que bonita. Ela era simplesmente perfeita.

Era um tipo de perfeição perturbadora e incômoda. Deixou meu estômago embrulhado. Esperava não estar pegando ranço por uma desconhecida.  

Enquanto eu observava, o garoto magro e quase careca se levantou com a bandeja — o refrigerante fechado, a maçã sem nenhuma dentada — e se afastou com passos longos, rápidos e graciosos apropriados para uma passarela. Fiquei olhando, me perguntando se havia uma companhia de dança na cidade, até que ele largou a bandeja no lixo e seguiu para a porta dos fundos, mais rápido do que eu teria considerado possível. Meus olhos dispararam de volta aos outros, que não tinham se mexido.  

— Quem são eles? — perguntei ao cara da minha turma de trigonometria, cujo nome eu esquecera.

Enquanto ele olhava para verificar de quem eu estava falando, de repente ela olhou para nós, a garota perfeita. Ela olhou para o meu vizinho só por uma fração de segundo, e depois seus olhos escuros fulguraram para mim. Eram olhos longos, curvados nos cantos, com cílios grossos.  

Ela desviou os olhos rapidamente, mais rápido do que eu, que baixei o olhar assim que ela se virou para nós. Consegui sentir as manchas vermelhas surgindo no meu rosto. Naquele breve instante, seu rosto não transmitiu nenhum interesse.  

Meu vizinho riu uma vez, sem graça, olhando a mesa como eu.  

Ele murmurou a resposta bem baixinho.  

— São os Cullen e os Hale. Edythe e Eleanor Cullen, Jessamine e Royal Hale. O que saiu é Archie Cullen. Todos moram com a Dra. Cullen e o marido.  

Olhei de lado para a garota perfeita, que agora parecia estar falando em voz baixa com eles.  

Nomes estranhos. Antigos. 

Finalmente me lembrei de que meu vizinho se chamava Jeremy. 

— Eles são todos... muito bonitos. — Que minimização da verdade.  

— É — concordou Jeremy com outra risada. — Mas todos estão juntos... Royal e Eleanor, Archie e Jessamine. Tipo namorando, sabe? E eles moram juntos. — Ele deu uma risadinha e balançou as sobrancelhas de forma sugestiva.  

Eu não sabia por quê, mas essa reação me deu vontade de defendê-los. Talvez só por ele ter falado com um tom tão crítico. Mas o que eu podia dizer? Eu não sabia nada sobre eles.  

— Quem são os Cullen? — perguntei, querendo mudar o tom, mas não o assunto. — Eles não parecem parentes... quer dizer, mais ou menos...  

— Ah, eles não são. A Dra. Cullen é muito nova. Tem trinta e poucos anos. Os filhos Cullen são todos adotados. Os Hale, os louros, são mesmo irmãos, gêmeos, eu acho, e são filhos de criação.  

— Parecem meio velhos para filhos de criação.  

— Agora, são. Royal e Jessamine têm 18 anos, mas estão com o Sr. Cullen desde que eram pequenos. Ele é tio dos dois, eu acho.  

— Isso é bem legal... eles cuidarem de todas essas crianças, quando eram tão novos e tudo isso.  

— Acho que sim — disse Jeremy, apesar de parecer que ele preferia não dizer nada positivo. Como se não gostasse da médica e do marido por algum motivo... e, pelo jeito como olhava para os filhos adotivos, eu imaginava que podia haver certa inveja. — Mas acho que a Dra. Cullen não pode ter filhos — acrescentou ele, como se isso tornasse menos admirável o que eles faziam.  

Durante toda essa conversa, não consegui afastar os olhos da estranha família por mais de poucos segundos. Eles continuavam a olhar para as paredes e não comiam.  

— Eles sempre moraram em Forks? — perguntei.  

Como eu podia não os ter notado em um dos meus verões depressivos aqui?  

— Não. Só se mudaram há dois anos, vieram de algum lugar do Alasca.  

Enquanto eu os examinava, a garota perfeita, uma dos Cullen, virou-se e encontrou meu olhar, dessa vez com uma expressão de evidente curiosidade. Quando desviei os olhos rapidamente, me pareceu que o olhar dela trazia uma espécie de expectativa frustrada.  

— Quem é a garota de cabelo avermelhado? — perguntei.  

Tentei olhar casualmente na direção dela, como se estivesse dando uma avaliada no refeitório; ela ainda estava me encarando, mas não com cara espantada, como os outros alunos hoje. Ela tinha uma expressão meio frustrada, que não entendi. Olhei para baixo novamente.  

— É Edythe. Ela é gata, é claro, mas ela não sai com ninguém. Ao que parece, nenhum dos caras daqui é bom o bastante para ela. — Jeremy falou com amargura, depois grunhiu.  

Eu me perguntei quantas vezes ela o tinha rejeitado.  

Apertei os lábios para esconder um sorriso. Depois, olhei para ela de novo. Edythe. Seu rosto estava virado para o outro lado, mas achei, pelo formato do pescoço, que ela também podia estar sorrindo.  

Depois de mais alguns minutos, os quatro saíram da mesa juntos. Todos eram muito elegantes — até o rei do baile dourado. Era estranho vê-los juntos em movimento.  

Edythe não voltou a olhar para mim.  

Fiquei sentada à mesa com Riley e os amigos dela por mais algum tempo até que o sinal bateu e eu me preparei para a próxima aula. Uma de minhas novas conhecidas, Angela, teria a mesma aula e seguimos juntas em silêncio para a sala. Ela devia ser tímida como eu.  

Quando entramos na sala, Angela foi se sentar em uma carteira de tampo preto de laboratório exatamente como as que eu costumava usar. Ela já tinha parceiro. Na verdade, todas as cadeiras estavam ocupadas, exceto uma.  

Ao lado do corredor central, reconheci Edythe Cullen, por seu cabelo alaranjado, sentada ao lado daquele único lugar vago.


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Notas finais do capítulo

TT @pittymeequaliza



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