FRAGMENTO 10

(Sabia que nossas escolhas de palavras mostram muito mais sobre quem somos do que as próprias frases?)

Louis Weasley frequentara várias mansões e casas de famílias bem abastadas bruxas ao longo de seus anos em Hogwarts, uma das muitas vantagens de ser o que chamamos de borboleta social. Seu charme era um elemento muito útil quando se tratava de se infiltrar em círculos de velhas amizades: após poucos minutos em sua presença extravagante, todos se davam por vencidos pelas suas longas sobrancelhas e seus cabelos loiros. O caçula de Bill e Fleur incorporava em seus maneirismos e roupas bem escolhidas a imagem desejada do bruxo do século XXI: aí podemos encontrar uma boa razão para o garoto nunca ter conseguido se fazer presente nos salões dos Safo Nott, apesar de algumas boas tentativas. 

Mantinha a compostura com as mãos juntas atrás das costas, uma distância considerável entre ele e seu tio Percy e pai. Não estava ali além da motivação mais supérflua que era atestar se havia de fato sido privado de algo extraordinário quando não pudera comparecer à festa de noivado de Lucy, sua prima e filha do dito tio que o acompanhava, e a herdeira Nott.

Talvez o gosto amargo no fundo de sua garganta fosse arrependimento por ter sugerido a possibilidade de Safo e Dominique terem alguma conexão. Ele não imaginara que Bill o levaria a sério, afinal sempre desdenhara de suas conexões dentro da nata da sociedade bruxa. Louis ficava sabendo dos fatos antes dos jornais sonharem em publicá-los, e, fofocas da alta sociedade podem facilmente se tornar escândalos políticos em uma questão de organização de frases. Não era a toa que Hermione, sua ex-tia, se essa definição sequer existe, o mantinha próximo como olhos e ouvidos ao redor da bêbada e rica juventude: a prole dos poderosos poderia ser muito mais suscetível a compartilhar segredos diante de um toque gentil no ombro e um sorriso sedutor.

Bill alinhou o terno que usava com a mão, e se segurou para não deixar seus dedos correrem pelos fios ruivos, sabendo que os desalinharia. Desviou seus olhos da porta para Percy que encarava a maçaneta de forma intensa demais, provavelmente levado por outros pensamentos, mas o outro logo percebeu o olhar do mais velho e seus olhos se cruzaram. A porta foi aberta alguns segundos depois.

— Boa-tarde, a Sra. Nott e a Srta. Nott os esperam, os senhores devem ser os Weasleys. – Louis olhou para o mordomo-chefe da mansão, curioso quanto à ausência de elfos domésticos – Peço que me acompanhem até lá.

Percy tomou a liderança do grupo:

— Sim, somos nós, boa-tarde. – sua voz pareceu firme, mas o loiro quase não conseguiu engolir a risada que queria sair diante do evidente nervosismo do tio.

O mordomo, Beaumont, apenas sorriu e se virou, indicando o caminho. Ao longo da rota até a sala onde há pouco deixamos Elvira e Safo esperando as não tão inusitadas visitas, o homem de cabelos grisalhos fez comentários sobre as pinturas que enfeitavam as paredes, evitando a prevalência do barulho dos passos. O Weasley mais novo olhava para os corredores com um pouco de interesse, deixando sua vista vagar pelos papéis de parede e a madeira envernizada do chão. Logo chegaram à porta da sala, por onde Beaumont entrou primeiro anunciando a chegada.

Elvira já estava de pé em frente do sofá com suas mãos atrás das costas e um pequeno sorriso no rosto, a filha ao lado mantendo uma expressão menos afável, mas não explicitamente desagrada.

— Sra. Nott, que prazer revê-la. - exclamou Bill no seu barítono profundo e grosso, sendo ele o primeiro a entrar na saleta.

— O prazer é meu, e não precisa de tantas formalidades, Bill. – a mulher dispensou o aperto de mão que ele parecia oferecer, envolvendo-o com seus braços num abraço. Louis observou como parecia mais uma aranha cercando a presa do que um contato agradável, mas nada falou.

Percy e Elvira se cumprimentaram rapidamente, tentando ignorar o noivado desfeito entre suas filhas. Enquanto isso, Bill já se voltava para Safo, quem se aproximou a passos lentos, estendo a mão:

— Prazer, Sr. Weasley, sou Safo. – ela falava meio rápido, mas Bill não viu tantos problemas, e envolveu a mão menor num aperto firme, sendo surpreendido pela dureza que recebeu em retorno. Apostava em passar uma figura de autoridade para a garota mais jovem, porém o modo que ela empinava o queixo levemente já era suficiente para ver que seus esforços seriam insuficientes.

— Igualmente, chame-me somente de Bill, por favor. – falou enquanto sacudiam brevemente as mãos, ganhando um pequeno puxar positivo de lábios da moça.

Louis já se precipitava para, dessa vez, ser ele quem fosse envolver a Sra. Nott em suas garras.

— Estou absurdamente encantado, senhora. – piscou as longas sobrancelhas imprimindo no gesto o charme por qual era tão famoso.  

Elvira identificou os modos dele no segundo em que ele entrou na sala com seus olhos de águia, já sabendo a quem atribuir àquela visita.

— Oh, seu filho é adorável, Bill. – comentou após plantar dois beijinhos na face do Wealsey.

Ela e os adultos já se sentavam nos sofás quando Safo e Louis se encontraram frente a frente, obviamente analisando um ao outro e medindo forças e pontos fracos.

— Finalmente posso dizer que conheço a famosa Safo. – sussurrou baixinho no ouvido dela enquanto trocavam os cumprimentos adequados.

— Você pode dizer que já me encontrou, Weasley, não que me conhece. – ela deixou escapar antes que pudesse se conter, gerando um risinho irônico por parte de Louis.

Safo distanciou-se e foi se sentar ao lado da mãe, enquanto Louis se dirigia para a direita do pai. Eles já estavam a conversar sobre algum tópico importante e desinteressante para o objetivo dos visitantes, o que deu impulso e segurança a Louis.

— Acho que agora compreendo porque Domi não conseguia calar a boca sobre a noiva de Lucy.

Sua frase foi mal calculada a penetrou uma pausa silenciosa entre Elvira e os Weasley, ressoando de forma levemente rude, mas a Nott mais velha tinha habilidade em desviar e evitar situações constrangedoras.

— E como está Fleur? – dirigiu-se para Bill, preocupação cobrindo qualquer marca de falsidade da sua expressão. – Li sobre o sumiço de Dominique nos jornais.

Louis Weasley se contentou em observar toda face controlada de Safo, quem parecia levemente compenetrada na conversa.

— Está lidando com a situação da melhor forma possível, sim – Bill lutou para não desviar os olhos, acabando por ceder aos seus anseios e bagunçando o cabelo. – Sabemos que ela está viva e bem, o que é ótimo, porém nos parece que ela está sem comunicação contra a vontade.

A interlocutora meneou a cabeça em entendimento, gesticulando que estava escutando. Bill continuou:

— Ela estava lançando a carreira de modelo com os produtos da família de Fleur, não há razão para não falar conosco.

— Muito estranho, é verdade, Bill. Se eu puder ajudar de qualquer forma, não hesite em me falar. Aceita um chá ou café? – perguntou aos visitantes, indicando o mobiliário de chá.

— Aceito um chá com açúcar, obrigado. – Louis foi o único a responder positivamente, os outros dois declinando à oferta.

Elvira voltou a se sentar, e ocupou o diálogo com sua voz enquanto preparava a bebida, preparando espaço para Safo elaborar sua resposta mentalmente. Elas sabiam que estava chegando.

— Sabe, Elvira, é extraordinário visitá-la, mas realmente estamos aqui por Dominique. – Percy sorriu tomando o embalo de passar os motivos de sua presença.

— Oh, sim, meu marido deve ter comentado algo, mas acabou fugindo da minha mente com a presença de Safo, - a mulher de cabelos crespos sorriu de lado indicando com o queixo para a filha. – ela visita pouquíssimo, espero que Louis não o faça vítima dessa desfeita também, Bill.

— Não tenho oportunidade, ainda moro na casa de meus pais, senhora Nott. – Louis respondeu com suavidade, gerando risadas leves.

Percy limpou a garganta, retomando o seu discurso e inclinando-se para a antiga nora. Nunca fora próximo de Safo, embora tenha jantado várias vezes junto de Lucy e dela. Elas eram alegres juntas, comentando espertamente as últimas notícias, e de vez em quando Nott deixava escapar algo sobre uma exposição de artes da qual faria parte, mas no final o pai de Lucy nunca chegara a conviver com ela em tamanha intensidade para se ver convidado a entrar na vida dela.

— Tivemos sorte de vir aqui justo hoje, já que queríamos falar com você, Safo. – Bill falou.

Ela sorriu e balançou os ombros.

— Se eu puder ajudar de alguma forma. – suas palavras vagaram pelo ar por alguns momentos.

— Foi você quem conduziu o sumiço de Domi, não é? – Louis jogou sem rodeios ou maquiagem, recebendo com jubilo o choque que passou pelos olhos de Elvira, mas a reação da Nott nova foi de confusão.

— Não vejo como seria possível, Louis, - ela parecia verdadeiramente afetada pelo questionamento. – embora eu saísse com ela junto de Lucy – seu olhar desviou para Percy. – perdemos contato depois do término. E afinal, o que eu ganharia fazendo parte da fuga de Dominique?

Bill e Percy pareciam convencidos, já se encarando e chegando a um acordo de dar fim ao encontro, mas o mais novo ali, loiro e desprezado até mesmo pelo pai, arqueou uma sobrancelha e cruzou os braços, enxergando a tensão no corpo da garota.

— Não sabia que era uma fuga, Safo. Por que você não nos conta mais sobre isso?

Aquilo de certo sobressaltou os Weasley quem tiveram sua atenção retomada pelo comentário de Louis, mas Elvira também já se precipitava para interceptar o rumo da conversa. Safo somente acompanhava o grande relógio que mostrava que ela já estava mais do que atrasada para a reunião no ateliê de Artemísia. Se Louis tivesse algum poder de decisão, eles não sairiam dali tão cedo.