A Aurora de Castelobruxo - A Harry Potter Story escrita por ThaylonP


Capítulo 2
Avenida 25




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De todas as coisas incomuns do ambiente incomum, dos pais incomuns e da vida incomum; a coisa mais incomum de todas essas, certamente era a Aparatação. Segundo seu pai e os comentários infinitos de Emília, Aparatação se tratava de um método mágico de transporte que levava de um local ao outro em segundos. Não haviam lhe dito que seu corpo iria se desdobrar e encolher em todas as direções; que sua visão ficaria escura e turva, como se o ambiente à sua volta fosse algo distorcido e intocável; que seria como se tivesse entrado em um furacão com um giro tão concentrado que a mente se tornaria apenas algo que parecia ser ejetado do corpo. E, certamente, ninguém a avisara sobre as náuseas.

— N...blergh! – disse ela, antes de regurgitar todo seu café da manhã na parede do beco.

O pequeno esconderijo aonde foram aterrissaram era estreito e sujo. Quase completamente cinza, com lixeiras e lixo fora delas, espalhado por todo o lugar. Cascas de banana, latas de refrigerantes e restos de animais mortos permeavam o local, dando a Aurora mais vontade de vomitar do que a Aparatação. Quando se levantou de seu ato nojento, olhou ao seu redor, imaginando se havia risco de encontrar partes humanas naquele beco. Emília, fez questão de dizer que não, sacudindo o dedo negativamente, de cima do ombro de seu pai. Luiz Magalhães olhava a filha, aguardando a própria se recuperar para prosseguir na jornada.
O pai, dissera que antes de ir para a tal Castelobruxo, tinham que passar em um lugar para comprar material escolar. Aurora já havia visitado um local que parecia algo do tipo, e isso a fazia imaginar que tipo de material teriam para comprar naquele beco. Uma casca de banana de caderno; duas canetas de sujeira e para levar tudo isso, aquele saco de vinte litros. E mais, que tipo de coisas um bruxo teria de comprar? O pai, carregava aquela varinha (como ele a explicou antes), mas seria só aquilo?
A menina terminou de se recuperar e viu que o pai olhava para fora do beco, espreitando a saída deles. Da área, podia ouvir um barulho imenso de pessoas andando de um lado para o outro, chamando umas às outras, gritando preços, pechinchando, brigando, se insultando e fazendo tudo que o povo tupiniquim era profissional. Aurora sentiu uma sensação de familiaridade. Era um mercado, conhecido e famoso, por vezes pelos motivos errados e algumas vezes pela quantidade de motivos errados.

— Pronta, filha? – perguntou o pai, dando a mão para a menina e saindo do beco.

A multidão se misturou com o pequeno grupo. O pai, que vestia uma camisa social com manga dobrada, calça social justa e um sapato, se aventurou por entre o povo, abrindo caminho por eles. Sua camisa azul–claro estava seca, apesar de que não estava nenhum pouco suado; talvez, os óculos escuros, o impedissem de se incomodar com o clima, mas a mesma, vestia roupas mais adequadas para a temperatura, e mesmo assim, transpirava bastante; vestia seu macacão jeans, tênis branco e uma blusa azul por dentro. O sr. Magalhães, se dirigia para um prédio em frente a um cruzamento, mas na beirada da calçada, resolveu mostrar a grandiosidade do ambiente, dizendo:

— Bem–vinda – ele fez uma pausa dramática. Típica de suas brincadeiras. –, à Vinte Cinco de Março!

A empolgação que ele queria transmitir murchou, pois o que a criança via eram camelôs, gente suada se esbarrando e um cheiro de comida oleosa.

— Tá… isso é bem diferente do que eu imaginava… – resmungou a garota.

— Diferente? – a voz de Emília saiu de dentro do bolso do sr. Magalhães. Ele a empurrou para dentro. Ninguém poderia vê–la ali.

— Como diferente? – o pai questionou, olhando a filha e pegando em sua mão para atravessar o cruzamento.

— Achei que ia da de cara com coisas voando, criaturas esquisitas e tal, algo mais rústico, não… Aladdin.…

O pai gargalhou. Começaram a andar em direção ao prédio de estrutura colonial e antiquada à frente deles. Havia uma grande passada que levava até a outra avenida, do outro lado da rua em que estavam. Passaram pelo cruzamento, empurrando as pessoas com dificuldade e educação ao mesmo tempo, caminhando de um ao lado do outro, enquanto a boneca estava amassada no bolso do sr. Magalhães. Ouviam gritos constantes de anúncios verbais, não–verbais (placas e cartazes) e até gritos dos próprios consumidores reclamando de anúncios verbais e não–verbais.

— Está olhando errado, Aurora.

Adentraram o espaço que era apenas um corredor, até o outro lado. A luz quente de fora, dava lugar para um ambiente de sombra, com uma espécie de bilheteria dos dois lados da área estreita. O pai de Aurora, remexeu em seu bolso e sacou sua varinha novamente, enquanto paravam no centro do corredor, antes de chegar ao final do mesmo.

— Tá bom.. Deixar minha mente viajar na maionese – caçoou ela ao ver o pai erguer o objeto mágico. – O que deveria acontecer, agora?

O homem tocou sua varinha no chão, em lugares específicos. O piso, de tijolo antigo, se afundou em três pontos, como um código de passagem secreta. Depois, ele se levantou e guardou o instrumento. Aurora esperou algo acontecer e quando estava prestes a reclamar, tudo começou a se modificar. Eles ainda estavam virados para o outro lado da passagem, mas os pés da menina e de seu pai foram balançados, como se o cômodo estivesse passando por um terremoto. Sentiu como se o chão abaixo de si rotacionasse, num movimento surpreendente e impossível para qualquer estrutura comum. De repente, tudo parou de se mover.

— Tudo bem, agora chegamos… – disse o pai, se virando para trás e andando de volta da rua onde estavam.

Quando a garota se virou, ficou perplexa. Todo o lugar mudara. Ao caminhar pela passagem, a luz invadiu seus olhos, acordando–a para uma visão fantástica. A rua, tinha um cruzamento de quatro vias, onde centenas de pessoas passeavam; não eram pessoas comuns, como as de antes, e sim, bruxos e bruxas vestidos de chapéus pontudos, vestes longas e coloridas e portando vassouras ou cajados. Acima das ruas, voavam uma centena de pipas sem linha, controladas por crianças acima dos ombros de seus pais, que balançavam as mãos para movê–las de um lado para o outro – uma típica demonstração de poder bruxo infantil. As lojas, antes tendas de camelô com muitíssima quantidade de parafernálias e trecos inúteis e falsificados, agora eram lugares com fachadas coloniais, conectados aos prédios da rua; ornamentadas nas paredes e janelas, com um toque antigo clássico e elegante. Alguns, ainda eram pequenas tendas, onde se vendiam comidas e outros produtos menores. Aurora, desejou ter mais um par de olhos para observar tudo. E creu, que mesmo se tivesse, não conseguiria olhar tudo. Chegou até o meio do cruzamento com seu pai, e viu uma estrutura metálica semelhante a um poste que se estendia sem tocar o chão e exibia placas por toda sua extensão, que iam para quatro lados e intercalavam entre si. As placas em formatos de mãos apontando, continham indicações de alguns lugares de nomes peculiares como: Porta–Vassouras, Agenda da Rainha Louca, Cajados–não–são–Bengalas, entre outras. A menina, novata nas experiências mágicas, apenas deu mais uma olhada em volta para observar uma dezena de crianças, se dirigindo até uma barraca que parecia ser uma pastelaria, estenderem a mão para o atendente. O homem, alegre, com um bigode e sorriso simpático, depositou um guardanapo nas pequenas mãos e em seguida, apoiou uma massa crua aberta com um punhado de recheio em cima de cada um. Aurora, estranhou o comportamento, mas quando viu o alimento se assar sozinho e fechar–se em um lindo pastel dourado e crocante, ficou fascinada. Atrás de si, o pai tirava a boneca de seu bolso e apoiava sobre o seu ombro. Emília respirava o ar puro com satisfação, já que o ambiente abafado de um bolso de uma calça social podia ser um pouco opressor.

— Filha – disse ele, tocando a cabeça da criança. – Te apresento a Avenida 25 – dessa vez, ele não tentou ser dramático.

— Isso é fascinante! – a garota fala admirada com todas as novidades. Sua curiosidade estava explodindo em sua mente. A partir dali, ela não só desejara mais olhos como mais ouvidos também.

— Bom, aonde temos que ir? - pergunta o pai, retoricamente. Resolveu consultar o brinquedo. – Está com a carta, Emília?

— Sim, sim… - ela remexeu em seus minúsculos bolsos e tirou um papel que certamente não caberia ali. - É isso?

— É? Espera… por que não entregou pra Aurora antes? É a carta dela! - o pai disse, indignado.

— Ela gritava demais… - a boneca argumentou, estendendo a carta para a garota.

— Eu ia saber que você falava? - retrucou a garota, recolhendo o papel envelopado e o abrindo.

A garota abriu o papel dobrado. Era um velho e encardido, típico de cartas antigas. Em cima, um brasão representando a escola: Um núcleo cinza com um C no centro e abaixo, um rolo de pergaminho aberto com as inscrições "Noli Turbare Tapirs Dórmiunt In Silva". Abaixo, os dizeres:

Escola de Magia e Bruxaria de Castelobruxo

Prezada Srta. Magalhães,

Temos o prazer de informar que V. Srta. tem uma vaga na Escola de Magia e Bruxaria de Castelobruxo.

Estamos anexando uma lista dos livros e equipamentos necessários. O ano letivo começa em 1° de julho. Aguardamos que sua escolha seja por optar nossa Escola. Nos vemos em breve.

Atenciosamente,
Benedita Dourado, diretora.



Por último, ao final, uma cera dourada com um carimbo de um desenho do brasão acima e a assinatura linda e rebuscada da diretora.

— E aí, o que compramos primeiro? - perguntou Emília, ansiosa.

— Espera, mas o que diz que precisamos comprar, exatamente? Faz tempo que minha carta veio… – explica o pai.

Aurora já havia sido informada que existiam mais escolas de bruxaria pelo mundo e que Hogwarts era uma delas. Luiz Magalhães, havia se mudado para os Estados Unidos com oito anos de idade, portanto recebeu a carta de Ilvermorny e não de Castelobruxo. Quando terminou os estudos, voltou para o Brasil, sem saber que sua carta havia também chegado para sua casa brasileira.

— Mas pai… - a garota estava confusa. - Não tem lista. Só a carta.

O homem se aproximou e examinou o documento.

— Você tem que sacudir o papel, filha – disse ele.

— Certo – ela obedeceu.

Após balançar a folha com rapidez, como se misturasse um shake, os escritos contidos nela mudaram para uma extensa lista:


Escola de Magia e Bruxaria de Castelobruxo
 

Uniforme
Os estudantes do primeiro ano precisam de:

1. Três conjuntos de vestes comuns de trabalho (verdes, que podem ser customizadas como capas, mantos, ponchos, entre outros à escolha do aluno), além de uma camisa social branca e uma opção entre shorts jeans ou saia verdes para as meninas e calças marrons para os meninos.
2. Um par de luvas protetoras (pele de Torttura ou similar)


Livros
Os alunos devem comprar um exemplar de cada um dos seguintes:

— Livro padrão de feitiços (1ª série) de Miranda Goshawk
— História da Magia, de Batilda Bagshot
— Teoria da Magia, de Adalberto Waffling
— Guia de Transfiguração para Iniciantes, de Emerico Switch
— Um Milênio a mais de Herbologia, de Narcisa Venturini
— Bebidas e Poções Mágicas, de Arsênio Jigger
— As Américas Criaturas do Sul, de Julia Negrini
— As Forças das Trevas: Um Guia de Autoproteção, de Quintino Trimble

Outros equipamentos
1 cajado mágico
1 caldeirão (estanho, tamanho 3)
1 conjunto de frascos
1 telescópio
1 balança de latão
1 conjunto de ferramentas de plantas (prata, cobre)
Obs.: Os alunos podem ter uma arara, uma serpente ou um mico.


— Serpente? Castelobruxo não está para brincadeiras, mesmo – disse o sr. Magalhães, coçando a parte de trás da cabeça.

Aurora leu e releu a lista e sentiu falta de um detalhe que vira todos os bruxos que conheceu terem: A varinha.

— Pai, acho que ficou faltando a varinha… – disse ela, virando e revirando o papel, sacudindo-o na esperança de mudá-lo novamente.

Emília saltou para o ombro de Aurora para analisar a lista.

— Está aqui – ela aponta. - Fofa, está escrito, “cajado mágico”, bem aqui.

— Aqui é diferente? - questionou o pai.

— Sim, os alunos de Castelobruxo usam cajados, gente. Bem, não são bem cajados no primeiro ano, mas dão para o gasto.

O sr. Magalhães achou o fato interessante.

— Entendi – resmungou, chateada, pois queria uma varinha como a de seu pai.

— Muito prático, sr. Merlin! - debochou ela.

Os três começam a andar, se aventurando por entre as ruas, à procura do objeto mágico. As tendas e lojas tinham de tudo. De tudo mesmo. Aurora olhou fascinada uma cambada de crianças correrem na frente da sua caminhada, carregando uma figurinha pentagonal que se movia, enquanto outros tentavam correr atrás de um sapo marrom que a menina tinha quase certeza de que era feito de chocolate. A sensação na magia era impressionante, no meio da rua de paralelepípedos, a pequena sentia-se alegre e tentava acompanhar tudo, assumindo quanta informação era necessária. Um ser passou por ela, grande, largo, gordo e de nariz achatado no rosto, como um porco. Suas narinas podiam ser vistas por completo e brotava cabelo delas. Na cabeça, o couro cabeludo era ralo e escasso, porém liso e esbranquiçado como um velho. A pele da criatura era densa e grossa, com inúmeros ferimentos, cortes e machucados em geral. Os membros eram largos, como se o homem (só podia ser um homem) tivesse elefantíase. Usava uma vestimenta de trapos, com uma bermuda de um tecido rasgado. A loura olhou com cuidado, mas sr. Magalhães a alertou:

— Não olhe muito, filha. São Irradores. Dizem que se olhar muito para eles, as feridas dele passam para você.

Após isso, Aurora não olhou mais. Uma gritaria estourou à frente deles, porque vinha passando um grupo de adolescentes, gritando, se esbarrando e rindo, todos com capas e mantos verdes. Aurora viu, depois dos garotos, algumas pessoas com bonecas Emília nos ombros, assim como sua família.

— Espera, você faz parte do pacote de estudantes? – disse ela, mostrando as outras bonecas semelhantes.

— Claro que não – ela respondeu, desdenhando a sugestão. – Nunca ia ser baixa como elas! Argh! – a criatura fez uma faceta de nojo.

— São Animatus, filha – explicou o pai. - São criaturas feitas a partir de um feitiço de mesmo nome, dando vida aos objetos. Foi criado pelo Lobato.

— Espera, Monteiro Lobato? - a garota perguntou, surpresa.

— Só Lobato, como ele preferia – respondeu o pai. – Pelo que eu soube, quando visitou Castelobruxo tentou arranjar uma forma das crianças receberem suas cartas. Então, criou o feitiço. As Emílias, são compradas por famílias de bruxos e de putos…

— Pai! Que isso? – disse, incomodada com o palavrão.

— Perdão, filha, é como chamamos os não-bruxos aqui. Quer dizer, na América do Sul inteira – ele disse, depois prosseguiu o que estava explicando.

— Então, para os bruxos, é apenas um ato necessário, pois sabem que se seu filho ou filha for bruxo, terão que eventualmente comprar a Emília que entregará a carta; para os trouxas, o feitiço contido nas bonecas, os atraem para adquirir o brinquedo, sem saberem, estão com um mensageiro de Castelobruxo em suas casas.

— Fantástico – afirmou a garota, com olhos brilhantes perante as explicações.
Mais pessoas andavam com Emílias em seus ombros. Algumas carinhosas, outras solidárias, outras amorosas e apenas a sua, pensou Aurora, era a faladora piadista.

— Certo… é tanta coisa esquisita que não sei por onde começar a aprender… vamos logo comprar as coisas.

— A loja de cajados é bem ali – a boneca apontou.

Um homem gritou do fundo da rua um alerta, e Aurora só teve tempo de pular para trás. Um garoto, gorducho, voava na direção de sua família com rapidez em uma vassoura. Os cabelos ondulados até o ombro se agitavam com a velocidade da partida e ele irrompeu à frente da garota e subiu, acertando uma das pipas flutuantes. Pelo visto, estava fora de controle, e não sabia como pilotar. O pai, riu e deu de ombros, enquanto o dono da loja gritava que o garoto havia saído sem pagar. Emília achou hilário e quase caiu do ombro da menina de tanto rir.

— Que tonto – disse sorrindo, querendo parecer não assustada com o fato de que provavelmente voaria em uma também.

— Chegamos – disse o pai, andando em direção à loja Cajados-não-são-Bengalas.

A porta era de uma madeira dura e rígida, que era ligada a um pequeno conjunto de escadas, também de madeira. Na frente, podia-se se ver nas vitrines, cajados expostos, grandes e suntuosos, de formatos diferentes e com preços exorbitantes. Acima, além do nome da loja, a placa tinha um lembrete entalhado em madeira: Do inepto ao sábio, do aprendiz ao mestre. O lugar era gigantesco. A fachada em si, não era grande, mas o interior se estendia por cerca de uns bons vinte metros. O cheiro de madeira era quase hipnótico e por um tempo, Aurora teve que se acostumar à sensação de polimento das coisas. Nas paredes, haviam diversos suportes para cajados e à frente, muitas estantes para as coisas que, de fato, não eram bengalas. Ao fundo, cobrindo toda a extensão da parede de trás, uma vasta quantidade das mesmas ferramentas mágicas, que por si só, eram bonitas demais. Bem moldadas, bem polidas, bem ornamentadas; isso gerou na garota uma sensação e uma vontade muito forte de querer um, apesar de não saber muito bem como se portar carregando um objeto tão grande, pois alguns tinham cerca de um metro e pouco. Um homem estava sentado numa cadeira, mas ao ouvir o barulho do sino de entrada, levantou-se e avançou na direção dos clientes. Tinha o cabelo cinza e um bigode branco. Olhos pequenos e apertados por causa das rugas do rosto, mas o sorriso de um vô que lhe dá dinheiro de aniversário. Vestia um robe largo que devia ser branco, mas estava bastante encardido, mas por cima das vestimentas, um longo tecido macio e azul-escuro agindo como cachecol e protetor para os braços. Apesar de sua idade andava normalmente ereto.

 – Bom dia! – disse ele. Aurora teve vontade de abraçá-lo, todo miúdo em suas roupas largas. – Procurando cajados?

— Ah, bom dia! Sim, estamos. Primeiro cajado da vida! - disse ela, animada como nunca.

— Primeiro? – o homem olhou a boneca de pano no ombro da criança. – Ah, entendo… entendo. Castelobruxo, certo? – ele não a deixou responder. - Tudo bem… me acompanhe.

Ele andou mais à frente, chegando as estantes. Eram oito no total, dispostas com uma largura de dois corpos entre elas. Ele se dirigiu para a do centro mais para o lado esquerdo. O sr. Magalhães esperou um pouco mais atrás, deixando a filha ir com o dono da loja. Ele puxou de uma das prateleiras, uma caixinha, semelhante àquelas que se levam colares, com cerca um palmo e meio de largura. Abriu a tampa e revelou um pedaço de madeira levemente avermelhada, com riscos transversais em relevo, fundos, por toda a extensão do objeto. Era lindo.

— Cajado feito de Jacarandá, rígido, com essência de azevinho e núcleo de Valeixo. Delicada, porém consistente. Uma excelente peça. - afirmou ele.

— Eu adoro vermelho… - suspirou a garota, olhando o artefato. - Mas isso não parece um cajado… como funciona? Na verdade… para que serve?

— Os cajados são uma espécie de varinha, a princípio, e se estendem à medida que o bruxo amplia seu conhecimento mágico. O cajado da sra. Dourado, por exemplo, tem dois metros de altura. Imagina o quanto essa mulher sabe… aliás, que mulher…

O lojista se perdeu um pouco nos elogios, imaginando coisas, perdido em pensamentos. Então, o pai resolveu explicar mais detalhes à sua filha.

— Então – começou o pai –, as varinhas, ou cajados no caso, são um condutor das habilidades do bruxo.

— Isso, isso mesmo – o lojista continuou, retornando à realidade. - Pode testar, pegue.

O homem continuou com as mãos estendidas para Aurora. Ergueu a mão para pegar o instrumento, mas se deteve quando chegou mais perto.

— Ah… como se faz isso? E será que eu não posso acabar, sei lá, explodindo a loja?

— Não tem problema… consertaremos depois – disse ele, rindo de canto da sua forma fofa.

A garota estava em conflito sobre o que achar do vendedor. No começo, era um velho fofo e depois mostrou-se um pouco estranho falando da sra. Dourado. Decidiu que tinha tempo para decidir-se mais tarde.

— Certo…

Ela envolveu os dedos entorno da madeira e puxou até si. Sacudiu o cajado de um lado para o outro levemente, esperando alguma reação. Mas, nada aconteceu. A reação foi estranha e inesperada. Nada acontecera. Ela sacudiu e sacudiu e nada além de vento conseguiu ser jogado pela varinha. O lojista logo recolheu o instrumento rapidamente, devolvendo-o para seu lugar na estante.

 – Nossa… só porque era a minha cor… - lamentou-se ela. – Por que não aconteceu nada?

— Porque o cajado não te escolheu, filha. Calma, o certo chegará – disse o sr. Magalhães, consolando a criança.

O grupo se dirigiu para duas fileiras à esquerda da anterior, ficando agora mais próximo da parede.

— Aquela tinha o núcleo de Valeixo, certo? - perguntou o adulto, próximo à filha. - Pensei que era proibido recolher os corações dos Valeixos.

— Sim, é proibido. Mas o Ministério promulgou a lei esse ano, então ainda podemos vender o estoque remanescente – explicou o velho, encontrando mais uma caixa.

— O que é um Valeixo?

— Valeixo é um ser florestal e mágico, que se anexa em troncos de árvores centenárias ou milenares, como uma espécie de dono. Todos tem um núcleo, um coração, que alimenta a própria criatura, a árvore e um arredor de mata em volta de si. Foram proibidos de serem usados como núcleo de varinha porque se você mata um, mata toda uma quantidade de árvores em volta. E isso é cruel, não acha? – explicou o pai.

A garota assentiu e recebeu a caixa e abriu para ver a ferramenta. Emília saltou para o antebraço para presenciar a abertura da caixa. O vendedor velho explicou:

— Feito de madeira de Ipê, flexível, com raiz de ipê dourado e núcleo de Vermifugo-de-ouro – disse ele.

Esse era diferente. Mais irregular e entortava-se na extremidade, formando uma espécie de curva na madeira. Era menos lustrado, porém mais áspero e cascudo, como se de fato, a garota estivesse com as mãos sobre a árvore. Em volta, ornamentando, uma espécie de raiz se envolvia até a ponta de baixo, onde a guarda estava, supôs ela que aquela seria a guarda.

— Achei muito bonita! Fica com essa, Aurora! - disse Emília.

Seria fácil se fosse só escolher, né boneca?

— É realmente bonita… - olhou para o pai. - Vermifugo-de-ouro é uma criatura, pai?

— Sim. É um pequeno verme que carrega pepitas de ouro em suas costas – explica o pai. - Pelo que já vi de fotos, é muito bonito. Tem outras espécies que carregam outras pedras preciosas, mas acho que você vai aprender isso na escola – sorriu ele.

— E… é do mesmo núcleo que a varinha da sra. Dourado. Ah… Dourado… - disse o lojista, se perdendo novamente.

A garota olhou para o instrumento e o sacou da caixa. Nada aconteceu, novamente. Ela se frustrou por completo. Acreditava que daquela vez era a certa.

— Droga… - reclamou.

— Hum, que curioso – disse o homem, devolvendo o instrumento à caixa. 

— Calma, filha – disse o pai, pondo a mão sobre o ombro da garota. 

— Tô achando que essa aí nem é bruxa – afirmou Emília, caçoando a dona.

O vendedor observou as estantes, intrigado, procurando mais um para teste e encontrou ao chegar em uma prateleira central daquela mesma fileira aonde estavam.

— Acredito que esse é perfeito – diz ele, abrindo a tampa do compartimento do cajado. - Feito de bétula branca, maleável, com cipó de trepadeira-de-outono e núcleo de Alaspavor.

O objeto era bem esbranquiçado. Na parte da empunhadura, haviam umas vinhas marrons enroladas para a mão do portador; da extremidade até a ponta mais grossa, a bétula seguia como um galho, com pontas para fora e curvaturas características.

— Melhor de três, né? - disse ela, com um sorriso amarelo, apreensiva.

Empunhou o instrumento e novamente, nada aconteceu. A expressão do pai se fechou e Emília ficou quieta. O vendedor olha para a menina, mais intrigado com aquele detalhe. Parecia ser incomum. Aurora se abalou pelo acontecimento, pois nenhum ali no aposento se pronunciou perante a garota cabisbaixa.

— Pai, como se chamam os não-bruxos, mesmo? - disse baixo.

— Putos, filha – respondeu receoso, questionando o porquê da pergunta.
 
A resposta simplesmente invadiu o ar e os ouvidos da criança. O lojista analisa a garota mais uma vez de cima a baixo. Talvez teria perdido algum detalhe físico e estava escolhendo os cajados errados. Ou não. A mão no queixo, indicava uma tentativa de raciocínio. Seria Aurora o problema?
O grupo passou um tempo na loja. Procurando e procurando. A pilha de cajados testados já passava de duas dezenas e a desolação na menina era visível em seus olhos caídos e boca cansada. Emília, deitada na escrivaninha do atendente, estava entediada com toda aquela demora. Aurora e seu pai sentaram-se numa pilha de livros no canto de uma mesa, aguardando o homem, que dissera:

— Vou ver no meu porão, deve ter algo para você lá – e abriu um sorriso piedoso.

A loura já começava a perguntar o seu pai quanto tempo ele tinha levado para escolher a varinha e se ela havia reagido bem para ele. O sr. Magalhães mentiu, e ela percebeu, quando disse que seu tempo foi de quatro horas. Aurora levantou-se, andou de um lado para o outro e investigou mais cajados. Olhou em prateleiras os que havia testado e outros que nunca vira. Nenhum reagiu a ela. Tentou com vários, mas nada.

— Aurora! - chamou Emília.

A menina olhou para trás e viu o atendente subir com algumas caixas de cajados em suas mãos. Ele parecia feliz. Encontrou meu cajado, tenho certeza, pensou ela. Ela testou as varinhas incansavelmente até a última caixa trazida pelo homem. Naquele instante, na vigésima quarta caixa, três horas já haviam se passado. Aurora, já sem esperanças, olhava para o pai e Emília extremamente desolada.

— Eu não entendo… todos que vieram aqui conseguiram seus cajados – afirmou o vendedor.

— Eu já não tô aguentando mais isso. Depenamos essa loja e eu não consegui fazer uma folha de papel se mexer… o que há de errado comigo? - perguntou ela, choramingando.

— Calma… - o sr. Magalhães não sabia mais o que dizer.

— Calma? Eu não quero calma! Eu quero que algum cajado faça algo! - gritou irritada, correndo loja adentro.

A menina saiu da vista de seu pai, que a encontrou minutos depois, sentada entre alguns compartimentos de cajados, abertos e largados ao abandono. Ele, angustiado, sentou-se ao lado dela. Imediatamente, ao perceber o pai, ela pôs sua cabeça entre seus joelhos, não querendo olhar para a face dele.

— Ei – disse Luiz, sentando-se ao lado da filha – vamos lá, não fique assim.

— Não… não é isso, pai… - a voz engasgada soou fraquíssima.

— É mais do que o cajado… certo? - questionou ele.

— É – disse ela, esfregando o rosto choroso na pele da perna.

— O que é, então?

— E se meu pai estiver certo – ela levantou a cabeça. Os olhos transbordavam. - E se eu não for bruxa e não precisar estar aqui! Ele me protegeu por um motivo, certo?

— Aurora…

— Não, pai! Sem Aurora! Talvez… fosse só mais um engano da Emília.

— Não é assim, filha…

— Não é? - sua voz subiu uma oitava. - Só olha pai! Não sirvo pra esse mundo… - concluiu ela, voltando à proteção nos joelhos.

— Aurora! Tem mais um! - gritou Emília enquanto a garota não queria mais ouvir.

— Aurora… eu sei que é difícil, mas… vamos lá, não custa nada tentar – ele pôs a mão na cabeça da filha.

— Não, pai… eu cansei…

— Só mais um – implorou ele.

— Não… - disse ela, de novo.

— Só mais um. Por mim. É o último. Depois a gente pode ir para casa – afirmou ele, solícito.

— Não sei… só mais um? - ela levantou a cabeça novamente, enxugando os olhos.

— Só. Mais um.

— Promete?

— Prometo – disse o pai, levantando-se e estendendo a mão para a menina. - Tenho certeza que dessa vez é esse! - afirmou.

Mas ele não tinha certeza.

Ao se aproximarem do velho, ele estava com uma caixa empoeirada às mãos, tremendo. Emília se mostrava orgulhosa, satisfeita por alguma coisa que fizera.

— Sabia que devia ter mais alguns, então perguntei para o velho se não tinha mais nenhum cajado bom nessa espelunca! E essa estava na gaveta dele! - afirmou ela, animada.

— A… aqui está… Aurora – disse o homem, ao ver a menina chegar. - Madeira de Orabutã, rígido, essência de flor de Orabutã e núcleo de fibra de dragão… - ele parecia receoso em compartilhar a informação.

O lojista engoliu em seco e abriu a caixa. O cajado tinha cerca de 20 centímetros, com uma madeira levemente escurecida e que se erguia retilínea até a ponta. Na estrutura, várias ranhuras pequenas como inscrições ou entalhes indígenas postos de forma tão sutil, que ao olhar meio lateralmente podiam-se ver traços vermelhos, característicos da árvore. Na empunhadura, era mais grossa do que a ponta, precisa e arredondada. Elegante e clássica. O sr. Magalhães olhava impressionado.

— Orabutã? Não estavam extintas? - questionou ele, com os olhos arregalados.

— Estão. Esse é o último cajado feita delas. Era comumente usado pelos europeus que colonizaram o país depois que descobriram as propriedades mágicas da árvore, mas… e a fibra, de Cornuálio Escarlate-americano, que também é de alta raridade… - o homem analisava o que tinha em mãos cuidadosamente. - O resto foi contido por serem temperamentais demais. Mas… não custa tentar…

Aurora observava com atenção. Parecia especial demais para uma garota rejeitada por metade dos cajados da loja. Tentar, pensou ela, aflita, tentar de novo. Ela não esboçou uma mínima reação de surpresa ou qualquer sentimento de felicidade por aquele artefato raro. Só queria ser rejeitada por mais um cajado e ir embora. Usarei Cajados de Bengala, pensou ela.

Num simples tocar de dedo na varinha, a mente de Aurora viajou.

Viu um turbilhão de coisas. Pessoas gritando seu nome com dor e sofrimento. Viu lugares em chamas. Vassouras voando sem cavaleiros irradiando chamas por toda a parte. Tudo era avermelhado, alaranjado e queimava. Ardia. O calor parecia derreter as feições de Aurora que mal conseguia se mexer. Às mãos, um longo cajado, repleto de detalhes de inscrições agora mais avermelhadas em destaque com a madeira escurecida. Mais gritos de dor. Uma pessoa à sua frente. Encapuzada. Sinistra. O fogo mal tocava sua pele, mas Aurora se sentiu queimar. Olhar aquela figura lhe fazia perecer. Seus olhos encheram-se de lágrimas e a figura sumiu, assim como sua visão. Ao retornar, estava arfando, suada e seus globos vazavam líquido intermitente, como se tudo presente em sua vida estivesse caindo num poço sem fundo.

— O que você viu? - perguntou o lojista, agitado, sacudindo a menina. – O que viu? - gritou novamente, e sua visão escureceu.

Aurora apagou.


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