02/05: Eu Odeio Essa Data... escrita por Kirimi


Capítulo 1
Eu não vou comemorar o dia da morte dos meus pais




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Teddy Lupin sempre foi um garoto independente. Andromeda Tonks o criou desta maneira, impedindo que o garoto fosse alvo de piedade por causa de sua condição como lobisomem.

O dia amanheceu nublado e uma fina garoa salpicava as janelas. Sempre que chovia, as plantas suspensas na Sala Comunal da Lufa-Lufa exalavam um perfume delicioso e o garoto gostava disso. Mas não hoje. Não nesse dia. Desde pequeno, nunca apreciou o dia dois de maio. Esse ano, a Batalha de Hogwarts completaria quinze anos, mas não é assim que Teddy enxergava a data. Hoje, completa quinze anos que seus pais foram mortos. Os pais que nunca conheceu, já que morreram quando o garoto tinha em torno de um mês de vida.

As comemorações do aniversário da Batalha eram infinitas. As aulas em Hogwarts eram suspensas e o evento era ainda maior que o Halloween, contando com muita comida, histórias, a visita de Harry Potter, seu Padrinho, e uma cerimônia solene, próxima ao Memorial da Batalha de Hogwarts, onde a Diretora McGonagall diria belas palavras ensaiadas, que fariam os descendentes e parentes das pessoas envolvidas no episódio, chorarem.

Teddy levantou, trocou-se e olhou no espelho. Tentou mudar os olhos e os cabelos, mas sem sucesso. Contentou-se com as cores naturais castanho para o cabelo e castanho claro, quase mel, para os olhos. Sempre que usava essas cores padrões e sem graça, todos diziam o quanto era parecido com o pai, quando jovem. Antes de sair do dormitório, procurou em seu malão pela velha caixa de madeira, dada por sua avó e a colocou delicadamente na mochila.

Tão logo deixou o Salão Comunal, dirigiu-se ao corujal, por onde mandaria seu presente para Victorie, afinal era naquela data horrível que ela fazia aniversário. Eles não se veriam hoje, ela sabia da angústia do garoto, e respeitava seu espaço e sua dor. Depois de voltar do corujal, sentou-se à mesa de sua Casa para quebrar o jejum, onde foi recebido com entusiasmo pelos outros Lufanos, afinal, Teddy era uma pessoa muito querida. Mal conseguiu terminar a torrada que mordeu e do suco de abóbora bebeu um único gole, e já se sentiu estufado. Depois da tentativa falha de refeição, dirigiu-se para a Torre de Adivinhação, onde a Professora Trelawney já o esperava:

— Fique à vontade, querido. - Ela disse, prestativa - Leve o tempo que precisar.

— Obrigado, Professora. Hoje a Torre de Astronomia está fechada... A senhora sabe... - Teddy respondeu, sem olhar diretamente para ela - Aqui, é o único lugar onde sei que ninguém vai me incomodar. Não quero ser obrigado a discursar sobre a morte dos meus pais...

Sem saber o que dizer, a Professora pousou a mão no rosto do garoto e deu a ele um olhar de sincera compreensão. Teddy não esperava mais que isso, na verdade, não queria mais que isso, só queria ficar sozinho. Subiu pelo alçapão e o fechou, sentindo a segurança da pancada oca da porta de madeira contra o chão de pedra. Diferente do odor costumeiro de incenso e xerez, a sala tinha um cheiro suave de erva-doce, que vinha de um bule, pousado numa das pequenas mesas junto com um prato de biscoitos de aveia, onde os alunos faziam as aulas. Teddy reparou que a xícara de detalhes azuis, estava apoiada num pires desparelhado amarelo-chamativo, e junto dele, havia uma pequena nota:

 

"Aproveite sua solidão, Sr. Lupin. Tome uma xícara de chá e coma alguns biscoitos. Nos vemos durante o jantar. 

S. Trelawney

 

PS: Quando quebrar o pires, pegue o que combina com essa peça. Coloquei o amarelo de propósito. Obrigada."

 

O garoto sorriu diante da gentileza da professora e de dirigiu às pesadas cortinas de veludo e as abriu, deixando a luz pálida e cinzenta do dia chuvoso adentrar. Quando voltou para se sentar, serviu o chá, pegou a xícara e ao esticar o braço para alcançar um biscoito, derrubou o pires amarelo, fazendo-o se partir em mil pedaços. Depois de consertar a peça com o feitiço "Reparus", seguiu a recomendação do bilhete da Professora e pegou o pires que combinava com sua xícara. Depois de apreciar o chá oferecido pela docente, o garoto foi até a janela, onde viu os jardins cheios de estudante em volta do Memorial e do túmulo do Professor Dumbledore. Ali, teve certeza de que a melhor decisão que tomou foi a de não participar daquele circo.

"Mas você é Monitor", disse uma voz aguda em sua mente. "Hoje eles conseguem se virar sem mim. Já deixei os outros Monitores avisados", sua própria voz retrucou. 

Na maioria das vezes, Teddy era um menino amável e gentil. Não explodia de raiva. Mas ao ver aquelas pessoas todas tomando chuva e vento "pela comemoração da Grande Batalha", teve vontade de gritar com elas. De dizer que aquilo não era bonito. Que só servia para abrir velhas feridas. Lembrou-se então, da única pessoa que conhecia que concordava plenamente com ele: George Weasley. Tio George nunca vinha a essas celebrações estúpidas para lembrar o quão doloroso foi a morte de seu irmão gêmeo.

Perdido em pensamentos, enquanto olhava para fora, arqueado sobre o parapeito da janela, ouviu uma batida de leve no alçapão que o sobressaltou. Quando abriu a porta quadrada, viu seu padrinho, segurando uma bandeja com comida e sorrindo para ele:

— Posso entrar, Teddy? - Perguntou Harry Potter.

O garoto não tinha como dizer não ao padrinho:

— Claro, Tio Harry. - O garoto abriu espaço para a passagem - Seja bem-vindo ao meu esconderijo. - Ele tinha uma tendência insana de fazer piadas sem graça quando estava nervoso. Diziam que herdara isso da mãe.

Harry posicionou a bandeja em uma das mesas mais altas e olhou em volta, admirando a sala:

— Faz anos que não subo aqui - comentou ele - Creio que nunca tenha visto essas cortinas abertas.

 

Teddy não aguentava enrolações:

— O que posso fazer por você, tio?

— Bom, pensei que você gostaria de se juntar a nós na solenidade depois do almoço.

— Não, obrigado. - O rapaz respondeu de forma mecânica - Estou bem aqui.

— Entendo sua dor... - Harry disse, com sinceridade - Mas espero que entenda o quanto manter essa memória viva é importante, para que nunca aconteça novamente um horror como aquele.

Teddy não soube o que responder sem usar de grosseria. Então optou apenas por encolher os ombros e entortar a boca.

— Ano retrasado você saiu no meio da cerimônia e ano passado você nem apareceu. - Teddy achou que o padrinho estava beirando à inconveniência - É importante que as pessoas o vejam. E saibam que a história daqueles que deram suas vidas na Batalha, resistem.

— Ano passado, o dia caiu em semana de lua cheia. Por sorte, estava fora, sem precisar de uma desculpa qualquer.

— Certo - Concordou Harry, desconcertado - Ainda sim, Teddy. É importante que você esteja presente e...

— Posso te perguntar uma coisa, Tio Harry? - Teddy lutava para não se tornar agressivo, mas acabou o interrompendo de forma muito brusca - De afilhado para padrinho?

A surpresa no rosto de Harry era evidente:

— Claro que pode, Teddy.

— Dia 31 de outubro é o aniversário de morte dos seus pais, certo? - O padrinho assentiu, não entendendo muito bem onde o garoto chegaria com aquilo. - Por acaso as pessoas sempre fazem algum evento enorme e espalhafatoso prá te lembra da morte deles?

— Bem, tem o Dia das Bruxas...

— Não foi isso que eu perguntei, Tio Harry. - Teddy o interrompeu novamente.

— Não... Na verdade, não. - Harry refletiu por um momento - Eu costumo de visitar Godric's Hollow sozinho nesse dia, mas é só isso...

— Pois é, Tio Harry... - Teddy disse, cansado - O aniversário da Batalha é um lembrete constante do assassinato dos meus pais. E isso é realmente doloroso. As pessoas na minha Casa são compreensivas e tudo mais, mas eu não aguento pessoas desconhecidas lendo discursos vagos que provavelmente sequer escreveram, como se conhecessem eles, ou qualquer outra pessoa que caiu em batalha aqui. Não me importo em conversar com você, ou a Vovó Andie, ou até mesmo o Tio Draco sobre o que aconteceu, mas essas pessoas... - Teddy apontou para fora da janela, acusador e dolorido - Essas pessoas são um bando de hipócritas quando acham que foi tudo lindo e glorioso... Mas não foi! Não é! Eu só queria poder comemorar o aniversário da minha namorada na data certa! Eu só... Só queria ter conhecido eles... - E sem poder se conter, Teddy Lupin caiu no choro, enquanto era amparado pelo padrinho.

— Pronto, pronto... - Harry dizia enquanto o garoto soluçava em seu ombro - Sei exatamente o que está sentindo...

Teddy não sabe por quanto tempo seus olhos verteram lágrimas, mas quando finalmente conseguiu parar de chorar, levou instintivamente a mão às têmporas, pois sua cabeça doía muito.

— Beba água. Vai ajudar a melhorar. - Harry disse, entregando ao afilhado uma taça da bandeja, e conjurando água fresca - Não sei exatamente o porquê, mas é o que a Ginny sempre diz às crianças.

O garoto aceitou a taça e tomou dela um longo gole:

— Deve ser porque chorar desidrata. E a água restabelece a perda...

— Se eu fosse seu professor, te daria 20 pontos pela resposta. - Harry sorriu, ao ver que Teddy riu de sua piada. - Desce comigo para o almoço? Ainda dá tempo.

— Não obrigado, Tio Harry... Vou ficar por aqui até o jantar.

— Tudo bem, Teddy. - Harry começou a descer pelo alçapão - Se precisar, não exite em me chamar.

Teddy viu a cicatriz parcialmente coberta pelos cabelos negros e rebeldes do padrinho desaparecer pela passagem. Quando ouviu o barulho, terminou seu cálice de água e percebeu que estava com fome. Quando abriu o cloch que cobria a bandeja, deparou-se com aquele delicioso empadão de rins que tanto gostava, ainda quente. "Obrigado, Tio Harry", o garoto pensou, enquanto saboreava sua refeição.

Depois que acabou de comer, percebeu que chovia mais pesado lá fora. Quando foi fechar as janelas, viu que as pessoas que estavam do lado de fora haviam entrado. Provavelmente seguiriam com as solenidades da tarde no Salão Principal. O garoto acomodou-se num canto, onde havia um tapete peludo, abriu a mochila e pegou a velha caixa de madeira, de onde tirou uma série de fotografia de seus pais, dadas por muitas pessoas que conviveram com eles na época e até antes da guerra. Passando por várias situações, envolvendo outras pessoas e até duas fotos tiradas durante o casamento quase secreto deles, às quatro últimas, que eram as suas preferidas: A primeira foto, era da tão falada época dos Marotos. Ali, parados nos jardins de Hogwarts, estavam sorrindo e fazendo palhaçada para ele o belo e rebelde Sirius Black, padrinho de seu padrinho e primo da Vovó Andie. James Potter, idêntico ao filho Harry, mas de olhos castanhos e sem cicatriz, exibindo um sorriso matreiro de quem está eternamente aprontando. Seu pai, Remus Lupin, com suas vestes velhas de segunda mão e um sorriso acolhedor e cansado. E por último, em frente a todos eles, baixo e atarracado, estava Peter Pettigrew.

A foto seguinte, mostrava sua mãe, Nymphadora Tonks, jovem e sorridente que ascenava e jogava um beijo, charmosa, para ele, sentada no parapeito da janela de uma casa qualquer de cabelos rosa berrantes curtos e espetados e camiseta da banda As Esquisitonas. No passado capturado pela fotografia, o sol daquela tarde preguiçosa, refletia uma luz avermelhada no rosto da moça risonha, enquanto no presente, a luz das velas refletia uma luz amarela e pálida no rosto do garoto, que sentia os olhos queimar de lágrima novamente. A próxima foto, era do seu pai: Não devia ter mais que 20 anos, e escrevia numa agenda gasta, à sombra de uma árvore há muito esquecida. Quando percebeu a foto, sorriu enquanto fechava os escritos, usando a própria pena como marcador e fazia uma pose engraçada para o seu fotógrafo. Teddy riu. Sempre ria ao olhar essa foto. Mirou seu pai com atenção e percebeu o quanto, de fato eram parecidos, apesar de o garoto não usar óculos, tinha o rosto muito parecido com o do pai. Apesar de não compartilhar isso com ninguém, tinha muito orgulho disso.

— "Será que o Tio Harry sente orgulho por parecer com o pai dele também...?" - questionou-se silenciosamente o garoto.

A última foto, era o seu maior tesouro. Nela via seu pai e sua mãe, abraçados a um Bebê-Teddy sorridente, de cabelos azuis celestes, acenando para a câmera e rindo. Eles pareciam tão felizes ali, novamente repirou fundo para conter mais lágrimas.

Teddy juntou suas coisas e seguiu direto para o banheiro dos Monitores, que por sorte estava vazio, onde usou um feitiço para convocar roupas limpas e tomou um banho quente e relaxante, antes de enfrentar o jantar. Desceu até o salão a passos contados, sem a mínima pressa de chegar.

Quando alcançou as portas do Salão Principal, misturou-se aos que acabaram de chegar e rumou para a mesa da Lufa-Lufa. Sentou-se próximo aos amigos, que sorriram para ele, mas nada disseram. Houve uma última homenagem, onde Harry e o Professor Longbottom falaram sobre a Batalha, e antes do jantar, um minuto de silêncio. O banquete foi servido, mas Teddy ainda se sentia apático e cheio. Cheio de que? De pesar? De tristeza? De saudade? Não saberia responder, por isso acabou comendo pouco. Quando foram dispensados para o dormitório, o garoto correu até a namorada e dela roubou um beijo rápido. Victorie sorriu e agradeceu em francês, do jeitinho que ele gostava. Ela seguiu para um lado e ele para outro, a compensaria amanhã, quando esse teatro todo enfim acabaria.

Quando chegou à Sala Comunal, despediu-se dos colegas e foi direto para o dormitório, onde se trocou e finalmente caiu na cama. Se sentia exausto, mesmo sem ter feito esforço algum. O último pensamento daquele dia, foi destinado aos pais, a quem ele desejou boa noite, e talvez pelo cansaço ou simplesmente um sonho, ele ouviu com clareza duas vozes em uníssono dizendo: "Durma bem, meu filho".


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado!

Reviews são muito bem-vindas!

Beeeejo! ^v^



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