O abismo em todos nós. escrita por Ninguém


Capítulo 14
Capítulo 14




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“ Nunca é alto o preço a se pagar pelo privilégio de pertencer a si mesmo.” – Nietzsche.

 

Alexandre estava sentado em uma rocha fincada no solo no meio da floresta da princesa olhando para o chão com os cotovelos sobre os joelhos em uma posição fixa de pensar e pesar. Usando somente uma calça jeans amarrotada que tinha pego na rua em chamas enquanto fugia, o jovem acomodou-se no meio da mata tentando absorver o que houve. E conforme mais pensava nos eventos mais lágrimas saíam de seus olhos apesar do rapaz não entender o motivo.

Ele estava triste? Era estranho, não conseguia reconhecer a tristeza apesar de entender perfeitamente as implicações de sua situação, de saber que o que aconteceu horas atrás foi sua culpa... que a calamidade que recaiu sobre a sua cidade, sobre as pessoas que conhecia... foi sua culpa.

Sentado, o jovem fitava o chão de folhas secas e terra sendo umedecidas por suas lágrimas que saiam descontroladas. Alexandre não sabia quanto tempo ficou ali naquele ponto isolado no meio da floresta, seus pensamentos divagaram por questões complexas misturando-se a emoções fraternas. Sim, ele chorava como um desesperado porque estava desesperado apesar de não conseguir sentir isso. Sua alma e sua mente pareciam anestesiadas, mas seu corpo reagia muito bem à tragédia.

E como não reagir?

Catarina estava morta. Sua avó Gertrudes estava morta. Centenas ou milhares de pessoas da cidade morreram em meio ao fogo incessante que causou explosões por vários pontos enquanto consumia tudo a sua volta. É possível até que tenha atingido a escola... talvez seus colegas também tenham perecido. Em meio ao inferno coberto por fogo e fumaça preta Alexandre não sabia dizer nada. Ocasionalmente via helicópteros sobrevoando a região, assim como ouvia os sons das sirenes de bombeiros e ambulâncias que tentavam conter o desastre aparentemente sem explicação.

Ele correu. Foi só que pôde fazer no momento, correu e correu até parar muito longe do caos, até parar exatamente naquele ponto da floresta onde se sentou esperando que a mente assimilasse o ocorrido.

Tudo deu errado da pior maneira possível.

 Alexandre escuta passos aos sons de folhas quebradas e galhos secos se partindo. Uma figura misteriosa surge das sombras das copas das árvores entrando em sua pequena clareira. Era um homem alto com uma barba por fazer, trajava uma calça preta com camisa branca e jaqueta, sozinho o estranho aproximou-se com uma adaga na mão direita.

Alexandre não o conhecia, mas agora que seu cérebro tinha finalmente despertado para o que acontecera, para o que originou tudo aquilo... era fácil dizer que o homem sabia quem ele era. Sabia o que Alexandre era.

— Você sabia que isso poderia acontecer? – perguntou o neto de Gertrudes.

— Não – respondeu o homem – minhas informações não diziam que tamanha catástrofe aconteceria se eu agisse como agi. Foi algo fora do previsto, entretanto, eu te faço a mesma pergunta: você sabia que isso poderia acontecer?

Alexandre cessa as lágrimas e balança a cabeça na negativa.

— Até seus homens agirem... eu não me lembrava de como eu havia me transformado – ele olha para as próprias mãos – em seja lá o que for isso. Eu entendia que havia algo de errado... mas nunca imaginei... nunca imaginei...

Leon suspirou olhando para cima.

— Não era o que queria. Minhas ordens eram expressas para evitar que inocentes morressem.

— Ainda sim morreram. Só que pra você... esses inocentes são estranhos quaisquer que  não sabe nem os rostos... enquanto pra mim... eram tudo o que eu tinha.

— Reconheço minha parcela de culpa pela tragédia. Mas não adianta, menino, o sangue daquelas pessoas está em suas mãos no maldito momento em que deu ouvidos a Lucérius!

Sim, agora Alexandre se lembrava perfeitamente da conversa que havia tido com o estranho chamado Lucérius. O mais irônico talvez fosse que sua avó sempre dizia para nunca falar com estranhos.

Leon balança a cabeça voltando a suspirar.

— Eu falhei miseravelmente embora o destino talvez seja o mais cruel.

O homem retira um papel do bolso da jaqueta e joga no chão perto de Alexandre.

— Meus investigadores finalmente conseguiram achar o dentista certo e o registro da arcada dentária, finalmente descobrimos de quem era o cadáver na floresta... tarde demais é claro. Se eles tivessem sido mais competentes, se aquele policial imbecil não fosse displicente e ocultado o fato de que acharam alguém vivo no meio da floresta em chamas... ah! Esqueça. Não adianta lamentar o passado.

Leon não conseguia se livrar da frustração de tantos fatos que deram errado e que resultaram no atual cenário desolador.

Alexandre se levanta da rocha.

— E agora? – olha para a adaga na mão do estranho – veio aqui me matar?

Leon apertou mais a mão ao redor do cabo da arma.

— Sim. Pelo bem de todos você precisa morrer.


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