Eu o olhava todas as vezes que passava por lá. Sabia o que sempre
chamava minha atenção...

Aquelas mãos sempre sujas de terra.

Aqueles cabelos sempre caídos sobre a testa.

Aqueles olhos verdes sempre focados no que estava fazendo.

Aquela áurea de quem amava o que fazia.

Todas as plantas que tiveram contato com ele pareciam, de certa
forma, mais vivas, mais vibrantes, mais coloridas.

Eu até sentia um pouco de inveja delas. Também queria receber
aqueles olhares ternos. Os únicos olhares que recebi foram rápidos,
quase imperceptíveis. E só percebíveis pois eu já o observava.

Ele era muito cuidadoso. Suas mãos eram tão delicadas que mal
pareciam tocar nas folhas das flores. As pétalas dançavam ao redor do seu cuidador e ele parecia não ter olhos para outras coisas além de tamanha delicadeza.

E, com um susto, percebi que sua atenção mudara. Ele não olhava
mais para suas obras de arte. Seus olhos, que pareciam curiosos,
me encaravam.

Agora, ele me olhava, como eu havia sonhado diversas vezes. Mas
ao contrário do que eu idealizara, não consegui permanecer sob
sua atenção.

Senti que fiquei da cor das roseiras logo ao lado e desviei meus
olhos para a grama recém aparada. Eu queria sair dali, porém, meus pés não se mexeram. Eu havia virado uma flor que estava à espera do meu cuidador.

E então, em minha visão, um par de botas marrons surgiu. Surpresa,
levantei meu rosto e procurei aqueles olhos que tanto sonhava
que um dia iriam me notar.

Ele me olhava no fundo dos olhos, e notei que em suas mãos jazia
uma única flor amarela.

Reconheci: Uma tulipa.

Suas mãos manchadas de uma terra quase negra contrastavam
com o tom vivo do amarelo da pétala e do verde do caule. Era
quase um quadro que merecia estar em uma galeria ou em uma
casa de campo antiga.

Sua mão que segurava a flor se aproximou, a oferecendo para mim.
Olhei novamente seu rosto. Nele, um pequeno sorriso gentil se
mostrava.

Sorri, envergonhada, e aceitei o presente. Talvez as flores se
sentissem daquela forma. Coradas e felizes ao serem cuidadas.

O garoto virou-se de lado e estendeu a mão para sua direita,
pedindo para eu ir na frente.

Não sabia o que ele queria, mas mesmo assim fui.

Andei em passos lentos até onde ele estava antes, e logo ele
surgiu novamente, voltando a agachar na terra e me olhou, como
se esperasse que eu entendesse suas palavras não ditas.

Notei que havia um pequeno buraco na terra, que seria a casa
daquela tulipa. Percebi, feliz, que ele me dera a oportunidade de
fazer aquela flor ter um novo lar.

Agachei-me quase ao seu lado e, delicadamente, coloquei a raiz da
flor no chão. Em seguida, o garoto começou a puxar a terra em
volta dela, para encher o buraco e sustentar o caule de modo que
ficasse reto.

Ver suas mãos trabalhando de perto era completamente diferente
de ver ao longe. Parecia ainda mais gostar e saber do que fazia. A
terra era fofa, escura e úmida, sujando ainda mais suas mãos.

Observei seu rosto com um pequeno sorriso de quem estava
admirando tudo aquilo. Nossos olhares se cruzaram e
permaneceram unidos, e eu não consegui desviar daquela vez.

Ele parecia olhar para uma de duas flores enquanto me analisava, e
eu me senti novamente envergonhada. Encarei a flor amarela e delicadamente toquei suas pétalas, sentindo sua textura macia. Não pude deixar de sorrir.

E no mesmo instante, mais três tulipas apareceram em minha visão.

Uma vermelha, uma coral, e uma rosa.

Ele me olhou com um sorriso divertido nos lábios.

Era um convite.

Sorri e as peguei, aceitando o desafio de encher aquele jardim com
mais cores.

Tulipas se tornaram minhas flores preferidas e, em pouco tempo,
quela primeira flor amarela foi nomeada.

Jade.