Dias quentes e ensolarados eram raros na Escócia e Tom não sabia se gostava disso ou não. Estava tão acostumado com o céu cinzento (fosse de Londres ou das Terras Altas de Hogwarts) que ter os raios de sol incidindo sobre si sem nenhuma barreira chegava a ser estranho e machucava os olhos. E o calor! Ele podia sentir um ou outra gota de suor escorrendo pelas suas costas, por debaixo da camisa do uniforme, e não sabia como alguns alunos conseguiam manter-se usando capas e vestes longas.

Abraxas era um desses alunos esquisitos que mantinha as aparências mesmo debaixo do sol. As vestes negras mantinham-se impecáveis enquanto ele se esticava sobre a grama ao lado do lago, as mangas da camisa fechadas com abotoaduras de prata e a gravata presa no lugar com um grampo decorado com uma pequena esmeralda. Tom, por outro lado, já havia largado as vestes, afrouxado a gravata e dobrado as mangas até os cotovelos.

“Espero que o clima fique assim em Julho,” o loiro falou, escondendo parte do rosto sobre o braço. Onde estavam, debaixo da sombra de um salgueiro, o ar parecia levemente mais fresco.

“Eu não,” Riddle resmungou, observando as águas negras do lago cintilarem sob os raios do sol. “Londres fica terrível no calor.”

“Não seja rabugento...”

“Fica abafado e empoeirado.” O jovem torceu o nariz. “Os esgotos fedem mais do que o normal.”

“Então por que não aproveita o verão aqui?” Um sorriso suspeito apareceu nos lábios do Malfoy.

“Já estou aproveitando, não estou?” Tom gesticulou para o salgueiro e o céu azul.

“Não está, não.”

Em um pulo, Abraxas se levantou da grama. Riddle observou enquanto o amigo tirava as vestes negras, jogando-as em cima dele, antes de tirar os sapatos e as meias, dobrando as calças até um pouco abaixo dos joelhos.

“O que você está...?” Tom arregalou os olhos. “Você sabe que não pode entrar no lago.”

“Eu sei que não posso nadar no lago,” o outro falou, dando de ombros e correndo até a água. Ele parou subitamente quando seus pés tocaram a água e pareceu ficar petrificado por um momento. “Santa Morgana! Até no verão isso aqui é gelado!”

Riddle sacudiu a cabeça, tentando conter a risada, antes de se levantar e tirar os sapatos também. Olhando em volta, notou que havia poucos alunos perto deles (a maioria, de certo, estava mais perto do castelo).

“Mas assim que é bom,” ele falou, sentindo um arrepio subir-lhe pelo corpo quando seus pés foram cobertos pela água fria. “Para aliviar o calor.”

“Quero aliviar o calor, não morrer congelado.”

“Quanto drama.” Riddle levantou o pé, espirrando um pouco de água no amigo.

“Olha quem fala.” O loiro abaixou-se, afundando a mão no lago e a usando para molhar o outro.

Talvez fosse o calor fritando os seus miolos, Tom pensou depois, mas em menos de três minutos já não havia mais roupas secas e ambos os garotos estavam tremendo, apesar das risadas. Abraxas havia conseguido molhar o outro sonserino jogando água, mas por fim acabou escorregando nos cascalhos e se molhando por completo. Enquanto Riddle se ocupava rindo, o loiro o puxou para o mesmo destino. Agora, os dois estavam deitados na beirada do lago, os resquícios das risadas ainda lhes roubando o fôlego.

“Que ideia de merda foi essa?” Tom perguntou, passando a mão pelo rosto para tirar os cabelos que se grudavam em sua testa.

“Isso, Tommy, é aproveitar o verão.” Abraxas virou o rosto e o encarou. Ele estava pálido por conta do frio, com o queixo tremendo um pouco, mas o sorriso em seus lábios era enorme e Tom não sabia se prestava atenção nisso ou nas gotas de água que escorriam pelo nariz dele, deslizando pelo sulco acima da boca para então ir para nos lábios.

“Ainda é uma ideia de merda,” Riddle falou, rindo fraco enquanto erguia a mão e pegava uma gota antes desta chegar à boca do outro.

O frio pareceu se dissolver por um momento, quando Malfoy sorriu de lado e esticou-se, pressionando os lábios contra os dedos de Tom. O rapaz não se afastou, apesar de se assustar com a ação. Manteve os dedos parados, sentindo o calor do beijo parecer se espalhar por sua mão. O sorriso não deixava o rosto de Abraxas nem por um segundo.

“Quem está aí?” Uma voz grossa chamou de algum lugar perto deles. Riddle se ergueu rapidamente e, com os olhos arregalados, viu o guarda-caça do castelo os observando de longe, cobrindo os olhos com uma mão para combater o sol. “É proibido entrar no lago! Vocês dois! De que casa-?!”

Malfoy apenas riu e puxou Tom uma última vez, agora cobrindo os lábios do outro com os seus. O beijo foi rápido, pareceu ter durado menos de um segundo, e logo o loiro estava de pé, pegando as suas vestes e correndo na direção do castelo.

Talvez fosse apenas o calor do sol misturado com a água gelada do lago afetando o seu raciocínio e tempo de resposta, mas Tom Riddle quase não teve tempo de pegar as suas roupas e correr para longe antes que o guarda-caça o alcançasse.