Hot 'n' Cold escrita por Killua


Capítulo 1
Got a case of love bi-polar


Notas iniciais do capítulo

Oi!

Essa história ficou muito maior do que eu havia imaginado, caramba!
Enfim, só a Gabs para me fazer escrever 10k em três noites, num completo desespero por ter confundido o aniversário dela (12 de Junho, não 12 de Julho)

Gabs, tu sabe o quão importante pra mim tu é. Tu é como minha irmã.
Eu gosto tanto de você, a ponto de ressuscitar uma ideia da qual eu já havia quase desistido!

Foi corrido, não sei se estou bem satisfeito com o resultado, mas eu espero mesmo que você goste! Meu coração, minha alma e muitas horinhas de sono estão nessa fic, que é todinha dedicada à você.

Boa leitura a todos, especialmente para minha Akemihime ♥



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O entardecer era definitivamente mais bonito naquele canto da cidade. Pelo menos essa era a opinião de Keith, que estava jogado no sofá, observando pela janela.

         Ele e seu irmão mais velho, Shiro, haviam se mudado para o subúrbio, buscando um pouco mais de quietude e sossego, e aquela foi a melhor decisão que haviam tomado.

         O bairro era tranquilo e possuía um clima familiar, sem falar que os vizinhos de apartamento eram todos muito gentis. Bom, pelo menos com ele; com Shiro, nem todos. Uma em especial, na verdade.

         E provavelmente ela era o motivo do mais velho bater a porta com tanta força ao entrar em casa.

— Sério, Shiro, — soltou em tom cansado — você tem que parar de descontar as suas frustrações na porta. — A vizinha, de novo?

— Quem mais seria?! — o mais velho praticamente rugiu. Ele andava de um lado pro outro, procurando uma forma de descontar suas frustrações.

— Você devia desistir, Shiro — Keith soltou num suspiro, deitando-se mais confortavelmente no sofá — Você devia ter desistido na primeira vez que ela te rejeitou. Ou na segunda; talvez na quinta. No máximo, na décima...

— Keith! — Sua voz era um misto de raiva e indignação. Nem seu próprio irmão estava do seu lado!

— Desculpa, mas é verdade! — O mais novo rebateu, não podendo conter o riso — O que houve dessa vez?

         E Shiro começou seu monólogo dramático.

         Mas, vamos adiar isso um pouco; antes de sentar à sombra dessa árvore, vejamos como ela nasceu e cresceu.

         Os irmãos se mudaram para aquele apartamento havia cerca de dois meses, pouco mais que isso. O barulho e o agito do centro da cidade estava começando a incomodar ambos, então eles decidiram procurar um local mais calmo.

         E foi no mesmo dia da mudança, enquanto carregava uma caixa escada acima, que Shiro se apaixonou perdidamente. Ali começou a fase chamada por Keith de fase da paixão adolescente, ou fase um. Por que dividir em fases? Vocês verão.

         Allura era o nome dela; a vizinha da porta da frente. A mulher perfeita, aos olhos dele.

         Ela passou por ele na escadaria, fazendo o caminho inverso, lhe dando um sorriso simpático e também as boas-vindas à vizinhança, oferecendo-se ainda para ajudar no que fosse preciso.

         Ele queria que ela o chamasse para ajudar em algo. Ele queria passar algum tempo com ela, nem que fosse por apenas alguns minutos, enquanto ele lhe fazia um favor. Então, ele sempre batia nessa tecla e ela, sempre com um sorriso gentil, agradecia Shiro por ser tão prestativo.

         O problema é que ele ficava muito nervoso perto de Allura e isso, somado ao fato de ele não ser muito bom com garotas, às vezes gerava algumas frases toscas e sem sentido, mas estava tudo bem, porque ela até que achava bonitinho.

         Até que, em um certo dia, Shiro subia as escadas e Allura estava tendo uma briga com a porta de seu apartamento. Malditas fechaduras! O rapaz não perdeu tempo e ofereceu-se para ajudar. Um pouco de pressão na chave e um pouco de força bruta na maçaneta depois, a porta estava aberta. A moça agradeceu a ajuda dizendo que estaria perdida se não fosse por ele.

         E foi aí que tudo começou o que Keith chamava de a fase do ódio unilateral ou fase dois; com o comentário muito mal formulado daquele um metro e oitenta e cinco de homem, que, aparentemente, só tinha a cabeça para segurar a franja descolorida:

— Não precisa agradecer — ele falou agitando a mão num gesto de descaso — Mulheres, certo? O que seria delas sem nós?

         E pronto. Caso vocês não saibam o som que faz a merda quando atinge o ventilador, é mais o menos o som dessa frase ali.

         Acho que não é preciso dizer que o tempo fechou. A cara de Allura foi de um sorriso amigável a uma expressão de quem chupou limão em menos de um segundo. Ela pensou que tivesse ouvido errado, então lançou um famoso “como é que é?” e, meus amigos, se vocês acham que não dava para piorar, eis que:

— Pois é, você sabe — ele continuou, gaguejando e levando sua mão à nuca — nós somos a força bruta. Nós abrimos as portas emperradas para as mulheres poderem entrar em casa e cuidar dela! — riu nervoso.

         O tempo havia fechado, sim, mas depois desse dito ele voltou a abrir. E o mar incendiou. E começou a chover bolas de fogo. Porque foi o apocalipse.

         Allura gritou tanto com Shiro naquele dia que qualquer Shiro num raio de um quarteirão teria se ofendido. O rapaz até tentou se desculpar e se corrigir, afinal ele não pensava nada daquilo, apenas era idiota, mas não funcionou. Eles bateram boca naquele corredor por Deus sabe lá quanto tempo.

         Ela o chamou de tantas coisas, que daria para fazer um dicionário de ofensas. Shiro precisaria de um novo passaporte, para ir a todos os lugares que ela o mandou.

         Keith ouviu aquela discussão desde o térreo e quando chegou até eles, seu irmão estava com uma cara de poucos amigos e Allura praticamente cuspindo marimbondos nela, batendo com seu indicador no peito largo do outro, enquanto gritava com ele.

         Ao ver seu irmão mais novo os encarando com os olhos arregalados e uma cara de pura confusão, ele clamou por ajuda:

— Keith! Diz pra ela que eu... eu... É que eu... — Shiro gaguejava com uma expressão de puro desespero — Eu adoro mulheres!

— Claro, pra bater com uma clava na cabeça e arrastar por aí pelos cabelos, né, seu homem das cavernas? — Allura gritou furiosa, voltando-se então para Keith — Me faça um favor, My Chemical Romance, e tira esse Neandertal de perto de mim! — e entrou em seu apartamento, batendo a porta com toda a sua força.

         Keith olhava da porta para Shiro e dele de volta para a porta, com uma interrogação enorme na sua testa e perguntou que merda que havia acontecido ali. Eles entraram em casa e Shiro contou tudo, com uma voz acuada, coçando a cabeça diversas vezes. Quando ele terminou, o mais novo apenas lhe olhou fixo nos olhos e soltou um belo e sincero “você é tão idiota às vezes, Takashi.” e foi para seu quarto.

         Shiro era um ótimo rapaz, acreditem, porém quando ficava nervoso, falava besteiras e se metia em confusão como essas. Parecia uma criança.

         Os dias passaram e ele refletira muito sobre o acontecido e viu que havia pisado feio na bola, então tentou se desculpar. O único problema era que o ódio mortal que Allura criou por ele só crescera.

         Durante aquela semana toda, foram inúmeras as tentativas de se desculpar por parte do homem, mas ela não queria vê-lo nem pintado de ouro. Ela ignorou seu pedido de desculpas, o mandando ir abrir uns vidros de palmito, jogou as flores que ele lhe deu no lixo e comeu os bombons, porque boba ela não era; até seus bom-dia ela ignorava.

         Para aumentar ainda mais o desgosto dela, a academia que ele frequentava era a mesma na qual ela dava aulas de dança. Um belo dia, ela chegou ao local e algo lhe chamou a atenção: uma bela, grande e muito bem desenhada bunda, mexendo de um lado para o outro dentro de um moletom, enquanto o homem fazia seu exercício na bicicleta.

         Ela ficou hipnotizada, mas quando o rapaz acabou a atividade e ela conseguiu ver o rosto do rapaz, ela queria desaparecer no chão. O calor na sua face era de raiva e de vergonha.

         Enfim, numa manhã, depois de Shiro tentar puxar conversa com Allura na cantina da academia, enquanto ela tomava sua vitamina, foi quando o jogo deu mais uma virada, ou o barranco deu mais uma deslizada, vocês decidem.

         O homem havia comentado do calor que estava fazendo, soltando um “maldito aquecimento global” e então, muito elegantemente, Allura deu o último gole em seu suco e. com o sorriso mais cínico que podia dar, falou que faria a sua parte pelo meio ambiente e jogaria o lixo no lixo.

         E então, ela jogou o seu copo plástico vazio na cabeça de Shiro, levantou-se e começou a caminhar em direção à porta.

         Foi a gota d’água para Shiro, que foi atrás dela.

— Ok, ok! Se é assim que você quer, assim que vai ser! — ela parou de caminhar e virou-se para encará-lo, furiosa — Tudo o que eu tenho feito é tentar me desculpar pela minha boca grande porque sim, eu falei besteira, mas o que você está fazendo já é ser cruel por esporte! Eu cansei, pense o que você quiser! — e após se encararem mudos por alguns segundos, ele voltou para dentro do prédio e ela seguiu seu caminho, ambos fervendo de raiva.

         Esse foi o início da fase batizada por Keith de fase do ódio mútuo, ou fase três, que era a que se encontravam agora.

         O mais novo dividia a relação entre seu irmão e a vizinha em fases porque primeiro, na fase um ele não aguentava mais ouvir Shiro falar sobre como Allura era linda e incrível; na fase dois, não suportava ouvir seu irmão choramingando sobre o quanto a mulher estava sendo cruel e injusta com ele e na fase três, atualmente, não suportava mais Shiro chegando em casa raivoso, após mais algum atrito com a vizinha,

         Eram três formas diferentes de não suportar Takashi Shirogane. Sim, porque Allura lhe tratava normalmente; ela até havia lhe dado um par de luvas de couro pretas, sem dedos, de presente de aniversário. O parou no corredor, arremessou-lhe um embrulho, sorriu e entrou em seu apartamento. No cartão que veio junto com o embrulho estava escrito “Feliz aniversário, My Chemical Romance! Espero que goste!”.

         Keith não entendia o porquê do apelido e nem do presente, mas simplesmente havia amado as luvas. Na manhã seguinte, deixou um post it colado na porta do apartamento dela, agradecendo.

—... e ela disse que, apesar de eu dizer que sou diferente, eu sou só mais um babaca, igual a qualquer outro homem escroto por aí, sem nada de especial! — Shiro adentrou a sala novamente, tirando Keith dos seus devaneios e flashbacks. O mais novo não ouvira uma palavra do que o irmão havia dito, mas também não se importava. Eram sempre as mesmas picuinhas entre esses dois.

— Shiro, eu acho que você devia deixar ela em paz. — voltou a fitar a paisagem pela janela, respondendo sem muito caso.

— Eu? — gritou indignado — Eu não fiz nada! Ela que começou! Ela é rancorosa, fica remoendo as coisas, Keith! Ela me chamou de machista, de novo, de “só um monte de músculos ridículo e previsível” e disse bem debochada, que o dia que eu a surpreender, ela vai me pagar um drink!

— Você podia surpreendê-la a deixando em paz. Às vezes, quando você se irrita, você fica muito competitivo. Me parece que você...

— Ah, mas ela vai ver só! Eu ainda tenho uma carta na manga! — Shiro resmungou, sem nem mesmo ouvir o que Keith havia dito, mas mesmo assim provando sua teoria — Ela quer ser surpreendida, ela vai ver só! Eu queria usar isso para impressioná-la, mas já que tem que ser assim... — Ele praticamente rosnava, enquanto andava em direção ao quarto, tirando a camisa.

         Keith apenas revirou os olhos, sabendo que, o que quer que seu irmão estivesse tramando, iria acabar lhe rendendo mais uma sessão de reclamações e resmungos sobre a vizinha. Esse espírito competitivo que o mais velho havia desenvolvido no exército era um saco.

         Enfim, essa história é como uma moeda e tem duas faces. Se Allura era o gatilho para Shiro perder a postura, Keih também tinha seu.

         Os dois irmãos eram ambos muito tranquilos, de formas diferentes. Shiro era divertido e muito pacífico, era engraçado e muito respeitoso com todos e por isso era muito querido onde quer que fosse. Keith era tranquilo no sentido de quieto. Estava sempre na dele, cara meio fechada, mas sempre educado quando se dirigiam a ele. Nenhum dos dois era de perder a paciência fácil.

         Mas, todos têm seu ponto fraco; seu gatilho. O de Keith estava prestes a ser disparado.

— Keith — o mais velho chamou, aparecendo com uma toalha e uma muda de roupas sobre o ombro, e algumas notas de dinheiro na mão — você pode ir comprar café? O meu é o mesmo de sempre. Compre algo pra você também. — Colocou o dinheiro sobre a mesa e se dirigiu ao banheiro, parando no meio do caminho ao ouvir o grito desesperado do outro.

— Não! — Keith levantou do sofá num pulo — Quer dizer, por que você não vai? E se eles não souberem qual é o seu de sempre? É melhor você ir e eu esperar aqui! — falou afoito, tropeçando nas palavras.

— O que deu em você? — O mais velho o encarou, confuso — Você não fez o menor sentido agora. Só vá à cafeteria e me traga um café, não seja preguiçoso. — Falou em tom repreensivo e foi tomar seu banho, deixando para trás um Keith pálido e com uma cara de desespero.

         Talvez vocês estejam se perguntando se Keith possuía algum tipo de fobia de café, ou de cafeterias, mas não, não é nada disso. O seu problema era com um dos baristas do estabelecimento em questão.

         Quando os irmãos estavam procurando uma nova moradia, eles se apaixonaram por aquele bairro, porque além do lugar ser bem pacífico, tinha tudo o que precisavam bem perto. Um mercadinho, farmácia, academia, uma cafeteria etc. tudo organizado nas ruas em torno de uma bela praça, bem arborizada, com um laguinho no meio, um ótimo lugar para relaxar. Não tiveram a menor dúvida na hora de fechar negócio.

         No dia que fizeram a mudança, estavam exaustos. Ficaram desde cedo pela manhã até o meio da tarde trabalhando, sem intervalo. Horas e mais horas levando caixas, sacolas, desempacotando coisas, montando móveis, subindo e descendo escadas. Quando terminaram, a última coisa que queriam era fazer comida. Foi aí que descobriram a tal cafeteria, no lado oposto da praça.

         Era cafeteria, confeitaria e padaria no mesmo lugar; o paraíso. Os dois amaram o ambiente assim que entraram nele, porque o clima era muito acolhedor e a decoração era incrivelmente agradável. O cheiro do local era uma mistura de café com guloseimas recém assadas.

         Estavam sentados junto a uma mesa, foleando o cardápio para escolher o que iriam pedir, quando ele apareceu. O futuro motivo de toda a raiva e desconforto de Keith.

         Parou-se junto a eles, com o mais lindo dos sorrisos —segundo Keith— um dos baristas, que aparentemente também quebrava o galho como garçom, quando o lugar estava bem cheio. Ele olhou de um para o outro e pareceu não notar que o mais novo lhe encarava com uma expressão abobalhada. Com um tom muito simpático e animado, deu as boas vindas ao estabelecimento e pediu se eles já haviam escolhido.

         Shiro, respondendo no mesmo tom carismático pediu uma torta de caramelo com mousse de maracujá e um mocaccino, no maior copo que tivessem e Keith... Bom, Keith nunca gaguejou tanto na vida. Ele não conseguia se concentrar para fazer o pedido com aquele rapaz lindo e cheirando à café fresquinho do seu lado.

         Quando finalmente pediu, estava todo vermelho e querendo morrer, tamanha a vergonha. Shiro notou tudo, mas preferiu ficar quieto.

         Cerca de dez minutos depois, o jovem atendente voltou trazendo os pedidos, sempre com um sorriso muito charmoso no rosto.

— Aqui está — ele colocou a bandeja sobre a mesa, tirando de cima dela as tortas e os cafés, e servindo os respectivos pedidos aos rapazes — Vocês parece que deram duro hoje, então eu caprichei no tamanho das fatias e os cafés estão reforçados! — ele sorriu, apontando para os pratos e recolhendo a bandeja. Ele havia observado o semblante cansado dos dois e o suor nos cabelos.

— Poxa, obrigado mesmo! Nós acabamos de fazer a mudança, só paramos agora. É muito gentil da sua parte! — O mais velho agradeceu rindo amigavelmente e esticando a mão para um aperto, prontamente aceito — Meu nome é Shiro e esse com a cara emburrada é o Keith, meu irmãozinho.

— Meu nome é Lance, sejam bem-vindos à vizinhança! — deu um aperto firme na mão de Shiro e em seguida esticou a mão para Keith, que olhava fixamente para a mesa, como se estivesse paralisado. O mais velho teve que lhe chutar a canela por baixo da mesa, para que ele volta-se a esse plano e cumprimentasse Lance.

         Keith ergueu a cabeça e fez contato visual com o garçom, aceitando o seu aperto de mão, corando como uma menininha pré-adolescente encontrando a sua paixonite. Mas, quem podia culpá-lo? Lance era realmente lindo.

         Sua pele parda fazia seu par de olhos azul-escuros se destacarem, como pedras preciosas em uma joia. Seu sorriso era sempre terno e amigável. Tinha uma cara de bom moço, porém seu cabelo meio bagunçado, provavelmente da correria do dia-a-dia, lhe dava um ar um pouco selvagem. Até sua postura era linda, aos olhos de Keith, com seu corpo esguio, de movimentos suaves e fluidos.

         Em menos de meia hora, Keith já havia desenvolvido uma quedinha —lê-se penhasco— por Lance.

         Keith havia se assumido gay há cerca de um ano, mas seus pais não aceitaram muito bem. O único que lhe apoiou foi Shiro. Numa noite, o mais novo teve uma discussão intensa com seu pai, que quase o agrediu, se não fosse por Shiro intervir. Sua mãe não fez nada, além de assistir. No dia seguinte, o mais velho saiu para procurar um apartamento para alugar.

         Quando voltou para casa, começou a arrumar suas coisas e mandou que Keith fizesse o mesmo. Partiram no dia seguinte e não voltaram mais.

         Não era grande e muito menos luxuoso, mas quebraria o galho. Shiro só não queria que seu irmão sofresse mais. Ele passou o ano todo fazendo horas extras, bicos aqui e ali, até que finalmente haviam juntado o suficiente para dar entrada num lugar só deles, maior e num lugar mais agradável. Um sempre cuidava do outro.

         Enfim, Keith passou a frequentar a cafeteria todos os dias após a escola, apenas para poder ver Lance. Sentava-se num canto e torcia para que fosse o rapaz que viesse lhe atender e geralmente era. Sempre que Lance o via entrar pela porta, abria um sorriso que parecia iluminar todo o ambiente.

         No início, só pedia um café e algo para comer, e quando terminava, pagava e ia embora, mas só aqueles quinze a vinte minutos não pareciam mais ser o suficiente. Ele poderia passar horas observando Lance, então começou a fazer a sua lição na cafeteria também.

         De vinte minutos, começou a passar uma hora no local, e então duas. Tinha vezes que passava mais tempo que isso, às vezes fazendo suas tarefas e às vezes fingindo, só para matar mais tempo ali. Lhe incomodava ver o moreno sorrindo e flertando com outras meninas, mas tudo bem, ele se contentava em observá-lo à distância, pensando em coisas que certamente jamais aconteceriam.

         Às vezes, Lance conversava um pouco com ele. Esses dias eram sempre os melhores. Teve um dia em que o barista usou o tempo do seu intervalo para ajudá-lo com um trabalho de espanhol. Aquele dia havia sido, de longe, o melhor. Keith havia até marcado num calendário.

         Ok, essa explicação era necessária antes de explicar o porquê de Keith ter entrado em desespero agora, quando Shiro o mandou comprar café. Se Keith gostava de Lance, por que preferia dar uma volta no inferno a ir à cafeteria?

         Simples: em algum momento, o jogo virou. Sim, e isso foi quando Lance descobriu a queda de Keith por ele e começou a flertar descaradamente com o rapaz.

         Talvez, para alguns isso fosse algo bom, mas não para Keith. Ele era orgulhoso demais para admitir que estivesse afim de alguém, ainda mais tão afim assim, a ponto de gastar uma fortuna em café e bolo, apenas para ficar próximo dessa pessoa. Na cabeça sua cabeça, ele estava sendo muito discreto em relação a sua paixão. Mas é, era só na cabeça dele mesmo.

         Um dia, no fim do seu expediente, Lance foi atrás de Keith e o convidou para sair, para comerem algo juntos. O rapaz ficou praticamente paralisado, sem reação. Ele provavelmente havia ouvido errado, né? Não podia ser verdade. Ele voltou a si quando Lance completou sua fala com algo como “É, eu notei que você fica me olhando o tempo todo e...”.

         Esse foi o exato momento que deu merda. Keith, no alto de seu orgulho, ficou indignado com a essa acusação do outro! Ele não ficava olhando para Lance o tempo todo, que absurdo! Ele não tinha uma queda por Lance, não! Quer dizer, tinha, mas ele disfarçava bem e ninguém sabia disso!

         Obviamente Keith negou, em um grito indignado, que ficava o encarando e, para fazer a longa história curta: os dois discutiram no meio da rua, Lance o chamando de menininha apaixonado e Keith respondendo com acusações de babaca sem noção, e desse dia em diante Lance passou a provocar e flertar descaradamente com Keith toda a santa vez que o via.

         O rapaz obviamente passou a não ir mais à cafeteria, para não ter que ver a cara ridícula de Lance novamente. Porém, quando Shiro lhe pedia para comprar café ou pedia companhia para comer algo lá, Keith não tinha como recusar e então, ficava exposto à indecência de Lance. Ele não queria dizer para Shiro que estava sendo tarado pelo barista.

         Eram piscadas de olho, passadas de mão discretas, sorrisos ordinários, cantadas ridículas; tudo o que Lance podia fazer para fazer com que Keith ficasse sem jeito e fora do sério, ele fazia.

         E era por isso que o irmão mais novo de Shiro estava escorado na porta de casa, relutando para ir comprar o maldito café. Ele sempre saía do estabelecimento com pensamentos homicidas.

         Mas, o que poderia fazer? Respirou fundo e saiu. Cortou caminho pela praça, então demorou apenas uns dez minutos para chegar ao estabelecimento. Estava bem movimentado e todos os caixas estavam cheios, então ficou na fila, rezando para que não fosse atendido por aquele babaca.

         Como é mesmo aquela história da Lei de Murphy? Enfim, o fato é que a voz que gritou “próximo!” na vez de Keith, era a de Lance e ele quis correr para fora do local e se jogar na frente de um ônibus. Mas né, Shiro ainda precisava de um café.

— Boa tarde, bem-vindo ao... Ei, é você! — Lance mudou imediatamente o tom para um mais jocoso, quando viu quem era — No que posso lhe ajudar, Keith-kat? — perguntou num tom assanhado, apoiando-se no balcão que os separava, para ver mais de perto o garoto corar.

— Um mocca triplo, por favor — responder sem humor algum, olhando para o painel com as opções oferecidas ali.

— Ah, Shiro, né? — recebeu um maneio de cabeça do outro, confirmando que era para seu irmão — Vou fazer no capricho. E pra você, Kitten? — jogou a isca de novo e Keith mordeu, bufando de raiva — Posso te recomendar o especial da casa, se quiser.

— E qual seria? — o outro rebateu com um tom irritado e impaciente.

— Hoje é o Latin latté. É café com leite e creme, vem quente, gostoso, com um pouco de canela e uma colherinha — Lance falou em tom sério. Keith só percebeu a situação quando o atendente jogou um pouco de canela na própria mão e colocou uma colherinha em sua boca.

         Keith quase que instantaneamente revirou os olhos e bufou de raiva de novo, fechando suas mãos em punhos e apertando o mais forte que conseguia, tentando extravasar a raiva. Não que tenha funcionado, bem pelo contrário, a raiva só aumentou quando Lance saiu rindo para preparar o café.

         Ele voltou com a bebida de Shiro e também com um cappuccino médio para Keith, que era o que ele costumava pedir. O rapaz pagou, pegou o suporte com os drinks e saiu a passos largos, quase deixando buracos por onde passava.

         Como se não bastasse a desgraça que era aquele barista na sua vida, ao chegar em casa, abriu a porta e deu a cara com Shiro, de pijamas, rebolando em frente à televisão. Foi a segunda vez em menos de meia hora em que ele pensou em correr pra rua e se jogar na frente de um ônibus.

— Shiro, mas que merda é essa? — ele gritou, num tom de voz agudo e cansado.

— Ei, irmãozinho — parou o que estava fazendo e foi até o mais novo, que lhe entregou a sua bebida — isso sou eu me preparando para dar o xeque-mate na Allura! Ela não perde por esperar. — completou, num tom quase vilanesco. Keith deu um suspiro longo e profundo.

— Desde quando a relação de vocês virou uma competição?

— Desde sempre! Ela sempre ficou de joguinhos comigo, mas isso vai acabar! — seu tom era cheio de empolgação — Ela me desafiou pela última vez e agora ela vai perder em definitivo! Eu vou ganhar a guerra! — infelizmente para Keith, o tom de Shiro não era de brincadeira.

— Shiro, se seu plano for matar ela vomitar as tripas rebolando de pijama na frente dela, acredite, pode ser que vá funcionar. As minhas já estão se revirando — deu um gole no seu cappuccino (que estava incrível) enquanto observava o irmão voltando para frente da televisão, enquanto bebia seu mocca.

         Pela enésima vez naquele dia, o mais novo revirou os olhos. Decidiu dar o dia por encerrado, indo para seu quarto e se trancando lá, mas não sem antes ouvir “Oh, Lance colocou chantilly extra! Eu adoro esse cara!”. Keith cogitou pular da janela.

          E assim a semana foi passando. Shiro estava de férias do trabalho, então estava em casa boa parte do tempo. Pela manhã ele ia para a academia e, por algum deboche do destino, geralmente saía de casa na mesma hora em que Allura. Eles nem se olhavam na cara, nem se cumprimentavam. Na rua, caminhavam em lados opostos da calçada.

         Quando Shiro voltava para casa, dedicava a maior parte do tempo ao seu plano para a destruição de Allura, como ele gostava de chamar. Sim, ele era muito competitivo e também muito dramático. Ele ensaiava sempre quando ela não estava em casa, ou seja, à tarde. Essa também era a hora que Keith chegava da escola, então ele era forçado a presenciar aquelas cenas traumáticas.

         Chegou a um ponto que Keith não aguentava mais ouvir a mesma música, de novo e de novo, e tinha que sair de casa. Normalmente, ele iria para a praça matar um tempo, mas a vida é debochada e o clima naqueles dias estava horrível. Estava frio e chovendo, então ele não tinha muita escolha se não passar seu tempo na cafeteria. É, a vida é uma merda.

         Foi a semana mais estressante da sua vida, mas finalmente estava no fim, porque Shiro estava pronto para por seu plano em ação. Havia praticado dia e noite também, com fones de ouvido. Estava pronto para por um fim naquela guerra (que existia somente na cabeça dele).

         Usou a manhã para praticar e garantir que tinha tudo decorado e de tarde, na hora em que Allura estava dando aula, foi para a academia, mais determinado do que nunca.

         Allura havia o chamado de só mais um homem qualquer, monte de músculos sem conteúdo e coisas desse gênero; coisas que ele não era. Ele rebateu dizendo que era mentira, que ele não era nada disso, que era cheio de coisas boas e surpresas também; que ela estava o julgando mal.

         Em resposta a isso, a mulher riu e disse que, no dia em que ele a surpreendesse, ela lhe pagaria um drink. Isso atingiu diretamente o ego de Shiro, pegando também no seu espírito de competitividade e nos levando a esse momento solene.

         Allura se preparava para começar a dar mais uma aula de dança, quando Shiro entrou pela porta do estúdio, largando sua mochila no chão e tirando seu casaco, ficando só com uma regata preta e uma calça fina de moletom. Chamou a atenção te todos ali presentes, inclusive da própria, que fechou a cara no mesmo instante.

— Mas o que você pensa que está fazendo? — ela rosnou, parando-se na frente dele, bloqueando seu caminho e o encarando com ferocidade.

— Boa tarde, senhoras e senhores — virou-se para as mulheres e os poucos rapazes que participavam da aula — eu vim aqui para provar que essa mulher — apontou para Allura, falando num tom que parecia o de um advogado — estava errada sobre mim.

— Você tira essa sua franja descolorida da minha aula, ou se não, eu vou enfiar meu pé tão fundo na sua bunda, que você vai sentir o gosto do meu tênis, cara! — ela falou no tom mais ameaçador que conseguiu. Estava a poucos segundos de cometer um crime. Shiro apenas sorriu desafiador.

— Você me acusou de ser monótono e grosseiro, duas coisas que eu não sou, então se, por gentileza, você me ceder cinco minutos, — levantou sua mão aberta, sinalizando cinco — você nunca mais precisa nem olhar para a minha cara, se não quiser. Só cinco minutos para eu tentar provar que você me julgou por algo que eu não quis dizer.

         Os dois se encaravam fixamente nos olhos, há poucos centímetros de distancia um do outro. Ela tinha os braços cruzados e olhava para cima, afinal Shiro era mais alto. Ele, por sua vez, olhava para baixo e tinha as mãos na cintura.

— Nunca mais vou precisar olhar pra sua cara? — ela perguntou com um sorriso debochado ele maneou positivamente com a cabeça — Ok, cinco minutos — ela saiu de sua frente, liberando sua passagem.

         Shiro caminhou até o aparelho de som, onde engatou o pen drive que tinha consigo. Deu uma última alongada nos músculos e se posicionou de frente para a grande parede de espelho, na qual Allura estava escorada.

— Pode dar play, por favor? — perguntou para a professora, que caminhou lentamente até o som, que estava próximo dela — Quem souber e quiser me acompanhar, sinta-se à vontade. Vai ser mais divertido assim — ele virou para as alunas de Allura, que o encaravam curiosas (e interessadas, afinal Shiro era incrivelmente atraente).

         Quando Allura deu play, reconheceu instantaneamente a música e soltou uma risada. Shiro começou acompanhando as palmas ritmadas que introduziam a música, enquanto as outras pessoas da sala faziam um coro de “oooh” como se ele tivesse num território sagrado cometendo uma blasfêmia.

         Ele ia mesmo dançar Beyoncé na frente de Allura, sua maior fã? Aparentemente ia. Shiro era a única pessoa louca o suficiente para ousar dançar single ladies na presença dela.

         Shiro soltou os quadris e os braços, assim como Beyoncé e suas dançarinas faziam no inicio do clipe. Ele havia decorado cada movimento daquela música. Foi um trabalho hercúleo, mas ele havia conseguido. Botou em sua cabeça que, os passos de dança faziam parte de uma luta corpo-a-corpo com alguém e que se ele errasse um só movimento, estava morto.

         Algumas das outras pessoas da sala se arriscaram a participar. Duas moças foram uma para cada lado de Shiro; essa música pedia um trio para que fosse tudo perfeito. Outras ficaram mais para trás, todos virados para a parede de espelho, na qual Allura estava novamente escorada, com uma expressão de diversão.

         O homem havia pedido por cinco minutos, mas só precisou de um pouco mais de três. Ele fez toda a coreografia como se fosse a coisa mais fácil do mundo. O seu rebolado chamou a atenção, porque um homem daquele tamanho, com aquele corpo, ter uma cintura tão solta era impressionante.

         A cada passo que ele acertava, Allura ficava mais e mais chocada. As outras pessoas da sala gritavam eufóricas, enquanto acompanhavam ele. Shiro encarava Allura a maior parte do tempo, com um sorriso sempre aberto, rindo como criança. Ele estava se divertindo demais.

         Ele dominou a dança de ponta a ponta. Cada jogada de quadril, cada gesto de mão icônico de quando ela dizia que, se o cara gostasse dela, devia ter posto um anel em seu dedo, cada chute; cada jogada de cabelo! Ele deu os tapinhas na sua bunda e fez a incomparável caminhada, sincronizada com os braços, que pareciam socar em direção ao chão.

         Shiro desceu até o chão rebolando, como elas faziam no final do primeiro refrão. Agachou-se e passou os dedos nos lábios, como Beyoncé fazia no início da segunda estrofe. Após a segunda repetição do refrão, pouco antes dos “oh oh oh’s” ele contou de cinco a oito, para lembrar as outras dançarinas da sequência intensa de passos que começaria; e eles acertaram cada um deles, sem perder a sincronia, sempre rindo.

         Algumas pessoas mais ao fundo não conseguiram acompanhar, se atrapalhando na dança, mas não Shiro; ele foi perfeito. Ele foi selvagem! Era como se tivesse incorporado a própria Beyoncé.

         Ele sempre foi um bom observador e um bom imitador, e usou isso para absorver toda a energia que as mulheres passavam no videoclipe da música. Era uma coreografia intensa, com passos firmes e intensos e Shiro preparou seu corpo para transmitir tudo isso. Até mesmo um homem daquelas proporções tinha um lado feminino e ele soube deixar o seu aflorar.

         Quando a música acabou, todos estavam ofegantes, principalmente ele, que estava com o cabelo bagunçado, com a franja cobrindo seus olhos, enquanto ele estava imponentemente parado com sua mão esquerda na altura de seu rosto e sua mão direita sobre ela.

         Todos os que dançaram estavam ofegantes, mas gritando e aplaudindo o bom trabalho de todos, especialmente o de Shiro, que se permitiu cair para trás e se deitar no chão. Estava simplesmente exausto. Allura tinha a mão sobre a boca; estava incrédula. Ele realmente havia feito tudo aquilo só para provar que ele não era como ela pensava?

         Alguns minutos depois, já com a respiração mais calma, ele apenas se levantou, foi até o aparelho de som e pegou seu pen drive, sem olhar para Allura. Ele disse “Obrigado pelo seu tempo”, se virou e saiu, pegando seu casaco e sua mochila no caminho. Foi para casa, tomou um banho quente e se jogou no sofá. Seu corpo doía até o último músculo.

         Enquanto isso, Keith voltava da escola. Ele não sabia se Shiro já havia realizado seu plano maléfico ou se ainda não, se havia tido sucesso ou não, mas sabia de uma coisa: de uma forma ou de outra, ia sobrar para ele. Quem iria ter que ouvir as lamúrias da derrota ou os discursos de sucesso seria ele.

         Então ele decidiu que não ia para casa tão cedo e Shiro que se virasse com seus problemas. Como estava frio e ventando bastante, Keith, muito a contragosto, foi para a cafeteria, tomar um café e enfrentar seus demônios.

         Entrou no local e foi para a sua mesa habitual. Como um enviado do Inferno a mando do próprio Satan, Lance veio lhe atender, já com um sorriso matreiro.

— O que vai querer hoje, Keith-Kat? — ele provocou, sem perceber que Keith já estava no limite da paciência — Posso te oferecer um pedaço de um bolo muito especial, chamado euzinho — ele riu — E esse bolo ainda tem uma parte em especial que é muito saborosa e...

         Keith estava farto. Aquela foi a gota d’água. Lance tomou um susto quando o rapaz socou a mesa com as duas mãos, se pondo de pé e o encarando fundo, com os olhos marejados e exalando puro ódio.

— Já chega! Eu estou tão farto dessas suas merdas, Lance! — ele gritou, chamando a atenção de alguns clientes e alguns funcionários também — Você acha mesmo tão engraçado brincar comigo assim? — ele era pura raiva naquele momento.

— Por favor, Keith, não grita! — Lance tinha medo nos seus olhos — Me desculpa, mas, por favor, não grita, se não eu terei problemas! — Ele tinha as mãos juntas, num gesto de súplica.

— Você acha que eu me importo? Você é um babaca e eu estou de saco cheio de você achar bonito brincar com o sentimento dos outros, sabia? — Keith bradava e Lance engolia grosso. Não demorou muito para a gritaria chamar a atenção do gerente, que se aproximava dos dois.

— Keith, por favor — Lance olhava do rapaz para o gerente e voltava, cada vez mais desesperado — eu preciso desse emprego! Minha família precisa! Eu sinto muito mesmo, mas, por favor... — seus olhos estavam marejados também.

         Keith retomou seus sentidos quando ouviu a palavra família. Ele estava puto com Lance, mas não queria o prejudicar e prejudicar toda a sua família por causa da birra entre os dois. Ele não era assim, baixo a esse ponto.

— Qual é o problema aqui? — o gerente do local perguntou, já encarando Lance com uma cara nada boa. Keith olhava de um para o outro, respirando fundo e pesado.

— Não foi nada, senhor — ele respondeu já mais calmo, deixando Lance com uma cara de espanto — eu tive um dia ruim e acabei explodindo e descontando nele, foi só isso. Eu entendi mal algo que ele falou e despejei tudo nele. — ele falava meio confuso e atropelado, enquanto vasculhava sua carteira, tirando algumas notas dela — aqui, isso é pelo transtorno. Perdão pela confusão, senhor, só não... — ele parou, olhando do gerente para Lance e de volta para o gerente — não o responsabilize, ok?

         Dito isso, ele deu as costas e foi em direção à porta de saída do local, sob muitos olhares confusos, inclusive o de Lance. Ele correu atrás de Keith e o alcançou antes dele sair. Queria conversar com ele e agradecer, mas ele se desvencilhou de seu toque e rosnou um “nós não terminamos” e foi embora.

...

         Shiro havia tirado o melhor cochilo de sua vida. Estava com a consciência leve, apesar de ter algo em seu interior lhe incomodando. Era o fim. Ele havia vencido, certo? Provou para Allura que ele podia ser surpreendente. Agora, cada um seguiria com seu caminho, com a sua vida.

         Era isso que o incomodava. Ele não queria ficar longe de Allura, ele não queria que ela o deixasse em paz. Desde que acordava pela manhã, Shiro pensava que tinha que mostrar que ela estava errada. Lembrava-se de como ela era cheia de atitude; de como suas sobrancelhas se arqueavam quando ela estava com raiva.

         Ele lembrava até de como ela costumava jogar o peso do corpo de uma perna para a outra, de forma impaciente.

         Desde que se levantava até quando ia dormir, Shiro pensava nela.

         Espreguiçou-se como um gato sonolento e levantou-se do sofá, indo até a cozinha preparar algo para comer. Eram oito e pouco da noite, ele dormira a tarde toda, praticamente. Não havia nenhum sinal de Keith em casa, mas ele não se preocupou; sabia que o mais novo provavelmente estava o evitando porque não aguentava mais seu drama com Allura. Riu com seu pensamento

         Estava pegando o necessário para fazer um sanduíche, quando ouviu algumas batidas na porta. Só podia ser Keith e sua cabeça de vento, que esqueceram a chave de novo, então ele gritou para que entrasse, pois a porta estava aberta. Porém, mais batidas.

         Largou o saco de pão sobre a mesa e foi em direção a porta, O quão grande não foi a sua surpresa, ao ver que quem batia era Allura, trazendo consigo uma sacola com o que parecia ser uma garrafa de vinho.

— Oi — ele falou gaguejando, pois havia sido pego de surpresa — eu posso ajudar?

— Oi — ela respondeu um pouco sem jeito, esticando o braço com a intenção de entregar a sacola para o homem — toma, isso é seu.

— Hã... É? — perguntou confuso, pegando a garrafa. Ela assentiu com a cabeça.

— É sim — falou num tom calmo, quase cansado — eu prometi que, se você me surpreendesse, eu lhe pagaria um drink. Pois bem, aí está — ela explicou, escorando-se no batente da porta.

         Quando Shiro entendeu a situação, começou a rir. Uma gargalhada alta e gostosa, que contagiou até Allura, que deu uma risada mais contida.

— Você venceu. Talvez eu tenha te julgado mal — ela o olhou nos olhos — você é diferente e cheio de surpresas. Satisfeito agora? — a mulher ergueu uma sobrancelha quando a resposta para a sua pergunta foi um maneio negativo de cabeça.

— Eu não quero vencer e não quero ter razão, se isso significar que você não vai me olhar mais na cara — ela arregalou os olhos — e eu só estarei satisfeito se você entrar e tomar uma taça comigo — agitou a garrafa  de leve, sorrindo para a moça — o que me diz? Só uma taça...

— Shiro — ela respondeu com incerteza.

— Por favor — pediu num tom suave — você disse que talvez tenha me julgado mal, então eu gostaria de te fazer ter certeza — sorriu com doçura.

         Ela respirou fundo, assentiu com a cabeça e entrou.

...

         Keith estava sentado num banco da praça há horas. Ele sabia que Lance passava por ali para ir para casa e não sairia dali até acertar as contas com ele, num ambiente onde ninguém fosse necessariamente prejudicado.

         Alguns minutos após seu turno acabar, Lance apareceu no seu campo de visão. Caminhava um tanto cabisbaixo, com as mãos no bolso da jaqueta. Estava frio e ventando um bastante, parecia que iria chover. Arregalou seus olhos quando viu Keith parado no meio do caminho, o encarando fixamente. A passos lentos, ele se aproximou do rapaz.

         Como mais um dos deboches da vida, os pingos grossos de chuva começaram a cair, de vagar, a princípio, e então foi se intensificando. Lance olhou para o outro rapaz e olhou para os lados. Antes da tormenta se agravar, ele agarrou Keith pelo braço e o puxou para o banheiro, que havia ali próximo.

         Uma vez lá dentro, o moreno largou o outro do agarre. Keith se parou de frente para Lance, que não o encarava de volta. Olhava o chão, envergonhado. Não conseguia parar de pensar no que havia acontecido e em como Keith havia sido piedoso com ele, apesar do seu comportamento infantil.

— Eu não perdi meu emprego. Gritaram comigo, mas não fui punido. Muito obrigado por não ter me prejudicado — falou baixo, num tom amuado.

— O que você quer de mim, Lance? — perguntou direto, ignorando o que o outro havia falado. O outro rapaz finalmente lhe olhou nos olhos; estava confuso — Primeiro você é todo gentil comigo e com meu irmão, inclusive ele te adora! Depois, quando você percebeu que eu gosto de você, veio todo cheio de si me chamar pra sair, se gabando pelo fato de eu gostar de você.

— Se acalma, Keith! — Lance tentou o tranquilizar, porque o outro falava como se fosse uma metralhadora, mal fazendo pausar para respirar.

— Não me pede calma, eu não ‘tô calmo! — ele gritou num acesso de raiva — Depois disso você só debochou de mim, brincou comigo pra me humilhar e me irritar. Claro, porque você é o todo poderoso Lance, que tem todas as garotas e garotos ao seus pés; eu vi outros clientes dando em cima de você! E você retribuindo, óbvio. O que é só mais um afim de você, né? O que é só mais um, para alguém que pode ter quem quiser? — ele estava tremendo de raiva — Eu te odeio, Lance, e me odeio ainda mais por gostar de você! Alguém que me irrita a tal ponto que...

— Eu quero beijar você — Lance falou firme, fazendo Keith se calar por alguns instantes e então gritar um “o que?” completamente confuso — Você perguntou o que eu queria de você. Um beijo. É só isso que eu quero e então eu te deixo em paz.

— Do que você está falando? — Keith indagou desorientado. Não estava raciocinando direito por estar muito agitado.

— Desde que você chegou no café pela primeira vez, eu só quero te beijar — Lance se aproximou do outro, que não recuou — e quando eu descobri que você tinha uma queda por mim, eu estava no céu! Shiro me contou, em troca de marshmallows extra no chocolate quente dele — confessou entre risos — mas quando eu fui chamar você para sair, você chegou todo orgulhoso e dizendo que gostava de mim coisa nenhuma e... Caramba, Keith! — Lance agarrou o outro pela jaqueta e o puxou para perto de si, deixando-o com uma expressão assustada nos olhos, porém mais calmo — Você sabe ser muito irritante quando quer, sabia?

— Sabia... — ele murmurou incerto — Shiro me diz muito isso — Lance deu uma risada sem som — Espera, se eu te beijar agora, quer dizer que você vai me deixar em paz? Sair da minha vida? Porque aí eu não vou te beijar!

         Lance só sabia rir; riu até gargalhar. Keith não estava entendendo bem, ainda estava um tanto anestesiado e desorientado. Nunca esperou que ele, o barista com o sorriso mais lindo do mundo, pudesse se interessar nele.

         Quando parou de rir, Lance respondeu:

— Eu fico, se você quiser.

         O outro garoto, com uma expressão boba no rosto, apenas acenou positivamente com a cabeça, antes de ter seus lábios colados aos de Lance, num beijo carregado com uma mistura explosiva de sentimentos. De paixão a ódio, de ternura a uma pura necessidade primitiva; aquele beijo passava por todo o espectro de sentimentos que dois seres humanos podiam possivelmente sentir um pelo outro.

         É, um banheiro público não era o lugar mais romântico do mundo para ter seu primeiro beijo, mas tudo bem. Naquele momento eles não se importavam com o lugar; eles só se importavam um com o outro e nada mais.

         Aquele longo e necessitado beijo foi como usar uma droga pesada que, após o primeiro uso você já vicia; você precisa de mais. Uma mão de Lance foi para a nuca de Keith e a outra para a cintura, para trazê-lo o mais próximo possível. As mãos do outro se encontravam no pescoço de Lance, num agarre suave e macio. A princípio, pelo menos.

         Conforme o tempo passava, os beijos se tornavam mais urgentes e necessitados. A mão de Lance já se emaranhava nos cabelos de Keith, num agarre feroz; as carícias que Keith fazia no pescoço moreno do outro, se transformaram em arranhões.

         E era só o começo.

...

         A garrafa de vinho que Allura havia trazido já estava quase vazia. Os dois estavam sentados junto à mesa da cozinha, um em cada lado, rindo a ponto de quase chorar.

— Você correu por quanto tempo atrás dele? — Allura perguntou num tom incrédulo, em meio a uma gargalhada que lhe roubou o fôlego.

— Eu acho que foram uns dez minutos! — ele exclamou a resposta, também rindo — mas o que eu ia fazer? Ele mexeu com meu irmão e não tinha como eu o deixar sair ileso. Nossa, precisaram de quatro professores para me tirar de cima daquele moleque — Shiro completou já mais calmo, num tom saudoso.

— Você é um bom irmão, Shiro — Allura soltou sem muito caso, bebendo um gole de vinho da sua taça — Keith é um menino muito quieto, mas muito querido — o homem apenas concordou com um aceno de cabeça.

— Ele adorou as luvas que você deu pra ele. Vive com elas, parece que já fazem parte dele — ela sorriu — Keith já passou por um bocado de coisas, por isso é meio retraído, mas mesmo assim ele tem um coração de ouro.

— Por falar nisso, que horas ele vai chegar? Está ficando tarde, eu também tenho que ir — ela perguntou apenas para arrumar um gancho para ir para casa. No fundo, ela sabia que não resistira muito mais, então terminou o vinho de sua taça num gole e foi se levantando.

— Não! Fica mais um pouco! Você mora do outro lado do corredor! — levantou-se também, indo atrás da mulher, que caminhava em direção à sala — Eu não tenho uma conversa tão boa assim com alguém há muito tempo!

— Escuta, Shiro — ela soltou num suspiro, virando-se para encará-lo — eu saí de um relacionamento péssimo não faz muito tempo. Você realmente conseguiu provar que é um cara muito legal, mas eu não estou pronta para mais alguém me controlando.

— Eu jamais faria isso — ele deu um passo na direção da mulher — Allura, desde que eu me mudei para cá, eu não passei um dia sequer sem falar de você, sem pensar em você. A última coisa que eu quero agora é te deixar mal — ela sorriu, negando com a cabeça — e mesmo se eu quisesse te controlar, eu não conseguiria. Você é uma força da natureza, você é incontrolável.

         Allura deu uma gargalhada, levando as mãos ao rosto, incrédula. Como era possível um homem assim existir? Mas ela sentia que não podia dar o braço a torcer assim, tão fácil. Ela estava pronta para rebater, mas ele falou primeiro.

— E antes que você fale algo, eu quero te oferecer algo.

— Do que você está falando agora, Shiro? O que você quer me oferecer? — ela perguntou num misto de confusão e surpresa, arregalando os olhos ao ver o homem se ajoelhar em sua frente, a encarando nos olhos.

— Eu. Eu sou seu e isso não é mais segredo. Faça o que quiser comigo — ele tinha um sorriso terno, mas ao mesmo tempo cafajeste em seus lábios — Você quem manda. Você tem o controle.

         Allura se arrepiou da cabeça aos pés. Não importava mais o que ela fosse dizer para si mesma, para se convencer de que não desejava Shiro: não iria funcionar. Ela o queria provavelmente desde a primeira vez que o viu e agora ele estava ali, diante dela, caído sobre seus joelhos, entregue. Abdicou de todo seu poder, de toda a sua imponência e se submeteu a ela. Esse era o tanto que ele ansiava por seus toques.

— Shiro... — ela o chamou num tom firme, fazendo-o encará-la — meu apartamento. Agora. — e saiu pela porta.

         O homem levantou-se num pulo, abrindo um sorriso que mal lhe cabia no rosto, e foi atrás dela.

         Mal estavam dentro do apartamento e Allura pulou em Shiro como uma tigresa dando o bote em sua presa. Ela enlaçou suas pernas na cintura do homem e seus braços em volta do seu pescoço, atacando seus lábios sem fazer cerimônia, sendo retribuída com um par de braços fortes em torno de sua cintura.

         Shiro a encostou contra a parede, para que suas mãos pudessem vagar pelo corpo sinuoso da mulher, apertando e alisando cada parte das pernas e também de sua bunda. Mas o que ele queria mesmo era sentir a textura de sua pele sob seus dedos, então sem fazer cerimônias, levou as mãos ao botão do short que ela usava.

         Ao fazer isso, o homem sentiu uma dor aguda e soltou um gemido de dor. Ela havia puxado o seu cabelo tão forte, que o fez tombar sua cabeça para trás. Ele a soltou do agarre e levou suas mãos à cabeça, numa súplica para que ela o soltasse.

— Allura, o que é isso? — ele disse em meio a lamúrias e uma careta de dor.

— Ué — falou em tom irônico — pelo que eu me lembro, você disse que quem manda, não?

         Shiro se arrependeu amargamente de suas palavras naquela hora.

         Em seguida, a mulher foi em direção ao seu quarto e mandou que o homem a seguisse. Chegando lá, tirou sua camisa, passando suas mãos pelo peitoral largo e definido dele, apenas por prazer. Ela mandou que Shiro deitasse na cama e foi até seu armário, de onde tirou um lenço.

         Ela sentou sobre a cintura de Shiro, empurrando-o e fazendo com que ele se deitasse na cama. Pegou seus pulsos e os ergueu na altura da cabeceira da cama, onde amarrou suas mãos em uma das barras de metal que detalhavam a peça.

         Shiro não conseguia conter o sorriso maldoso em seu rosto, que era retribuído à altura por Allura. Ela levantou-se e novamente foi até o seu armário, de onde retirou uma caixa preta, que parecia ser embrulho de uma loja de roupas.

— Você tem muita sorte de eu estar bêbada o suficiente para isso — ela soltou num tom enrolado, por causa da risada que escapou junto com sua fala e, em seguida, saiu do quarto, deixando para trás um homem confuso, curioso e imobilizado.

         Alguns minutos depois ela voltou, escorando-se no batente da porta. Shiro não conseguia acreditar no que estava vendo. Era Allura, usando um conjunto de lingerie branco, todo detalhado em renda e ainda uma cinta liga, que segurava uma meia com os mesmos detalhes rendados, que ia até a altura da metade da coxa.

         Ela tentou fazer uma pose sensual, mas teve que rir de si mesma. Shiro também caiu na gargalhada.

— Você está linda — apesar dele falar entre risos, estava sendo franco — o que você está tramando, hein?

— Eu? Nada — ela rebateu, com uma falsa inocência em sua voz — eu só quero mostrar pra você o que eu venho ensaiando há algum tempo — Shiro ergueu uma sobrancelha, curioso, acompanhando Allura com o olhar.  Ela foi até um pequeno aparelho de som no canto do quarto, onde plugou seu celular e começou a teclar na tela — você conhece work, da Rihanna, não é?

         Shiro gelou.

— Ah não... Você não vai fazer isso.

         Antes mesmo de ele terminar a sua fala, a voz de Rihanna já preenchia o ambiente e os quadris de Allura já começavam a balançar como se tivessem molas nele. Ela foi até a frente da cama e ficou de costas para ela, balançando os quadris no ritmo da música. De cima para baixo, de um lado para o outro, em movimentos sensuais e tão fluidos, que pareciam os de uma serpente.

         Ela olhava provocante para Shiro por cima de seu ombro, como se o convidasse para juntar-se a ela, mas ele estava preso e nada podia fazer, se não assistir passivamente ao show, se contorcendo e a amaldiçoando por tê-lo prendido.

         Quando Shiro se deu conta, ela estava novamente em cima de si, arranhando lentamente seu peito.

...

         Keith não se reconhecia mais. Não sabia quando foi que havia ficado tão fraco, a ponto de se entregar tão fácil assim para alguém. Sua memória não andava nada boa, a ponto de ele nem lembrar de como havia ido parar dentro de uma daquelas apertadas cabines do banheiro, sendo prensado contra uma das paredes dela por Lance, que lambia e mordia a carne do seu pescoço, o fazendo delirar e soltar sons que nem sabia que era capaz de produzir.

         As mãos do moreno agarravam as coxas e a bunda de Keith em apertos vigorosos, como se fosse um leão cravando as garras em sua presa. Mas o outro não ficava atrás, não. As unhas de Keith marcavam a carne dos ombros, braços e costas de Lance, que já estava sem camisa.

         Seus corpos roçavam um no outro, em movimentos selvagens e instintivos; pareciam saber que necessitavam um do outro. O pescoço e algumas partes do peito de Keith estavam cheios de marcas de mordidas e chupões, que já começavam a ganhar cor arroxeada.

         De repente, Lance largou as pernas de Keith, fazendo-o pisar no chão pela primeira vez em um bom tempo. Ele quase caiu, pois suas pernas estavam bambas.

         Num movimento súbito e com um pouco de dificuldade, por conta do espaço apertado da cabine, Lance se ajoelhou na frente de Keith, levantando a barra de sua camiseta e beijando descaradamente sua barriga. Mas ele não parou só nisso, não, e logo estava mordendo e deixando diversas marcas na barriga branca e delgada.

         Keith estava fora de si. Ele se apoiava onde podia, para tentar conseguir alguma estabilidade, mas não funcionava. Sentia como se seu corpo fosse começar a flutuar a qualquer momento, tamanho o prazer que sentia.

         Ele voltou aos seus sentidos bruscamente, com o susto que levou ao sentir Lance desabotoando sua calça e puxando seu zíper para baixo.

— Ei, ei, ei! O que você está fazendo? Ficou louco? — Keith gritava, ofegante, agarrando Lance pelos cabelos e o afastando de si, o que o fez bater as costas contra a outra parede do cubículo.

— Essa é a minha forma de te pedir desculpas por ser um babaca com você e também de agradecer por você salvar meu emprego. — ele o encarou com um sorriso cafajeste, que fez Keith engolir grosso.

— Lance, você não precisa...

— Eu quero — o interrompeu num tom de voz forte, que fez Keith se arrepiar — você não precisa retribuir nem nada, mas eu quero fazer você se sentir bem.

         O olhar de Lance, além de luxurioso, era sincero. Como Keith não protestou, ele foi em frente, acabando completamente com sua sanidade e também o levando ao céu.

...

         Aquele havia sido o banho mais dolorido de Shiro. Suas costas e seu peito ardiam como ferro em brasa ao entrarem em contato com a água. Era um pequeno preço que tinha que pagar por ter tido a melhor noite da sua vida com Allura.

         Secou seu corpo com muita cautela, por conta da ardência nas marcas deixadas pelos arranhões que a outra mulher havia lhe infligido. Quando terminou, apenas enrolou a toalha em sua cintura e saiu do banheiro, indo até a cozinha, onde Allura passava café para os dois, vestindo apenas a camiseta de Shiro.

         Não, não era de manhã ainda. O homem foi até a mesa e pegou seu celular para olhar as horas. Duas e quinze da madrugada. Ele fez uma careta de preocupação.

— Relaxa — ela falou num tom suave e meio cansado, atraindo sua atenção — Keith está em casa, são e salvo. Chegou há pouco, enquanto você tomava banho.

— Ele chegou em casa às duas da manhã? — perguntou num misto de irritação e preocupação. Não era do feitio do seu irmão fazer coisas assim.

— O menino da cafeteria estava com ele — contou, servindo uma xícara de café quente para o homem — Lance — acrescentou, vendo Shiro erguer uma de suas sobrancelhas.

— Eles estavam... — Allura captou o que ele queria dizer e respondeu apenas com um maneio positivo de cabeça.

— Não vá brigar com ele — ela pediu suave, aproximando-se para um abraço — ele é jovem, faz parte da vida.

— Eu não vou brigar com ele — ele aceitou o abraço e a envolveu em seus braços — depois desses três rounds com você, eu estou exausto demais para qualquer coisa!

         Allura estapeou o ombro de Shiro e o xingou, indignada com o ultraje do outro, mas no fim, ambos caíram na gargalhada.

...

         Keith acordou na manhã seguinte com uma ferida profunda na sua dignidade. Não conseguia acreditar no que havia feito na noite anterior e ao mesmo tempo em que ele se arrependia daquilo, se pudesse voltar no tempo, ele não mudaria nada do que havia acontecido.

         Depois do “pedido de desculpas” de Lance, seu corpo ficou mole como gelatina. Nunca havia experienciado algo como aquilo antes, não com tanta intensidade. Quando conseguiu se recompor, decidiu que precisava retribuir. Não era justo que somente ele aproveitasse ao máximo aquele momento que os dois haviam compartilhado. Abriu o fecho da calça de Lance e num momento de coragem, botou sua mão lá dentro. E o resto, é história.

         Quando terminaram, ambos estavam exaustos. Parecia que haviam corrido uma maratona. Eles se limparam e se vestiram, então sentaram-se no chão do banheiro, lado a lado, e passaram horas conversando sobre as coisas mais diversas, até Keith cair no sono no colo de Lance.

         O moreno fez cafuné no cabelo dele até cair no sono também. Acordaram no susto e já era de madrugada. Keith se desesperou, correndo para seu celular para ver as horas e também quantas ligações de Shiro ele havia perdido.

         Nenhuma.

         Nem teve tempo para estranhar, de tão afoito que estava, Jogou seu celular de lado e foi até o espelho do lugar, para ajeitar o cabelo e a roupa, que estavam todos desgrenhados. Aproveitou e amaldiçoou Lance por tê-lo enchido de marcas roxas no pescoço. Ouvindo os xingamentos, o outro apenas riu em resposta.

         Como era já era tarde, Lance insistiu em acompanhar Keith até a porta de sua casa. Lá conversaram mais um pouco, trocaram números de telefone e mais alguns beijos. Foi isso que Allura havia visto pelo olho mágico de sua porta.

         Keith pegou uma muda de roupa, que incluía um cachecol e correu para o banheiro. Saiu de lá já pronto para ir para a escola. Foi até a cozinha e lá encontrou Shiro, com uma cara amassada e uma aparência exausta, esperando o café ficar pronto.

— Cachecol? — perguntou Shiro, em tom de deboche.

— Sua camisa branca está cheias de manchas de sangue. Você não faz perguntas e eu também não, certo?

— Fechado. Eu só quero saber se você está feliz — Keith foi pego de surpresa pela pergunta de seu irmão.

         Depois de um suspiro profundo, ele sorriu e acenou positivamente com a cabeça, fazendo Shiro sorrir também. Tomaram café juntos e conversaram um pouco sobre assuntos aleatórios.

         Shiro disse para o irmão convidar Lance para jantar com eles qualquer dia e ele concordou. Keith disse o mesmo sobre Allura e isso foi tudo.

         Tudo estava bem, tudo estava em ordem. Aparentemente, aquele seria o novo normal por ali.

         Será que ter uma queda por morenos era algo genético?


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Notas finais do capítulo

Então... Se essa não foi a coisa mais louca que escrevi, eu não sei de mais nada HUASHUASASHU

Espero que a formatação não tenha ficado cagada.
Eu não lembro de metade das coisas que estão nesse texto, mas é nóis WTYEFRTWEFRY

Beijão ♥