Mequetrefe escrita por themuggleriddle


Capítulo 1
mequetrefe




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No início, era divertido. 

A eterna luta de James para ser notado por Lily Evans era uma distração interessante quando o dia estava muito sem graça. Era sempre um bom entretenimento ver o amigo tentar chamar a atenção da garota com sorrisos e flertes terríveis (James podia ser ótimo em cima de uma vassoura, mas era uma negação na hora de interagir com garotas). As rejeições dela eram fontes de risadas para ele e resmungos por parte de Remus, que pedia para Potter, por favor, parar de falar tão alto no meio do corredor. 

Era divertido criar cenários imaginários onde James finalmente conseguia sair com Evans. Onde ele e Peter o seguiriam até o Três Vassouras como as velhas acompanhantes das jovens damas da alta sociedade e ficariam narrando todas as qualidades do amigo. Nesses faz-de-conta, o encontro era mais sobre eles brincando com o amigo do que sobre ele e Lily em algo romântico. E sempre acabava com todos rindo e a menina, magicamente, sumindo do cenário. 

*** 

No quinto ano, alguma coisa mudou. Talvez fosse o tom de voz de James ao falar sobre Lily, talvez fosse o jeito como os olhos dele se perdiam quando a olhavam. Havia algo diferente e, quando Sirius comentou isso com os amigos, Peter deu de ombros e Remus disse que não havia nada demais ali. 

Os desenhos das letras com pomos-de-ouro foram outro sinal. Sirius via os rabiscos de Prongs nos cantos dos pergaminhos e, onde antes havia caricaturas de suas formas animagas ou das tentativas falhas de suas primeiras transformações, agora havia um L e um E em uma caligrafia rebuscadas. Havia lírios. Havia olhos que pareciam muito os olhos de uma certa ruiva.

Black não sabia exatamente o por que disso, mas algo em todos aqueles sutis detalhes o incomodava. 

*** 

Ele realmente achou que seria divertido pregar uma peça no Ranhoso e que James iria rolar de rir ao ouvir sobre o pavor do sonserino. Mas o que aconteceu foi exatamente o contrário... Potter arregalou os olhos e, em um segundo, já estava correndo para longe. Para os jardins. Para o Salgueiro Lutador. 

Sirius o seguiu até a árvore, mas não teve coragem de ir mais longe. Assim que viu o amigo sumir dentro do túnel secreto, algo se derramou sobre ele: medo, ansiedade, pânico... Ele não sabia como especificar, mas era algo que fez os pelos de sua nuca se arrepiarem, seu estômago parecer um vácuo e suas pernas tremerem. Só então notou o que havia feito e o que havia colocado em risco... não a vida do Ranhoso, ele estava pouco se importando com isso, mas a segurança de Remus e James. Se o amigo fizesse algo contra Snape enquanto lobisomem, nem mesmo Dumbledore poderia continuar escondendo a condição dele. 

Os minutos que se passaram entre James entrar no Salgueiro sozinho e voltar com um Snape de olhos arregalados e pálido feito a morte pareceram uma eternidade. Seu queixo tremia com o frio e seus olhos ardiam com lágrimas de frustração. Suas pernas pareciam que iriam desistir de suportar o seu peso a qualquer segundo. Seu coração parecia pronto a saltar pela boca. 

E quando o amigo finalmente apareceu e Sirius só queria saber se estava tudo bem com ele e Remus, James se recusou a falar com ele. James Potter, sempre tão sorridente, agora tinha as sobrancelhas grossas franzidas e os olhos castanhos sérios enquanto arrastava um Ranhoso e choque pelos terrenos. Black apenas o seguiu, falando e falando e falando incansavelmente sobre como sentia muito, querendo saber como estava Lupin, mas o outro não lhe respondeu nada. 

Quase uma semana se passou antes de alguma palavra lhe ser dirigida. E quando isso aconteceu, James estava furioso. Ele xingou e gritou e tudo o que Sirius fez foi abaixar a cabeça como algum tipo de cão acuado. No fim, Potter lhe deu um último sermão, agora mais calmo, mas mesmo assim firme, antes de pedir para ele se apressar, pois eles precisavam falar com Remus. 

*** 

No dia em que Lily Evans aceitou sair com James, Sirius achou que aquilo não passava de um brincadeira de mal gosto vinda de Peter, que lhe dera a notícia. 

"Claro, Wormtail, e eu aceitei sair com a Narcissa nas férias."

Mas então Potter chegou com um sorriso ainda maior do que o normal e ele soube que era verdade. De início, foi divertido, como sempre. Era engraçado ver o amigo todo bobo por conta de um encontro e aquilo era fonte de muitas piadas. A semana antes do fatídico dia fora divertida: Sirius fazia piadas, Peter narrava um encontro fictício e Remus ria deles. 

Depois, ficou chato. 

Depois que as fantasias de James e Lily juntos deixaram de ser fantasias, Black ficou incomodado. Não havia graça em imaginar o amigo agindo apaixonado quando ele estava agindo assim há mais de uma semana. Não havia graça em imaginar um encontro porque eles se encontravam todo final de semana. Não havia graça nas coisas quando a piada se tornara realidade e a realidade era simples e mundana. 

*** 

Sirius nunca achou que fosse sentir tanta falta de Regulus quanto naquele ano. Depois de sair da casa dos pais, o garoto havia sofrido com a distância entre ele e o irmão, mas aquilo fora algo superado com o tempo e com a ajuda dos amigos. Mas agora James estava cada vez mais distante, cada vez passando mais tempo com Lily, cada vez mais focado em assuntos que envolviam a namorada... ele não queria admitir isso, mas era como perder Regulus uma segunda vez. 

Ele tentava se aproximar. Ele chamava James para ir na Zonkos ou ouvir a narração da última partida dos Magpies de Montrose no rádio, mas o amigo estava ocupado sendo Monitor-Chefe ou indo na Dedosdemel com Lily. O rapaz contrabandeava whiskey de fogo para o dormitório, mas James estava ocupado estudando para os NIEMs...

Não era como se Black não gostasse de passar o tempo com Moony e Wormtail. Ele adorava, mas a falta que James fazia era ridícula e parecia que a cada dia que passava, mais ela aumentava. Qualquer coisa fazia com que o rapaz se lembrasse do amigo e quisesse falar com ele, comentar sobre algo, fazer piadas, mas Potter estava ocupado se preocupando com os ataques de Você-Sabe-Quem.

Sirius, com seus dezoito anos, queria apenas aproveitar o pouco que restava da infância, dos dias em Hogwarts e da leveza de ser apenas um estudante. Talvez fosse essa a razão da enorme agonia que sentia ao ver James e Lily tomando os primeiros passos da vida adulta juntos.

***

Quem Sirius queria enganar? Ele sabia muito bem que desde que entrou em Hogwarts (não, desde que ele superara o fato de não estar na Sonserina), tinha na cabeça o cenário perfeito do futuro: ele e James dividindo um apartamento mequetrefe em Londres, um lugar onde iria tocar música alta e onde os Marotos poderiam se reunir para fazer farra sempre que quisessem. Era o plano perfeito, sempre foi.

Até Lily Evans aceitar o convite para um encontro. A partir desse momento, Black viu a sua fantasia do apartamento mequetrefe se despedaçar, pois sabia que James iria sair de Hogwarts e se mudar para junto de Lily. E ali não haveria lugar para Sirius Black.

Aquilo o deixava irado ao ponto de ficar de cara amarrada por dias, sem falar direito com o amigo. Remus parecia saber o que estava acontecendo (quando é que Remus não sabia?) e até mesmo Peter, distraído como era para certas coisas, não demorou muito para notar que a razão do seu mal humor era o namoro de Prongs.

“James nunca vai deixar de ser seu amigo, Pads,” dizia Moony, na calada da noite, enquanto Potter patrulhava os corredores como Monitor-Chefe.

“Prongs não é esse tipo de pessoa que esquece dos amigos, Sirius,” dizia Wormtail, enquanto eles faziam as tarefas na biblioteca. “Ele não esqueceu da gente.”

Sirius queria gritar e falar pra todo mundo que, sim, James Potter havia esquecido deles. Eles não saíam mais no meio da noite para afanar doces da cozinha, não ficavam acordados até de madrugada conversando besteiras, não jogavam mais Snap Explosivo em cada intervalo de aula... Black só queria aquilo de volta, era pedir muito?

***

Não era como se Lily fosse uma pessoa ruim. Na verdade, Sirius sempre a admirara, tanto pela aptidão com magia quanto pela teimosia. Ela também era divertida, gostava das piadas deles (quando estas não envolviam ridicularizar outros alunos) e fazia boas brincadeiras. Ele sabia que, de todas as garotas do mundo, ela era ótima para James.

Ainda assim, não havia como ficar impassível ao vê-los conversando sobre música ou livros ou sobre qualquer assunto bobo. Era impossível não pensar que era ele quem deveria estar ali tendo aquela conversa com Potter, rindo com ele e fazendo troça. E ele ficava com essa raiva contida por horas e horas, até Evans aparecer e conversar com eles... Ai ele notava como ela era, sim, uma garota legal que merecia seu amigo.

Nunca durava muito. Tanto os surtos de ciúmes, quanto as realizações de que aquilo era o certo.

***

Quando eles se formaram, Sirius não demorou nem um dia para receber a confirmação de que o apartamento mequetrefe dele e de James nunca existiria. Voldemort estava poderoso, os Comensais da Morte estavam aterrorizando todo mundo nas ruas e o Ministério estava em desespero... Jovens bruxos e bruxas sabiam que agora era tudo ou nada, não podiam esperar para realizar os seus sonhos.

James e Lily foram morar juntos logo depois de saírem de Hogwarts e o casamento ocorreu um ano depois. Nesse meio tempo, Black arrumou um apartamento para si, o qual ocasionalmente dividia com Remus. Mas não era o que ele havia sonhado... Não havia noites de música alta, cigarro e bebidas; não havia cuecas jogadas por todos os lados; não havia Peter desmaiado no chão, nem Remus rindo feito idiota enquanto ele e James cantavam, bêbados; não havia os Marotos comprando algo bobo com o primeiro salário de merda de estagiário no Ministério.

O que havia era Lupin chegando assustado, com medo de ter atraído a atenção de algum Comensal na rua. Havia James e Lily visitando, mas sempre prontos para atacar caso algum seguidor de Você-Sabe-Quem os seguisse até ali. Havia conversas sobre a Ordem da Fênix (Potter não demorou para convencer todos eles de entrar para a organização) e reuniões secretas. De vez em quando havia música, mas nunca muito alto... Eles precisavam conseguir ouvir caso alguém invadisse o local.

***

Quando James contou que Lily estava grávida, Sirius sentiu como se tivesse sido atingido por um Estupefaça na boca do estômago.

O amigo parecia feliz, apesar de preocupado. Claro, quem não ficaria preocupado com uma criança nascendo no meio da guerra? Mas, por debaixo do medo, ele podia ver o sorriso bobo na boca de Potter e os olhos brilhando de emoção. Ele conseguia ver todas as cenas que Prongs já imaginava de um futuro com um filho dele e de Lily.

Sirius ouviu tudo em silêncio, odiando-se mais e mais a cada minuto que se passava. Ele devia estar feliz por James, afinal, ele podia ver a alegria do outro, mas... Uma parte de si, aquela parte que ainda se corria ao ver James e Lily como Sr. e Sra. Potter, não parava de pensar que ali era o fim da última esperança de que tinha em relação a ter o amigo de volta um dia.

No entanto, Black sabia que o momento era delicado e que os dois precisariam de todo o apoio que pudessem ter. Ele prometeu ajudar no que fosse preciso e o sorriso que recebeu em resposta fez o seu coração doer.

***

Ele evitava ver Lily e James juntos naquela época. Não queria ver a ruiva com a barriga enorme de grávida e ter ainda mais certeza do fim de seus sonhos de adolescente. Não queria ver o casal (não, a família) que simbolizava o fim de uma época de inocência.

Mas então, durante uma visita na qual ele e Remus foram levar presentes para o bebê (Moony era a única pessoa no mundo que se importava em comprar luvinhas para recém nascidos, só podia), Lily não parava de dizer que Harry estava inquieto. Lupin perguntou se podia senti-lo e a ruiva logo colocou a mão do amigo sobre a sua barriga, fazendo-o rir.

Sirius revirou os olhos e voltou a prestar atenção no gato que arranhava o sofá, mas logo a bruxa estava sentando ao lado dele e puxando a mão dele para a sua barriga. E Black, de olhos arregalados, apenas ficou estático, antes de deixar o queixo cair.

“Pelas barbas de Merlin!”

Ele sentiu sua mão ser empurrada por alguma coisa dentro da barriga de Lily. Bom, ele sabia que aquela ‘alguma coisa’ era Harry, mas ele nunca pensara que fosse conseguir sentir tão bem. O bruxo tentou imaginar o bebê ali dentro, chutando onde sua mão estava quase que para se mostrar.

“Esse é o Sirius, Harry,” disse Lily, olhando a própria barriga enquanto James espreitava ao redor deles.

“É o seu padrinho, filho,” o amigo falou, parando atrás da esposa e apoiando as mãos nos ombros dela.

Foi a segunda vez em menos de cinco minutos que Sirius Black sentiu os olhos arregalarem e o queixo cair, mas agora ele também sentia os olhos arderem com lágrimas.

***

Quando Harry nasceu, Sirius estava quase arrancando os cabelos na sala de esperas do St. Mungus. Ele pedira para James lhe avisar, mas o desgraçado só lembrou de mandar uma mensagem por Flu quando já estavam no hospital (na verdade, foi uma enfermeira que fez isso, pois Potter estava ocupado demais surtando).  Remus e Peter eram as pessoas calmas do lugar. Moony lhes trazia chocolate quente da cantina e Wormtail ficava comentando as notícias do Profeta Diário, mas Black realmente não queria saber sobre o novo namorado de Celestina Warbeck. Ele queria saber do seu afilhado.

Foi só quando um James Potter com o rosto melado de lágrimas e um sorriso enorme apareceu que Sirius sentiu-se relaxar. O amigo o abraçou e desabou a chorar e rir ao mesmo tempo. E ele fez o mesmo, porque James estava feliz, estava radiante, e era aquilo que realmente importava no momento.

***

“Meu afilhado é melhor que o seu,” ele dizia para Remus, que apenas arqueava uma sobrancelha e falava que ele nem tinha um afilhado.

Harry, com os cabelos negros e olhos extremamente verdes, não demorou muito para se tornar o mascote que Sirius sempre quis. O jovem podia não querer filhos, mas, pelas calças de Merlin, ele adorava aquele menino. Ele podia passar horas brincando de esconde-esconde atrás das mãos, lendo alguma história boba, cantando alguma coisa alheia... Harry sempre ria e sacudia as mãozinhas e fazia o coração do bruxo derreter.

Foi um dia, enquanto sacudia o leãozinho de pelúcia na frente do bebê, que Sirius percebeu que, de certa forma, aquela era apenas outra versão da fantasia do apartamento mequetrefe. Não havia latinhas de cerveja, cigarros, rock alto ou cuecas espalhadas pelos cantos, claro, mas havia mamadeiras, bichinhos de pelúcia, canções de ninar e fraldinhas de pano pela casa. Havia Sirius e James, claro, mas também havia Lily, sacudindo a cabeça para as palhaçadas deles, e Harry, rindo de tudo.

Era uma versão melhorada e menos mequetrefe da sua fantasia.


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Notas finais do capítulo

Ninguém vai me convencer de que o Sirius aceitou super de boas o relacionamento JamesLily.