Les Marcheé escrita por Marurishi


Capítulo 22
Se isolou em Bherto




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Desde que se isolou em Bherto, Lorde Codhe recusava a maioria das visitas e a irmã era uma das poucas que ele ainda não se negava a receber. Lady Khei queria apenas que o irmão se dedicasse a outras coisas além da magia para a Ordem, armaduras e armas.

— Mclin, você é minha melhor amiga e sabe que tem muita influência sobre meu irmão — tentava convencê-la de ir junto falar com Codhe. — Vamos juntas e, talvez, ele escute você!

— Eu não posso, Khei! Eu queria muito ajudar, mas não é apropriado — sentia-se mal, mas tentava defender seu ponto de vista. — Veja bem Khei, eu vou me casar com Lorde Shaido, não fica de bom tom eu ir ter uma conversa particular com seu irmão, todos sabem dos sentimentos dele por mim.

— Justamente por isso que ele, provavelmente, escutará mais a você do que a mim!

— Eu acho o contrário! Ele está do lado dos que são contra meu casamento, ele não há de querer me ver.

— Não pode usar seus poderes para persuadi-lo?

— Nunca! Khei, que absurdo! Jamais usaria meus poderes para persuadir a mente de alguém, muito menos de um amigo! E meus poderes não funcionam dessa maneira. Não posso mudar o sentimento das pessoas.

— Que decepcionante! — bufou inconformada. — Vou ir sozinha de novo, mas tenho quase certeza que vou voltar de lá ainda mais chateada!

E Lady Khei foi novamente sozinha visitar o irmão e contestar a conduta dele. A conversa deles não foi amigável, novamente. Lorde Codhe estava irredutível.

— O que você sabe sobre certo e errado? — Codhe conversava tranquilamente enquanto temperava algumas pedras preciosas para encantá-las com magia.

— Apenas não me parece correto. Temos tempos de paz, por que precisaríamos de uma Ordem como essa, com todas essas armas e magia?

— Então você nada sabe. Mesmo que sejamos gêmeos, nossos caminhos foram separados no dia em que despertei a magia e você não. Naquele dia, você recusou e, por isso, hoje, você de nada sabe.

—  O que eu deveria saber? Sobre guerras, sobre selos?

—  Sobre as Musas e o poder que se opõe a elas.

— Eu sei disso! Qual seu objetivo? Por que você se tornou assim, seu espírito parece que está perdido em trevas!

— Você vê trevas em mim? Olhe para mim, o que você vê? — sorriu e pareceu se divertir com a discussão. — É trevas realmente?

—  Não... Ainda não. Às vezes, você ainda parece meu irmão, divertido e bondoso — sorriu levemente, mas logo acrescentou com repúdio. — Logo será trevas se não mudar esses planos.

—  Você está errada, Khei — tentava convencer a irmã de forma branda e decidida. — Eu jamais serei trevas. Eu sou fogo, calor, acalento e prazer. Sou o que há de levar as batalhas adiante até o fim, justamente contra as trevas que você e Les Marcheé temem.

— Ah sim, e pretende fazer isso sozinho? — debochou.

—  Não, você já viu que tenho muitos aliados — respondeu zombeteiro no mesmo nível da irmã. — Mas isso eu vejo depois, no momento meus planos são outros.

— Me fale, não precisa me esconder. Precisa?

— Que dia é o casamento da Loren? É daqui três semanas?

— Não mude de assunto! Fale-me dos seus planos antes.

— Meus planos são para esse dia. Não precisa me dizer, eu sei que é daqui três semanas — completou com ironia —, tenho anotado com muito carinho.

— Você não vai fazer nenhuma bobagem né! — pareceu preocupada com o olhar irônico do irmão. — Não faça nada que vá se arrepender.

— Nunca, não haverá arrependimentos — falou convicto. — Eu juro.

Lady Khei, realmente, voltou para o palácio de Linmor mais chateada do que já estava, pois tinha certeza que seu irmão planejava algo e não era coisa boa.

Todavia, era notável o trabalho que Lorde Codhe realizou na região de Bherto. Nesse ano em que fez residência ali e iniciou suas atividades, auxiliou no desenvolvimento dos vilarejos ao redor das suas terras e ganhou confiança da maioria, que sentiam-se felizes e seguros em ter suas terras incorporadas aos domínios de Lorde Codhe.

Todos tinham trabalho, terras, comida e profissão. Os lorde da Ordem Protheroi eram bem visto e respeitados, pois representavam a segurança e justiça daquelas terras.

Mesmo que Lorde Shaido fosse o governador de todas as terras em Boandis, ainda sim, em Bherto, somente as leis de Lorde Codhe eram obedecidas. Aqueles que não se sentiam à vontade, acabaram por mudar-se. Lorde Codhe comprou as terras dos que não desejavam lhe servir e os deixou partir livremente, sem rancor ou ofensas.

Boandis estava dividida entre o lado governado por Lorde Shaido, em legitimidade e poder, e o lado de Lorde Codhe, na região de Bherto. Não eram opostos nem faziam afronta, havia uma neutralidade onde um lado não se intrometia nos assuntos do outro. Havia respeito e ambos prosperavam a sua maneira.

Todavia, ambos os lados eram observados atentamente pelos Lordes Lynzeths e, principalmente, por Lorde Thwar.

 

 

No grande salão de Atos, a Imperatriz Lady Beriune entrou na companhia de suas veilanas. Agora que a Tríade estava desfeita, apenas Lorde Meyne fazia sua guarda, mas ela decidiu dispensá-lo por alguns dias, para que ele pudesse tratar melhor de seus assuntos pessoais. Ela estava ocupada com rotinas do castelo, entre ordens e desordens.

Lorde Thwar se fez presente no salão, e com um gesto de mão, ordenou que as veilanas se retirassem. O Imperador nunca falava na presença de outros que não fossem Lordes Lynzeths ou Lordes Magos e sempre evitava ser visto por muitas pessoas.

— Viestes aqui pessoalmente averiguar o porquê das borboletas estarem desaparecendo das tapeçarias? — perguntou Lady Beriune, sabendo que o motivo não era esse.

— Sabes que não. Não faças piadas sobre minha presença — repreendeu com seriedade. — Não estou de bom humor.

— Ora, meu amado, não te zangues por tão pouco — sorriu e caminhou rapidamente até ele, dando lhe um caloroso beijo.

Lorde Thwar retribuiu o beijo, envolvendo-a em seus fortes braços e inclinando-se para melhor beijá-la. Havia uma grande diferença de altura, pois Lady Beriune era de estatura baixa, mesmo usando salto alto, enquanto ele era alto e másculo; esse contraste tornava o casal peculiar e atraente.

— Sempre sabes como me acalmar quando estou furioso — disse após concluir o beijo.

— E posso saber o motivo de tamanha fúria?

— Como se não soubesse! A agonia que sinto ao ver todo esse poder maléfico se regenerando nesta era, e você age como se não fosse importante! — dizia perplexo.

— Não estou agindo como se não importasse, mas no momento, posso no máximo, oferecer pequenas ajudas em forma de conselhos e presentes.

— Então, aconselhe Lady Hestea a jogar-se da torre! — falou irônico, ainda que tivesse um resquício de desejo verdadeiro naquela fala. — É intolerável que ela esteja cooperando com os Kailes somente para obter um falso poder!

— Mais do que cooperação, ela está nitidamente sendo usada por eles.

— Se ela pudesse ser convencida de que tudo o que eles prometem, jamais cumprirão.

— Isso não acontecerá, a obsessão dela pelo poder é maior que qualquer razão. Ela irá até o fim e é exatamente isso que desejo! — acrescentou com desdém. — Inclusive, nesse momento, ela está privada de seus poderes, trancada em seu próprio quarto, onde ficará por um bom tempo — finalizou com um sorriso vitorioso.

— Sei que ela tem planos para o dia do casamento de Lorde Shaido, em Boandis.

— O lorde que você julga como inútil se encarregou de uma atitude louvável.

— Não estou interessado na vida pessoal de Lorde Meyne ou da megera, mas se isso contribuiu para o bem de todos, que assim seja.

— Não quer ouvir como aconteceu?

— Não, eu tenho outras preocupações.

— Quais?

— Você! Quando aconteceu? — falou em um sussurro. — Quando as Musas decidiram sobre tal, e você, minha eterna amada, se tornara tão obcecada em combater esse mal a ponto de trazê-lo para os dias atuais? É, de fato, somente para destruí-lo?

— Eu sei que desejas deixar tudo como tem estado. Mas não é possível viver nesse mundo tão restrito! — falou com angústia. — Eu sempre ei de concordar com as Musas; queremos a paz e a verdade de volta ao nosso império para restabelecer o que fora perdido.

— Pensei que, depois de tudo, meu amor fosse o suficiente.

— Sim, ele é... Mas... — foi interrompida pelos dedos de Lorde Thwar, que tocaram levemente seus lábios, fazendo-a se calar.

— Eu odeio sempre que pronuncia esse “mas”. É como se me escondesse algo — falou sério e levemente irritado.

Agora foram os finos dedos de Lady Beriune que tocaram os lábios dele, fazendo-o emudecer contrariado. Não era sempre que Lady Beriune usava seus poderes contra seu amado esposo. Ele não se importava de fato, porque nunca lhe feriam realmente, além do seu ego. Às vezes, achava até graça, mas não era o caso desse momento; entre todos, o Encantamento do Silêncio, que a Imperatriz dominava com maestria, era o que ele mais odiava.

Claro, poderia ter feito algo para revidar ou se livrar facilmente daquilo, mas sua mágoa foi maior por compreender que, realmente, ela estava escondendo algo, que não podia ser revelado por vontade ou por um motivo maior. Não havia motivos para desconfiar de sua esposa, se ela negava contar-lhe, tinha um grande motivo e ele deveria respeitar isso, pelo bem do império.

Simplesmente, se retirou a passos largos e pesados, sem olhar para trás. O encanto logo perdeu o efeito, mas não tinha mais motivos para continuar ali.

Lady Beriune permaneceu calada, e relembrou da conversa que teve com seu Lorde Mago do Gelo que ocasionou na decisão dele em por fim nos planos da esposa petulante.

Em uma das salas privadas da torre de Panapanézia, estava Lorde Meyne de joelhos diante da Imperatriz. Tinha ali uma conversa desagradável e reveladora.

— Não sei o que devo dizer, mas ... — Lorde Meyne queria de alguma forma se desculpar, mesmo sabendo que jamais teria perdão para o que a Imperatriz acabará de lhe informar sobre sua esposa.

Foi interrompido bruscamente.

— Não diga nada, não há nada que você possa me dizer. Nada vai mudar o que aconteceu e o que ela pretende fazer! — caminhava de um lado para outro, não escondendo seu desgosto e ira. — Em consideração a você, não pretendo matá-la imediatamente. Deve estar ciente que se aliar aos Kailes é o maior e pior de todos os crimes! — completou quase aos gritos. — Ela trará a destruição e trevas para toda Les Marcheé! Jamais permitirei isso!

Um momento de silêncio se fez.

Era verdade que Lady Beriune possuía um poder altíssimo, direto das Musas, isso lhe permitia saber de muitas coisas e, principalmente, sentir as variações de poderes. O Lorde Mago do Gelo se condenava por nunca ter percebido nada sobre sua esposa. Como era possível que sendo um Lorde Mago, não tivesse sentido nada sobre a evolução de poder da esposa?

Agora, até mesmo Lady Beriune temia e acreditava ter subestimado a Dama Albina. Esse era um dos motivos que deixava Lorde Meyne abismado. Quão poderosa Lady Hestea havia se tornado? Ele, mesmo com toda sua sabedoria e sagacidade, havia sido cegado por ela? Ou isso era um fato antigo? Talvez, percebesse com humilhação, que havia estado cego em relação a verdade sobre sua esposa já fazia muitos anos.

Era como se vivesse, mas não estivesse completamente lúcido sobre sua vida em totalidade. Ao se dar conta disso, ficou perplexo.

— Você ainda é casado e deve ir ter com ela, recuso-me tê-la diante de mim — parou em frente o Lorde Mago que, ainda ajoelhado, encarava o chão como se tentasse buscar respostas para perguntas que ele nem sabia quais eram. — Não sei qual punição seria suficiente para ela! Esse ódio que tenho faz mal ao meu coração e trás rupturas à harmonia dos reinos.

Lady Beriune tentou se acalmar, fechou os olhos por um breve momento e depois olhou para baixo, para aquele no qual depositava total confiança. Podia sentir o peso que estava sobre os ombros do Lorde Mago e completou:

— Não consigo deixar de odiá-la e desejar a ela os piores castigos do mundo! — prosseguiu com voz mais amena, mas continuava assustadora pela forma com que arrastava as palavras. — Até aqui, tolerei muito dela em consideração a você e as meninas que tenho muito carinho... Mas agora, minha tolerância se esgotou, quando vidas são perdidas, quando o medo é espalhado, quando o mal é introduzido de forma vulgar e mesquinha. Se Lady Hestea acha que pode enfrentar-me com pensamentos tão baixos, aliando-se a um mal que já foi derrotado, está iludida. Não vou aceitar tal afronta. Eu vou destruir qualquer mal que ofereça risco a Les Marcheé e ela, sua esposa, será a primeira.

Para Lorde Meyne, ser casado com Lady Hestea agora era muito vergonhoso. Como poderia permanecer ao lado da Imperatriz se sua própria esposa havia traído o império? Em prol de desejos estúpidos, aliando-se com os mais abomináveis seres de Les Marcheé?

Em sua mente, muitas coisas fizeram sentido e percebeu que Lady Hestea sempre havia demonstrado sua insatisfação com o Império e o desejo oculto de ser a própria Imperatriz. Ele havia visto e sentido tal sentimento por várias vezes, mas acreditou que fossem apenas caprichos bobos de uma mulher mimada e fútil. Agora, isso lhe parecia sério e perigoso, uma mente obcecada e perturbada que tornou-se maligna e impiedosa.

— Vá e faça sua escolha — soou grave e autoritária, fazendo Lorde Meyne sair de seus pensamentos. — Escolha ao lado de quem deseja permanecer.

Sem esperar por resposta, Lady Beriune desapareceu na cintilante névoa roxa. Não precisava da resposta, ela tinha certeza da escolha que faria seu mais amado Lorde Mago.

Com um aceno de cabeça, como se espantasse as lembranças daquela conversa, Lady Beriune se moveu para cuidar de sua tapeçaria. Pensar que não precisava se preocupar com Lady Hestea naquele momento lhe trazia tranquilidade.


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