Amor e Amizade escrita por The Escapist
Daniel e Camila se conheceram na segunda-feira, primeiro dia de aula. Antes das aulas propriamente ditas começarem, o diretor da escola fazia uma palestra para os alunos no auditório. Agora a escola estava repleta de alunos, todos com seus uniformes, andando em grupos, falando sobre as férias, contando as novidades, etc. Daniel foi um dos primeiro a chegar ao auditório – estava tendo péssimas noites, sem conseguir dormir direito e já tinha tido a primeira discussão com um dos colegas de quarto – sentou-se na última cadeira da última fila; ouvir as baboseiras do diretor não era a melhor maneira de começar o dia!
Mila se atrasou; as três colegas demoraram tanto no banheiro que ela foi a última pessoa a entrar no auditório lotado; procurou um lugar para sentar e só viu uma cadeira vazia, no fim da fila. Quando o diretor começou a falar, Mila até procurou se interessar; talvez por ser novata e bolsista, mas depois de meia-hora estava entediada, e poderia apostar que o resto dos alunos também estavam; a maioria nem prestava atenção às palavras do diretor. Mila olhou de lado e percebeu que o colega estava dormindo. Depois de mais meia hora, que pareceu eterna, o diretor encerrou a palestra e dispensou os alunos, que começaram a sair do auditório; Mila achou que seria legal se ela acordasse o garoto e avisasse que a palestra tinha acabado.
─ Ei! Ei, garoto! – disse cutucando o rapaz – Ei!
─ Hãm?! – Daniel acordou assustado.
─ Desculpa por te acordar, mas é que a palestra já acabou.
─ Acabou a chatice? Menos mal! Ah, obrigado, por me acordar, Iracema.
─ Iracema?
─ Virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos pretos como as asas da graúna! – disse o garoto mostrando os longos cabelos negros de Camila, que sorriu com a brincadeira – Então o que vai ser agora?
─ Heim? Ahm, aula, é, eu acho, ahm, de que turma você é? – Camila decidiu que era hora de tentar fazer algum amigo.
─ Primeiro ano.
─ Ah, você também é novato?
─ Isso é um problema?
─ Não! Claro que não, eu também, sou, é, nova por aqui.
Os dois caminharam juntos para a sala de aula, em silêncio; Mila bem que gostaria de ter conversado alguma coisa, mas Daniel não pareceu interessado em bater papo e não encorajou a moça puxar assunto; eles foram os últimos a entrar na sala e sentaram-se juntos no final da fila; também sentaram juntos no refeitório na hora do almoço, e trocaram algumas palavras; e a mesma cena voltou a se repetir nos dias seguintes. Camila e Daniel ficaram amigos naturalmente; estudavam juntos, faziam as refeições juntos, e quando estavam em horários livres assistiam TV juntos.
Daniel era um garoto estranho, Camila pensava; ele parecia estar sempre triste, por mais que fizesse piadas sobre qualquer coisa; enquanto não tinham intimidade suficiente para perguntar sobre a vida dele, Camila ficava imaginando os possíveis problemas que ele teria pra viver daquele jeito.
Um mês depois que estavam na escola, Camila foi passar o primeiro fim de semana em casa; antes de sair, encontrou Daniel deitado no sofá da sala, todo “largadão”, de moletom e pantufas.
─ Pantufas, Daniel?
─ Ah, nem vem com essa!
─ Eu vou passar o fim de semana em casa.
─ Legal, divirta-se, se isso for possível.
─ Você não vai?
─ Não.
─ Por que não?
─ Sabia que você pergunta demais, Camila? Eu não vou pra casa por que eu ainda estou com raiva do meu pai.
─ Ah, você é mesmo muito bobinho, Daniel! Bom, eu já vou, a gente se vê na segunda.
O fim de semana foi curto demais pra Camila contar todas as novidades à família; ficou feliz ao ver que Caio já estava recuperado e de volta ao trabalho. Embora isso deixasse Rosa em completo estado de desespero.
Depois de se divertir com os irmãos, Camila voltou para a escola, dessa vez foi Caio que levou-a de moto, e quando eles chegaram Camila convidou o irmão pra conhecer o colégio por dentro.
─ Que chiqueza, hein, doutora? – brincou ele quando entrou na sala!
─ Você não viu nada.
─ Que bom que você tá feliz, Mila, sério, a mamãe morre de saudade de você, quer dizer todo mundo lá em casa, morre de saudade de você.
─ Eu sei...
─ Mas você tá feliz né? Então, tudo bem.
─ Caio... O pai... Ele não...
─ Não, Mila, ele não voltou a jogar, está tudo bem mesmo, de verdade. Bom, mas tá na minha hora, eu preciso voltar pro trampo, doutora.
─ Tudo bem, eu preciso me trocar e ir pra aula, já estou quase atrasada.
─ Então, eu vou nessa; tchau, Camila.
─ Tchau, Caio.
Depois que Caio foi embora, Camila trocou a roupa pelo uniforme e correu para a sala de aula; quando entrou o professor já estava na sala e ela levou uma bronca.
─ Ei, Iracema, onde você se meteu? – cochichou Daniel assim que a garota sentou ao seu lado.
─ Bom dia, Daniel!
─ Que mal humor, hein? O que foi que EU fiz?
─ Olha, eu não tô de mal humor, só que um mínimo de boa educação não faz mal a ninguém, concorda?
─ Chata!
Na sexta-feira seguinte eles tinham a tarde livre e poderiam sair pra passear; Daniel resolveu convidar Camila pra ir ao cinema. Mas ela saiu bem mais cedo da aula e não se viram durante o almoço. Ele procurou por todos os lugares possíveis que Camila pudesse estar e não a encontrou, nem mesmo no seu habitat natural, a biblioteca. Quando votou ao dormitório encontrou Julia, uma das colegas de quarto de Camila.
─ Ei, você viu a Camila?
─ Ei, eu tenho nome, sabia?
─ Você viu ou não a Camila?
─ Está no quarto, garoto grosso! – Julia saiu com o jeitinho arrebitado.
─ Garotinha metida. – ignorando completamente a regra de que garotos não podiam entrar no dormitório feminino e vice-versa, Daniel subiu as escadas correndo e bateu na porta do quarto de Camila.
─ Quem é? – respondeu a garota com uma voz manhosa.
─ Sou eu.
─ Eu quem?
─ Eu, ora, Daniel.
─ Daniel? Você não pode estar aqui, é proibido!
─ Ora, não seja chata e abra logo essa porta – Camila destrancou a porta e voltou a se enfiar embaixo dos lençóis.
─ O que foi que houve com você? Por que você saiu da aula mais cedo? Por que não foi almoçar?
─ Eu me senti mal e fui pra enfermaria.
─ Mas o QUE você teve? – Camila se escondeu ainda mais sob as cobertas – Camila, qual é o problema?
─ Cólicas menstruais. – disse com a voz abafada pelos lençóis.
─ Ah, ah, então é isso! Mas essa parada é assim tão...? Quer dizer, você não vai ficar doente todos os meses, vai?
─ Não, acho que não.
─ Camila, como é?
─ Como é o que, Daniel?
─ Você sabe, isso, essa coisa, ser menina, botar sangue pra fora todos os meses?
─ Sabia que se existisse um troféu insensibilidade ele seria dado a você, Daniel?
─ O que é que tem? Eu só fiquei curioso e perguntei! Você pode perguntar qualquer coisa também, se quiser.
─ Sabe, não é a coisa mais agradável do mundo, principalmente quando eu fico assim, sabe, com essas cólicas horrorosas.
─ E você fica assim muitas vezes?
─ Mais ou menos.
─ E dói muito?
─ Muito mesmo. – Camila levantou os lençóis da cara e viu a expressão de pena no rosto de Daniel – Viu, eu não exagero quando digo que ser menina é um saco! – disse dando uma tapa no ombro do amigo.
─ Você não quer ir ao cinema?
─ Hoje não, não tenho força pra sair. Você vai sair?
─ Ia, mas eu não quero ir sozinho, sabe?
─ Chama outra pessoa.
─ Quem?
─ Eu não sei, alguém – Daniel deu de ombros – vai passar a sexta livre sozinho no quarto outra vez?
─ Eu pensei em ficar aqui com você. – Daniel riu e Camila concordou balançando a cabeça. Durante a tarde a maior parte dos alunos saíram e os outros estavam estudando e a sala de estar estava livre; quando Camila melhorou ela e Daniel aproveitaram para ver um filme juntos; Daniel foi até o refeitório e conseguiu uns salgadinhos Elma chips e coca-cola.
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