Mente de Coordenadora Pokémon

Episódio 39: Epílogo

O que um ano de jornada faz por uma pessoa? O quanto ela a amadurece e o mais importante o quanto ela a muda? Certamente, não muda mais do que passar um ano inteiro fugindo. Em jornada eu passei medos que eu não esperava e descobri coisas sobre mim mesma que eu nem imaginava, achei uma força dentro de mim que sabia ter e até tive a oportunidade de curar alguns traumas, apesar de ter adquirido outros. Podemos dizer que a jornada fez amadurecer e descobrir uma versão minha que eu ainda não conhecia, mas estava ali.

Agora, fugindo... Eu não passei medo, fiquei apavorada os primeiros dias e depois me acostumei. Não que eu amadureci e encontrei em mim uma porção de coragem ou me senti melhor por estar na companhia da família e melhor amigo, muito pelo contrário, tudo isso só aumentava meu pavor. A verdade é que a vida de fugitiva te obriga a se transformar em outra pessoa, adquirir coragem, forças e outras coisas que normalmente não faria por não ser da sua essência e não estarem dentro de você.

Viver fugindo não me amadureceu para ser uma Mirian Miller mais forte, pois eu como Mirian Miller seria sempre uma menina mediana que teria um potencial artístico grande, com uma visão de mundo excêntrica e procurando sempre estar em sua zona de conforto para não perder o controle das coisas, pois sabe que quando perde o controle ou saí, desespera-se e acaba precisando ser salva. O amadurecimento leva-a, no máximo a salvar-se sozinha, conseguindo ser confiante e calma o suficiente para não desesperar-me mesmo ao sair da sua zona de conforto. Mas, isso não significa que eu deixava de ser mediava. Ainda havia o problema quando tudo saia do controle eu me desesperar. Como quando Alma foi assassinada e usaram minha imagem, ali eu soube que todo o meu crescimento ainda não era o suficiente, afinal eu só sabia chorar.

Mas, a Mirian Miller que surgiu quando comecei a fugir, foi totalmente nova. Não havia nada dentro de mim que indicasse que eu poderia, em algum momento, fazer as coisas que faço hoje.

— Mel? -

A menina parou de mexer no computador salvando rapidamente seus arquivos, antes que a pessoa que se aproximava, chamando-a de Mel, conseguisse ver a o que ela fazia. Olhou por cima do ombro e viu uma mulher de cabelos rosa e avental branco parar próximo a porta da pequena sala onde ela estava. Não fez menção em levantar, apenas deu-lhe atenção, olhando por cima do ombro.

— Terminei a lista do material de hoje. -

Mel levantou-se mexendo rapidamente no computador, limpando do navegador. Vestiu sua jaqueta de couro marrom rapidamente, ajeito seus cabelos castanhos logo após. Conferiu as luvas de suas mãos e passou a mão na cintura conferindo três pokebolas e em seguida algo que parecia cartuchos para armas. Deu alguns passos e pegou o rifle de caça que estava encostado na mesa e pôs a mochila nas costas.

Parou diante a moça de cabelos rosa, uma enfermeira Joy que estava com a lista de material em mãos. Observaram-se durante alguns instantes.

— Não precisa fazer isso. - A enfermeira disse por fim quebrando o silêncio e parecendo desanimada. - Poderia usar o computador do centro para estudar e eu cuidaria dos pokémon de vocês mesmo não estando registrados em nenhuma base oficial. -

A menina sorriu em resposta a fala da enfermeira, pegando a lista de papel que estava em suas mãos e caminhou para fora da saleta em que estava e rumou para fora do Centro Pokémon. Modesto, como toda a cidade, rodeado de uma mata densa, o lugar não era exatamente esquecido por pelas divindades, mas também não podia ser dito observado por elas todos os dias. Um lugar perfeito para a família Miller e Mauricio esconderem-se durante algum tempo.

Aquela cidadezinha era a terceira parada deles na fuga e foi onde Mirian se tornou Mel uma jovem observadora de poucas palavras que vivia de pequenos bicos, especialmente aqueles que podia fazer na mata, lidando com os pokémon selvagens e outras coisas mateiras. No início, nem ela mesma acreditou no que estava fazendo, mas aos poucos foi percebendo que cada um havia adotado um novo modo de atuar e o fazia a cada nova localidade. Para a excentricidade de Mauricio ela estava pronta, o viu sendo Dark Mau que era uma pessoa completamente diferente e assim ele assumindo personalidades e atitudes diferentes a cada cidade que se instalavam durante a fuga, até mesmo mudando o visual, não a assustou, mesmo mudando o jeito de falar. Entendia que seu amigo era um gênio incompreendido e que ela só o entendia algumas vezes.

Agora, não estava preparada para ver a mãe e o irmão fazer o mesmo com tanta velocidade e desenvoltura. Tentou colocar na cabeça que a mãe, de alguma forma, precisou aprender a fazer aquele tipo de mudança. Mas, não conseguia assimilar que todas as trapalhadas com as quais o irmão havia se metido lhe fizeram ser um trapaceador tão bom a ponto de fazer o mesmo que os demais.

Fugir me tornou forte. Aprendi a esconder, enganar, mentir, analisar e quem diria que sei caçar. Não acredito que aprendi mesmo alguma coisa com Aries. Eu não parecia prestar atenção, mas está tudo gravado em minha mente, plantas, como me aproximar dos pokémon, como capturá-los e tantos outros. Não mato, não os prendo em pokebolas, no geral sempre que venho atrás deles é para pegar algo para remédios ou fazê-los se afastar da cidade para pararem de causar dano, mas ainda assim é que difícil imaginar que Mel um dia foi Mirian. E pensar que meu primeiro pokémon caçado foi um Ariados. Eu realmente mudei com a fuga.

Mel estava abaixada com seu rifle de tranquilizantes em meio a mata, mirando um Stantler que aproximava-se de uma arvore de berries. Ela precisava se umas lascas do chifre do pokémon e não tinha ideia ainda se iria se aproximar do pokémon e tentar a sorte em uma conversa, ou iria colocá-lo para dormir e fazer o trabalho e depois ficaria de baba dele até ele recobrar os sentidos.

Um estalo de um galho se quebrando e o pokémon pareceu ficar alerta e correu para o meio da mata deixando Mel com o rosto irritado. Apenas uma pessoa tinha a péssima mania de segui-la enquanto caçava e apenas uma pessoa conseguia fazer aquilo no vilarejo. Virou-se e viu o negro que estava de cabelo raspado e óculos com um sorriso sem graça no rosto.

De todos os disfarces que Mauricio havia escolhido, Milton um jovem abobalhado e que se metia onde não era chamado, era o mais difícil de Mirian lidar, mas ela admitia que era o mais divertido para a cidadezinha, já que não havia quem não curtisse as brincadeiras sem sentido que ele fazia e assim o jovem circulava pela cidade sempre ficando informado de qualquer coisa que estivesse acontecendo sem que ninguém se desse conta que ele estava bisbilhotando.

— Estou atrás dele a três horas. - Disse Mel sem muita paciência começando a se levantar para ir atrás do pokémon. - Espero que seja importante. -

— É a piada do momento. - Milton disse em um tom zombeteiro e de repente ele retirou os óculos e seu sorriso sumiu, fazendo Mel ver o olhar que a um ano não via. - Kenan venceu. -

Mel estancou no seu lugar e sentiu seu coração acelerar. Kenan Kornox era um bicampeão de liga pokémon por quem ela nutria sentimentos, muito bem correspondidos, mas que não ficavam juntos devido ao jovem ter declarado guerra ao Lado Sombrio da Coordenação Pokémon. O mesmo não participou do Concurso de Sucessão devido a eventos da Liga pokémon acontecerem na mesma época e isso o fez alvo dos finalistas que tinham a missão de caçar potenciais ameaças. A última vez que os Millers e Mauricio tiveram uma notícia de Kenan e da competição, Kenan estava preso em um castelo em chamas em uma competição de morte súbita, arriscando a vida em uma apresentação armada.

Mas, naquele dia, em Jotho, havia acontecido o final do Grande Festival de Jotho e por consequência o final do Concurso de Sucessão e por mais que estivessem se escondendo e mantendo as aparências, Wanda Miller jamais deixaria de assistir aquele evento e acabou vendo Kenan triunfar contra o Lado sombrio e o favorito deles.

O rapaz levou a mão ao bolso e pegou o celular e colocou para exibir um vídeo.

“Eu sou Kenan Kornox, Multicampeão da Liga Pokémon e agora Campeão do Grande Festival de Jotho. Talvez possamos acrescentar, devido aos últimos eventos, que todos puderam acompanhar, que mesmo sem participar venci o Concurso de Sucessão.

Eu tenho uma mensagem para todos os coordenadores pokémon do mundo. Não temam as sombras, não temam o Lado Sombrio. Vocês acompanharam neste último ano um grupo patético de pessoas sendo manipuladas por outras ridículas criaturas ocultas nas sombras tentando forçar outros coordenadores a irem aos palcos em desvantagem, arriscando suas vidas, apenas para benefício próprio e ousaram chamaram isso de Concurso de Sucessão. Sobrevivi a isso, mas infelizmente muitos não conseguiram, como minha mãe tempos atrás.

Então... É hora do basta! Eu convido a todos para se juntarem a mim no meu Concurso de Sucessão em cada região do mundo que tenha um Grande Festival! Vamos acabar com a tirania e fazê-los saírem das sombras e nos encararem nos palcos para verem se tem talento de verdade!

Não temam e não se escondam do Lado Sombrio, inscrevam-se para o Concurso de Sucessão de Kelly Kornox da sua Região! Juntos vamos mudar os concursos para ganharem vida novamente!”

A menina ficou parada tentando absorver o que o vídeo havia passado. Kenan não estava se escondendo. Estava lutando e indo para cima das pessoas que estavam ameaçando a ele e o estilo de vida da mãe dele. De fato ele não tinha mais nada a perder e não parecia estar movido apenas por vingança como por diversas vezes chegou a pensar. Por alguns instantes imaginou as pessoas que estariam apoiando-o ele neste protótipo de Concurso de Sucessão Kornox e se deveria voltar para ajudar. Mas, ao final havia uma pergunta que era a certa a se fazer.

— O que significa? - Perguntou a menina sem saber.

O que realmente significava aqueles acontecimentos para ela, sua família e Mauricio? Mudava o perigo? Eles deveriam tomar alguma ação a respeito? Querer era diferente de dever em todo o caso e isto ela sabia e se o amigo havia ido mostrar o vídeo ele já tinha possivelmente a resposta para aquilo. Olhou de forma a buscar a resposta.

O negro apenas sorriu de uma forma indecifrável e voltou a colocar os óculos no rosto e a ter um ar abobado. A resposta de Mirian estava ali, Mauricio voltava a ser Milton. Era apenas para que ela ficasse informada e caso chegasse em casa e percebesse a mãe um pouco mais agitada, sem poder falar do que vira devido a estar na cidade, não ficasse preocupada.

Se Mauricio voltava a ser Milton, Mel deveria continuar sua caçada. Um dia chegaria a hora de voltar para casa e quem sabe até de juntar-se a luta contra o Lado Sombrio. Muitos incidentes como aquele os faria imaginar que seria a hora de largar tudo e voltar correndo para se juntar a luta contra o Lado Sombrio, mas já não era mais a mesma pessoa que saiu de Jotho fugindo com medo para proteger sua família, amigos e a própria pele.

Mel deu alguns passos para frente preparando-se para seguir os rastros do Stantler, abaixou-se junto e examinou os rastros para confirmar o caminho e preparou-se para seguir, quando escutou o negro dizer:

— Gosto desta sua personalidade pokémon. -

Deteve-se por alguns instantes olhando a mata a sua frente. Sorriu para ela mesma sem olhar para o amigo disfarçado a quem temeu não reconhecer o olhar devido ao ar abobado que ele poderia estar mantendo.

Eu também gosto Mauricio! Eu também gosto! Respondeu ela em pensamentos seguindo para o meio da mata.