A janela escrita por Fibe


Capítulo 1
Quando uma janela não é uma janela?


Notas iniciais do capítulo

É o primeiro desafio que participo e, honestamente, espero que esteja nos conformes. Também espero que você, Saulo, e todas as pessoas que venham ler, tenham gostado um pouquinho só, não precisa ser muito.



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CAPÍTULO ÚNICO: QUANDO UMA JANELA NÃO É UMA JANELA?

 

Girei a bicicleta em três curvas esquerdas diferentes até que segui pela reta, descendo a ladeira que me deixaria de frente para a casa de minha avó e senti, naquele momento, a brisa batendo no meu rosto, acariciando minhas bochechas como a mão de uma mãe amorosa e apaixonada pelos filhos.

Quando pulei por causa do quebra mola, virei à direita no fim daquela ladeira e segui reto toda vida, entrando na estrada arenosa e guiando-me por ela, reto durante toda a minha vida, até que vislumbrei aquela enorme casa de madeira antiga e modesta da minha vó; era grande, dois andares, ainda dos belos anos oitenta, setenta também, feita de madeira velha por fora e o interior reforçado com pisos, ainda em obra.

Minha mãe morou lá a vida inteira com seus irmãos, mas agora era somente eu e vovó, com direito à visitas de tios durante os finais de semana, festividades ou emergências.

Não os culpo, se eu não fosse criado desde sempre em Sapé, interior da Paraíba, também não iria querer voltar, não quando o Rio de Janeiro parece mais acolhedor, ou quando a capital do meu estado, João Pessoa, é muito mais movimentada do que seu interior.

A única coisa que, de fato, serve de diversão para nosso povo é a pracinha que festeja durante as noites, cheia de barracas, brinquedos para crianças. Uma maneira de ganhar a vida, mas ainda cara o suficiente para que alguém modesto como eu pudesse se esbanjar quando queria, todos os dias, sem hora para terminar.

Às vezes, minha avó liberava um dinheirinho quando sua aposentadoria saia, outras vezes não tinha choro ou vela, somente aceitava o que me era imposto. Dado.

A vida no interior não era fácil, de fato, principalmente quando se tinha um total de zero experiências em muita coisa e ninguém, num tempo de crise, queria te contratar.

Quando chego em frente à casa, estaciono minha bicicleta bem na varandinha, precisando subir alguns degraus de madeira antes de finalmente estar lá e, então, adentro na casa com sua sala vazia e bato com o traseiro na porta, encostando-a sem me dar ao luxo de usar as mãos.

‘’Cheguei, dona Maria!’’ Grito para que minha vó saiba que estou de volta e vou em direção à cozinha, desejando um copo d’água.

Encontro-a lá, sentada na mesa de madeira com oito lugares que outrora fora feita pelo meu avô, quando ainda iam casar segundo ela, e vou em sua direção, dando um beijo em sua testa bem estalado.

‘’O que a senhora está fazendo, vó?’’ Pergunto apenas para irritá-la.

‘’Catando feijão, Saulo, tá cego, menino?’’ Resmunga alto e eu solto uma gargalhada, seguindo para a geladeira e retirando uma garrafa d’água, enfiando um pouco no copo e bebendo tudo de uma vez.

‘’Ué, mas a senhora sempre dorme nessa hora.’’ Rebato sabendo que mesmo sendo sete horas, pessoas do interior tinham mania de dormir cedo, principalmente pessoas mais velhas como ela.

‘’Menino, você por acaso vai catar o feijão para eu cozinhar amanhã? Não, não vai, seu preguiçoso. Aquieta o faixo.’’ Manda e eu, prontamente, dou-lhe as costas sabendo que está mesmo certa.

Feijão eu não cataria, ainda não sabia diferenciar os podres dos danificados na hora do colhimento.

‘’Tá bom, véia. Vou tomar banho que to, ó, suadão e vou pra cama.’’ Aviso e paro no batente da porta. ‘’Ou, vó, Jão me chamou amanhã para jogar bola, posso?’’ Questiono pondo em prática uma das normas importantes da vida: não importa quantos anos tenha, sua figura materna sempre terá controle sobre você enquanto viver na casa dela.

‘’Pode sim, fio, mas ó, tome café antes de ir porque não quero você desmaiando de fome por ai, já basta ser quase anêmico de tão branco, e ó, volte para o almoço.’’

Aceno com a cabeça para ela e, então, finalmente sigo para o banho.

Lá dentro, a água é extremamente gelada, boa o suficiente para limpar a alma e todo o suor que está impregnado nos meus fios escuros, e quando finalizo meu banho, visto a roupa de dormir que não passa de um short, sigo para o quarto.

Ele fica no fundo da casa, sendo necessário que eu atravesse o quintal onde os cachorros se encontram e, então, abra uma portinha de lataria e, finalmente, estou lá. Meu lugarzinho é simples, modesto demais; tem somente uma cama de solteiro na lateral da parede, uma luz no centro do quarto, alguns posteres, minha cômoda, uma tábua de passar roupa cheia de roupa que não tomei coragem para cuidar ainda e, mais uma vez, minha cama.

Minha preciosa cama.

Jogo-me nela com a luz apagada e enrolo um pouco até dormir.

Parece que tive somente meia hora de sono quando meus olhos se abrem devido ao frio extremo que está no meu quarto e olho rapidamente para a esquerda da cama, encontrando uma janela aberta ali. 

Um pouco confuso, deslizo o lençol para baixo e caminho até a janela, parando de frente para ela e percebendo, no fim, que o meu quarto não tinha nada disso. Meio que ainda congelado em meu lugar, deixo minha mão esquerda trabalhar para fechá-la e quando os vidros transparentes estão bem lacrados naquela janela feita de madeira, relaxo.

Continuo encarando-a e me pergunto quando minha avó colocou-a ali. Pelo o que eu me lembro, nunca me fora dito nada e mesmo se tivesse sido, há grandes possibilidades de eu ter esquecido.

Dou de ombros.

Ameaço voltar para a cama quando escuto a chuva aumentar e, junto dela, algo é lançado contra a minha janela. O barulho é pouco, meio baixo, mas ainda escuto pela proximidade. Giro meu pescoço e grudo o rosto no vidro da janela, buscando ver alguma coisa.

O nada parece uma boa paisagem, ou só combina com muita chuva.

''É coisa da sua cabeça, Saulo.'' Digo a mim mesmo quando estou muito confiante de que rezar é o melhor a ser feito.

''Ou talvez não seja.'' Uma voz miúda ecoa por todo o meu quarto e ao buscar o dono da voz, encontro uma silhueta encapuzada bem na frente da minha janela.

Automaticamente, dou dois passos para trás e olho para os lados buscando algum objeto para me defender, ou calculando a distância até a porta. 

Não é nada demais e estou protegido, é o que tento dizer ao meu corpo.

''Você não está protegido.'' A mesma voz insiste e eu volto a encarar a janela.''Responda-me algo e, então, lhe direi se está ou não protegido.''

Minha cabeça se move negativamente, mas minha boca parece ter vida própria.

''Que tipo de pergunta?''

A pessoa encapuzada bate três vezes no vidro da janela e se distanciando, escuto sua voz mais uma vez.

''Quando uma janela não é uma janela?''

Por alguns segundos, tentei pensar numa resposta que parecesse plausível e digna daquela pergunta. Contudo, minha mente, apesar de inteligente, era incapaz de fazê-lo.

''Eu não sei.'' É o que digo.

''Quando uma janela não é uma janela?''

''Não sei.'' Insisto levemente amedrontado com um trovão que é explodido no céu.

''Quando uma janela não é uma janela?'' A voz é mais alta dessa vez, precisa e um pouco enraivecida. Meu corpo parece congelar no lugar, não quer mais se mover. ''Quando ela não existe.''

 





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