G a r d e n escrita por Brave


Capítulo 1
black hole.




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Era difícil esconder minha vontade de admira-lo. Meus olhos caiam de segundos em segundos no rapaz. Ele, é claro, estava mais interessado em seu cigarro. Ele era tão viciado em nicotina quanto eu era nele. Quando não estava o encarando, prestava atenção em meus pés, esforçando-me para não pisar nos cadarços desamarrados ou não os enroscar em algum buraco do asfalto. O caminho que percorríamos, apesar de já muito conhecido, se tornava levemente mais perigoso depois de alguns goles.

Não precisei levantar os olhos para saber aonde estávamos passando. A mão direita subiu automaticamente até o meio de minha testa, escorregou até o umbigo, voltou ao ombro esquerdo e deslizou ao direito, antes de finalizar com os dedos nos lábios. Um sinal de respeito para uns, uma mania para outros, algo natural para mim.

— Pra quem você reza? – A voz rouca e arrastada me fez levantar a cabeça de novo.

— Deus. – Dei os ombros. Não era uma resposta tão óbvia. – E você?

— Já tentei fazer isso. Por doze anos. Não consigo. – Ele andava de costas, de modo que pudesse me ver. – Alguém te responde?

Dou os ombros outra vez, sem uma resposta.

Ele desacelera os passos até que alcançamos a mesma distância. Nossos narizes se tocam e se acariciam, enquanto fechamos os olhos nas proximidades um do outro.

— Depois vocês fazem isso, continuem andando. – Trocamos risadas enquanto ele aceita a garrafa de conhaque do amigo, se afastando de mim e retomando o trajeto. Dividimos a bebida, ou o que ainda restava dela, engolindo tanto o álcool quanto nossos desejos.

Algum de nossos companheiros afirma já estarmos num bom lugar. Rodeados de plantas e com alguns bancos e árvores em direções estratégicas, escondendo a visão da rua. Apressei-me para pegar logo o melhor lugar, em cima da mesa, virando a garrafa na boca assim que sentei. Já sem desculpas, ele se ajeita entre minhas pernas, encaixando-se em mim da maneira que lhe é permitida. Suas mãos alternam entre passear pelo meu quadril e meu rosto.

— Seu cabelo ficou maneiro curto assim. – Seus dedos se enroscaram nos cachos ruivos que estavam caindo em meu rosto. – Desculpa não te dizer essas coisas quando tô sóbrio. – Contento-me em rir de seus comentários, sem dar muita atenção ao seu papo boêmio, mesmo sabendo que cada palavra ficaria gravada em minha mente, mesmo contra a minha vontade. – Quer ficar por aqui mesmo?

— Tanto faz. – Eu tenho você, é o que importa. É o que realmente queria dizer, mas a frase morreu em meus lábios, sufocada pelos dele.

Nosso contato não parecia o bastante, continuamos nos pressionando, enroscando-nos nos corpos um do outro em meio ao beijo que parecia infinito. Mas não era. Risos.

Quando ele se afastou, o ventou tocou os lugares antes tocados por ele como uma faca.

Por outro lado, enquanto nos distanciávamos por um outro lado, nos aproximávamos em outro. Minha pele exposta parecia atraí-lo feito um imã, ignorando os machucados pelas minhas pernas, ele se deleitou em massageá-la e aprecia-la de seu próprio jeito extremamente tátil. Os roxos em contraste à cútis pálida de destacavam na luz do luar, pareciam tê-lo impressionado tanto que resolveu deixar marcas parecidas por meu pescoço.

Piscava, mas o mundo girava ao meu redor, o sorriso em meu rosto não era meu e o controle das minhas mãos tinha se perdido. Momentos em branco. Momentos em preto.

 – Alcança o isqueiro pra mim. – Sussurrou contra meu ouvido.

— Achei que tinha parado. – Estico-me para pegar o objeto verde fluorescente e passar para ele.

— Eu tentei. Parece que eu não consigo. – Virou-se para o lado para acender o novo cigarro de maneira respeitosa.

Não me importava com a fumaça dele, na verdade. Era como se parte do rapaz se desfizesse no ar e eu pudesse inalá-la, fazendo-o então, parte de mim. Enquanto ele se ocupava de seu vício, inclinei a cabeça para trás, já relativamente tonta. Me perdi em uma conversa ou duas, sem conseguir me concentrar realmente em ninguém. Outros amigos haviam se juntados a nós, eu só queria que todos fossem embora.

— Olha o que eu tenho. – A voz dele no meio de uma risada contra o meu ouvido me fez sorrir outra vez e me virar para ele, se afastou e mostrou a garrafa roxa com detalhes verdes com um olhar distante e um sorriso vago. – Seu vinho favorito, agora vai ter que ficar mais tempo até isso aqui acabar.

Tirei o vidro de suas mãos e o coloquei em um lugar seguro, puxando-o pelo casaco. Olhar para ele me incomodava, mesmo sendo uma obra de arte. Cada traço de seu rosto denunciava sua falta de controle mental. Ele estava distante, mesmo estando em meus braços. A primeira noite em que eu verdadeiramente o tive, também foi a última.

Nós encontramos depois de três semanas. Você não me queria, mas não foi o suficiente para me negar. Dizem que os romances de verão são os melhores, deve ser por isso que tivemos esse momento vinte dias antes no início do verão de 2016.

Você receou o primeiro beijo, abri mão. Você veio até mim, virei o rosto. Não o queria por pena. Você deu os ombros e se afastou. Eu engoli o orgulho e fui até você. Ficou comigo o resto da noite. E então foi embora.

Essa foi nossa breve história de amor que de amor não teve nada. Não sei por que achei que fosse digno de se tornar palavras tangíveis no papel. Mas quantas pessoas podem dizer que serviram de inspiração para alguém? Quantas pessoas já escreveram sobe você? Quantas pessoas escreveriam sobre você? Bom, eu escrevi. Espero que se lembre disso da próxima vez que nos encontrarmos numa festa e você fugir de mim, envergonhado, para poder ficar com ela.


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Notas finais do capítulo

oioioi, tudo bom? então, é a primeira vez que eu posto algo do tipo, então uma espécie de retorno seria ótima, nem que seja uma "que merda" ou então "legal" só isso beijinhos



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