Quadrilha escrita por Vatrushka


Capítulo 2
Que amava Raimundo que amava Maria




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Um dos maiores incômodos de Teresa em seu casamento, acreditava ela, era o fato de ser mais nova. Idade era algo faceiro, sabe. De certa forma, justificava que ela fosse muitas vezes ser infantilizada ou subestimada por seu marido. Ele não fazia isso por mal, não. Com o tempo, foi descobrindo que ela não era a única tratada assim por ele.

Raimundo havia sido convocado, junto com toda a força local, para uma operação no município vizinho. Outro conflito de indígenas com fazendeiros, diziam. Tendiam a ficar cada vez mais violentos.

Antes de sair de casa, Teresa envolveu Raimundo em um abraço demorado. “Pelo amor de Deus, homem, tome cuidado.” Raimundo sorriu, acariciando sua mão. “É o meu trabalho, mulher.”

Ela afundou o rosto em suas costas. “Eu te amo.”

Raimundo respirou fundo. Alguns minutos se passaram, os dois ali, na mesma pose. “É hora, Teresa. Não pode se preocupar assim toda vez que eu saio.”

“Me obrigue, homem.” Ela riu, finalmente deixando-o ir.

Ela esperou a porta se fechar para então chorar. Não faria isto na sua frente. Não queria aparentar ser ainda mais fraca para seu marido.

Estava se achando ridícula. Não devia estar assim, tudo iria ficar bem! Ele voltaria, teria seu marido de volta. Talvez ele estivesse certo, afinal. Era imatura demais para controlar suas emoções.

 

Raimundo, obviamente, passaria na casa de Maria antes de partir. Foi recebido com olhos arregalados.

“Raimundo, francamente! Você sabe o que fez ao meu filho, não pode vir aqui em casa assim!” Retrucou Maria, impedindo o militar de entrar.

Ele lembrou-se do rapaz. Sim, João, filho de Maria, que estava apaixonado por sua mulher e despejava suas frustrações em versos para quem quisesse ouvir. “Porquê, o rapaz por o acaso está aí agora?”

“Para a sua sorte, não.” Ela acabou cedendo, abrindo a porta para que entrasse. Ele se acomodou no sofá. “João está impossível, ultimamente. E não tiro a razão dele. Não conversa comigo porque não aceita que eu ainda seja amiga sua. Honestamente, eu mesma começo a me perguntar o mesmo.”

“O que queria que eu fizesse, Maria?! Eu devo a minha vida à família de Teresa, e estavam precisando de mim! Ela é uma boa menina, sim. Me faz muito feliz. Mas você sempre soube que era para você ser a minha noiva! Se ao menos quisesse se casar comigo, Maria, não teria um filho sofrendo agora…”

Maria revirou os olhos e se virou para a parede. “Ora! Mais isso agora...!”

Raimundo se levantou e foi em sua direção. “Eu vou, Maria… E honestamente, não sei se volto.”

Maria cruzou os braços. Sim, sabia desse risco. A cidade inteira sabia.

“Maria… Eu te amo, Maria. Por favor, despede de mim.”

Ela murchou os ombros. Era seu amigo de anos, afinal de contas. Abraçou-o, e ele retribuiu provavelmente com a mesma intensidade que Teresa tivera mais cedo.

 

 

A notícia da morte de Raimundo chegou após dois dias.

Todos estavam em seu velório. Teresa chorava tanto pela perda de Raimundo quanto por seus próprios pensamentos. Sua família parecia estar escondendo - até de si mesma - uma satisfação egoísta. Teriam a herança, estavam salvos. Ela poderia se casar de novo!

A garota enojava-se com a ideia. Com o pouco tempo que tivera junto de seu marido, fora feliz.

Maria passava por um dilema parecido. Recusara uma oportunidade de ouro ao não querer se casar com Raimundo, sabia disso. Era um amigo, gostava dela, cuidaria dela. A ideia fixa e idealizada que tinha de casamento, entretanto, não a permitiu se relacionar com quem realmente não amava. Não fora assim só com Raimundo, mas com vários pretendentes que haviam lhe aparecido ao longo da vida. “Solteirona por opção.” Era como a cidade lhe descrevia.

Discordava, logicamente. Por opção? Jamais. Todos os seus filhos foram tentativas seguidas de prender a atenção de quem acreditava ser o verdadeiro amor de sua vida: Joaquim.


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