Claire's Anatomy escrita por Clara Gomes


Capítulo 23
Capítulo 22 – The Scientist.


Notas iniciais do capítulo

E aí, gente? Como sempre, depois de um tempo de sumiço, eu voltei! Estou meio que tentando postar a cada 1 mês, então aqui estou eu. Mais uma vez peço perdão, é que agora, mais do que nunca, estou com a cabeça cheia, afinal já foi o primeiro dia do Enem (a propósito, creio que fui muito mal na redação! Que tema complicado!), mas ainda tem o segundo dia e minha tão esperada FUVEST, então sejam pacientes comigo. Prometo aparecer com mais frequência depois que tudo isso acabar!
Abaixa que esse capítulo é tiro! Preparem os corações, pois aí vem problema! Só pelo título, creio que já deu pra sentir o drama (se vocês conhecem a música).
Falando do título, é um dos meus hinos da bad. Essa música é um espetáculo de maravilhosa, então quem nunca ouviu, por favor, ouça! O nome em si pode não fazer muito sentido, mas a letra combina bem com o capítulo. Link: https://www.youtube.com/watch?v=RB-RcX5DS5A
Então, vamos logo para o capítulo. Espero que gostem das tretas. Boa leitura!



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Orgulho. Às vezes, preferimos a morte do que deixa-lo de lado. Algumas coisas, por mais pequenas que sejam, acabam ferindo-o, e ficamos na defensiva. Ele pode ser necessário algumas vezes, mas também é extremamente nocivo. Por causa dele, relacionamentos podem ser destruídos e pessoas podem ser perdidas. E, do outro lado da moeda, vem o arrependimento.

Batia a caneta sobre o balcão das enfermeiras, extremamente entediada. O relógio marcava 5:00 da manhã, e eu contava os segundos para aquele plantão acabar. Meus olhos intercalavam entre o relógio na parede e a entrada das ambulâncias, ansiando que alguma coisa, mesmo que pequena, acontecesse.

Suspirei e encostei a cabeça sobre o balcão, ameaçando tirar um cochilo. No entanto, com o tanto de coisas que estavam em minha cabeça, não conseguiria dormir tão cedo. Havia um nome que não deixava minha mente em nenhum segundo: Ronan. Eu estava evitando-o desde o dia do quase beijo, e já tivera que ouvir vários sermões de Rebecca, dizendo de quantas maneiras aquilo era errado, e que eu tinha que me afastar. E era aquilo que eu estava fazendo, e ele parecia estar colaborando. Ele me bipava muito raramente, e eu parei de aparecer em seu quarto por livre e espontânea vontade. Mas meu cérebro compensava as horas que eu passava fisicamente longe dele.

De repente, o som de uma sirene fez-me erguer minha cabeça rapidamente, sentindo que algo de interessante estava chegando. Virei-me bruscamente, e pude avistar uma ambulância se aproximando da porta. Owen Hunt e eu corremos até ela, e os paramédicos já tiravam a maca de dentro do veículo.

— O que temos aqui? – perguntou o ruivo, analisando a paciente.

— Gale Cooper, 53, está consciente. Ela está internada em uma clínica para pessoas que sofrem de Alzheimer, e as enfermeiras perceberam sinais de AVC. – explicou o paramédico, e eu arregalei os olhos ao reconhecer a mulher.

— Ela é a mãe da Rebecca. – afirmei, olhando para Owen, preocupada. O homem devolveu-me o mesmo olhar e suspirou.

— Eu estou bem... Não precisa de tudo isso. – disse a paciente, enquanto caminhávamos com ela para dentro do hospital.

— Como ela está hoje? – questionei a uma enfermeira que acompanhou-a na ambulância.

— Acredite ou não, mas ela está bem. – assentiu.

— Leve-a para o Trauma 4, faça um check-up completo e peça uma Ressonância Magnética. – ordenou Hunt, e eu acompanhei-a até a sala indicada pelo médico.

— Sra. Cooper, eu sou a Claire, amiga da sua filha. Eu estou aqui para ajudá-la hoje. – falei simpaticamente, pisando em ovos.

— Eu sei quem você é. – rebateu – Você é a amiga da Elizabeth.

— Do que mais a senhora lembra? – indaguei, franzindo o cenho. Ela estava diferente dos outros dias que eu a encontrara.

— Eu lembro de tudo. Estamos em Seattle, procurando um tratamento para minha doença. Mas pelo o que parece, eles acabaram me internando, não é? – respondeu, e eu tentei esconder a surpresa, inutilmente.

— Isso quer dizer que... A senhora está lúcida hoje? – ergui as sobrancelhas, incrédula.

— Estou. – disse com certeza na voz, e eu engoli em seco. Não sabia exatamente se aquilo era uma boa coisa ou ruim.

— Pelo seu prontuário, você teve um AVC leve, mas teremos que fazer alguns exames da mesma forma. Eu vou pedir paras as enfermeiras levarem-na, e vou entrar em contato com seu marido e sua filha. – afirmei, fingindo não estar quase explodindo.

— Não quero ver Elizabeth. Ligue apenas para Anthony. – retrucou, e eu arregalei os olhos, sem graça.

— Ela realmente iria querer saber que... – comecei a falar, mas a mesma cortou-me.

— Você é minha médica, e faz o que eu quero. E eu exijo que você não avise-a. Faça seu trabalho, e não questione minhas decisões. – revidou, deixando-me ainda mais sem jeito.

— Tudo bem, desculpe-me, Sra. Cooper. Vou deixa-la, agora. – concordei com a cabeça educadamente e saí da sala apressadamente à procura de Owen – Ela está lúcida. – afirmei ao encontra-lo, e o mesmo pareceu chocado.

— Você tem certeza? – ergueu uma sobrancelha.

— É o que ela alega, mas creio que devemos chamar o psiquiatra dela. – falei, um pouco incerta.

— Eu vou conversar com a enfermeira dela, enquanto isso avise seu marido e Rebecca. – disse o cirurgião, começando a caminhar de volta para os arredores do quarto.

— Ela não quer que avisemos Rebecca. – suspirei, e ele virou-se e ergueu ainda mais as sobrancelhas.

— Você estava entediada? Aguenta essa agora. – o homem disse, e foi até a enfermeira da mulher.

Aproximei-me do balcão, pedi os exames e peguei o telefone, discando o número do pai de Rebecca. Ao dar a notícia, o homem pareceu extremamente surpreso, e alegou que ia correndo para o hospital.

Ouvi meu bipe disparar, e vi que era Owen me chamando na Ressonância Magnética. Segui para a sala, onde encontrei o ruivo observando algumas imagens do cérebro da paciente.

— O que temos? – perguntei, parando ao lado dele.

— O que você vê? – indagou, apontando para a tela.

— Na minha opinião, não parece muito sério. Definitivamente é um AVC isquêmico, então alguns remédios e observação já ajudarão. – respondi, analisando o exame. Tentei parecer confiante, mas devido a tudo que acontecera comigo, ainda estava insegura.

— Certo, na minha também. Mas ainda acho melhor consultar com um neuro, então bipe o que estiver de plantão. – disse Hunt, e eu assenti, já fazendo o que ele mandou – Eles chamaram o psiquiatra dela para confirmar a lucidez. – quebrou o silêncio que se formara enquanto esperávamos – Ela e Rebecca não se dão bem, não é?

— Não... É complicado. – respondi, respirando fundo.

— Eu entendo. – concordou com a cabeça, e ficamos quietos novamente.

— O que está acontecendo aqui? – indagou Derek, adentrando a sala já observando as imagens.

— Qual a sua opinião? – perguntou o ruivo – Deu entrada com sinais de AVC leve.

— Mantenha-a sob observação e dê Cebralat. Parece leve, mas pode ser um aviso para algo muito pior, então é melhor ficarmos de olho. – afirmou o neurocirurgião, pegando um bloco de receitas e escrevendo alguma coisa nele, entregando uma folha a mim logo em seguida.

— Okay, muito obrigado, Dr. Shepherd. – agradeceu Owen.

— É só isso por aqui? – questionou, intercalando olhares entre o outro médico e eu.

— Por enquanto sim. – o traumatologista deu de ombros.

— Muito bem, qualquer coisa, me bipem. Se me dão licença... – falou e saiu da sala, deixando-nos sozinhos novamente.

— Levem-na a um quarto e administrem o Cebralat como o Dr. Shepherd prescreveu. O psiquiatra dela deve chegar a qualquer momento, então deixem tudo pronto para ele. – instruiu à equipe de enfermeiros – Claire, acompanhe-os e fique de olho nela. Ela é sua paciente hoje. – virou-se para mim – Agora, eu tenho que voltar à Emergência. Qualquer coisa fora do normal, pode me bipar ou o Shepherd. – finalizou e deixou o local.

— Okay pessoal, vamos nos mexer. – afirmei, e nos deslocamos até um quarto vazio. Fiquei preenchendo o prontuário do lado de fora enquanto a equipe instalava-a.

— Bom dia, eu sou o Dr. Mora, o psiquiatra da Sra. Cooper. Chamaram-me para um consulta, será que vocês podem me informar em qual quarto ela está? – disse um homem, com aparência latina, à uma das enfermeiras do balcão.

— Olá. – virei-me para ele – Eu sou a médica da Sra. Cooper.

— Ótimo! Dr. Mora. – estendeu a mão para me cumprimentar.

— Dra. Scofield. – apresentei-me e apertei sua mão – Eu o levarei ao quarto dela. – continuei, e segui com ele até a porta do cômodo, onde os enfermeiros acabavam de acomodá-la – Oi de novo, Sra. Cooper. Você reconhece esse homem? – apontei para o médico ao meu lado.

— É claro, ele é meu psiquiatra. Bom dia, Dr. Mora. – respondeu, impressionando-me.

— Bom dia, Sra. Cooper. Parece muito bem hoje, mas preciso dar uma checada para termos certeza de que você está 100% lúcida. – explicou, educadamente – Se vocês puderem deixar-nos sozinhos... – pediu a todos que estavam lá dentro, e assentimos.

— Qualquer coisa, eu estarei logo ali fora. – afirmei antes de deixar o quarto.

Fiquei andando de um lado para o outro pelo corredor, com medo de qual seria o diagnóstico do psiquiatra. Aquilo poderia ser bom e ruim, pois ela parecia não querer ver Rebecca nem pintada de ouro, mas minha amiga com certeza iria confrontá-la assim que ficasse sabendo de sua presença no hospital. E aquele confronto me assustava. Todo o momento fofo que elas haviam tido no mês anterior, seria perdido naquele dia.

— Acabei aqui. – disse o psiquiatra, juntando-se a mim.

— E então, qual é seu diagnóstico? – questionei, mordendo-me de curiosidade.

— Ela está definitivamente lúcida. – afirmou, sorrindo fraco – Mas essa doença é muito imprevisível, então não sabemos até quando ela ficará assim. O aconselhável é chamar todos os mais próximos, e resolver todas as pendências.

— E quanto à filha dela? Ela disse que não quer que eu avise-a, mas o certo não é fazer isso? – indaguei, sentindo-me na obrigação de contar a minha amiga que sua mãe estava ali, e bem.

— Eu aconselharia uma abordagem mais calma, convencê-la aos poucos a receber a garota. As duas têm um passado complicado, e um reencontro abrupto poderia ter consequências catastróficas para ambas. – explicou, e eu assenti.

— Você está certo... Eu vou tentar convencê-la. Muito obrigada, doutor. – sorri educadamente, e ameacei entrar no quarto.

— Qualquer mudança no humor dela, liguem-me. Eu estarei à disposição o dia todo. – ofereceu-se, e eu apenas concordei com a cabeça, e entrei no cômodo.

— Agora que vocês têm certeza da minha lucidez, e aproveitando que estamos sozinhas, eu tenho uma exigência a fazer. – disse a mulher, ao me ver.

— É... claro. – gaguejei, amedrontada do que viria.

— Eu quero assinar uma Ordem de Não Reanimar. – afirmou, com convicção na voz.

Fiquei em silêncio por um momento, tentando digerir o que ela acabara de me pedir. Estava incrédula e extremamente chocada, sem saber muito bem o que fazer. Aquilo simplesmente não poderia estar acontecendo, justo comigo.

— Não... – murmurei, rindo fraco de nervoso – A senhora tem certeza? – questionei, negando com a cabeça.

— É claro que tenho. – retrucou, com ainda mais certeza – Meu marido tem gasto muito dinheiro e tempo comigo, e eu estou em uma situação deplorável. Eu não quero mais viver nessas condições. Então se alguma coisa acontecer comigo, eu não quero medidas extraordinárias. Anthony já sofreu o suficiente, está na hora de ele seguir em frente e voltar para casa. – explicou, fazendo meu coração apertar – E eu exijo sigilo. Eu conheço meus direitos e suas obrigações como médica, e você não pode quebrar o sigilo médico-paciente. Ninguém além do necessário pode saber. – finalizou, cada vez mais deixando-me sem ação.

— Mas... Sra. Cooper, eu acho que você está sendo precipitada... – tentei convencê-la, mas fui interrompida por uma voz feminina, adentrando o quarto rapidamente.

— Como minha mãe dá entrada no hospital e ninguém me avisa?! – berrou Rebecca, parando ao meu lado.

— Filha, por favor... – pediu seu pai, entrando logo atrás.

— Por favor?! Eu é que peço por favor! – rebateu – Eu estou chegando no meu trabalho normalmente, quando de repente encontro meu pai no estacionamento, e só ele me conta que minha mãe está internada porque teve nada mais nada menos que um AVC. E, ainda por cima, você é a médica, Claire! – apontou o dedo em minha cara, possessa de raiva.

— Eu pedi a ela para não ligar, e eu tinha razão em minha decisão. – falou Gale, olhando para sua filha de braços cruzados – Bom dia, Elizabeth. Esses não foram os modos que eu te ensinei.

— O que? – franziu o cenho, fechando mais a cara.

— O psiquiatra dela esteve aqui. Ela está lúcida hoje. – afirmei, tentando amortecer o impacto dessa informação.

— Oh meu Deus... – sussurrou Anthony, surpreso.

— Então você se lembra de tudo? – Rebecca riu fraco, provavelmente de nervoso – Inclusive de nosso pequeno reencontro mês passado?

— É isso que significa estar lúcida, Elizabeth. – rebateu a mulher.

— E você ainda me vê como uma lésbica nojenta? – questionou a morena, negando levemente com a cabeça.

— Olha, Elizabeth... – começou a Sra. Cooper, tomando postura – Eu nunca, nem viva, nem morta, nem delirando ou lúcida, vou concordar com sua postura sexual pecaminosa. Para mim, é inaceitável que uma mulher saia com outras mulheres como se fossem homens. É pecado de morte. No entanto, não posso negar que eu admiro onde você chegou, mesmo tendo estragado todo o apoio que seu pai e eu iríamos te dar. Você se mudou de país e se tornou uma médica, tudo sozinha. Isso é notável, e você seria uma pessoa brilhante, se não fosse seu estilo de vida. – explicou, deixando todos nós perplexos.

— Você sequer me ama? – indagou Rebecca, aparentemente inconformada com o discurso de sua mãe.

— Uma mãe nunca deixa completamente de amar sua filha. Admito que me orgulho de você, Elizabeth. – afirmou, e sua filha deu uma risada forçada.

— Sinto muito, mas isso não é suficiente para mim. – Cooper balançou a cabeça negativamente, deixando a sala rapidamente.

— Rebecca... – tentei chama-la, mas fui ignorada.

— Deixa que eu vou. – disse o homem, e seguiu o mesmo caminho que sua filha.

— Providencie os papéis que eu te pedi. – ordenou, e eu suspirei, convencendo-me de que talvez a melhor coisa era deixa-la ir mesmo.

— Em um minuto. – fui até a porta e chamei uma enfermeira com a mão, que veio curiosa até mim – Traga uma ONR. – cochichei, na tentativa de manter o segredo. A moça olhou-me espantada, mas concordou com a cabeça e deu as costas, indo até o balcão – Sabe, a Rebecca, ou Elizabeth, realmente quer a aceitação da mãe dela... Quem sabe você possa no mínimo fazer isso, antes que alguma coisa aconteça e nós não possamos salvá-la, o que acha? – sugeri, com uma pitada de ironia na voz.

— Eu não vou deixar minhas crenças de lado pouco antes de morrer, apenas para massagear o ego de uma garotinha pirracenta. – retrucou, deixando-me ainda mais irritada.

— Essa “garotinha pirracenta” é sua filha, que esperou a vida toda apenas para ouvir um “eu te amo” ou um “eu te aceito do jeito que você é” da própria mãe. Mas talvez ela não precise disso, Rebecca é uma pessoa incrível, você aceitando-a ou não. Isso não vai mudar. – dei de ombros, sorrindo sarcasticamente. Ficamos um instante em silêncio, até que a mesma enfermeira de antes veio entregar-me a papelada – Obrigada. – agradeci a ela e voltei para dentro do quarto, pousando a ordem sobre a mesinha móvel. Tirei a caneta que ficava presa no bolso do meu jaleco e coloquei-a ao lado da folha, cruzando os braços enquanto aguardava a assinatura da mulher – Assine nos “x”, por favor.

Gale pegou a caneta e assinou em todos os locais indicados, sem ao menos ler o que estava escrito. Ao terminar, pousou a caneta onde estava antes de olhou-me com uma expressão séria. Ela não parecia demonstrar arrependimento de nada, o que estava me deixando ainda mais irritada. Peguei as coisas de cima da mesa e anexei a seu prontuário, assinando nos locais destinados ao médico do caso.

— Estamos terminadas aqui. Qualquer coisa que precisar, me bipe. Passar bem. – falei, antes de deixar a sala. Ordenei à mesma enfermeira que colocasse uma pulseira que sinalizava “paciente sob ONR” na mulher, e segui pelo corredor, sem ter exatamente um rumo.

—-

Sentei-me em uma das cadeiras vazias e coloquei minha bandeja sobre a mesa, juntando-me a Anastasia e Diego, que olharam-me curiosos. Ajeitei-me no assento e peguei meus talheres em silêncio, sentindo os olhares sobre mim.

— O que? – indaguei, irritada.

— É mesmo verdade que você é a médica da mãe da Rebecca, que está lúcida? – questionou a loira, parecendo inconformada.

— E que ela pediu para não avisarem Cooper, mas ela invadiu o quarto puta da vida? – complementou o rapaz, e eu revirei os olhos.

— É verdade. – suspirei.

— O que tem de errado com aquelas duas? – perguntou Lewis, com uma pitada de ironia.

— É que algumas pessoas não cresceram com a família perfeita igual nós duas, Anastasia. – retruquei, respirando fundo para não me exaltar ainda mais.

— Só se for você que teve a família perfeita, a minha passa longe disso. – a jovem rebateu, aparentemente ficando na defensiva.

— Eu sei que seu dia está sendo um tanto quanto... intenso, Claire. Sua irritação é compreensível. – Gomes cortou-nos, provavelmente tentando evitar uma briga – Você viu a Rebecca mais alguma vez, depois de ela invadir o quarto?

— Não... Eu passei metade da manhã atrás dela, mas nada de encontrá-la... Acho que ela precisa de um tempo. – afirmei, bufando – Eu estou preocupada.

— Ela vai ficar bem. Rebecca gosta de se virar sozinha. – falou o moço, e nós assentimos.

— É, claro... – concordei, ainda preocupada.

Terminei meu almoço em silêncio, enquanto ouvia os dois falando sobre coisas aleatórias. Minha mente não saía da Ordem de Não Reanimar de Gale, e da conversa intensa que ela tivera com sua filha mais cedo. Aquilo estava literalmente me dando dores de cabeça, e eu sentia como se fosse explodir.

Meus pensamentos foram interrompidos pelo apitar do meu bipe, e podia jurar que meu coração parou por um segundo. Agarrei o aparelho rapidamente e olhei quem era, respirando aliviada por não ser Gale.

— Sai do choque, Claire. – brincou Diego, rindo fraco.

— Eu pensei que fosse a mãe de Rebecca, mas felizmente não é. Mesmo assim, eu tenho que ir. Vejo vocês depois. – despedi-me, levantando e levando minha bandeja comigo.

Segui para o quarto da pessoa que havia me bipado, adentrando-o um pouco sem jeito.

— No que posso ajudar, Sr. O’Kelleher? – questionei, parando um pouco distante de sua cama.

— Kathleen encontrou uma casa. – afirmou o homem, olhando-me com urgência. Aquilo soou como um tiro em meu peito, deixando-me ainda mais perdida do que já estava. Respirei fundo, procurando a melhor resposta, ou pelo menos a que não me deixasse tão ridícula.

— Que bom. – foi o melhor que consegui dizer, fazendo uma força danada para manter a cara de paisagem.

— Por favor, dê-me um motivo para não me mudar. – pediu, com seus olhos suplicantes cravados em mim.

— Eu não posso, Ronan... – neguei com a cabeça, tentando manter-me firme.

— Vai me dizer que o outro dia não significou nada? Que nenhum desses dias significou alguma coisa? Olhe nos meus olhos, e diga que não sente absolutamente nada por mim... – afirmou, aparentemente bravo com minha indiferença.

— Você deveria se mudar com sua esposa, Ronan. – falei, mostrando-me calma e fria, mesmo estando prestes a explodir por dentro.

— Não se engane, Claire... Você sabe que tem alguma coisa acontecendo aqui. Eu tenho certeza. – encarou-me intensamente, de forma que quase quebrou meu escudo imaginário.

— Mesmo que estivesse acontecendo, Ronan! – retruquei, perdendo a paciência – Eu não posso. Primeiramente que você é meu paciente, e, além de tudo, você é casado. Katlheen é uma boa esposa, e você tem que viver com ela. Eu não sou uma destruidora de lares. – retomei meu tom de voz normal, mas ainda estava nervosa.

— Então você está dizendo que quer que eu simplesmente jogue os últimos dois meses no lixo, e comece de novo? – questionou, inconformado – Nada vai ser a mesma coisa agora. Eu te...

— Não termine essa frase. – cortei-o, levantando a palma da mão, como sinal para ele parar – Você consegue voltar ao normal. Só precisa sair desse hospital. Será a melhor coisa para nós dois. – abaixei a cabeça, prendendo as lágrimas – Foi bom te conhecer, Ronan. Vejo você em suas consultas. – assenti e virei as costas, seguindo para a porta.

— Claire, espere! – o homem gritou, mas apenas ignorei-o e saí do quarto, deixando algumas lágrimas escorrerem por meu rosto. Corri até uma Sala de Descanso, onde me tranquei e deixei o choro sair por completo.

Aquele dia estava piorando cada vez mais, e eu tinha medo de como acabaria. Por um lado, a mãe de Rebecca e todo o drama. Por outro, Ronan e todo o drama. Eu não aguentava mais estar praticamente todos os dias numa sinuca de bico, sempre em situações difíceis de se lidar. Achei que perder Akira seria o ápice dos meus problemas, mas eles pareciam se multiplicar mais e mais com o tempo. Eu estava cansada. Mentalmente, emocionalmente e fisicamente.

—-

Acordei com o som irritante do meu bipe. Abri os olhos lentamente, e lembrei-me que havia pego no sono ali naquela Sala de Descanso, depois de uma longa sessão de choro. Olhei o aparelho, e notei estava sendo bipada com urgência no quarto da Sra. Cooper. O pior já se passou em minha mente, e o sono desapareceu num passe de mágica. Peguei meu jaleco e saí daquele cômodo como uma bala, vestindo a peça branca no caminho. Corri o mais rápido que pude até o local, dando de cara com os aparelhos disparando, a equipe de enfermeiros apenas observando e Anthony desesperado.

— Claire, graças a Deus! Diga a eles para fazerem alguma coisa! – pediu o marido da paciente, desesperado.

— Eu... – comecei a falar, mas fui interrompida por outra voz.

— Que porra está acontecendo aqui? – indagou Rebecca, observando a cena – Façam alguma coisa! – ordenou às enfermeiras.

— Nós não podemos. Ela assinou uma ORN. – afirmou uma moça, mostrando as mãos em sinal de que não podia fazer nada.

— Como assim, Ordem de Não Reanimar?! – exclamou a morena, arregalando os olhos – Deixe-me ver o prontuário. – arrancou-o da mão de uma enfermeira e abriu-o, lendo o que estava escrito – Essa é sua assinatura, Claire... – subiu o olhar até mim, aparentemente inconformada.

— Eu sinto muito... – desculpei-me, deixando algumas lágrimas brotarem em meus olhos.

— Como você pôde?! – disse, encarando-me acusadoramente.

— Ela me pediu para assinar, e como ela estava oficialmente lúcida, eu deixei-a. E pelo sigilo médico-paciente, eu não podia contar para ninguém. Eu sinto muito, Rebecca, mas não tem nada que eu ou ninguém possamos fazer... – expliquei-me, caindo no choro novamente.

A jovem deteve-se a continuar negando com a cabeça, ainda com seu olhar acusador. De repente foi possível ouvir o som contínuo da parada definitiva, anunciando que a paciente estava morta.

— Não!!! – berrou Anthony, agarrando o corpo de sua esposa – Não, não, não... – continuou, sucumbindo-se às lágrimas, e apertando o corpo inerte contra si.

— Eu não acredito que você deixou isso acontecer... – falou Cooper, virando-se para mim com o rosto molhado – Você é um monstro, Claire. – passou por mim e saiu disparada do quarto, deixando-me ali, ainda mais desamparada.

Os sons se misturaram em um só: os soluços desesperados do homem, o som das máquinas, os cochichos das pessoas do lado de fora... Tudo parecia um conjunto de um pesadelo, e eu me senti paralisada. Meu corpo estava pesado, e eu não sentia que poderia sair dali tão cedo. O dia que parecia não poder ficar pior, acabara de piorar.

—-

Eu havia rodado o hospital todinho, do necrotério às Salas de Operação, atrás de Rebecca. Eu precisava encontrá-la, nem se fosse para que ela me espancasse até a morte. Afinal, eu sentia que merecia.

Adentrei o almoxarifado, que era um dos únicos lugares que ainda não tinha procurado ainda. Pude ouvir que alguém estava chorando, mas parara assim eu entrei. Caminhei na direção daquele som, esperançosa de que encontraria quem tanto queria. Avistei uma pessoa sentada no chão, atrás de um armário, abraçando os joelhos e com a cabeça entre as pernas. Ela ergueu o rosto para me olhar, e pude reconhece-la: era realmente Rebecca. A mesma olhou-me de cima embaixo e desviou os olhos, fungando. Sentei-me ao seu lado e observei-a, buscando as palavras certas para dizer.

— Rebecca, eu... – comecei a falar, mas um movimento repentino da morena me parou.

O orgulho e o arrependimento. Esses dois andam lado a lado. Às vezes o orgulho nos impede de dizer e fazer coisas que mudariam ou consertariam tudo, e acabamos perdendo a oportunidade para sempre. E aí vem seu sucessor, o arrependimento. Nos arrependemos tanto de sermos orgulhosos, que temos vontade de morrer. Engraçado, porque às vezes preferimos morrer do que deixar o orgulho de lado, mas depois que não o deixamos, preferimos morrer porque assim o fizemos.

Ela aproximou-se rapidamente e enfiou uma mão em meus cabelos, puxando minha cabeça para perto de seu rosto. Em uma fração de segundos, nossos lábios estavam unidos, e eu me senti incapaz de reagir.


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Notas finais do capítulo

O que acharam? Ficaram tristes pela morte da mãe da Rebecca? O que fariam no lugar da Claire? O que acharam do final não muito feliz da Rebecca e sua mãe? E o Ronan indo embora? E o beijo Clairebecca? Meu Deus, são muitas perguntas!
Btw, quem fez Enem, o que acharam? Eu fui bem na prova, mas a redação foi meu ponto fraco, porque tenho facilidade em escrever narração, mas chega na dissertação, eu empaco.
Enfim, chega de falar por hoje! Vejo vocês nos comentários. Espero que tenham gostado do capítulo. Até mais. Beijos!



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