Apesar de a rotina no Acampamento Meio-Sangue ter voltado ao normal, os dias para alguns dos semideuses se tornaram cinzentos e tristes.

Para Will, por exemplo, mesmo que o sol brilhasse no céu azul desprovido de nuvens, a paisagem lhe parecia triste. Principalmente por não ter Nico reclamando que não precisava de um banho de sol ao seu lado.

Ele se lembrava de quando contaram a ele sobre o que ocorreu. Estava num sono pesado, por ter passado a maior parte do dia e da madrugada anterior cuidando da enfermaria. E, quando soube que seu melhor amigo e mais dois semideuses incrivelmente corajosos foram levados embora por sabe-se lá quem, foi como se um gigante houvesse lhe dado uma bofetada. Suas emoções foram de surpresa para indignação, de indignação para ódio e do ódio para a tristeza. Ele pediu para ficar sozinho em seu chalé e chorou por horas. Estava pensando em como os deuses foram injustos e cruéis. A única certeza que o filho de Apolo tinha em toda a sua vida (além da morte, é claro) era a de que nem Nico, nem Thalia e muito menos Leo tentariam derrubar a Névoa para atrair atenção ou assustarem os mortais. E sua única vontade era a de invadir seja lá o lugar para onde os três foram levados e tirar todos de lá.

A situação para Jason também havia piorado. No primeiro dia sem Thalia ele abriu os olhos esperando encontrar sua irmã o encarando com um sorriso no rosto, dizendo sua clássica frase: “Hora de acordar, Bela Adormecida!”.

No entanto, quando acordou, Jason fitou apenas o chalé vazio. Vazio, escuro e mais frio sem a presença de Thalia para torná-lo como o lar do qual o filho de Júpiter fora tirado quando era muito jovem. Um lar ao lado de sua irmã mais velha, sempre cuidando dele e o protegendo do que quer que fosse.

Ele fechou os olhos com força, esperando abri-los e ver Thalia ali, perguntando se ele teve um pesadelo e dizendo que estava tudo bem e ela estava ali.

E, para tornar sua angústia pior, quando Jason finalmente tomou forças para sair, o dia lhe pareceu muito mais frio e cinzento, principalmente sem a presença de Leo e suas piadas infames e sem a menor graça, mas que ainda assim o faziam rir pela coragem do latino de deixar escapar piadinhas infames. Parado à porta de seu chalé, ele fechou os olhos levemente, lembrando-se de quantas vezes já havia encontrado Leo coberto de fuligem pedindo sua ajuda com seu “mais novo e maneiro” projeto. Ou simplesmente sorrindo e dizendo que seu melhor amigo, quando não estava desmaiado, estava hibernando. E Jason, como todas as outras vezes, riria após não conseguir conter a falsa expressão ofendida.

Conforme caminhava pelo acampamento, ele reconheceu Will sentado sobre os campos de morangos. E foi com um baque que ele também se lembrou de algo: Nico não estava mais lá. Ele também havia sido tirado deles. A presença do filho de Hades, antes sempre afundado em melancolia, passara a alegrar mais ainda os dias de Jason e os de Will também. Ele havia começado a tratar Nico como se fosse seu próprio irmão, sempre lhe dando todo o apoio necessário e sempre o protegendo quando ele precisava (mesmo que Nico insistisse que sabe muito bem se virar sozinho). Apesar de não saber, Jason sentia como se tivesse dado a Nico o que foi tirado de ambos: uma família.

E não eram apenas aqueles dois que se encontravam em angústia: a situação de Percy estava tão péssima quanto. A única coisa que lhe arrancava um sorriso vez ou outra era Annabeth, e isso ocorria quando a própria não estava mergulhada em tristeza, o que o levava junto. Como os deuses puderam ser tão injustos? Como puderam acusar Nico, Thalia e Leo de algo que não fizeram? Ele não entendia. Simplesmente não entendia porque, depois de lhe privarem de tantas coisas, agora tirariam dele os seus amigos. Por um momento, ele imaginou se seu pai havia apoiado toda aquela maluquice.

Por fim, ele se levantou de sua cama no chalé de Poseidon, com cuidado, para não acordar Annabeth, cujo rosto ainda estava manchado pelas trilhas das inúmeras lágrimas que derramara na noite anterior. Em silêncio, o Jackson caminhou até a porta enquanto vestia a camiseta laranja do acampamento e a abriu, ignorando a forte luz solar que ofuscava seus olhos. Estava cansado. Poucos dias se passaram desde o acontecimento, mas ele não permitiria que aquilo acontecesse. Não com as pessoas com quem mais se importava. Não com Nico, que jurou a si mesmo que protegeria. Não com Thalia ou Leo, amigos incrivelmente especiais para o moreno de olhos verdes.

Ele atravessou a área dos chalés, caminhando a passos pesados até a Casa Grande e chamando a atenção de Jason e de Will, que, curiosos, o seguiram até o local. Ele não agüentava mais. Tinha que por um fim naquela história absurda.

— Quíron! — Chamou ao ver o centauro em seu disfarce com a cadeira de rodas, lendo um livro calmamente. Tal calma que foi substituída por curiosidade quando ouviu o filho de Poseidon chamando-o.

— Olá, Percy — Disse com seu típico sorriso gentil. — O que deseja?

Percy respirou fundo, sentindo os olhares curiosos de Jason e Will, que o seguiram até a confortável casa de madeira. O moreno os olhou por um momento e, logo depois, voltou-se para Quíron.

— Eu quero acabar com essa palhaçada! — Ele disse. — Para onde levaram Thalia, Nico e Leo?

Quíron o encarou por um longo momento, franzindo o cenho, um gesto que fez com que Percy ficasse curioso pelo que diria.

— Quem? — Questionou, fazendo o Jackson arregalar os olhos.

— Você sabe de quem eu estou falando, Quíron! Thalia Grace, Nico Di Angelo e Leo Valdez!

Quíron negou levemente, olhando nos olhos do filho de Poseidon.

— Eu nunca ouvi falar nesses semideuses. Talvez você esteja confundindo com alguém, Percy.

— Como assim?! — A voz de Will se fez ouvir. — Como não os conhece?! Thalia, filha de Zeus, e Nico, filho de Hades! Eles nos ajudaram nas guerras contra Cronos e Gaia! E Leo, o filho de Hefesto, um dos sete semideuses da profecia! Que derrotou Gaia montado no dragão de bronze, que ele mesmo batizou de Festus! Como não se lembra de Thalia?! Não foi da morte dela que surgiu o pinheiro que protege as barreiras do acampamento?!

— O pinheiro sempre esteve lá, Will... — Quíron disse calmamente. — Vocês devem estar confusos, meus jovens... Por que não vão treinar um pouco? Certamente as suas respectivas primeiras atividades já devem ter começado...

— Está falando sério?! — Jason se intrometeu, agora claramente irritado. — Como pode estar fingindo que eles não existem quando os três estão num lugar desconhecido! E, se não estiverem mortos, com certeza estão sofrendo! Minha irmã e meus dois melhores amigos estão lá e você age como se isso não fosse nada?! É isso o que nós somos para você, Quíron? Apenas meros semideuses descartáveis que quando morrem é só fingir que jamais existiram?! Você agiu assim com todos os semideuses que você treinou?! Qual o problema com você?! Qual o problema com a droga do Olimpo?! Eu quero os três de volta! Quero minha irmã e meus amigos de volta porque eles não fizeram nada! E, se for preciso, eu mesmo saio desse lugar e procuro por eles!

No mesmo instante, Quíron se alertou, encarando-o com um olhar de alerta enquanto saía de sua cadeira de rodas e chamava os três para um local afastado da movimentação dos semideuses. E os três, completamente confusos, o seguiram.

— Escutem... — Começou em voz baixa. — Vocês três devem evitar tocar nesses nomes agora! É muito perigoso para vocês e para o restante do acampamento! Se qualquer semideus tentar enfrentar esse protocolo para ir atrás dos três, isso pode acarretar numa imensa confusão com o Olimpo e com a CIA. Eu sei o quanto vocês estão sofrendo porque eu também estou. Mas não podemos mais tocar nesses nomes. Com o tempo, eles serão esquecidos ou lembrados de forma completamente diferente. Vocês nem deveriam saber que o Olimpo está envolvido com a CIA e é por isso que devemos fingir que nada aconteceu. Eu juro por todos os deuses que, se houvesse uma maneira, eu já os teria mandado para resgatá-los. Mas, infelizmente, são três vidas para salvar um acampamento inteiro.

Jason arregalou os olhos, empalidecido e incrédulo.

— Então vai deixá-los morrer assim?!

Quíron suspirou pesadamente.

— Eu realmente sinto muito, rapazes…

As reações dos três eram simplesmente indescritíveis para Quíron. Os olhares de dor e de choque quase o fizeram mudar completamente de ideia, mas ele não tinha outra escolha. Sabia o quanto aquilo estava sendo difícil para ele.

Assim que ele teve um relance de que poderia sim conversar com eles em um lugar mais escondido, para que, talvez, arranjassem um modo de burlar as regras e sair em uma espécie de busca, ele fora obrigado a fechar a boca com uma névoa surgiu em sua frente.

— Nem pense nisso. — Zeus, o Senhor dos Céus, o alertou; fazendo Quíron engolir em seco e dar de ombros, estranhando o fato dele ter se manifestado assim, de repente. — Mas não é com você que vim falar.

A mensagem de Iris se virou para os três semideuses ali presentes, fazendo Percy mirar os olhos claros do Solace com certa inquietação. Nunca era algo bom quando um dos três grandes vinha intimar os semideuses.

— Zeus. — Ambos os três saudaram em uníssono, não fazendo tanta questão de mostrar honra, visto que sabiam que ele tinha como impedir o feito.

— Olá garotos. — Ele suspirou antes de prosseguir, passando uma das mãos por sua barba a fazer. — Eu vou direto ao ponto, ok?

Jason respirou fundo, passando as mãos no cabelo em um ato de nervosismo.

— Eu preciso que vocês três, os destaques do acampamento, saiam em busca de respostas para uma única questão: o que está acontecendo com Hécate? — O Senhor do Céu estreitou o olhar e recuperou sua postura, encarando os semideuses em seus olhos, vendo que provavelmente iriam fazer chacota.

— Porque você não pergunta para ela? — Percy foi o primeiro a se manifestar, fazendo Will negar em reprovação, mesmo tendo achado graça; aquela não era hora para piadinhas.

— Engraçadinho, Perseu. — Zeus se esforçou para não rolar os olhos com tamanha ousadia. — Nós, Deuses, temos uma teoria: alguém pode estar usando Hécate para derrubar a névoa. Após os semideuses serem levados, Afrodite tomou as rédeas de uma nova discussão, por fim todos chegamos em um acordo de que, talvez, digo, só talvez, eles não tenham poder o suficiente para fazer isso, visto que a névoa é protegida por uma magia muito poderosa e antiga.

— Aí está a solução dos nossos problemas. — Jason indagou com um olhar sugestivo, fazendo o pai franzir o cenho totalmente confuso. — Vocês sabem que não foram eles, então é fácil, nós vamos até lá e falamos isso, então eles são libertados e pronto.

Zeus deu uma gargalhada de escárnio, fazendo Will engolir em seco e recuar um passo.

— Não temos provas, bobinho. — Disse então. — E outra, eles já podem estar mortos a uma hora dessas.

— E porque não tentar? É a SUA FILHA que está lá SOFRENDO! — O loiro fez questão de dar ênfase nas palavras, para que, talvez, um raio de sol o atingisse e Zeus finalmente se tocasse do que estava acontecendo.

— Nós não queremos problemas com a CIA, eu sinto muito Jason, mas a única coisa que eu vim ordenar, é que vocês saiam juntos atrás de Hécate, e descubram o que está acontecendo! Quem sabe isso não pode ter algo a ver com toda a confusão? — O Senhor do Céu engoliu o amargo que surgiu em sua boca só de pensar em Thalia, sabendo que aquela garota só sabia se meter em encrencas, desde pequena.

{...}

— Isso é injusto. — O moreno de olhos verdes murmurou, jogando uma de suas blusas dentro de sua mochila, fazendo sua namorada revirar os olhos o observando. — Eu acho que eles devem olhar para minhas costas e enxergarem um alvo! “Olha lá, o Perseu, porque não o mandar em uma missão que pode acabar matando ele?”.

— Para com esse drama, Percy. — Annabeth se arrumou na cama do chalé 3, encolhendo seu pé bem na hora que o dramático se sentou no colchão. — Até eu aguento mais que isso.

— Por Deuses! Nós, praticamente, fomos cuspidos para fora da guerra contra Gaia! E já querem me empurrar para outra confusão? — Continuou a reclamar, fazendo a loira pigarrear e chamar sua atenção.

— Lembre-se que isso é por nossos amigos, ok? — Ela tocou naquele assunto delicado, suspirando alto assim que o fez, visto que, desde que os semideuses foram levados, ela não conseguia falar sobre isso sem desmoronar e chorar pela perda.

Percy umedeceu os lábios com a ponta da língua, se virando e começando a engatinhar até a namorada, envolvendo-a em um abraço caloroso, acariciando sua bochecha e depositando um beijo em seus cabelos.

— Traz eles de volta para casa...— Annabeth pediu em um fio de voz, tão baixo que o moreno quase teve que pedir para que ela repetisse. —...por favor.

O coração dele se apertou contra o peito ao ouvi-la usar esse tom, puxando-a para mais perto e suspirando, sussurrando baixinho em seu ouvido:

— Eu prometo.