Demorou a entender o que havia acontecido. Estava prestes a beijar Linden, mas por alguma razão, ele já não estava mais próximo dela.

   Procurou em meio ao escuro e ao show de luzes coloridas da balada. Só conseguiu enxergar direito quando viu que a multidão de pessoas abria uma roda bem grande. Todos apertados, empurrando ombros com ombros para ver a briga que surgia.

   Linden estava caído no chão, tentando se recuperar e compreender o movimento brusco. Do outro lado da roda de pessoas, estava um Stoll irado. Era possível notar que sua respiração estava totalmente ofegante por baixo do sobretudo. Seu peito subia e descia num curso irregular. Sua expressão era mais do que raiva. Ódio, fúria? Avassalador. Ele mantinha uma posição de ataque, sem perceber.

   Não havia nada em volta dos dois quando Linden levantou por completo e foi para cima do outro. Somente Stoll e Linden. Tudo se desenrolava tão rápido. Tina não teve tempo de reagir antes que Linden estivesse no chão novamente. Stoll montou em cima dele e dava-lhe uma sequência de socos que poderia ser sentida através do chão. O dj tirou a música, as pessoas não tiravam os olhos do espetáculo. O álcool na cabeça de Tina finalmente subiu, permitindo que ela saísse do estado de choque e se mexesse para impedir aquilo.

   —-Stoll, larga ele! Larga ele agora!

   Ela puxava tudo que conseguia de Stoll, mas nada poderia pará-lo. A força era descomunal. O chão em volta estava vermelho. Sangue de quem? Stoll cada vez mais forte, mais rápido, o rosto de Linden, desfigurado.

   —-Stoll!!!

   Com isso, Tina puxou seu braço com toda a força reunida por cada centímetro do seu corpo. Antes de dar o próximo soco, ele a encarou. Mas quem a garota viu, não foi o rapaz que ela conhecia. Simplesmente, não era ele. Não era quem ela tinha beijado na noite anterior. Não era aquele garoto calmo, centrado e comedido. O que ela viu foi um monstro, transtornado, irreconhecível. Havia uma baba escorrendo pelo queixo dele. A testa estranhamente seca, não havia sinal de suor, apesar de todo esforço que todo mundo, inclusive Tina, pôde ver. Mas não foi isso que espantou a garota. O que a chocou, foi a cor dos olhos dele. Estavam arregalados, dilatados e... vermelhos. Vermelhos? Isso mesmo. A cor das íris estavam vermelhas. E não verdes, como deveriam estar.

   Ela largou o braço dele, como que assustada.

   Houve um período de 3 segundos. Stoll caiu na real. Abaixou o rosto, piscou algumas vezes, olhando para Linden no chão, numa poça de sangue que só crescia em volta dele. Estava tentando se controlar, voltar ao normal, porém aquele sangue... Impossível. Levantou cambaleando, olhou para Tina. Assustadíssima. Tinha lágrimas nos olhos dela?

   —-Ele ia... ele ia te beijar e...

   Gaguejou meias palavras. Não conseguiu completar.

   —-Por favor, sai... —Tina quase que suplicou, avaliando bem o comportamento dele. Já não conseguia enxergar os olhos dele.

   O que havia acabado de acontecer?

   Lanna surgiu no meio das pessoas. Entrou correndo dentro da roda, onde há poucos segundos era um ringue de luta. Olhou para o chão e viu seu irmão, desfigurado e ensanguentado.

   —-Linden! Linden, acorda! Fala comigo, irmão — ela sacudia o garoto, ele não se mexia. —Chamem uma ambulância, seus idiotas.

   A ruiva gritava, já chorando bem em cima do irmão.

   —-Tina, pelo amor de Deus, me ajuda! Linden, eu tô aqui —a garota não sabia com quem falar. Gritava, chorava, sacodia o garoto, tudo ao mesmo tempo.

   Tina caiu de volta em si e abaixou ao lado de Linden e da amiga. Alguém já estava chamando uma ambulância. Ela procurou por Stoll.

   Ele já não estava mais lá.

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—-Bom, o estado dele é gravíssimo — o médico principal do hospital dizia. As duas mãos em concha, uma segurando a outra. A expressão triste e cautelosa no rosto. — Além de perder muito sangue, ele quebrou pelo menos 6 ossos do rosto, mandíbula deslocada, tímpano direito estourado, duas costelas quebradas e uma fraturada, pulmão perfurado e rompimento de alguns órgãos do aparelho digestivo. A sorte dele foi que não identificamos nenhuma concussão grave na cabeça. Mas ele passou bem perto da morte. Vamos entrar em cirurgia assim que amanhecer. Ele está desacordado e deve permanecer assim por uns dias.

   A cada frase do médico, Tina sentia uma porrada na boca do estômago.

   Eram 4h36. Lanna ligou para sua mãe no caminho do hospital. Ela chegou junto com as amigas, segurando uma Lassie chorosa. Todas as 3 mulheres e a bebê ouviam as notícias sobre o garoto.

   Mãe e irmã choravam copiosamente. Tina ainda estava chocada. Mas nesse momento, ela tinha que ser forte para que a família McQueen pudesse se apoiar nela totalmente.

   —-A cirurgia dele será de risco. Mas já estamos fazendo o possível para que a recuperação seja boa —o doutor colocou uma mão no ombro da mãe de Lanna, numa tentativa fútil de reconforta-la e se afastou.

   Sentaram todas no banco de espera. Não poderiam fazer mais nada. Lassie não parava de chorar, portanto a mãe foi se ocupar comprando algo que ela pudesse comer para se distrair. As amigas se encontravam sozinhas.

   —-Eu não entendo. Foi tudo tão rápido... Você viu alguma coisa? Viu o que aconteceu? —Lanna tinha a voz embargada.

   Falava baixo, com medo de gaguejar. Estava tremendo de nervoso.

   Tina engoliu em seco. Como contaria para sua melhor amiga que Stoll, aquele que ela estava apaixonada, havia tentado matar seu irmão por ciúmes? Não era o momento para que Lanna ouvisse isso. Aliás, era mesmo ciúme? Nem ela sabia.

   —-Eu... eu não sei. Estava tudo tão escuro, eu... Eu também o encontrei depois...

   Tentou mentir. Lanna desabou ainda mais.

   As horas se passaram. Acabaram adormecendo as duas nas cadeiras, confortáveis, por sinal, porém geladas, da sala de espera do hospital. Quando Tina despertou, a mãe de Lanna já estava de volta, ninando uma Lassie adormecida com um chocolate pendurado na boca.

   —-Tia Lillyth... eu preciso que você cuide bem da Lanna nesse momento. Ela está muito abalada —Tina começou sussurrando, levantando e se desvencilhando dos cabelos e mãos da amiga.

   A mulher assentiu.

   —-Obrigada por cuidar deles, Tina...

   Ela expressava ternura pela garota. De fato, se considerava tia dela. Tina estava sempre cuidando mais de Lanna do que a própria mãe cuidara a vida toda. E agora, de Linden também.

   —-Eu vou passar na sua casa e trazer roupas pra vocês, algumas coisas pro Linden e pra Lassie também. Ok?

   A mãe ruiva assentiu, tranquila, porém com os olhos marejados. Entregou a ela a chave de casa e apertou a ponta de seus dedos em agradecimento.

   Tina se despediu, prometendo voltar o mais rápido possível com os suprimentos e roupas. Chamou um taxi na porta do hospital e rumou para sua casa.