Problemas escrita por Sascha Nevermind


Capítulo 1
Problemas




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 Frisk tinha um problema e, como todos os problemas da garota, aquele estava relacionado a Chara. Mas dessa vez, sua irmã gêmea não tinha brigado com ela, ou com outras pessoas, ou feito algo de errado em casa e colocado a culpa em Frisk, ou qualquer outro motivo pelo qual ela se encrencava por causa da irmã. Não, dessa vez Frisk havia conseguido ser meter em confusão sozinha. 

 Chara sempre foi meio moleque, brigando com os garotos da escola e aprontando, então ela sempre teve mais amigos homens. E Frisk estava acostumada com a passagem constante de garotos na sua casa, indo jogar videogame com sua irmã ou a chamando para fazer alguma coisa misteriosa depois da aula - nesses dias, eles saíam, as vezes de carro se algum dos garotos tivessem, e só voltavam tarde da noite. Frisk preferia não saber o que eles faziam. Eram sempre garotos que ela preferia não ter muito contato, aqueles que Chara conseguia dobrar mas Frisk era boazinha demais para fazer com que a escutassem. Então, ela deixava a irmã com as amizades dela, e ficava sozinha em seu quarto tentando se distrair ou fazendo as atividades da escola ou as tarefas da casa. As coisas funcionavam mais ou menos bem pra ela assim. 

 Mas Chara, como sempre, tinha que dificultar a vida de Frisk. Um garoto novo entrou na escola delas, no meio do ano letivo, e a garota imediatamente o achou uma gracinha. Asriel Dreemurr era alto, tinha a pele clara, cabelos muito loiros e lisos que pareciam sempre ficar espetados para cima por mais que ele evitasse aquilo e olhos escuros que contrastavam de um jeito impressionante. Na primeira vez que o viu, quando seu professor de álgebra pediu que se apresentasse para a turma, Asriel corou como um tomate, gaguejou um pouco e ficou torcendo as mãos juntas na frente do corpo. Frisk achou tão bonitinho que teve vontade de ir lá na frente e abraça-lo até sufocar. Quando Asriel olhou em torno da sala depois de acabar a apresentação, procurando nervosamente um lugar para sentar, a garota sorriu calorosamente e indicou o lugar vago atrás dela. Asriel pareceu tão aliviado e grato que ela teve aquele impulso de abraça-lo de novo, e mesmo sendo o tipo de aluna que presta total atenção na aula, Frisk se manteve conversando com ele o tempo todo, e ele parecia feliz com aquilo. 

 No fim daquele tempo, eles tinham aulas diferentes, então se separaram garantindo um ao outro que iriam se falar mais tarde. A próxima vez que Frisk viu Asriel, ele estava com a Chara. 

 Foi na hora de ir pra casa. Frisk ia pegar uma carona com uma amiga, e procurou a irmã para avisar. Por mais diferentes que fossem, uma se importava com a outra, e Frisk sabia que Chara iria ter um ataque se ela "sumisse". Quando a encontrou, Chara estava com Asriel e mais três amigos sentados na escadaria do lado de fora, todos conversando e rindo. Chara estava com o cotovelo apoiado no ombro de Asriel, e ele estava olhando para ela de um jeito engraçado, e o estômago de Frisk revirou. Deu as costas aquela cena na mesma hora, levemente enciumada, e marchou de volta para o estacionamento. Chara que ficasse sem saber onde ela estava. 

 As coisas mais estranhas começaram a acontecer depois disso. Asriel e Chara viraram melhores amigos, ou pelo menos era o que parecia. Saíam juntos, um ia na casa do outro jogar, uma noite Chara chegou em casa passando mal porque tinha apostado com ele quem comia mais torta. Aquele tipo de coisa enchia Frisk de ciúmes, os dois pareciam dois cabritinhos saltando alegremente por aí. Mas não era como se ele ignorasse a garota ou algo do tipo. Asriel continuava fielmente sentando no lugar vago atrás de Frisk todo dia, e por mais que ela tentasse prestar atenção na aula, ele sempre a puxava para alguma conversa. Ou isso, ou os bilhetinhos que passavam escondidos por trás da mesa. Asriel tinha um lado tão sensível e bondoso que Frisk não conseguia imaginar como ele e Chara se davam tão bem. Ela começou a desconfiar que os dois estavam juntos, mas não queria perguntar para a irmã - não adiantaria, de qualquer forma, ela nunca lhe contava coisas desse tipo. 

 Então, um dia, enquanto estavam em dupla para fazer uma atividade, Frisk se inclinou em direção a Asriel, como quem não quer nada, e sussurrou para ele:

 - Então... Você e Chara, hein? 

 O tom de voz dela não deixava nenhuma dúvida sobre o que estava falando, e Asriel imediatamente ergueu os olhos em sua direção, corando violentamente. 

 - E-eu e Chara? De onde você tirou essa ideia, Frisk? 

 A voz dele estava tão ultrajada que ela não conseguiu evitar se sentir um pouquinho aliviada, apesar de ter dado de ombros. 

 - Ah, você sabe. - Frisk respondeu. - Vocês são bem próximos e estão sempre juntos. Foi a conclusão que eu cheguei. 

 Asriel coçou a cabeça, sem graça. 

 - Não sabia que você achava isso. É por isso que você nunca fica com a gente quando vou visitar vocês? 

 - Mais ou menos. Eu realmente não costumo ficar com minha irmã e os amigos dela quando estão lá em casa. - Frisk respondeu. 

 - Você devia ficar com a gente. Eu sou seu amigo também, certo? 

 - Certo. - A garota sorriu levemente. 

 - E eu não tenho nada com a Chara. - Asriel bufou, como se aquela fosse a ideia mais inacreditável que ele já houvesse escutado. - Acho que ela é algo tipo minha melhor amiga, apesar de ser meio violenta. Mas eu nunca teria nada com ela. Não que Chara seja feia, mas... Eu não consigo pensar nela desse jeito. E sei que ela também não me vê assim. 

 - Mas você olha para ela de um jeito engraçado às vezes. 

 Asriel coçou a cabeça de novo, parecendo ainda mais sem graça. 

 - Às vezes eu me surpreendo com o quanto vocês são parecidas. Mas não tem como esquecer que ela não é você. 

 Dessa vez, quando Frisk sorriu, não conseguiu esconder o alívio. 

 - Parece que eu não vou ser sua cunhada então. 

 - Não mesmo. - Ele confirmou. 

 Eles se encararam, sorrindo um para o outro. Asriel olhava para Frisk com carinho, e quando ele começou a corar de novo, ela soltou uma risadinha e esbarrou com o ombro no dele. Depois disso, eles voltaram a fazer a tarefa, mas ela relanceava olhares para ele toda hora, e flagrou-o fazendo o mesmo algumas vezes também. 

 Pela primeira vez, Frisk se permitiu admitir que gostava do garoto doce sentado ao seu lado. Se sua irmã não estava interessada nele, ela se sentia "autorizada" a nutrir sentimentos e Asriel realmente mexia com Frisk. Ele era tão fofo e legal e sensível que queria guarda-lo num potinho só pra ela. E o garoto era tão atencioso que Frisk achava que, talvez, ele gostasse dela também. 

 Quando Asriel foi na casa delas jogar videogame com Chara, na semana seguinte, Frisk fez o que ele sugerira e saiu de seu quarto para ficar na sala com eles. Foi estranho estar com os dois no mesmo ambiente, mas também foi divertido. Chara ganhava o tempo todo, Asriel começava a resmungar, e Chara o chamava de bebê chorão. Às vezes Frisk o defendia, e às vezes apenas ria. Ela sentou do lado dele, e as vezes seus braços se roçavam ou suas coxas se tocavam, e a garota sorria sem perceber. Sua irmã, ao contrário do que esperava, não ficou chateada de tê-la ali, apenas a provocou por ficar se escondendo no quarto. E quando Asriel teve que ir para casa, mas antes de sair deu um abraço apertado em Frisk - o primeiro abraço deles - ela decidiu que qualquer provocação da irmã valeria a pena. 

 Os dois foram ficando cada vez mais próximos. Entre conversas sussurradas na sala de aula e mensagens trocadas até tarde da noite, Frisk sentia que cada vez mais pedaços de seu coração pertenciam ao loiro de olhos escuros que havia se tornado tão importante para ela. E também podia ver, em seu olhar, o quanto ele se importava. Como estava sempre dando um jeito de tocar nela, como sempre tentava chamar sua atenção e era perfeitamente gentil. Frisk admirava isso nele, assim como admirava sua sensibilidade e até sua timidez. Asriel era um tipo raro de garoto, e qualquer um que os visse juntos saberia que estavam apaixonados. 

 Foi o que aconteceu com Chara. 

 - Você e Asriel estão saindo? - Ela perguntou, cruzando os braços e encarando a irmã. 

 Frisk sentou-se na cama, onde estava lendo um livro, e olhou desconfiada para a garota no batente da sua porta. Chara não parecia muito contente. 

 - Não. - Respondeu, esperando por uma reação para dizer algo mais. 

 Para sua surpresa, Chara arregalou os olhos em descrença. 

 - Pensei que o molenga do Asriel estivesse mentindo! Porque diabos vocês não estão saindo? 

 Chara continuou encarando a irmã, esperando uma resposta, mas Frisk não sabia ao certo como responder aquilo. 

 - Você... Sabe, não se importa? Se a gente sair? 

 A irmã a encarou confusa por alguns segundos, e quando percebeu do que se tratava, começou a rir como se aquilo fosse a coisa mais engraçada que já ouvira. Riu por tempo o suficiente para que Frisk ficasse desconfortável, e quando finalmente parou, balançou a cabeça incredulamente. 

 - E porque eu me importaria, Frisk? Até parece que eu iria querer algo com Asriel. - Chara bufou. - E também, vocês se merecem, são dois bobões iguais. Porque não saiu com ele ainda? O cara não para de me perguntar coisas sobre você, já estou ficando irritada. 

 Aquela informação animou Frisk, que se sentou com as costas eretas, os olhos brilhando. 

 - Ele pergunta mesmo de mim? 

 - Já não falei que sim? - Chara revirou os olhos, impaciente. - Você não gosta dele? Porque se for isso é melhor falar logo. Eu já tô ficando com pena dele. 

 - Não, eu gosto. - Admitiu, corando um pouco. - É só que eu não tinha certeza se ele gostava também, e nenhum de nós tomou nenhuma atitude ainda. 

 - É bom você tomar então. Asriel é cagão demais pra isso, e eu já tô ficando impaciente com vocês. 

 Foi então que Chara decidiu usar sua lendária sutileza. 

 No dia seguinte, Frisk estava na escadaria na frente da escola, apoiando preguiçosamente seu peso contra o corrimão enquanto esperava a irmã, para que as duas fossem para casa juntas. Ela também iria aproveitar para ver Asriel, que tinha a última aula junto com Chara, e sempre saía junto com ela. A irmã estava certa, afinal. Mesmo no pouco tempo que Frisk conhecia o garoto, sabia o quanto ele era tímido e medroso, e seria realmente mais fácil para eles se ela fizesse algo em relação aquilo. 

 Frisk só não sabia o que, exatamente, poderia fazer. 

 O dia estava frio, e ela se apertava contra seu casaco, tentando se aquecer. Nada contra o frio, mas odiava ter que esperar naquele clima que pedia para que fosse para casa se enrolar nas cobertas. Quando estava quase se decidindo a entrar na escola de novo para procurar a irmã, no entanto, Frisk viu Asriel descer as escadas, sozinho e parecendo nervoso, o que imediatamente a fez perceber que havia algo errado. Assim que o garoto chegou perto o suficiente, ela perguntou:

 - Aconteceu alguma coisa? 

 Asriel desviou os olhos, sem graça. 

 - Chara ficou de detenção e não vai sair da escola antes das quatro, então me pediu para te acompanhar até em casa. 

 Frisk apenas o encarou, incrédula. 

 - Detenção?

 - Ela fez alguma coisa de Chara. - Ele deu de ombros, sem olhar nos olhos da menor. 

 - E pediu pra você me acompanhar. 

 - Isso. 

Asriel mentia muito mal, e imediatamente Frisk percebeu pelo modo que ele parecia sem graça e não olhava diretamente para ela. Quando ela ia perguntar o que havia acontecido MESMO, uma mensagem de Chara chegou. 

 "Resolve isso logo! Se Asriel me perguntar mais uma vez se eu acho que ele tem chance com você eu vou dizer que você namora o professor de química escondido" 

 Frisk segurou o riso e escondeu o celular no bolso. Ter a irmã a ajudando num assunto daqueles era algo totalmente inesperado para a garota, no entanto, não seria ela a reclamar. Frisk corajosamente passou seu braço pelo braço de Asriel e sorriu para o garoto. 

 - Bom, então vamos. 

 A casa de Frisk não ficava na mesma direção da casa de Asriel, ele teria que fazer um desvio que o faria chegar quinze minutos atrasado em sua própria casa, mas não parecia se importar com isso. Ele estava tímido, a princípio, parecendo desconfortável em estar tocando Frisk, mas isso passou em alguns momentos. Frisk conseguiu deixar Asriel a vontade, e eles conversaram e riram todo o caminho, até que finalmente chegaram a casa da garota. Pararam em frente ao portão e Asriel se desvencilhou do braço dela, ficando de frente e enfiando as mãos nos bolsos, parecendo sem graça novamente. A garota teve que se controlar para não sorrir com aquela cena. Era hora de colocar suas habilidades de flertar em ação.

 - Então... Está entregue.

 - Foi divertido vir com você. – Frisk sorriu, se aproximando um passo. – Você é o cara mais legal que conheço sabia?

 O rosto de Asriel ficou vermelho, e ele desviou o olhar.

 - Você não deve conhecer muitos caras.

 - O suficiente para você ser meu preferido. Então... Porque você não olha para mim?

 Ele ergueu os olhos, hesitante, e sorriu de leve.

 - Você é minha garota preferida também. – Confessou, e ficou mais vermelho ainda, mas dessa vez, Asriel não desviou o olhar.

 Frisk corou também, ao notar o olhar sério do garoto a sua frente. Isso a encheu de determinação. Deu mais um passo, o que a deixou mais perto de Asriel do que o socialmente aceitável, mas ele não reclamou, apenas continuou encarando-a. Seus olhos, sua boca.

 - Nesse caso, acho que devíamos sair um dia desses, não?

 Asriel sugou o ar com força, e antes que Frisk pudesse esboçar qualquer reação, os braços do garoto estavam em volta de seu corpo, e suas bocas estavam coladas. A surpresa impediu que a garota reagisse de imediato – sério que Asriel tinha tomado atitude para fazer isso? – mas isso não durou muito. Num piscar de olhos, Frisk correspondeu ao beijo, segurando o rosto macio de Asriel entre suas mãos, o coração batendo mais rápido do que ela pensava ser possível.

 Tão repentinamente quanto ele a havia beijado, interrompeu o beijo, no entanto.

 - D-desculpe, Frisk, eu não...

 - Shh... – A garota sorriu, puxando-o de volta para si. – Me beija mais.

E ele a beijou, dessa vez com mais confiança, até ouvirem uma risada baixa e uma voz dizendo:

 - Bem, eu gostaria de passar por esse portão, se não for incomodo.

 Dessa vez, os dois pularam de susto e se afastaram imediatamente, se virando na direção da voz de Chara. A garota assistia a cena a poucos passos de distância, a mochila displicentemente jogada sobre o ombro esquerdo, um sorriso debochado nos lábios porém um olhar de orgulho que Frisk reconheceu na hora. Ela segurou a mão de Asriel, que parecia que poderia explodir a qualquer momento, e se virou para a irmã, ignorando o próprio rubor.

 - Você não estava de detenção até as quatro?

 Chara deu de ombros.

 - Eu fugi. Então, se me dão licença...

 O casal de afastou do portão, o suficiente para que ela passasse, e Chara finalmente os deixou a sós – não sem antes, claro, dar uma piscada para eles.

 - Bom trabalho, Asriel.

 - Chara! – Frisk riu, com pena da expressão do garoto, mas sua irmã já havia entrado. – Não liga pra ela, só quer te provocar.

 - E conseguiu. – Ele reclamou, sem graça. – Acha que ela vai contar para seus pais?

 - Provavelmente não. – A garota respondeu dando de ombros. Aquilo não iria deixa-la em problemas, de qualquer forma. – A propósito, você fez mesmo um bom trabalho. – Completou, sorrindo para o garoto.

 Asriel desviou o olhar, tímido como sempre, porém sem conseguir disfarçar o sorriso.

 - Então posso te ligar mais tarde?

 - Vou estar esperando.

 Frisk se colocou na ponta dos pés, dando um último selinho no garoto, e então se despediram. Asriel provavelmente não percebeu, mas Frisk viu, antes de fechar o portão, ele se afastar, fazendo um gesto de vitória com as mãos. E percebeu que, finalmente, sua irmã tinha sido a solução, e não a razão, de um de seus problemas.


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