Aos treze anos, Saeko estabelecera uma política de ética: só apresentaria seus namorados para o irmão quando ele pudesse fazer o mesmo. Era, em teoria, para evitar que ele se sentisse “solitário e desprezado”, mas na prática deixava Tanaka mais nervoso do que grato. Preferiria ameaçar todos e estar pronto para bater nos que merecessem. Não que a irmã precisasse de ajuda para lidar com babacas, mas queria ajudar de qualquer jeito. Estava sempre disposto a entrar em brigas pelas pessoas que amava.

No final das contas, tinha a impressão de que o esquema beneficiava mais os namorados do que seu frágil coração. Nem todo mundo era forte o suficiente para dois Tanakas.

Havia a possibilidade de Saeko gostar de mulheres. Tanaka duvidava, porque ela era barulhenta e incapaz de manter segredos, mas estava pronto para surpresas no que dizia respeito a sexualidades. Ele, por exemplo, reverenciava Kiyoko-san com o entusiasmo habitual e mantinha os pôsteres de garotas no quarto, mas o espaço que EnnoTana (TanaEnno?) ocupava nos seus pensamentos era tão natural quanto o resto. Ennoshita não se encaixava no tipo que Tanaka achava que tinha, mas talvez desse para ter mais de um tipo.

Talvez todo mundo fosse um pouco gay. Talvez heterossexualidade não existisse. Talvez fosse uma grande pegadinha espalhada pelos adultos. Era bem fácil acreditar nisso depois de tudo o que Tanaka aprendera. Saeko e seus supostos relacionamentos heterossexuais não integravam suas preocupações desde AsaNoya. Ela poderia ter mostrado uma foto com o namorado, e Tanaka teria acenado sem ver e falado, “aham, claro, nee-san”.

Era mais difícil ignorar a evidência quando ela estava beijando sua irmã.

O queixo de Tanaka caiu. Aquela era última coisa que esperava encontrar na porta de casa - Saeko agarrada com um cara, com as mãos na bunda dele. Era a cena mais desnecessária que via no mês, e no dia anterior Hinata colocara a mão no abdômen de Kageyama e anunciara, com reverência, que era duro.

—Nee-san! – exclamou, horrorizado, traumatizado, traído.

Eles se separaram com um som molhado e Tanaka cogitou passar mal. O homem fez menção de se afastar, mas Saeko continuou com as mãos travadas, segurando-o no lugar. Ela olhou para Tanaka como se esperasse que ele fosse imaginário.

—Você chegou mais cedo. – acusou.

—Eu cheguei no horário de sempre! – protestou Tanaka, indignado que ela estivesse colocando a culpa nele. Se queria passar mais tempo beijando seu namorado, podia ter ligado avisando. Tanaka teria ficado longe, bem longe.

—Eu tentei avisar, Saeko-san. – falou o homem, por quem Tanaka sentiu uma sombra de simpatia até o rosto vermelho virar na sua direção. -Desculpe, Tanaka-san.

Tanaka o reconheceu apesar do cabelo bagunçado e de ele não estar vestido como um ladrão.

—Você! – apontou, mudando de acusado para acusador em um segundo, a voz cheia do mesmo terror que sentira ao ver os dedos de Saeko contraídos nas nádegas daquele conhecido que deveria ser desconhecido. -Você é o irmão do Tsukishima!

—Ah, você lembra de mim. – disse o Tsukishima mais velho, parecendo envergonhado e satisfeito. -Acho que me animei um pouco demais quando vocês ganharam da Shiratorizawa.

Um pouco, ele dizia. Ele abraçara Tsukishima soluçando o quanto estava orgulhoso e Tsukishima não escondera o sorriso com uma expressão azeda rápido o suficiente. Suga oferecera um lenço e ele recusara, o nariz escorrendo e os olhos vermelhos e um sorriso que rivalizava o de Hinata. Balançara os braços até o ônibus virar a esquina.

E agora Tanaka lembrava. De Saeko falando alguma coisa como “eu te levo pra casa, se você for sozinho vai dar de cara em um poste ou ser roubado”, dela rindo enquanto ele acenava para o ônibus, dela contando no jantar sobre como assistira ao jogo com “uma menina fofinha, dois caras e o irmão mais velho do seu companheiro de time alto”. Tanaka não prestara atenção, porque a maioria dos seus companheiros de time eram altos e ELES HAVIAM GANHADO DA SHIRATORIZAWA ESSA ERA A MELHOR COISA QUE JÁ ACONTECERA ERA O MELHOR DIA DA SUA VIDA ELE ESTAVA VIBRANDO TUDO ERA INCRÍVEL SUA CABEÇA DOÍA UM POUCO e era difícil de se concentrar em outra coisa.

Em retrospectiva, devia ter perguntado mais a respeito.

—O irmão do Tsukishima. – repetiu, com dificuldade para processar. Ele achava que estava pronto para qualquer coisa, que era um veterano de guerra inatingível.

Os olhares de Tsukishima prometiam violência desde o dia da confissão para Yamaguchi. Esperava-se que o namorado melhoraria seu humor, mas não, Tsukishima não conseguia relaxar quando não estava no controle. Tanaka achara engraçado e se sentira poderoso. Ah, tão imprudente. Outro Tsukishima se aproveitara da sua distração para dar o bote.

De repente Tanaka estava aliviado por não ter conhecido os outros namorados da irmã.

—Tsukishima Akiteru. – apresentou-se o vingador. O rubor subiu das suas bochechas para as orelhas, e ele, com os olhos baixos, murmurou: - Saeko-san, você pode me soltar, por favor?

Ela fez bico.

—Por quê?

—Para eu cumprimentar seu irmão! Porque estamos na frente do seu irmão! – disse, afobado, fazendo uso do senso comum e da decência, algo que Saeko costumava ignorar.

Contrariada, soltou-o. Akiteru pulou para longe no instante que lhe foi permitido e curvou-se para Tanaka.

—Sinto muito que você tenha descoberto sobre o meu relacionamento com a sua irmã desse jeito. – falou, soando honesto.

Tanaka achou que sua boca fosse abrir de novo. O Tsukishima que conhecia não pedia desculpas sem ser obrigado. Quem sabe o filho mais novo fosse a ovelha rude de uma família simpática.

Uuugh, não era isso que Tanaka queria fazer com a sua tarde. O plano era chegar em casa, tomar um banho, cair no sofá e deixar a TV ligada enquanto mandava mensagens para Ennoshita. Descobrir que o namorado da irmã era o irmão do Tsukishima e que ele era normal e educado era uma mudança muito dramática.

E aí. BOOM. Teve a epifania. Percebeu a parte mais surpreendente, maior do que conhecer quem sua irmã escolhera para apertar a bunda e passear, maior do que essa pessoa ser o irmão do colega de time com quem ele menos gostaria de passear.

Tsukishima Akiteru era do sexo masculino. E Saeko era do sexo feminino. E os dois estavam namorando. Heterossexualmente.

Heterossexualidade era real! Estava na sua família, no seu portão, na sua frente! Ele presenciara e fora péssimo. Não era uma piada que o mundo pregara por toda a sua vida; heterossexuais existiam.

O que significava que não havia uma força sobrenatural por trás da ausência de héteros no time, apenas uma coincidência insana, porque se fosse uma maldição ou um espírito o irmão de Tsukishima também teria sido afetado. Talvez ele tivesse mais de um tipo, como Tanaka, mas isso não importava. A relação heterossexual na qual se encontrava no momento já era mais do que Tanaka pensara possível.

—Ryuu, você está intimidando meu namorado? -perguntou Saeko, as mãos nos quadris. Akiteru estava inquieto sob a careta de Tanaka, com medo de não haver chance de se darem bem.

Tanaka se adiantou e abraçou Saeko, que ficou surpresa demais para reagir.

—Obrigado, nee-san. Obrigado. -fungou Tanaka, emocionado. Uma jornada completa.