Like a Rolling Stone escrita por MrsSong


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Se flopar nunca existiu.



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Eu tinha 15 anos quando meu mundo mudou. De uma forma bem Cinderella, de uma hora para outra eu era uma princesa de contos de fada, tratada com ares de realeza por uma coisa que eu nunca tive controle na vida: minha beleza.

Aceitei ser fotografada para provar que eu também era bonita, que eu também podia ser feminina e delicada se eu quisesse… Entrei num jogo sem ter aprendido todas as regras só para desafiar uma pessoa que nunca mereceu meu pensamento e tentar mostrar para outra pessoa que eu também podia ser uma opção.

Eu queria tanto mostrar que eu podia mostrar que eu era melhor que Amora que não pensei até muito tempo depois que eu sempre fui muito boa em tudo o que decidia fazer.

Menos forçar alguém a me amar.

Porém, naquela época eu ainda era uma menina boba que tinha renegado a própria feminilidade para ser aceita como um dos garotos por tanto tempo que tinha sido um milagre eu ter sido descoberta por um fotógrafo numa das sessões de Amora num parque… Acho que o da Cantareira.

Eu desejei tanto desafiar e debochar do estilo de vida dela que aceitei ser fotografada e aceitei brincar de ser modelo.

Ter que conviver com minha adorada colega de infância foi o preço a ser pago pela minha grande piada que por algum tempo não teria mais graça.

Eu era natural. Não precisavam de muito para que as fotos ficassem perfeitas… Num futuro não muito distante, me chamariam de Jean Shrimpton e eu riria falaria que eu queria ter sido tão bonita quanto ela foi e que a maior parte do trabalho duro era dos maquiadores, cabeleireiros e fotógrafo.

Mas, na adolescência, a oportunidade de ganhar dinheiro para ajudar em casa e conhecer lugares legais no Brasil e depois no mundo me estimulou a continuar num ramo que eu não queria estar.

Eu queria fotografar a natureza, as pessoas e os lugares… Meu portfólio de fotógrafa começou quando eu comecei a fazer biquinho para a câmera, como uma vez definiram o meu trabalho.

Engraçado pensar que todas as minhas grandes guinadas vêm de um desafio velado de outra pessoa, mas eu realmente tinha decidido voltar de vez para casa depois de anos pelo mundo e parar de brincar de princesa de cristal para uma câmera.

Eu quis ser real de novo, queria comer fritura sem uma voz reprovadora ao fundo, queria ver meu timão de verdade e não só notícias pela internet, queria andar na rua sem parecer impecável… Queria quebrar com o mundo da moda que era de Amora, que fingia me amar na frente das câmeras e me assustava essa facilidade em dissimular dela, mas não era o meu mundo.

Eu não sabia o que era o meu mundo. E queria voltar para o início para achar o meu mundo. O que eu era de verdade, a Giane que eu era debaixo das camadas de rímel e das roupas perfeitamente escolhidas.

 

 

 

Tudo que tivemos foi uma tarde num banco de praça e isso pode parecer um quase início de um romance clichê, mas não foi romântico porque nenhuma das pessoas envolvidas acreditava em romance. Acho engraçado que a mulher mais bonita que eu já vi na vida não queria ser bonita.

Ela estava fotografando e me lembrava tanto aquelas icônicas fotografias de Jean Shrimpton em Manhattan que eu não resisti em lhe dizer mesmo que fisicamente não fosse nada parecida, eu me lembro de sua risada ao me agradecer e dizer que, como não tinha mais nada a fazer pós sessão de fotos, poderia me dar alguns minutos de seu tempo.

Foi onde descobri que éramos compatriotas, o que fez com que os alguns minutos virassem horas.

— Então você decidiu se tornar modelo para implicar com uma modelo que debochou de você e você conseguiu uma carreira internacional maior que a dela? - me lembro de ter perguntado entre gargalhadas.

— Para você ver. Aprendi que eu não deveria fazer nada por ser desafiada por ninguém. - ela riu, balançando a cabeça.

— Ou deveria ser desafiada todos os dias.

— Não, obrigada. Os últimos anos foram o suficiente por uma vida.

— Ah, que isso! Ganhar o que você ganha para fazer biquinho para a câmera e ainda conhecer o mundo inteiro! - brinquei e ela se retesou no banco.

— Foi pensando que era só fazer um biquinho para a câmera que eu acabei aqui! - ela disse e eu acho que entendi que o quê me atraía a ela era o fato de ambos estarmos perdidos no mundo.

— Volta para casa, Jean Shrimpton. - disse e ela tentou me corrigir e dizer seu nome. - Não, vamos manter sem nomes. Se eu a encontrar novamente, você me diz seu nome.

Ela partiu logo após essa conversa e eu esperei nunca vê-la; por mais que a minha meio-irmã adotiva também fosse modelo, eu nunca convivia com Amora mais que alguns dias no ano se eu somasse tudo.

 

Nunca entendi direito como minha vida era tão cheia de gente e faltava tanto a ser preenchido. Quando eu nasci, minha mãe me entregou para o meu pai e sumiu no mundo, me forçando a crescer com a minha meio-irmã perfeita e a mãe fútil dela… Bem, até o divórcio do meu pai.

A louca da minha madrasta adotava para se expor na mídia, então acabei cheio de meio-irmãos adotivos. Uma casa cheia com lugares vazios à mesa.

Aquele vazio incomodava tanto meu pai que ele começou a passar muito tempo pelo mundo, logo eu estava seguindo o exemplo dele e sumi pelo mundo, mandando um eventual e-mail para minha irmã, Malu, e para meu pai.

O mundo todo para me encontrar e eu nunca pude. Nunca consegui entender como um lugar tão grande podia ser tão vazio de significados.

Malu me diria um dia que os significados somos nós que damos, mas até aquele ponto da minha vida, já tinha trabalhado por todos os continentes nos mais variados serviços para conhecer o mundo ao meu redor e entender o que Malu sempre soube.

Eu só vi significado num banco de praça numa cidadezinha da Espanha e foi o tipo de significado que me trouxe de volta para os braços da minha família.

E, até onde eu sabia, para longe de Jean Shrimpton.


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Notas finais do capítulo

Jean Shrimpton foi uma modelo famosa nos anos 60. Foi chamada de a modelo mais barata de todas por um fotógrafo porque todas as suas fotos ficavam perfeitas.



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