Minguante escrita por Leandro Gonçalves Nero


Capítulo 1
Capítulo 1 - Companhia


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal! Bem vindos a "Minguante", terceira curta narrativa que escrevo para um desafio do Café.

Neste mês, como já disse logo atrás, o tema foi Songfic de músicas nacionais. Bom, meus ouvidos não estão muito acostumados com músicas em português, então tive um pouco de dificuldades em encontrar alguma inspiração. Mas, para não enferrujar a escrita, decidi me arriscar.

Foi então que, para driblar essa dificuldade em encontrar alguma música nacional que me rendessem algumas linhas de história, eu recorri a aquele sentimento típico do brasileiro ou para quem se sente minimamente velho: a nostalgia.

Relembrando músicas de sucesso do começo dos anos 2000 (minha infância), encontrei o famigerado grupo Rouge...

...Calma, eu não escolhi Ragatanga.

O grupo tinha uma música - uma baladinha bem romântica - chamada Um Anjo Veio Me Falar. A letra, bastante bonita, embalava alguns relacionamentos juvenis naquela época. Logo, decidi usá-la para escrever um bonitinho clichê para este mês.

Achou a escolha inusitada? KK eu confesso que eu mesmo achei. Espero que vocês gostem do que irão ler (caso realmente leiam, claro) e, caso queiram ler mais, nos notas finais disponibilizarei os links das minhas outras duas oneshots escritas para desafios do café com letra.

Boa leitura e até logo, amiguinho!



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Repousavam sobre o muro dos mais belos amantes as finas flores damas da noite. O aroma, tipicamente adocicado, era levado pelo frescor da brisa noturna ao esbarrar das delicadas pétalas, testemunhando a entrega e a paixão. O sereno embalava os amáveis beijos e refrescava o ardor do sentimento. As luzes baixas da cidade iluminavam as brilhantes e, agora vazias, ruas de pedra, e os pássaros, já pousados em seus ninhais, tinham seu canto substituído pelas doces declarações e promessas de amor.

À sombra da realização do fascínio e da paixão, desolada estava enquanto presenciava os enamorados consortes. A Lua, enquanto alumbrava os meigos abraços, figurava única em um escuro céu sem estrelas, admirando a realização do amor a qual estava fadada a apenas sonhar. Minguante, declinava sobre a desilusão ao padecer em desesperança.

Sonhando em entender o coração, perdeu-se desejando novamente um carinho o qual nunca sentiu. Entristeceu-se ao imaginar jamais estar com aquele que sempre lhe aqueceu e iluminou as emoções, temendo nunca o deparar enquanto ainda desacreditava na perpetuidade do desencontro advindo do amanhecer. Esperava-o por todas as noites, do entardecer à alvorada, vigilando aprazíveis encontros os quais almejava para si. Tendo a companhia dos astros como amparo, presenciava se repetir a decepção em não se encontrar com o amado, mesmo o vendo, inúmeras vezes, surgir no outro lado à medida em que se põe em desalento.

Imersa em tristeza, pouco notou o pousar de um anjo em suas protuberantes curvas. Trazendo consigo a mais bela harpa – áurea e descomunal em comparação as delicadas mãos que lhe acariciavam –, se pôs a tocá-la ao passo que se recostava sobre a lívida luz. Lamuriosa, a meia-lua pouco se preocupou em entender a presença daquela rara figura, servindo-se do soar das cordas em melodia ao desconsolo. O cetim, que recobria o tímido querubim, mesclava-se ao ilusório fulgor da anfitriã e o ralo cabelo âmbar opaco parecia dançar em conjunto com o sopro dos deuses. Os olhos, fechados a procura de descanso e deleite, pouco se viam necessários na obtenção das mais admiráveis notas musicais, estas que, por um breve momento, pareceram ter sido notadas por aqueles logo abaixo.

Mantiveram-se assim, em harmoniosa companhia, sem interromper a melodia incorporada a charmosa sinfonia das cigarras. As palavras, evitadas em respeito ao íntimo e ao pessoal, pouco faziam falta tanto a lua quanto ao anjo naquele instante, já que aquela se resignava ao desconsolo e a desilusão ao passo que se dirigia ao seu leito sem vê-lo novamente, e esse, em distração, pouco via nela algo além de um tranquilo e gracioso repouso, sem perceber a tristeza que nela residia.

Envolvida nos braços do homem que amava, a dama invejada pela lua notou o entardecer junto ao amante. Em um beijo singelo de despedida, parecia não se preocupar com o amanhã, sabendo que aquele não seria o último encontro. Não satisfeito, o senhor a quem o coração dela pertencia a abraçou e enxugou seu rosto molhado pela garoa. Olharam-se antes de partirem por caminhos opostos, desaparecendo sob as sombras dos carvalhos adjacentes a medida em que se afastavam do lugar onde se amaram confidencialmente.

O temporário adeus testemunhado pela lua lhe aguçou a angústia. Entristeceu-se por eles, mas, como atestante dos mais encantadores encontros, sabia que a despedida valeria somente até o próximo se pôr do sol. Ela, por sua vez, nunca teria sequer a oportunidade de partir após uma noite de amor, tão pouco almejar estar com ele novamente sem nunca ter estado. Sem o consolo em ver a romance alheio, se colocou a chorar.

As lágrimas desceram por seu rosto e chegaram ao anjo que, em um movimento repentino, levantou-se ao sentir o molhar de seus cachos. A harpa, em desatenção, caiu ao soltar das mãos em susto, desaparecendo na longitude da altura em meio as nuvens e a neblina formada próxima ao amanhecer. A procura de seu precioso objeto, a amável figura fitou o que estava abaixo de si, apercebendo-se do que antes fora admirado pela lua. Indagou-se sobre o motivo de tamanha tristeza e questionou a si mesmo como não percebera tanto desalento. Ao entender o desencanto da lua, preocupou-se ao imaginar a inviabilidade de seu sentimento e, em compaixão, seguiu até próximo a ela.

Distante, no outro lado dos céus, irradiavam os primeiros raios de luz daquele que chegava para a vigília diurna, ofuscando, pouco a pouco, aquela que preocupou-se por toda a extensão da noite em um dia estar com ele. A lua, apercebendo-se de sua chegada, abriu os olhos marejados para poder vê-lo naquele breve flagrante.

Presenciando aquilo que notou ser contínuo, o anjo entendeu ser o alvorecer o mais próximo da lua realizar seu sentimento. Mais que tudo, também sabia que, somente agora, ela parecia perceber o utópico e inconcebível desejo o qual se prestou a acreditar. Entristecido, se recostou sobre ela novamente, abraçando-a enquanto acompanhava dado desengano.

Sem as cordas de sua harpa, o anjo entonou uma canção a medida em que, com seus delicados dedos, transcorria pelo ar na tentativa em obter imaginárias notas musicais. Acompanhado pelos primeiros gorjeios das aves que despertavam com o amanhecer, cantou deixando escapar por entre os úmidos lábios curtos versos de uma bela cantiga.

Nas estrofes, recebia o esclarecer com uma declaração em encarnação da lua, que o notava curiosa. Confessava ritmado quantas vezes com um beijo sonhou e, logo após, com um carinho que nunca sentiu. Olhou contente para a lua, esperando que ela tivesse notado seu empenho em demonstrar ternura e apoio. Em resposta, a lua entoou saber que um dia ele estaria lá, em um sonho lindo no qual em seus braços é onde ela quer estar.

Pouco a pouco, em companhia do mais novo amigo, a lua se pôs em seu leito, levando consigo a noite benevolente aos amantes e amores. O querubim levantou-se em despedida, beijando no rosto aquela que não queria mais ver sofrer.

Agora só, a lua não temeu continuar sozinha a cantiga e, esperançosa, entoou os últimos versos em um tom singelo de paixão e apreço. “Um anjo veio me falar”, sussurrou para si mesma em crença, “O amor chegou pra mim; Veio me mostrar que o sonho não tem fim; E não importa quanto tempo vai passar...”, e terminou, ao olhar para o horizonte pelo último instante, prometendo o esperar, mais uma vez, ao anoitecer.


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Notas finais do capítulo

Eis os Mistérios da Fé - escrita para o 3° Café com Letra, de tema Halloween e com nome de "Café Preto" : https://fanfiction.com.br/historia/656328/Eis_os_Misterios_da_Fe/

Insonte - escrita para o 6° Café com Letra, de tema Monstros e com nome de "Descafeínado": https://fanfiction.com.br/historia/656328/Eis_os_Misterios_da_Fe/

Espero vê-los novamente e até a próxima!