Como cães e gatos escrita por kelly pimentel


Capítulo 6
Sempre que você precisar




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Desço do táxi e caminho em direção à praia. Identifico Fábio de longe, ele está sentando numa roda de garotos. Só então percebo que aquela foi uma péssima ideia, no que eu estava pensando? Eu não poderia me aproximar daquelas pessoas, não no meu estado. Dou as costas e começo a voltar, até que escuto a voz de Fábio gritando meu nome. Quando olho na sua direção vejo que ele se aproxima correndo, suado, sem camisa. Fico ainda mais sem graça.

—Aonde você vai? – Ele pergunta finalmente me alcançando.

—Eu não sabia que você estava com amigos, sinto muito. Não acho que sou uma boa companhia no momento... achei que ia ser só você... – Percebo o que estou dizendo. Percebo que não é certo. Eu não sabia porque Fábio estava interessado em mim, talvez ele estivesse pegando a maior de todas as peças de todos os tempos, como vingança pelas nossas brigas na escola, mas algo me dizia que não era isso. Mesmo assim, eu não queria arriscar.

—Deixa de besteira. Vem cá. – Ele diz me puxando pela mão. – Eu não sei o que aconteceu, mas talvez você precise exatamente disso, conhecer gente nova, jogar conversa fora. Vem, eu juro que eles não vão te morder. Além disso, as meninas estão montando a rede de vôlei, como filha de um dos maiores nomes do esporte você deve ter algum talento.

—Claro. – Digo sorrindo. – O talento de quebrar os dois braços tentando sacar.

—Você topa ou não? – Ele pergunta ainda segurando minha mão.

—Tudo bem. – Digo soltando a mão de Fábio. -Mas eu posso andar sozinha.

Caminhamos até o grupo de amigos de Fábio que param de conversar quando nos aproximamos e nos observam curiosos.

—Pessoal, essa aqui é a Manuela. Ela estuda comigo no Dom Fernão.

—Muito prazer, Tiago. – Um menino moreno de olhos castanhos diz ficando de pé e me dando dois beijinhos. – Estou à sua disposição, qualquer amiga do Fábio...

—Ok... um pouco demais. – Fabio diz. – Pode voltar pro seu lugar. – Todos riem e Fábio me apresenta ao restante dos garotos. – E tem todo aquele pessoal ali jogando, mas essa aqui é a turma da minha antiga escola.

Fábio se senta e faço o mesmo, cruzando minhas pernas na areia da praia.

—Então, Manu... – Tiago começa. – Nos conte sobre como Fábio tem se saído nessa nova escola.

—Eu não sou a pessoa mais indicada pra falar. – Respondo olhando pra Fábio.

—Claro, juiz e parte interessada. Sei como é. – Ele diz com um sorriso malicioso. Só então percebo que ele é bonito, um pouco mais baixo que Fábio, porém um pouco mais forte. Seus músculos em exibição na regata.

—Não. – Respondo. – Somos só amigos.

—Claro que são. – Uma voz de garota diz, levanto a cabeça seguindo a voz e percebo que ela está por trás de mim. – Fábio sempre gostou mais das loiras. – Ela afirma me encarando de cima. – Não olho pra Fábio, mas posso sentir que seus olhos repousam em mim.

—Larissa, essa é uma amiga do Fábio lá da escola nova. – O garoto cujo nome acredito ser Carlos diz.

—A amiga do Fábio tem nome? – Ela questiona erguendo as sobrancelhas.

—Manuela. – Respondo.

—Prazer Manuela. Quer jogar com a gente? – Ela aponta pra rede de vôlei armada.

—O pai da Manuela é.... – Fábio começa a dizer.

—Contra vôlei, pra mim pelo menos. – Respondo interrompendo-o. – E além disso eu sou muito ruim. – Completo.

—Tudo bem. – Ela diz. – Só vim buscar a bola.

Assim que ela se afasta os garotos jogando futebol gritam comemorando um gol. “Próximo!”, alguém fala e os meninos se organizam.

—Sua hora de tirar time Fábio. – Carlos diz.

—Você pode ir no meu lugar, eu vou ficar fazendo companhia pra Manuela. – Fábio afirma.

—Vai colocar um perna-de-pau no seu lugar? – Felipe pergunta.

—Eu vou ficar bem. – Digo olhando pra Fábio. – Vai lá, você sabe que eu sei me virar.

—Como sei. – Fábio responde com um grande sorriso. Percebo que seus olhos ficam mais estreitos quando ele sorri e que uma covinha se forma no lado esquerdo de seu rosto. Mas porque inferno estou notando essas coisas?

—Eu cuido dela. – Carlos diz.

—Porque quando é ele que fala essas coisas ninguém repreende? – Tiago pergunta enquanto os meninos caminham pro jogo.

—Porque você é um escroto. – Alguém responde.

Me viro pra poder assistir ao jogo. Fábio não é ruim. Observo que a garota loira, Larissa, o observa.

—Eles foram namorados. – Carlos diz como se pudesse ler meus pensamentos.

—Ela é bastante bonita. – Digo.

—E bastante louca. – Ele diz. – Meteu o Fábio em cada furada.

—Que tipo de furada? – Questiono.

—Ih, é melhor ele te contar se quiser mesmo saber. Eu não deveria nem ter mencionado. Mas a única coisa que eu posso dizer é que ela é o tipo de pessoa que gosta do caos.

—Vocês se conhecem tem muito tempo? Você e ela?

—Ela é minha irmã. – Ele responde com um pequeno sorriso. Fico constrangida e ele percebe. – Não se preocupe, sabe Manuela, às vezes, e isso leva tempo, nós precisamos saber reconhecer quando uma pessoa que amamos não é uma boa pessoa. – Aquilo me atinge, penso em Bárbara, em tudo que ela me disse mais cedo, no modo como os olhos dela estavam cheios de ódio.

—Acho que esse é um conselho muito bacana. – Digo. – E um conselho que eu precisava ouvir.

—Isso não significa que eu não ame a minha irmã, apenas que eu sei o que posso e o que não posso esperar dela, que eu sei do que ela é capaz.

—Droga! – Ouvimos um dos meninos gritarem. Volto minha atenção ao jogo e percebo que um dos meninos está caído na areia, Carlos levanta e vai até ele. Faço o mesmo, assim como as meninas jogando vôlei do outro lado da orla. Felipe fica de pé com ajuda dos colegas.

—O filho da mãe fez de propósito. – Ele diz irritado.

—Não fiz nada. Cê tá pensando que isso aqui é o que? A final da libertadores? Eu apenas entrei com tudo. Sinto muito.

Depois da confusão dissipada falta um jogador no time de Fábio e eu me ofereço, existem risadas iniciais, mas eu não mudo de ideia, se eu deixasse de fazer algo sempre que um garoto desdenha de mim por ser uma garota, eu não estaria do Jiu-jitsu.

Os garotos acabam topando e entro no jogo, ganhamos de dois times e depois acabamos perdendo, mas numa partida bastante acirrada. Voltamos pra perto de Carlos e Felipe, o segundo está colocando gelo na coxa que parece menos vermelha agora.

—Você deveria vir sempre. – Tiago diz. – É melhor que o Felipe, talvez até melhor que o Fábio. – Ele diz. Não consigo evitar o sorriso.

Depois de um tempo nos despedimos de todos e deixamos a praia. Caminhamos um pouco aproveitando o fim da tarde.

—E ai? Ajudou? – Fábio pergunta.

—Muito.

—Vai me contar o que aconteceu?

—Agora parece meio bobo. Na verdade, acho que eu preciso te pedir desculpas por ligar assim, no meio do dia num domingo.

—Manuela, eu falei que você pode contar comigo, não falei? E não é só porque... bem, você pode mesmo. – Ele diz. Sinto meu rosto queimar ao preencher os vazios, o não dito daquela frase era tudo que eu estava tentando evitar. – Você brigou com seu pai?

Dou uma risada de deboche.

—Como se meu pai se importasse o suficiente pra isso. Claro que ele briga comigo, se for peitar o meu tio ou se eu for até ele com alguma coisa, mas ele nunca presta atenção em mim de forma voluntária. Mês passado eu fiquei doente e meu me levou para o hospital, claro, mas depois disso me deixou sozinha em casa de molho. Meu pai de verdade é o Tio Caio, ele sim se importa. Se ele estivesse aqui eu nem teria te importunado, mas ele viajou com a dupla.

—Eu sei. E eu estou feliz que ele esteja viajando. – Fábio fala me olhando de lado.

—Na verdade, foi a Bárbara. Ela me disse umas coisas que nem vale à pena repetir. Sobre a Joana, sobre meu pai, sobre mim mesma.

—Você não deveria dar tanta atenção ao que sua irmã fala. Ela tá cega de ódio por causa da Joana, as coisas que eu escuto sobre como aquela garota trata a Joana... – ele para de andar e me encara. – Sinto muito, não deveria falar da sua irmã assim.

—Não tem problema. – Digo. – Sabe, seu amigo, o Carlos, ele me disse algo que fez todo sentido. Ele disse que, às vezes, precisamos abrir os olhos mesmo sobre as pessoas que amamos.

—O Carlinhos é um cara esperto. Nunca me deu um conselho que pudesse me arrepender de seguir. – Você quer comer alguma coisa? Tomar um mate?

—Não, obrigada. Acho que eu só quero ir pra casa agora Fábio. Mas eu posso ir sozinha.

—De jeito nenhum. – Ele diz.

Já está de noite quando chegamos na frente do meu prédio, conferi o celular. Chamadas não atendidas da Bárbara.

—Eu adorei a tarde. – Digo. – Adorei conhecer seus amigos. Eles são engraçados e interessantes.  

—São sim. E eu acho que o Tiago tá apaixonado por você. – Fábio diz. – Mas ele vai ter que entrar na fila.

—E eu acho que a sua ex-namorada ainda gosta de você. – Falo encarando-o.

—Não gosta não. E mesmo que gostasse isso não importa. Eu teria que estar maluco pra voltar com ela.

—O que ela fez? – Pergunto.

—É um assunto chato. Talvez outro dia. Boa noite Manu. – Fábio diz se aproximando, ele parece me desafiar com a proximidade de nossos rostos e depois deposita um beijo no meu rosto.

—Fábio.. – Digo puxando-o pelo braço quando ele começa a se afastar. – Obrigada, por tudo.

—Sempre que você precisar. – Ele responde piscando. – Sempre mesmo.


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