Subiu as escadas no fundo da casa com uma sensação estranha de ser observada, mas como sua casa não possuía janelas além das amplas do andar de cima localizadas da biblioteca que estavam completamente cobertas por tecidos, não havia como ser observada, mesmo porque feitiços não eram permitidos nem mesmo pelos capangas pelo que ela sabia para algo vê-la através das paredes.

Quando chegou ao andar de cima olhou diretamente para as janelas, a escada dava diretamente para o corredor, e esse por sua vez terminava no arco de gesso que levava a pequena biblioteca muito precária que era dividida entre os interesses dela e do pai. Com apenas uma estante pequena dele e uma poltrona verde musgo que ele adorava em seu lado que era o leste e do lado dela haviam mapas com constelações, livros que ela nunca havia terminado de ler porque ela havia crescido e perdido o interesse neles, e incontáveis desenhos que ela fazia sentada olhando pela janela quando criança pendurados pela parede leste. Mas ela não tinha vista de nenhum dos lados de onde estava, não teria coragem de olhar mesmo que tivesse, tudo que conseguia ver eram os panos escuros apressadamente amarrados nos trilhos brancos das janelas que pegavam quase toda a parede da parte de cima da casa, onde eram para conter cortinas, mas nunca houve nenhuma, agora os lençóis que ela colocara lá, pelo menos três de cada lado, não sairiam dali tão cedo.

Só quando sentiu aquele pequeno ponto de vibração pulsar mais forte em seus sensores internos que voltou a si, indo para seu quarto à direita, colocou a mão na maçaneta e olhou por cima do ombro para o quarto a frente do seu sentindo um arrepio na nuca, e virou-se encostando as costas em sua porta fria e olhando com firmeza para a porta a frente. A casa estava começando a se iluminar fracamente do lado de dentro, logicamente as casas não funcionavam mais como antes já que o sol não brilhava com tanta intensidade e a luz noturna interna dependia da contenção de luz durante o dia, mas conseguia ver um fraco tremeluzir vindo de dentro das paredes, começando a se formar.

Deu passos incertos em direção ao outro lado do corredor, o coração batia dolorosamente no peito se lembrando de quantas vezes havia chorado baixinho encostada a esta mesma porta durante a noite, pois não queria que seu pai a visse chorando mas estava com medo demais para voltar ao seu quarto. Abriu a porta, estava tão familiar quanto nas outras vezes, a cama de casal azul escura no centro do quarto com os pés em direção à porta, um guarda-roupas desgastado do lado esquerdo e um quadro pintado a mão a direita de uma paisagem estranha que ela nem sequer sabia o significado, apenas achava que era uma paisagem, mas não tinha tanta certeza, as vezes parecia abstrato.

Fechou a porta e foi em direção a cama, deitou-se delicadamente em baixo das cobertas, movendo-se o mínimo possível, ainda sentia seu cheiro ali bem enfraquecido, mas conseguia sentir a mistura familiar de pinha com sândalo, tão reconfortante e ao mesmo tempo tão distante. E assim, tentando não se mover para não estragar a lembrança, adormeceu incomodada, como há muito não se sentia.