Cosa Nostra escrita por Ella


Capítulo 1
Capítulo I - In My Veins


Notas iniciais do capítulo

Eu já poste essa fanfic, entretanto resolvi fazer algumas correções e pequenas mudanças e assim postá-la de novo.



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Nothing goes as planned

Everything will break

People say goodbye

In their own special way

All that you rely on

And all that you can fake

Will leave you in the morning

Come find you in the day

O clima estava pesado na catedral do cemitério, e se não fosse em pelo inverno nova-iorquino Marlene poderia jurar que até mesmo a natureza se despedia de forma silencia de Carlo Gambino. Aquele era o líder da máfia estadunidense, considerado mais poderoso que o próprio prefeito e que dirigia muitos negócios ilícitos de forma discreta.  Seu pai, que trabalhava a anos como advogada da família, havia deixando-a sentada no ultimo banco da igreja ao lado de Lily e ambas usavam vestidos pretos e seguravam terços por entre as mãos.

Lene olhou para o lado e viu que a amiga tinha os olhos fixos na santa que estava no altar. Pensou em como se sentia desconfortável ali, cercada por pessoas que se conheciam por um único motivo. Todos estavam calados e então se levantaram quando o caixão do grande chefe da máfia italiana passou pelos portais da capela. Ave Maria começou a soar sombriamente no ambiente. Era um risco aquele grande grupo de mafiosos reunidos todos no mesmo lugar, entretanto o respeito ao chefe da Cosa Nostra era maior. Havia boatos que a polícia estava fazendo vista grossa ao encontro.  

Lily segurou o terço com força quando o padre começou a falar. Todos já estavam sentados e ela tentava manter o olhar firme, encarando o a figura de Virgem Maria com intensidade. Seus pais estavam sentados mais a frente, juntos com o senhor McKinnon. Ela e Marlene puderam ficar atrás, não tinham que estar ali obrigatoriamente. Alisou o algodão do vestido preto-azulado e colocou a franja atrás da orelha, olhou para Marlene que estava séria e encarava a imagem da virgem.

— Já está quase terminando. — Marlene sussurrou para a amiga.

Meia hora depois todos já tinham saído da igreja e as duas garotas ainda estavam sentadas esperando que os pais aparecessem. Elas sabiam que não era recomendado que ficassem perambulando no meio daquele povo.   

— Acho que vamos nos mudar. — Lily falou para a amiga enquanto vestia o casaco.

— Você também? Meu pai vai abrir uma clínica em Little Italy na próxima semana e segundo ele fica mais viável se nos mudarmos para o Upper East Side. — Marlene encarou amiga que balançou a cabeça negativamente.

— Não sei se é viável ou não Lene. Não acha estranho que estamos deixando Manhattan logo após a morte de Don Carlo? Meu pai acha que é bom irmos para Greenwich Village, já que segundo ele temos mais conhecidos lá. Mas eu não me lembro de nenhum conhecido que more lá. — Lily olhou para a amiga tristemente e logo um senhor idoso entrou pela porta lateral vindo em direção as duas garotas.

— Lily Evans e Marlene McKinnon eu suponho. — Ele encarou as duas e ambas balançaram a cabeça positivamente. — Muito bem meninas, um dos meus rapazes vão leva-las em segurança para casa.

As duas garotas apenas concordaram e seguiram o homem. Se havia algo que tinham aprendido desde cedo é que jamais deve-se questionar um dos pertencentes da família. Lily amarrou o lenço em volta do pescoço e sentiu os pelos da nuca se arrepiarem quando ficou frente a frente com Regulus Black. Aquele era um dos soldados de confiança de Scacca, o líder da família Bonanno, e não hesitaria em tirá-las do caminho se fosse necessário.

— Tenho ordem do senhor McKinnon para levar as duas até a sede da família. Parece-me que a família Genovese está lá. E tenho a impressão de ouvir sinos tocarem. — Ele ergueu as sobrancelhas para Lene que o ignorou. Mas ao mesmo tempo em que a morena fez pouco caso da fala do rapaz, Lily ficou irrequieta. Sinos tocarem era um sinônimo de casamento. E não estava nos planos dela se casar com um mafioso.

Marlene e Regulus haviam sido criados juntos até a morte fatídica da mãe da jovem. A verdade é que a morena se lembrava dele como um garoto adorável, não havia o olhar frio e muito menos a áurea de morte que agora rondava o jovem. Regulus na verdade era o garoto de ouro da família Black, muito inteligente e sempre disposto a fazer o que fosse preciso para que a família o notasse. Entretanto, ele era o caçula, o mais novo, o menino da casa. Era esperado que ele seguisse um caminho bem diferente daquele, já que seu irmão mais velho era que herdaria os negócios da família.    

Lily tentou se manter tranquila, mas apenas o fato de pensar em estar no mesmo ambiente que os assassinos mais frios da máfia ítalo-americana, fez seu sangue gelar. Ela conhecia alguns deles por nome e aquilo já era o suficiente. Ela não queria conhecer os rostos também. O trajeto até a residência no subúrbio de Little Italy foi rápido e logo as duas desceram em frente ao quartel da família Bonanno.

A morena foi à frente da outra jovem, logo atrás de Regulus que cantarolava o refrão de uma balada italiana. Lily parecia apreensiva, sequer sabia como devia agir. Ela podia sentir suas mãos tremerem levemente e um camada de suor se formar em seus dedos. E antes que ela pudesse fazer qualquer outra coisa à porta da frente se abriu. As duas sabiam que agora não tinha mais volta.

James parecia tranquilo depois de tomar uma dose de conhaque escocês que Sirius lhe serviu no bar na família. Ele e o outro rapaz logo entraram na sala principal. Seus olhos então se mantiveram sobre o rosto, até então desconhecido, de Lily Evans. A jovem ruiva, de expressivos olhos verdes era a única filha do médico que cuidava da família há muitos anos. A garota era jovem demais para estar ali, ele reconheceu. Parecia um cordeiro acuado diante de um lobo feroz. Ele pôde notar a senhora Evans se aproximar dela, mas isso não a deixou mais tranquila. Ela ainda tinha o terço em volta do pulso e abaixou os olhos quando percebeu que era analisada. Uma vermelhidão característica tomou conta de sua fase.

Sirius sorriu ao olhar para a garota que estava estática no umbral da porta da sala. Ela exalava uma dose contida de pureza e rebeldia, ah sim, a rebeldia estava muito bem marcada naqueles olhos amendoados . Lembrou-se de tê-la visto poucas vezes, todas elas em festas onde Regulus  aparecia dançando com a jovem. Marlene McKinnon era como um diamante teria que ser lapidada para ficar da maneira como ele queria. Ergueu as sobrancelhas para ela quando a mesmo o encarou com intensidade.

— Senhoritas, é muito bom vê-las depois de tanto tempo. — Victor Rosier as encarou de onde estava. Lily ainda tinha a cabeça baixa, mas Marlene o encarava. O homem gostaria de conhecer as duas garotas que eram até então incógnitas para qualquer um naquela sala. Todos já tinham ouvido falar como ambas eram protegidas pelos pais, foram até mesmo mandadas para estudar fora do país nos últimos anos. Não era novidade para ninguém que a Cosa Nostra podia representar muitos perigos a todos os envolvidos naquele mundo. Mesmo que no caso do pais das jovens fossem simples trabalhos de assistência médica e jurídica.

— É um prazer revê-lo senhor Rosier, lamentamos a ocasião em que nos encontramos. — Marlene respondeu com a voz baixa e suave. Ela sabia que deveria controlar o gênio naquela sala. Até porque o soldado fiel do líder da família não era conhecido por ter grande paciência. A morena se lembrava de todas as vezes que seu pai fora chamado para cuidar do filho rebelde de Rosier que vez ou outra era surrado pelo pai. E ela se lembrava também dos muitos homens que ele matara para proteger a família.    

Foi quando o barulho de sapatos batendo contra as escadas chegou até a sala. Ambos os pais das garotas entraram no ambiente e Lily respirou fundo quando sentiu o braço do pai em volta de si. Ela queria poder sentir de volta a proteção que o homem sempre representou para ela, ela queria poder ter a certeza que tudo ficaria certo, que a partir daquele momento tudo estava bem.    

— Fiquem longe dela. Vou fazer tudo o que pediram, mas não se aproximem da minha filha. — John Evans puxou a filha para trás de si e Lily sentiu o cano frio na cabeça. Um arrepio desceu por sua coluna e ela se sentiu incapaz de mover qualquer músculo. Aquilo não deveria estar acontecendo com ela. Ela encarou o olhar amedrontado de sua mãe e sentiu seu rosto perder toda a cor.   

— Você não vai dar mais nenhum passo doutor Evans, é isso ou a cabeça da sua filha explode e suja toda nossa sala. –A voz era fria, cortante e intimidadora. Ela estava diante de um dos homens mais frios da família Bonanno e conhecia o longo histórico de violência de Victor Rosier. Ele encarou a jovem e olhou para as paredes do local. — O senhor sabe que não seria bom perder toda a reforma da sala, além de saber que usamos um papel de parede muito caro. Vamos levá-los lá para cima agora. — A voz de Rosier era baixa e autoritária e Lily então sentiu Regulus segurá-la pelo braço. Ela foi puxada na frente do pai e ainda sentia a arma apontada para si. Um vacilo por parte de John e seus miolos iriam parar nos quadros Monet. Seus passos estavam vacilantes e ela tentava se manter atenta para não deixar seus pés tropeçarem um no outro. Os olhos de sua mãe estavam cheios de medo e a mulher tinha dois homens a sua volta também.   

Lily foi empurrada para dentro de uma sala superior e seu pai sentou-se ao seu lado. Ela não sabia o que estava fazendo ali e tinha certeza que aquele não era seu lugar. Ela balançou a cabeça negativamente, se negando a acreditar que seu pai estava mesmo metido nos negócios daquela gente. Não podia ser, John Evans jamais a colocaria em perigo. Era ele quem tinha a obrigação de manter a família sã e salva. Ele não deixaria que acontecesse a ela o que aconteceu com sua irmã anos atrás.  

— Parece que não adiantou muito deixar Lily longe não é John? Por que resolveu traze-la de volta agora? – Victor a olhou e sinalizou para que abaixassem a arma. Ele tinha acendido um charuto e soltou uma baforada de fumaça no ar. Seus olhos encaram a figura pequena de Lily, encolhida sobre a poltrona de camurça.

— Lily vai para a faculdade no próximo ano, estudar medicina na Penn. — John parecia realmente arrependido de ter se envolvido com eles. Não queria que sua única filha corresse perigo nas mãos daqueles marginais. Ele não podia perder mais uma de suas meninas. Por Deus, ele havia prometido a sua esposa que protegeria a garota.  

— Acredito que mudará seus planos em relação a isso. Você sabe demais para um simples médico da família. — Victor respirou fundo e seus lábios formaram uma linha reta sobre o rosto cansado.

— Temos outros planos para sua filha. — Charlus Potter entrou na sala e ocupou a cadeira atrás da mesa de mogno e madeira. Lily não se lembrava de sentir tanto medo de uma pessoa como sentiu ao encarar o Don da família Genovese. Sentiu seu estomago dar voltas e encarou o chão. Aquilo não estava acontecendo com ela. Agora todas as certezas invadiam sua mente. Não tinha volta, ela estava mesmo perdida diante daqueles homens.  

— Não a envolvam nisso, ela não sabe de nada... — John tentou falar, mas logo dois brutamontes surgiram e o seguraram na frente de Potter. Ele estava erguido a bons centímetros do chão e os olhos do líder da família o encaravam curiosos.  

— Mas você sabe Evans, sabe mais do que deveria. E eu sei que você daria sua vida pela a da sua filha. Eu estou me cansando de agentes se arriscando para entrar na Cosa Nostra, estou entediado com essas tentativas fúteis de mandar todos nós para a cadeia. E não vou deixar que você estrague tudo. Não vamos desmoronar sem Gambino. — Charlus ficou em pé, e a garota de cabelos acajus se encolheu na cadeira. O homem tinha uma aura medonha e todo seu corpo tremeu quando notou que os olhos dele a analisavam.

— Queremos a garota. — Victor olhou para Lily e Regulus arregalou os olhos. Tudo bem, ele não tinha muito sentimento, mas condenar Lily a pagar pelos pecados do pai não era a maneira certa de se concertar as coisas. E porque matar uma inocente? Aquilo só pioraria a situação.

— Não podem matar uma inocente, do que iria adiantar? — John encarou Potter e o homem sorriu. Charlus imaginou como aquilo seria fácil, associar sua imagem com a de John Evans tiraria de cima de si toda e qualquer imagem de corrupto. Lily era inocente, parecia doce e jamais faria algo para deixar os pais em risco. Ainda mais depois do que ocorreu com a irmã.

— Não vamos matá-la. Tenho planos brilhantes para sua doce garota. — Ele se dirigiu a Lily, encarou-a e a ela tremeu. — É muito bonita, sabia senhorita Evans?

— Obrigada senhor. — Ela fitou o chão sentindo o rosto enrubescer. Ela não era boba o suficiente para achar que estava ganhando aquele elogio assim, de graça.  

— Vou direto ao ponto senhorita. Como você já deve ter visto nos jornais, sempre me acusam de crimes horríveis. Coisas que meus homens precisam fazer para manter a ordem nos negócios e bem por mais que eu tente não consigo me livrar desse estigma. Mas pensei que talvez uma família como a sua associada à minha por meio de um casamento possa me ajudar. Com o anuncio de um noivado todas as atenções se voltariam para a adorável Lílian e me deixariam em paz para colocar ordem nos negócios. — O homem sorriu e a ruiva encarou-o horrorizada demais para expressar qualquer reação.

— Pensei que amasse Dórea. — John o afrontou perplexo.

— O quê? Mas é claro que eu amo minha esposa. — Foi quando ele encarou uma ruiva perplexa e então se apressou a explicar. — Não é comigo que você vai se casar. Eu tenho um filho e acredito que vocês dois formariam um belo casal. Imagine seu rosto em todas as famosas revistas, vivendo em um ciclo social seleto. Isso é o que muitas garotas da sua idade sonham.

Ela pareceu ficar um tanto desesperada, a verdade é que Lily estava assustada o bastante para sequer expressar qualquer palavra. Ela tinha planos para si e ninguém ali estava se importando com ela. Ninguém em nenhum momento pediu sua opinião sobre um maldito casamente arranjando. Ela estava sendo tratada como uma mercadoria de tratado de paz. Mas seu pai segurou-lhe o pulso antes que pudesse se levantar. John sabia que não era necessária muita coisa para irritar Charlus Potter.       Ele já tinha perdido uma filha e não estava disposto a perder outra da mesma forma.  

— Lily, vamos embora, você precisa descansar. — O senhor Evans a puxou da cadeira delicadamente e colocou-a a sua frente. — Vamos esperar Dórea para o chá amanhã. Lily vai gostar de conversar com ela sobre o casamento.

A ruiva perdeu a cor e sentiu-se com uma imensa vontade de chorar. Lily não sabia o que deveria fazer naquela situação. Seu coração se apertou e por alguns momentos ela cogitou estar em um sonho ruim. Mas não, aquilo tudo era real demais. Ela então fez a única coisa que sabia fazer melhor: se limitou a sorrir polidamente e sair com passos leves. Mas dentro de si ela procurava por alguma saída, estava se sentindo tão fraca que não sabia como não caiu dos degraus da escada.

Marlene já estava impaciente dentro do escritório de Charlus Potter. Odiava ter que esperar. Odiava que alguém achava que podia trata-la como marionete.

— Marlene McKinnon. Um belo nome para uma bela garota. — Um homem com cerca de cinquenta anos adentrou a sala e a morena ficou surpresa por não ser o chefe da família Lucchese — Sou Alfred Black.

— Sou Marlene, mas o senhor parece saber disso melhor do que eu. — A jovem o encarou e Black se surpreendeu com a ousadia que ela tivera. Será que ninguém a alertara sobre quem ele era?  

— Creio que seu pai já deve ter lhe contado sobre ele ser um dos advogados da família. — O homem sentou-se ao lado contrário à mesa que ela, e acendeu um charuto. — Não é bom que fique se proteção. Lembra-se do que houve a sua mãe? Aquilo não teria acontecido se seu pai houvesse aceitado uma aliança conosco antes.

A jovem sentiu uma pontada no dentro de si quando Alfred citou o incidente ocorrido com sua mãe. A ferida causada pela morte prematura da mulher ainda estava aberta. E seu pensamento vez ou oura vagueava até o dia do acontecido, muitos anos antes.

— Marlene, você não precisa fazer nenhum acordo com eles. — Seu pai segurou seu pulso com firmeza e a encarou.

— Vai deixar seu bem mais precioso em risco, senhor McKinnon? Marlene é como um belo tesouro sem dono que está a fácil alcance. Deixá-la sozinha é como entregar o mapa do tesouro aos piratas e dar-lhes as coordenadas. É como se ela possuísse um alvo para misseis em plena guerra nuclear. — O homem soltou uma baforada de fumaça no ar e Lene olhou para a janela atrás dele. Lá fora estava toda a liberdade que ela sempre ansiara. Todos os seus sonhos estavam esperando por ela.  

— É muito simples o nosso acordo. Alfred tem um sobrinho, Sirius, ele é brilhante. Acredito que uma esposa como Marlene tiraria de cima dele qualquer suspeita do envolvimento da família Black com a máfia. Fecharíamos o negócio com o Lord mais rápido. — Charlus Potter surgiu por entre as sombras e encarou a jovem. A morena sentiu uma fina linha de suor escorrer por sua coluna vertebral. Ela conhecia muito a bem a reputação do chefe da família Bonanno. E não era das melhores.

— Vocês não têm o direito de fazer o que querem com a minha vida. São as minhas escolhas, e eu não vou manchar o bom nome dos McKinnon com um bando de... — Ela não conseguiu terminar sua fala, pois agora um cano de revolver estava apontado para a cabeça de seu pai. Seu corpo ficou imóvel e seus olhos encararam o homem a sua frente. Ele não estava brincando.

— Você não entendeu senhorita McKinnon. Vai se casar com Sirius em seis meses, quer você queira ou não. E enquanto isso, você dois serão um belo casal ítalo-americano. Não ouse sonhar em passar por cima das minhas regras. Não sabe do que sou capaz pequena criança. Ouça meu conselho e viverá. — Potter estava imponentemente à frente dela. Encarando-a friamente. Ele havia assumido a máscara de assassino que ela sempre soubera que pertencia a ele.  

— Espero Sirius para jantarmos todos no Plaza na próxima sexta-feira. — Marlene encarou seu pai. Ela sentia-se fraca e descrente ao ouvir tais palavras saindo da boca do homem que sempre a protegera. Ele estava agora a entregando aos lobos com plena consciência do que fazia. Ela encarou o pai, mas o homem não a olhou nos olhos.

Ambas as jovens desceram as escadas de forma automática.  Lily tinha o olhar perdido quando encarou a mãe que a apertou em seus braços e beijou os cabelos da filha. E Marlene sentia que pela primeira vez em sua vida, obedecer sem questionar talvez fosse muito mais seguro e consciente.

A volta para casa foi estranha. Foi vazia para Lily. Sua mãe estava calada e a jovem reconheceu o olhar de tristeza e perda da mulher. Era o mesmo que ela recebera quando a encarou na manhã em que a polícia foi até a casa da família notificar sobre o acidente que Tunny sofreu. Os olhos estavam opacos, sem vida e sem o brilho costumeiros que fazia Lily acreditar que o mundo podia ser um lugar melhor. E o silêncio de sua mãe era perigoso, ele trazia de volta os fantasmas de uma época que a jovem preferia esquecer. Noites escuras, chuvosas e solitárias. A casa havia ficado vazia nos dois anos seguinte a morte da filha mais velha, quando a senhora Evans fora levada para uma casa de repouso. Vazia porque sem o jeito espirituoso e alegre da mulher, Lily fora mandada para um colégio interno longe de toda aquela dor.

Ela se recolhera em seu quarto assim que chegou em casa e mesmo com a porta fechada ainda pode ouvir a voz alterada de sua mãe. Ela não iria suportar perder outra filha.

— Você me prometeu que ela estaria segura! Eu não vou aguentar perder a Lily também! Eu não posso perder mais uma filha. — A mulher estava furiosa e sua face era tomada pelas lagrimas.

— Eu juro que eu... — John tentou responder a esposa, mas ela estava furiosa demais para aceitar qualquer justificativa.

— Eu te disse para irmos embora desse lugar, podíamos ter voltando para Londres e a Lily estaria bem! E eu ainda teria a Petúnia! Eu ainda teria as duas! — Ela chorava descontroladamente enquanto Lily estava sentada contra a porta, sentindo lagrimas quentes rolarem por seu rosto. — Eu ainda teria as minhas duas filhas John! As minhas meninas ainda estariam nessa casa.

John Evans sentia-se culpado. Culpado pela dor de sua esposa, pelo acidente da filha, por colocar Lily em perigo. Deus, ele havia vendido sua alma para o Diabo e parecia que nunca iria conseguir reavê-la. Ao encarar a imagem de sua esposa frágil, chorando compulsivamente, ele soube que não podia perder mais uma filha. Ele não podia deixar que Lily entrasse naquele mundo. Uma vez que ela estivesse ali, não havia mais volta.

O retorno para a casa da família McKinnon foi dolorosamente silencioso. Não que Marlene esperasse ouvir alguma coisa de seu pai. Desde a morte de Marianne a comunicação dos dois se resumia a rápidas trocas de palavras sem grande importância.

Para Matthew, os olhos azuis brilhantes de sua filha eram um eterno lembrete da vida que sua esposa não pudera desfrutar ao lado da família. E ele havia prometido a ela, olhando em seus olhos, que protegeria a menina. Ele havia jurado que nada de mal aconteceria a aquela garota. Para ele havia certas promessas que eram muito mais sagradas que qualquer coisa que acontece em um tribunal de justiça, ele não se importava com a quantidade de Bíblias em que já tinha apoiado sua mão.  E agora parecia que nada do que tinha feito valera a pena.

— Eu sinto muito por ter falhado Marlene. — O homem encarou os olhos distantes da filha e ela abaixou cabeça. — Talvez se eu tivesse te levado para casa provavelmente você estaria bem agora.

Marlene sentiu seus olhos lacrimejarem e então seu pai a abraçou fortemente. Ele ainda tinha o cheiro de menta e tabaco que ela se lembrava e seus braços ainda possuíam a segurança que ela ansiava. Ele não podia perder sua menina de novo. Já havia perdido parte da vida da filha e não podia cogitar a possibilidade de deixa-la partir novamente, sabendo que dessa vez poderia ser para sempre. Não, ele iria fazer. Ele tinha que fazer. Não podia deixar que gente como aquele lhe tirasse a filha. Matthew sabia o que significava lutar conta a Cosa Nostra, mas por sua filha e sua promessa a falecida esposa estava disposto a correr riscos.

Ele apertou a filha entre os braços, temendo que ela desaparecesse a qualquer momento. Sabia que faria inimigos poderosos, mas não entregaria os pontos sem lutar. Sua filha, a garotinha que ele segurara as pequenas mãos no hospital e prometera proteger assim que os olhinhos azuis o miraram, não iria pagar por seus crimes. Ele estava disposto a tudo, a dar sua própria vida para tira-la da mira daqueles homens. O senhor McKinnon sabia o que aquele mundo podia fazer com uma alma como a de Marlene, e ele não entregaria o jogo de forma alguma.  


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