O Destino do Amor escrita por Lilissantana1


Capítulo 3
Capítulo 3 - Primeiro Encontro


Notas iniciais do capítulo

A primeira impressão. A primeira conversa. O primeiro embate.



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Havia poucas pessoas na outra sala. Duas senhoras. Um homem grande, com a cabeça praticamente toda branca, o atual Duque de Hawkins. Ao lado dele, o ser que seria seu esposo conversava sem animação com o pai de Peter Mitchell, Sir Frederick Mitchell.

Eles não os viram imediatamente, por isso Annie teve algum tempo para analisar seu futuro marido, e a primeira coisa que notou foram os cabelos. Daisy nunca mencionara o fato de Jon ter cabelos longos. Cachos castanhos brilhantes caiam sobre ombros fortes e circulavam um rosto sério, de traços marcados, que não era realmente bonito.  Quando Jon finalmente a observou, ela tentou manter seus olhos fixos nos dele, mostrar que não estava disposta a ser subjugada. Entretanto, foi obrigada a desviar o olhar diante da forma como o rapaz a examinava.

Ele a media de alto a baixo como se fosse uma mercadoria. Olhos frios, despreocupados e sem vida estavam vidrados em seu rosto, em seu corpo, como se tivessem o poder de desnuda-la física e emocionalmente, ali, no meio da sala, diante de todas aquelas pessoas.

Sim, Jon Hawkins, futuro IV Duque de Hawkins, era o reflexo vivo da imagem que ela fizera em sua mente quando Daisy lhe falara sobre ele.

Notando a aproximação de pai e filha, o pequeno grupo se abriu. O noivo se aproximou em passos curtos. Carter foi o primeiro a falar:

— Meu caro. Gostaria de lhe apresentar minha filha. Sua noiva.

Jon ergueu a mão para segurar a que Annie lhe estendeu sem desviar os olhos dos dela. Em cada olhar, em cada gesto, ele era intimidador. Sem permissão o coração feminino estremeceu em algo que a jovem determinou como medo. Um medo esquisito... que se transformou em arrepio quando os lábios dele tocaram sua mão enluvada.

— É um prazer conhece-la finalmente. – falou firme. A voz era bonita e combinava com o restante da figura. Mas, isso não mudava o fato. Jon Hawkins representava tudo o que ela mais odiava em alguém. E mesmo que naquele momento estivesse fingindo cordialidade e gentileza, ela sabia de toda a maldade da qual era capaz.

— Sir... – ela respondeu baixo sem retribuir o comentário. E voltando-se para o futuro sogro aceitou os elogios que o homem lhe dirigiu com um sorriso social.

As pessoas aglomeradas no grupo lhe cumprimentaram pelo noivado. Pela sorte. Pela beleza. Annie não conseguiu se ater a qualquer coisa que não fosse os olhos do noivo a examiná-la detida e metodicamente. Parado ao seu lado, ela percebeu que ele não era tão alto quanto imaginara. Mas sua figura era realmente imponente e ameaçadora. Disso não tinha dúvidas.

Então, de repente, sem demonstrar qualquer tipo de medo em ser rechaçado e interrompendo a conversa, Jon pediu:

— Gostaria de falar a sós com minha noiva...  – encarando o futuro sogro continuou o pedido tranquilamente: - Sir Carter... há um lugar tranquilo onde possamos conversar por alguns minutos?

Os olhares de todos, inclusive de Annie, se dirigiram para o rosto inflexível do futuro Duque. Aquele era definitivamente um pedido inusitado. Jon não pareceu se incomodar com toda a atenção recebida por seu pedido, imóvel esperava pela concordância do Conde.

O dono da casa se mostrou desconfortável diante da solicitação. Apercebendo-se disso, Jon logo tratou de resolver o possível impasse que talvez impedisse seu intento. Afinal, sua noiva era uma “virgem de família tradicional e de renome”, não poderia sair assim, sozinha, para um cômodo qualquer acompanhada por um homem. Mesmo que esse homem fosse seu noivo.

— A criada pessoal de minha noiva poderá nos acompanhar... e prometo manter a porta do lugar aberta durante toda a conversa.

O conde ainda se mostrava inseguro. Cuidara tanto da filha evitando que caísse em mãos erradas, para, poucos dias antes do casamento, terminar perdida pelo próprio noivo. Era certo que todos falariam sobre o assunto no dia seguinte. Principalmente por causa da má fama do futuro marido.

— Meu filho será o mais completo cavalheiro, posso lhe garantir. – afiançou o Duque sem demonstrar qualquer sinal de que poderia se enganar quanto ao comportamento do filho.

Reticente, e ainda com medo, o Conde acabou aceitando a sugestão e conduziu o jovem casal em direção à saleta ao lado daquela, onde eles se encontravam. A criada pessoal de Annie permaneceu parada, na soleira da porta. Observando tudo o que se passava do lado de dentro.

*************************

A conversa era entediante. Aquele noivado estava se transformando na pior festa que ele já tivera a oportunidade de ir. E ainda pior era pensar que se tratava de “seu” noivado. A maldita virgem sequer dera as caras. Estavam fazendo tanto suspense que ele começava a acreditar que se tratava de algum monstro. Afinal, ninguém esconde tanto uma filha. Exceto se ela é tão feia ou tão estupida que não atraia a atenção de homem algum.

Mas, Jon encarou o pai parado ao seu lado, ele não acreditava que o velho fosse capaz de lhe aplicar mais uma presepada, não depois de todo o trabalho que tivera para mantê-lo satisfeito. Entretanto, o Duque era capaz de tudo. Seu corpo tinha muitas marcas que demonstravam a capacidade do pai em lhe infringir sofrimento. E lhe arrumar uma noiva feia seria o mais simples deles.

— Meu filho está tomando a frente dos negócios da família... – Sir Frederick Mitchell, parado a sua direita começou a falar, enumerando as qualidades do filho mais velho. Jon quase revirou os olhos tentando evitar que um sorriso sarcástico escapasse por seus lábios. O homem só sabia elogiar o entediante Peter. Apesar de terem a mesma idade, de estudarem na mesma escola, na mesma sala, de dormirem na mesma ala, eles não eram amigos. Pelo contrário, estavam sempre em lados opostos nas contendas escolares.

Jon estava se preparando para fazer um comentário qualquer a respeito do que ouvira quando sua atenção foi despertada pela entrada de duas pessoas na sala. Uma delas era o Conde, a outra, que vinha presa pelo braço do homem, Jon identificou como sua noiva. Annie tinha estatura mediana. Os cabelos, num tom mel brilhavam a luz das lamparinas. Os olhos dela encaravam os seus de uma forma desafiadora. Mas, bastou se fixar um pouco mais neles para que se desviassem, ela não era tão forte ou determinada quanto pensava que era, Jon disse a si mesmo enquanto continuava sua inspeção.

Era certo que a surpresa se mostrava agradável. Annie não era linda, mas também não era feia. Pelo modo como o observava, tinha conhecimento de seus “feitos”, e não gostava deles. Sinal de inteligência. Concluiu. Alguns homens temem as mulheres inteligentes, mas no caso dele, as considerava desafiadoras.  

O corpo delicado sob um vestido de cintura alta evitava a identificação clara dos dotes dela, mas, o noivo podia jurar que a garota tinha o corpo delicado de uma virgem.

Sorriu interiormente.

Não seria tão ruim ter de dividir a cama com ela. E se Annie também aceitasse o acordo que Jon estava disposto a lhe fazer, bem, tudo seria ainda mais simples para os dois. Pois desta forma ele não precisaria se preocupar com a chegada do dia em que se cansaria de ocupar a cama da esposa.

A dupla parou diante deles, o Conde os apresentou formalmente. Jon, gentilmente beijou a mão dela e sentiu um leve estremecimento quando seus lábios tocaram o tecido da luva. A que se devia aquele movimento? Recato? Medo? Raiva?...nojo? a encarou de frente mais uma vez, mas não soube dizer. De uma coisa tinha certeza, não se devia a um movimento de atração. Os olhos dela fugiam dos dele com extrema rapidez. E seus lábios estavam contraídos. Sim, era isso, ela o detestava. Ele já sabia disso. Não precisava de muito tempo para compreender quando era odiado. Conhecia esse sentimento desde a infância.

****************

A sala onde eles foram inseridos era espaçosa, bem iluminada por gigantescas janelas que permitiam a entrada de luz, vinda diretamente da Lua cheia. Jon caminhou lentamente até a beirada da mesa, ficando de costas para a noiva. O Conde deixou a filha perto da porta, a poucos passos de sua criada pessoal e se afastou receoso, mas devia muitos favores ao Duque para recusar um pedido feito pelo futuro genro.

— O que o senhor deseja?

Ele ouviu e não se surpreendeu com a firmeza presente na voz feminina. O tom determinado combinava com a figura que ele conhecera segundos atrás.

Se voltou, deu alguns passos em direção a ela, ciente de que estava contra a luz e que por isso, a garota não distinguiria seus traços com facilidade. Desta forma seria vantajoso, poderia observar suas reações sem se preocupar em ser avaliado.

— Conhece-la melhor. – confessou, era verdade.

Annie não pareceu encantada com o interesse dele como muitas outras ficariam.

— Estou na cidade há praticamente um mês... - Ela explicou, fazendo alusão a possibilidade de várias visitas que não foram feitas.

Jon sorriu e cruzou as mãos nas costas. Ele compreendera o recado.

— Estive ocupado.

Ela se moveu levemente, ficando de lado, mexendo distraidamente no encosto da cadeira perto de uma prateleira de flores.

— Sim, eu soube. A filha de sir Irving. Linda não é mesmo?

Jon riu alto.  

— Exatamente... Linda.

Annie deduziu que o constrangeria tocar no assunto das amantes que seu futuro marido tinha o hábito de colecionar. Mas, logo descobriu, através da gargalhada, estar completamente enganada. Não seria fácil atingi-lo.

— Mas, é caso acabado... – ele disse de repente, como se isso fizesse alguma importância para ela. – agora, estou atento ao nosso casamento.

Annie rapidamente se voltou para observa-lo, mas não conseguiu distinguir os traços de Jon, escondidos pela penumbra da noite. Se sentindo irritada por não conseguir vislumbrar o rosto masculino, reclamou:

— Por favor, o senhor poderia ficar numa posição em que eu possa ver seu rosto?

Não havia qualquer tipo de medo ou constrangimento naquela voz, ele concluiu antes de se mover, atendendo ao pedido e ficando mais próximo dela do que Annie desejava.

Jon cheirava a campo, a charuto, a noite fresca de verão. Era surpreendente perceber que essa mistura de aromas lhe era agradável. Ergueu o rosto, em direção ao dele, muito perto. Jamais estivera assim, tão perto de alguém do sexo oposto que não fosse seu pai ou seu irmão. Mas, aquele homem seria seu marido em poucos dias. Deveria ser normal que ficassem tão próximos.

— O que quer saber sobre mim? – perguntou assim que percebeu estar perdida dentro de um par de olhos castanhos frios.

Ele se ergueu, ficando ainda mais ereto antes de começar a falar pausadamente:

— Você esteve numa escola interna até poucas semanas atrás.

— Sim.

Não era uma pergunta, ela sabia, mas precisava falar, desafiar, provocar de alguma forma aquele ser insensível. Ele ignorou.

— Mas suponho que sabe como funciona um casamento como o nosso.

— Oh sim, eu sei. Nos casamos. Passamos a viver sob o mesmo teto. Mal nos falamos. Fingimos que somos um casal diante da sociedade, mas agimos como pessoas independentes na intimidade.

Os lábios masculinos, fartos e bem desenhados se ergueram levemente em muda concordância.

— Vejo que está bem inteirada de como as coisas acontecem.

— Meus pais se casaram da mesma forma.

— Os meus também. – ele disse de repente, como se falasse consigo.

Um suspiro rápido pareceu indicar que Jon Hawkins tinha alguma espécie de sentimento, mesmo que fosse apenas tédio pela conversa animada deles, antes de continuar:

— Tenho uma proposta a lhe fazer... e precisa ser hoje, agora. Quando nos casarmos, quero ter certeza de que você saberá onde estará.

O que ele pensava que ela era? Alguma idiota cega por uma escola repressora?

— Eu sei onde estarei. Numa bela casa, com muitos empregados, com um marido que vai fornicar pela sociedade, e de vez em quando me buscará para cumprir a tarefa de ter um filho legitimo.

Ele se calou. Ainda estava muito perto dela, e Annie acreditou sentir um breve estremecimento no braço que roçava o dela.

— Nem eu teria colocado o assunto de forma mais clara e sucinta. – Jon disse por fim. Sua noiva era surpreendentemente “espirituosa”. E isso o agradava.

O ar quente da boca dele cruzou por sua bochecha. Como aquele homem chegara tão perto e ela não percebera? Daquela posição, e com os olhos se acostumando a parca iluminação, Annie podia distinguir cada traço. Dos lábios carnudos aos cachos revoltos que pendiam ao lado da face masculina, e principalmente o olhar firme, seguro e completamente límpido. Surpresa pela constatação de que Jon não parecia querer fingir ou esconder quem era, deu um passo atrás. Estava preparada para encontrar um homem que se acobertaria sob galanteios, meias palavras e omissões, mas não para se deparar com a sinceridade estampada em cada gesto.

— Seu modo de ver nosso “casamento” torna tudo mais fácil. – ele disse por fim percebendo que ela se movia de modo a colocar a cadeira entre eles.

— Nada será fácil entre nós. Especialmente para mim... – Annie concluiu sinceramente.

Ele se calou novamente. Ela o observou. Jon parecia distante. Mas segundos depois, ergueu o rosto, a encarou, e continuou a falar no mesmo tom frio, de quem propõe um negócio.

— Por isso pedi esta conversa. Não sabia o que esperar de... você. Mas, agora acredito que posso falar abertamente, pois serei compreendido.

Ah! Ele é aquele tipo de homem que considera as mulheres incapazes de serem algo mais do que mães, esposas e donas de casa. Ela pensou, mas não contestou, haveria tempo para que seu noivo descobrisse como ela realmente era. Apenas esperou pelo que viria.

— Como você tem plena consciência de como acontece esse tipo de casamento, não precisarei enumerar as desvantagens de casar com alguém que se mal conhece... as brigas, as dores... a... traição.  – ele não mencionaria sentimentos, não acreditava neles, mesmo que houvesse a real possibilidade de sua noiva estar apaixonada por alguém – Para que tudo fique claro entre nós, sugiro então uma união cordial e monogâmica até que nosso primeiro filho do sexo masculino nasça...

De todas as coisas que poderia ouvir, aquela era a menos provável. O susto foi tamanho que Annie precisou se segurar a cadeira para não cair. Ele menosprezava sua inteligência fazendo aquele tipo de pedido, sabendo bem que jamais o cumpriria.

— O senhor...

— Me chame de você. – Jon pediu sem desviar o olhar.

— Não consigo... – Annie retrucou rapidamente sacudindo a mão diante do rosto antes de continuar em tom zangado – O senhor crê que acreditarei nisso? Nessa proposta absurda! Por quem me toma?

— Por uma mulher inteligente. – ele retrucou surpreendendo-a novamente.

Foram poucos os segundos necessários para que a filha do Conde pudesse se recompor de mais um comentário surpreendente.

— Quer realmente que acredite que se manterá afastado de suas amantes durante... quantos meses?...  anos talvez!

Ele deu um passo a frente, voltando a penumbra, evitando que ela o visse com clareza.

— Preciso de um filho. – falou sério. – Um filho meu, legítimo! E para que isso se concretize, serei capaz de me manter afastado de outras mulheres, pelo tempo que for necessário...  

Pela forma como o pai o tratara, pela experiência parca de amor que recebera, pelas tantas amantes que apenas se asseguravam ao fato de que ele um dia seria um Duque, era de se supor que Jon Hawkins jamais pensasse desta maneira tão formal. Porém, ele desejava que algo em sua vida fosse real e verdadeiro. E um filho, dentro de um casamento real, seria a realidade que ele tanto desejava. Seria o máximo de realidade que se daria o direito de possuir.

Annie não conseguiu contestar aquelas palavras, elas pareciam ter simplesmente escapado pelos lábios masculinos.

— Depois... – ele continuou baixo – depois que a criança nascer, estaremos livres. – de repente o tom de voz mudou, se tornando autoritário. - Porém, durante o tempo que este acordo durar, esperarei de você o mesmo comportamento que estou disposto a lhe oferecer...


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Notas finais do capítulo

Jon é muito mais do que as ideias que Annie formulou sobre ele.
Estou apaixonada! Beijos!