Who stalk the stalkers? escrita por HellFromHeaven


Capítulo 15
Expandindo os negócios




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Cheguei em casa sem prestar atenção no tempo que levei no trajeto. Estava ocupado discutindo sobre o futuro do relacionamento entre Ghost e Leather pelo celular com minha colega Hiperatividade. Ela acreditava que as duas combinavam e que envelheceriam juntas, a menos que fossem mortas em uma de suas atividades ilegais e perigosas antes. Por outro lado, eu e minhas inúmeras paranoias tínhamos certeza de que uma das duas apareceria morta cedo ou tarde. Havia 50% de chances de Petúnia se empolgar demais com seu sadismo e 50% de chances de Dalila colocar suas garras para fora e dar alguns tiros na pobre stalker.

Contrariando minhas expectativas, os dias se passaram sem nenhuma baixa em nosso grupo, pelo menos até a reunião com as stalkers da cidade vizinha. Fiz belíssimos nadas enquanto esperava por este momento tenso para minhas amigas paranoias. Li alguns livros, pensei em comprar um gato, passei dois dias pesquisando sobre raças de gatos, rações, brinquedos, acessórios e em como cuidar de um. Desisti da ideia na metade do segundo dia e migrei para cães. Infelizmente animais precisam de amor, carinho, atenção constante e de comida em horários programados para ficarem saudáveis. Encontrei Daisy no parque e conversei sobre o assunto, desistindo logo em seguida. Concordei com a garota quando ela disse que se eu era incapaz de cuidar da própria saúde, quanto mais da saúde de terceiros. O que posso fazer? Contra fatos não há argumentos.

Acordei por volta das oito da manhã sem muita dificuldade. A falta de coisas para fazer na internet me fez dormir mais cedo do que o habitual, o que fazia daquele um dia extremamente raro. Acredito que foi minha primeira noite de sono realmente decente em… Bem, acho que nunca soube o que era isso. Minhas paranoias ficaram assustadas por volta das nove quando perceberam isso. Afastei os pensamentos perturbadores com três xícaras de café.

A reunião estava marcada para as duas e meia da tarde em uma cafeteria em uma parte afastada do centro do Campo dos Sussurros. Aproveitei um dos dias em que estava imerso em tédio profundo para ir até o local conferir se não se tratava de uma emboscada e verificar todas as possíveis saídas de emergência para a pior das hipóteses. Felizmente, era realmente apenas uma cafeteria normal, menor de que a do Jhonny e do que o local de encontro preferido de Sherlock, com apenas quatro funcionários, sendo dois responsáveis pela cozinha e duas garçonetes. Suas faces demonstravam um nível de desesperança na vida que só tinha ouvido falar na internet, em filmes ou livros. Entretanto, o café era quase tão bom quanto o meu preferido.

Satisfeito pelas informações que recolhi em minha pesquisa de campo, almocei uma combinação maravilhosa de macarrão instantâneo com três ovos fritos às onze, me certificando de que meu estômago estaria abastecido o suficiente para que eu pudesse resistir à tentação de pedir algo na cafeteria. Assim, terminei a refeição rapidamente e saí do apartamento vestindo um casaco de moletom preto e calças jeans escuras. Ainda não sabia ao certo quantos de nós eram tão paranoicos com horários quanto eu, o que me deixou um pouco alarmado assim que entrei no ônibus para o Campo dos Sussurros. Involuntariamente, meu corpo se levantou para dar meia volta e chegar atrasado, mas logo retornou ao assento porque estragar minha pontualidade parecia mais incômodo do que ser o primeiro a chegar na cafeteria. Se um dia alguém for capaz de entender minha mente, eu gostaria de ter uma longa conversa com essa pessoa.

Satisfazendo a vontade maior da minha mente confusa e desconexa, cheguei à cafeteria meia hora antes do horário combinado, adentrando o local pela dupla de madeira que permanecia aberta durante todo o expediente e vasculhei o interior cautelosamente antes de prosseguir. Havia apenas um homem de cinquenta e tantos anos sentado ao balcão, calvo com uma longa e cheia barba grisalha, vestindo uma camiseta que um dia já foi branca, cheia de manchas de graxa e suor, assim como sua bermuda jeans desgastada pelo uso constante. Ao fundo, avistei Dalila sentada em uma das mesas, alternando seu olhar entre a janela ao seu lado direito, seu celular e a porta. Em uma dessas mudanças de ângulo, ela percebeu minha presença, e rapidamente checou o celular, voltando à sua atividade anterior.

Superei o fato de ter sido completamente ignorado e caminhei até a mesa da stalker, atento aos arredores. Minhas paranoias ainda tinham certeza de que seríamos mortos a qualquer momento e eu tentava disfarçar minha preocupação da melhor forma que podia. Sentei-me à frente da garota, que continuou em silêncio por alguns minutos. Uma garçonete foi até a nossa mesa e saiu sem levar pedido algum. Como ainda faltavam dez minutos para a suposta reunião, decidi quebrar o gelo com a fantasminha:

— Estou um pouco aliviado por não ser o único pontual aqui.

— Alívio não é uma palavra que combina muito comigo. - disse a garota, ainda vigilante. - Petú… Leather Face me disse para relaxar mais, só que é um pedido impossível.

— Somos colegas de paranoias, então?

— Prefiro não ter relações amistosas com homens. - disse a garota, me encarando com desgosto. - É que… Eu sempre ficava do lado de fora, disfarçada, durante esse tipo de encontro. Vocês ficam muito expostos!

— O grande lance é que agir cautelosamente demais no cotidiano pode levantar suspeitas. Claro, isso é só teoria e minhas paranoias discordam disso.

— Já pensou em procurar um psicólogo?

— Não confio em mim para resolver meus problemas, como poderia confiar isso a um desconhecido?

— Você tem um ponto. E antes que pergunte, eu já tentei fazer terapia, mas acabei falando demais e tive que apagar a pessoa.

— Muitíssimo obrigado, você acabou de alimentar meus pesadelos.

A conversa foi interrompida pelo som da porta do estabelecimento se abrindo, para o alívio de minhas colegas paranoias. Leather, Hiperatividade, Daisy e Sherlock adentraram o recinto e foram até a nossa mesa. Petúnia sentou ao lado da fantasminha depois de dar-lhe um beijo rápido. Sherlock sentou ao lado das duas, S.H. ao meu lado e a garçonete ao lado dela. A mesa acabou ficando lotada, então nosso colega stalker pediu para a garçonete para que juntasse uma outra para acomodar as duas atrasadas. O problema foi resolvido em poucos minutos.

Ficamos conversando sobre assuntos banais por meia hora até que a dupla finalmente resolveu aparecer. Heretic usava um vestido preto até os pés com mangas compridas que quase escondiam suas mãos, em suas extremidades havia alguns babados brancos costurados à mão e sua gola branca era presa com alguns botões negros. A garota segurava seu braço esquerdo com o direto, mantendo seu rosto voltado para o chão em um claro sinal de timidez profunda. Ao seu lado estava Doppelganger,com olhos verdes, cabelo raspado nas laterais, usando uma calça jeans rasgada e uma camiseta xadrez vermelha e preta. A forma de andar e seu olhar eram totalmente diferentes da última vez que a vi. Isso era uma boa confirmação de suas habilidades de disfarce. Eu não notaria que se tratava da mesma pessoa caso esbarrace com ela na rua. Provavelmente não é necessário dizer, mas minhas paranoias entraram em pânico assim que perceberam isso.

A presença do meu grupo foi notada rapidamente e a dupla de stalkers se juntou a nós, sentando na mesa providenciada por Sherlock. Todos se cumprimentaram e as garotas se apresentaram para quem ainda não as conhecia pessoalmente. Heretic parecia extremamente desconfortável com aquela situação social e o número de pessoas em sua mesa, se esforçando para evitar qualquer contato visual com meu grupo. Sua colega era o total oposto, falando amigavelmente com um sotaque estrangeiro enquanto gesticulava quase que involuntariamente. Dalila se manteve calada, com um olhar sério, batendo na mesa com seus dedos, demonstrando claramente sua impaciência. Ao notar isso, Leather resolveu ir direto ao ponto:

— O papo está bom, senhoritas, mas viemos aqui a negócios, certo?

— Sim, sim, claro! - exclamou Doppelganger. - Qual de vocês é a pessoa interessada nas informações?

— Sou eu. - disse Dalila, ainda com sua postura e olhar sérios. - Pode me chamar de Ghost. Estou acostumada a negociar, mas o assunto é de grande importância para mim, então prefiro ser o mais breve possível.

— Entendo, entendo. - disse a Doppelganger, com um sorriso de satisfação no rosto. - Parece que temos um caso de ligação pessoal. Isso significa que eu devo vinte créditos para minha colega.

— Peço perdão com antecedência por ser rude, mas o que farei com essas informações não é problema seu.

— Acalme-se, pequena! É natural para uma stalker ter a curiosidade aflorada. Enfim, nós já possuímos parte das informações que vocês precisam, porém não estamos interessadas em créditos.

— Se isso fosse há algumas semanas eu poderia oferecer meu corpo, mas vão ficar só na vontade agora. - disse Petúnia.

— Não sei dizer se foi uma brincadeira ou se estava falando sério, mas não é disso que estou falando. - brincou Victoria. - O lance aqui é que nós percebemos a eficiência dos stalkers da sua região e de outros grupos que vimos no A.S.E., discutimos bastante a respeito e percebemos que já era a hora de aumentar nosso pessoal.

— Nós… - Heretic começou a falar, hesitou e retomou a fala após uma pausa de meio minuto. - Somos muito boas no que fazemos, mas só nisso. Ter apenas uma especialidade limita nosso alcance e nossa eficiência.

— Estão propondo uma aliança? - indagou Sherlock.

— Sim, mas não com vocês. - respondeu Doppelganger. - Digo… Seria ótimo trabalhar com vocês eventualmente, entretanto…

— Um passo de cada vez. - completou Heretic, ainda se esforçando para evitar contato visual. - Já temos um stalker em nossa “mira”.

— O cara é o manjador das manjarias do submundo do crime. - disse Victoria, empolgada. - É um território difícil de se entrar, mesmo para mim. Nós duas só conseguimos arranhar a superfície desse mundo doido.

— Isso é a mais pura verdade. - disse. - Eu só não entendi ainda o que querem de nós.

— Então… - Doppelganger pensou um pouco antes de continuar. - Eu sou boa em socializar, mas minha colega aqui é péssima. E esse cara… Bem, digamos que ele não é de muitos amigos. Sabemos que ele mora aqui na cidade, mas ainda não conseguimos descobrir onde e… Bem, ele não respondeu de forma muito amigável a nossas tentativas de contato. Como vocês são profissionais em colocar pessoas malucas para trabalhar juntas, acreditamos que podem conseguir.

— Então se a gente conseguir fazer esse cara virar amiguinho de vocês, ganhamos as informações de graça? - perguntou Hiperatividade.

— É uma forma bem simplista de dizer, porém é isso aí. - respondeu Victoria.

— Isso pode ser arranjado. - disse Sherlock. - Geralmente os stalkers só precisam de um empurrãozinho para começar a trabalhar em equipe. Não há como negar a eficácia disso. O que impede a maioria são suas paranoias, orgulho ou ganância. Nos digam tudo o que sabem sobre esse sujeito para que possamos começar.

— Pois é, trazemos até mesmo a pessoa amada em sete dias. - brincou S.H.

— Não brinca que eu acabo botando fé. - debochou Doppelganger. - O cara é conhecido como Scarface, mas eu não sei se é por quem ele é ou se a cara do sujeito é zoada.

— Ele é extremamente cauteloso e costuma trabalhar para os poderosos do crime organizado.  - complementou Heretic. - Sabemos que ele é russo e que tem problemas com o álcool, mas nada além disso.

— Parece pouca coisa para se trabalhar em cima. - disse. - Como vocês entraram em contato com…

— Eu conheço ele. - Dalila me interrompeu e atraiu a atenção da mesa para si.

A conversa estava intensa até aquele momento. O silêncio resolveu sentar-se à mesa conosco por alguns segundos. Leather encarava a baixinha e seus olhos brilhavam. Ouvimos a conversa da outra mesa onde uma mulher reclamava de como seu marido não cortava a grama direito e resolvi acabar com aquilo.

— Espera, você o quê?

— Já contratei os serviços dele algumas vezes. - respondeu a fantasminha. - Não entendi o motivo do espanto.

— Foi mal, é que a gente esquece que você era uma poderosa chefinha. - disse Hiperatividade.

— Menina! - exclamou Victoria. - Você resolveu nossos problemas em um piscar de olhos! Te daria um beijo se isso não fosse me garantir uma facada na jugular.

— Na verdade eu prefiro métodos mais lentos e dolorosos. - disse Petúnia com um sorriso sutil em seu rosto.

— Desculpe, mas não há motivos para comemorar. - disse Dalila. - Como vocês disseram, ele é muito cauteloso. Nunca nos encontramos pessoalmente e eu sequer sabia que ele morava nessa cidade. Era apenas um dos informantes mais requisitados no meio. A única coisa que eu teria a oferecer seria o contato dele.

— Menina, mas isso já é muita coisa! - exclamou Victoria.

— Dependendo de como acontece esse contato e da segurança do sistema dele, pode ser possível utilizar isso para localizá-lo. - disse.

— Então, está feito. - disse Sherlock. - Vamos nos empenhar para conseguir o melhor resultado possível. Acredito que esta reunião deve ser encerrada aqui. Lhes manteremos informadas de nossos progressos por meio do A.S.E.

Todos se despediram e deixaram o local. Nosso grupo voltou junto por quase todo o trajeto. Petúnia e Ghost se afastaram de nós e foram conversando alegremente. Dalila parecia uma pessoa completamente diferente, sorrindo, rindo e tudo mais. Comentei sobre isso com Ana e acabamos conversando durante todo o trajeto. Nem notei quando nossos colegas stalkers deixaram o ônibus. Normalmente, eu teria que pegar outro ônibus para chegar ao meu humilde apartamento, mas eu tinha comido belíssimos nadas na cafeteria e Hiperatividade me convidou para comer uma pizza em sua casa.

Cinco minutos depois que chegamos na casa da louca, uma tempestade resolveu visitar a Baía dos Pecadores, com ventos fortes e trovões. Senti-me mal pelo entregador de pizza. Graças à minha preparação matinal, meu estômago ainda era capaz de aguentar algumas horas sem comida. Entretanto, minha colega stalker e suas irmãs estavam em maior número, então o pobre trabalhador teria que enfrentar a mãe natureza para nos alimentar.

Lisa e Luna decidiram assistir um programa onde uma garota mágica combatia as forças do mal usando um cajado falante e um gato esquisito. A menor estava visivelmente empolgada, fazendo as poses e torcendo pela heroína enquanto a irmã do meio tentava disfarçar o quanto estava gostando de assistir. Deixamos as duas na sala e fomos até a cozinha, onde Ana me serviu café em uma caneca preta. Só notei esse pequeno detalhe depois de tomar o primeiro gole daquele néctar dos deuses. Não era o melhor café do mundo, mas estava muito bom. Assim que percebi a cor da caneca, voltei meu olhar diretamente para o rosto da Hiperatividade, que me encarava com seu sorriso de vitoriosa. Fui incapaz de segurar o riso diante de uma situação dessas.

— Já vi que deixarão canecas pretas cheias de café no meu túmulo.

— Contratarei uma pessoa para chorar no seu túmulo e encher a caneca toda sexta-feira.

— Por que sexta?

— É o dia mais feliz da semana… Pelo menos para quem tem um trabalho normal. O que não é o nosso caso.

— Pois é, vivemos o sonho.

— Vem cá, desde quando suas paranoias morreram?

— Elas continuam vivas e me atormentando a cada segundo. Por que a pergunta?

— Não minta para mim, rapaz. Eu tinha certeza de que você ia surtar por causa da caneca. Foi mais do que uma pegadinha, eu poderia chamar de estudo social.

— Um drama desses te leva pro teatro fácil fácil.

— Meu irmão, você está pedindo para levar uns tapas hoje.

— Perdoe-me, senhorita Springs. A verdade é que minhas paranoias se acostumaram com nossos colegas stalkers.

— Poxa, e eu aqui achando que era especial.

— Mas você é especial… Digo… Elas ficam ainda mais calmas com você. A Daisy não conta porque a conheço há bastante tempo. Não tenho mais aquele medo mortal da Petúnia depois de entendê-la melhor, porém mantenho dois pés atrás e as paranoias em alerta. Embora eu ache que isso não seja mais necessário agora que a Dalila está com ela. Entretanto a Dalila…

— Eu já entendi, rapazinho. Não se empolgue demais com esses lances paranoicos, vai que essa porra volta.

— É… Vou seguir seu conselho.

— Resumindo, eu sou especial e o resto é resto. Ana rainha, stalkers nadinha.

— Tenho nem o que dizer diante de uma afirmação dessas.

A pizza chegou antes que aquela conversa sem sentido pudesse continuar. O entregador estava ensopado e a tempestade se mantinha firme, disposta a festejar a noite toda. Eu preparei meu psicológico para chegar em casa no mesmo estado do pobre entregador enquanto comia, mas fui surpreendido por minha colega, que se demonstrou uma ótima anfitriã e me ofereceu o sofá para passar a noite. Estranhamente, pouquíssimas paranoias se opuseram a isso, talvez para me poupar de uma pneumonia. Independentemente disso, fui capaz de ter uma boa noite de sono longe da minha zona de conforto, o que já poderia ser considerado uma grande vitória por si só.


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