Um Futuro Escrito em Gelo e Fogo escrita por crownprincess


Capítulo 2
Mata de Lobos


Notas iniciais do capítulo

Muito obrigada pelos comentários deixados no capítulo anterior! Fiquei muito feliz em saber que estão gostando da estória, e espero que também curtam esse segundo capítulo. Beijos!



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Lyanna saiu de seu quarto assim que os primeiros e poucos raios de sol apareceram no céu nublado do Norte. Aprontou-se rapidamente e sequer tomou seu café da manhã, tamanha era a ansiedade para tentar descobrir mais coisas sobre sua capacidade de ver o futuro, e principalmente a respeito do sonho que tivera com o Rei nortenho e sua filha valiriana. Queria saber o que ambos tinham a ver com a tal canção de gelo e fogo e o que, afinal de contas, significava tal expressão.

Foi novamente até o bosque sagrado, esperando obter respostas para seus questionamentos. Caminhou lentamente até a árvore coração, pensando nas consequências que a assolariam caso persistisse com as experiências de visualizar o futuro. Ao parar em frente ao grande tronco de madeira branca, estendeu sua mão para tocar a face esculpida, porém hesitou. Tinha medo do que veria, medo de presenciar algo que não lhe agradasse. Sentia as pontas dos dedos geladas, enquanto seu braço tremulava pelo temor que lhe afligia, mas respirou fundo, tomando uma longa lufada de ar, e prosseguiu, depositando a palma da mão sobre o tronco da árvore.

Quase que instantaneamente, viu-se novamente em frente à caverna em que encontrara o Corvo de Três Olhos pela primeira vez. Tomada de uma coragem recém-adquirida, adentrou a estrutura rochosa, seguindo o caminho que percorrera em seu sonho. Deparou-se com o velho senhor, que, fixado nas raízes da árvore, encarava-lhe com seu único olho de uma cor carmesim intensa.

― Lady Lyanna, fico feliz em vê-la novamente. Creio que sei o motivo de sua visita. ― ele lhe disse.

― Sabe o que se passou comigo desde a última vez em que nos encontramos?

― Sim. Inclusive, tomei conhecimento do seu encontro com o Príncipe.

Lyanna sentiu seu rosto esquentar, e sabia que havia corado. A frequência com que Rhaegar aparecia em seu caminho era desconcertante, e a deixava inquieta. Perguntava-se o porque de o Príncipe ser uma constante tão grande em sua vida.

― Mas não vim aqui falar dele. ― ela lhe cortou ― Desejo falar do que vi. Ou melhor, de quem vi.

― Oh sim. O Rei. ― o Corvo de Três Olhos cruzou as mãos, apoiando-as em seu colo, como se fosse começar uma longa explicação ― Terá de conhecê-lo para que compreenda a razão do seu dom.

― Como assim?

― Quero dizer que para entender o que se passa em sua vida, é necessário que saiba a história de Jon. O destino dele está diretamente ligado ao seu, Lyanna. ― ele explicou.

― Jon? Esse é o nome dele?

― Sim. Jon, o Lobo Branco. Jon, o Rei do Norte. Jon, o renascido. O garoto tem tantos títulos que é quase difícil lembrar-me de todos. ― um sorriso repuxado brotou nos lábios do homem.

― O que quer dizer com “Rei do Norte”? Esse título não existe há quase trezentos anos!

― Já falei que terá de conhecer a história para obter as respostas que procura, minha jovem. E para isso, passará por uma experiência não muito comum, mas que será necessária para que compreenda a fundo a importância que Jon e você têm para a salvação do mundo.

― E que experiência seria essa? ― Lyanna perguntou, temerosa. Não tinha certeza se teria bravura suficiente para passar por aquilo.

― Não apenas ver, mas viver o futuro por intermédio daqueles que são peças fundamentais na trajetória para salvar o mundo.

― E de que forma isso aconteceria?

O velho homem riu, e Lyanna não sabia se de sua ingenuidade ou se da situação num geral.

― Tire a mão da árvore e depois coloque-a novamente. Se quiser, pode trazer uma pessoa com você para compartilhar sua experiência.

― Então tudo que eu tenho que fazer é...

Lyanna não conseguiu completar sua frase e viu-se parada em frente à árvore coração. Já não estava mais com a mão sobre a madeira, pois, inconscientemente, cortara o contato com o Corvo de Três Olhos antes que ele pudesse lhe explicar exatamente o que fazer. No entanto, sabia que se tocasse novamente o represeiro, seria transportada para um lugar desconhecido, em uma época desconhecida, para que pudesse conhecer um desconhecido. Jon. Seu nome era Jon. A estranha ligação que tinha com ele fez com que sua intrepidez característica ressurgisse e que o medo fosse totalmente varrido de sua mente.

Antes que pudesse se dar conta, a palma da mão de Lyanna já repousava novamente sobre a fria e branca madeira da árvore.

 

***

 

Jon observava, do alto do forte, os corpos que jaziam empilhados nos campos às margens do Ramo Vermelho. O exército nortenho, reforçado pelos cavaleiros do Vale de Arryn, conseguiu atacar com sucesso os soldados Lannister e Frey que guarneciam Correrrio. O feito só foi possível pela ajuda de serviçais que ainda eram leais à Casa Tully, que lhe haviam fornecido informações sobre as trocas de turno, recebimento de suprimentos e o abandono que as tropas lealistas sofriam por parte do Trono de Ferro.

Correrrio era ladeado por água, e se não obtivessem sucesso em sua empreitada, os homens Stark teriam que montar um cerco que poderia durar indefinidamente, já que o castelo era quase expugnável se tivesse os mantimentos necessários. Mas não era o que acontecia. Desde que Cersei Lannister roubou a coroa para si, negligenciou os aliados e concentrou toda a força do exército de sua família em Porto Real, deixando os outros pontos estratégicos sem guarnição necessária. Com essas condições, somadas às informações privilegiadas que tivera, foi fácil para Jon conquistar o castelo, mesmo que não fosse um gênio da estratégia.

Emmon Frey e sua esposa, Genna Lannister, foram poupados, assim como seu neto e herdeiro, Tywin Frey. Jon tivera por eles muito mais consideração do que suas respectivas famílias tiveram por qualquer Stark, tornando-os prisioneiros da Coroa do Norte, mas mantendo-os vivos e bem tratados em uma das alas do castelo. Por mais que desejasse vingar a morte de seu pai, de sua madrasta e de seus irmãos, sabia que aquele não era o caminho. Desta maneira, assim que a notícia do assassinato de Lorde Edmure Tully, uma represália pela morte de Walder Frey, chegou ao Norte, prometeu à Sansa que libertaria as Terras Fluviais e a tornaria Senhora de Correrrio, fazendo com que mais uma parte do acordo que motivou o Casamento Vermelho fosse por água abaixo.

― Majestade, já retiramos todos os corpos do interior do castelo. ― Davos surgiu, retirando Jon de suas reflexões ― O que fazemos com eles agora?

― Leve-os para algum lugar apropriado e os enterre. Irei buscar a minha irmã no acampamento e não quero que estejam aqui quando ela chegar.

― Certo. Já enviei o mensageiro, e a esta altura a Princesa já deve ter conhecimento da nossa vitória.

Escutar Davos chamar Sansa de princesa soava menos estranho do que ser chamado de rei. Ainda não estava habituado com o novo título que lhe conferiram e achava que provavelmente nunca estaria. Às vezes, pensava que aquilo tudo não passava de mais um dos sonhos de bastardo que tivera ao longo da vida.

― Reúna alguns homens e mande selar meu cavalo. Partirei imediatamente.

Davos assentiu com a cabeça, obedecendo prontamente a ordem de seu novo Rei. Jon desceu até o pátio do castelo, e viu as bandeiras Lannister e Frey sendo substituídas pelos símbolos dos Stark e dos Tully, estes últimos representando a reinvindicação que Sansa possuía sobre Correrrio – afinal de contas, ela era a filha mais velha de Catelyn, que por sua vez era a primogênita de Hoster Tully.

Esperou alguns minutos até que tudo estivesse pronto, e assim que a ponte do castelo baixou, subiu em seu cavalo e partiu para o acampamento encontrar a irmã. Enquanto o cavalo trotava sob seu corpo, pensou em como ela o receberia, pois desde sua coroação, Sansa afastou-se dele. Seu esforço para conquistar Correrrio era uma tentativa de reaproximação, afinal de contas a irmã era a única família que lhe restava.

Avistou a conglomeração de barracas cinzas com detalhes em verde musgo e desacelerou assim que avistou Sansa no meio da paragem. Desceu do cavalo e caminhou em direção a ela, e sentiu-se completo novamente quando a irmã jogou-se em seus braços, dando-lhe um abraço apertado. Ele inspirou o cheiro de azaleia que exalava dos cabelos rubros da garota, que pareciam chamas devido ao reflexo do sol. Fechou os olhos e girou seu corpo, enquanto a segurava com força.

― Obrigada! Obrigada! ― Sansa sussurrou em seu ouvido.

― Eu disse que iria devolver Correrrio para sua família... ― ele sorriu.

― A nossa família. ― ela quebrou o abraço e o encarou ― O que é meu é seu também.

― Não neste caso. Essa é a herança da família da sua mãe, pertence a você e somente a você. É a Senhora de Correrrio agora.

― Tenho Correrrio devido ao seu esforço, irmão. Perdoe-me por ter sido tão infantil com você antes.

― Já pediu desculpas por isso, Sansa. Não é necessário remoer este assunto. ― Jon colocou a irmã de volta ao chão, mas não deixou de encará-la.

― Não está entendendo, Jon. Eu peço desculpas por meu egoísmo. Por não ter te apoiado da forma que você precisava e por ter sentido inveja.

― Inveja? ― ele perguntou, sinceramente surpreso. Até então, não sabia que a irmã nutria aquele sentimento.

― Sim. Tive despeito quando os Lordes do Norte o coroaram Rei, pois pensei que o mais lógico seria que eu fosse Rainha. ― confessou ― Deixei que envenenassem minha cabeça contra você, mas agora sou eu quem lhe faço uma promessa: jamais deixarei que nos separem. Não permitirei que nada nem ninguém fique entre nós novamente.

Jon sorriu. Olhou dentro dos olhos azuis-cobalto de Sansa e viu que ela falava a verdade. Deu um beijo em sua testa a abraçou novamente, sentindo que tinha sua família de volta.

 

***

 

― Um viva à Princesa Sansa Stark, Senhora de Winterfell e Correrrio! ― a voz de Jon ecoou pelo grande salão do castelo Tully.

Ele ergueu uma taça e foi seguido pelo grande exército que o acompanhava e saudava a irmã, além dos Lordes das Terras Fluviais que haviam sido convocados para celebrar a derrocada dos Freys. As vozes misturadas eram quase ensurdecedoras, porém Jon não se importava. A felicidade estampada no rosto de Sansa fazia valer todo o esforço que fizera para conseguir o domínio da fortaleza – além do óbvio valor estratégico que a construção possuía.

Jon sentou-se à mesa, e surpreendeu-se quando, poucos instantes depois, Sansa levantou-se e começou a falar.

― Eu, como a nova Senhora deste castelo, agradeço aos bons homens que ajudaram a retomar o que é meu por direito, e principalmente agradeço ao meu irmão, o Rei do Norte!

As vozes ficaram mais intensas e era possível escutar alguns aplausos no meio da algazarra. A parte nortenha do exército começou a bradar “Rei do Norte” à plenos pulmões, saudando o líder que tinham escolhido. O barulho era tanto que Sansa teve que esperar para prosseguir com sua fala.

― Como neta de Hoster Tully, faço uma sugestão aos senhores das Casas das Terras Fluviais: que assim como meu irmão Robb, Jon seja coroado o Rei do Tridente! ― ela bradou ― Ele os libertou do desmando e má administração dos Freys! Ele os salvou da loucura que tomou conta do Trono de Ferro, que agora está nas mãos de uma Lannister, cuja família demonstrou nada mais do que desprezo por vocês! Juntem-se ao Reino do Norte e ao Vale e libertem-se das correntes com as quais lhe prenderam!

Houve silêncio após as palavras de Sansa. Jon pensou que talvez a irmã tivesse ido longe demais, afinal de contas ele era o bastardo de Lord Eddard, fruto de uma traição que este cometera contra Catelyn, a amada filha do falecido Senhor Supremo do Tridente. Ele era uma mancha na união perfeita entre Starks e Tullys.

Contudo, havia aqueles que o viam como o sucessor de seu irmão, Robb. As vozes começaram baixas e rarefeitas, mas ao encontrar apoio e aceitação, foram crescendo aos poucos. Dentro de minutos, o grito de “Rei do Tridente” já era unanimidade, e ressoava pelas paredes de Correrrio de forma estrondosa, ao ponto de quase conseguir deixar Jon surdo. Rei do Norte. Rei do Tridente. O bastardo de Eddard Stark havia ido muito mais longe do que em qualquer sonho que tivera. Piscou os olhos rapidamente e só assim teve certeza de que estava desperto e que tudo aquilo era realidade.

 

***

 

Lyanna caiu de costas, e ficou sentada por um longo tempo no chão forrado pelas folhas vermelhas do represeiro. Tentava assimilar tudo que acabara de ver, mas não conseguia. O Rei de seus sonhos era filho Ned, o que o tornava seu sobrinho. E o pior, filho bastardo. E havia a garota com longos cabelos ruivos e profundos olhos azuis, que se dizia filha de seu irmão do meio e de Catelyn Tully. Ora, era Brandon quem estava noivo da garota das Terras Fluviais, não Ned! Se aquilo fosse verdade, só havia uma explicação para o noivo fosse trocado.

A saliva passou queimando na garganta de Lyanna, enquanto imaginava o que teria acontecido com Brandon. Provavelmente teria morrido, e como a data de seu casamento estava marcada para dentro de poucos meses, sua morte seria em breve. Tinha acabado de descobrir que perderia o irmão mais velho e já se arrependera de ter insistido em aprender mais sobre o seu dom de visão verde. Sabia que veria coisas das quais não iria querer saber, mas não esperava que lhe apareceriam logo assim, na primeira experiência que tivesse. Sentiu o coração apertar de tal forma, que lágrimas escaparam de seus olhos, tornando sua visão embaçada. Não queria perder Brandon, não saberia viver sem ele.

Deu-se conta, também, que referiam-se a Cersei Lannister como a rainha sentada no Trono de Ferro. Conheceu a filha de Lorde Tywin no Torneio de Harrenhal e a achou belíssima com seus longos e encaracolados cabelos dourados; no entanto, não entendia como ela se tornaria a Rainha dos Sete Reinos. Havia os Targaryen em seu caminho. Ou não?

Teria que superar o medo se quisesse esclarecer as dúvidas que dominavam sua mente. Lyanna decidiu agir e foi até os estábulos de Winterfell preparar sua montaria. Saiu do castelo e cavalgou até a Mata de Lobos, diminuindo o ritmo para tentar encontrar quem buscava.

― Rhaegar! Rhaegar! Se estiver por aqui, por favor, apareça! ― ela gritou, a todos pulmões.

Repetiu o processo mais algumas vezes, mas ninguém apareceu. Desceu de sua montaria, amarrou seu cavalo em uma árvore e começou a andar pela floresta, procurando sinais da presença do príncipe. Contudo, falhou em encontrar indícios de que Rhaegar havia passado por ali.

Após quase meia hora de busca, desistiu e decidiu voltar para Winterfell. O Príncipe de Pedra do Dragão deveria ter partido após o tapa que desferira contra ele, pensou Lyanna. Talvez aquilo tenha sido um golpe duro demais na honra e no orgulho de Rhaegar, que tinha percorrido um longo caminho das Terras da Coroa até o Norte apenas para vê-la.

Lyanna estava tão absorta em seus próprios pensamentos que foi pega de surpresa quando um homem desconhecido a abordou.

― Ora, o que temos por aqui... ― ele disse, enquanto a olhava dos pés a cabeça, com um sorriso de escárnio que mostrava uma fileira de dentes podres dentro de sua boca.

O desconhecido usava roupas sujas e gastas e tinha a pele coberta de poeira e algumas feridas. Ele deu alguns passos, indo em direção à Lyanna.

― Não se aproxime! ― ela respondeu, tentando parecer firme ― Sou filha de Lorde Rickard Stark, Senhor de Winterfell.

O homem gargalhou, como se estivesse zombando do que a garota acabara de dizer.

― Não me importo nenhum pouco com quem é seu pai. A única coisa que vejo é a puta com quem irei foder.

O maltrapilho avançou sobre Lyanna tão logo proferiu as palavras, derrubando-a no chão. A garota Stark tinha o homem em cima de si, e lutou para libertar-se dele, desferindo socos e tapas, até que ele lhe deu uma pancada no rosto que a fez ver estrelas e ficar atordoada. Sua visão ficou turva e a maçã de seu rosto ardeu e inchou, como se tivessem colocado ferro em brasas sobre sua pele. O senso de direção de Lyanna voltou apenas quando sentiu o homem enfiar sua mão asquerosa por dentro de suas pernas, levantando o vestido que ela utilizava até a altura das coxas. Por reflexo, ela enfiou seu joelho na altura da genitália do homem, dando um chute mais forte do que esperava.

O desconhecido tombou para o lado, revirando-se de dor enquanto rolava pelo chão coberto de folhas. Lyanna aproveitou o seu descuido e levantou-se, encarando o homem com ódio mortal.

― Eu devia colocar sua cabeça numa estaca agora! ― os dentes rangiam enquanto ela falava ― Eu deveria castrá-lo e enfiar suas partes em sua própria boca, apenas para ensiná-lo a não atacar mulher alguma!

Deu um chute nas costelas do homem, e sentiu o corpo dele retorcer-se sobre seus pés. Seu sangue fervia, e então chutou de novo, de novo, e de novo. Só parou quando alguém a segurou por trás, impedindo que prosseguisse com a agressão.

― Lady Lyanna! Lady Lyanna! O que está fazendo?

― Solte-me! Solte-me imediatamente!

A pessoa teve força suficiente para controlar a garota Stark, que se debatia freneticamente em seus braços.

― Pelo amor dos Sete, Lyanna! Sou eu, Rhaegar!

Ele rodou o corpo da garota e a fez encará-lo. Por alguns instantes, Lyanna ficou hipnotizada pelos profundos olhos índigo-escuros que o Príncipe tinha, sentindo seu coração acelerar-se dentro de seu peito ao fitá-lo. Mas o encanto durou pouco.

― Seu principezinho de merda! ― Lyanna começou a distribuir socos pelo peitoral de Rhaegar ― Vim até aqui procurá-lo e quase fui estuprada por este desgraçado! ― apontou para o homem que ainda jazia no chão, imerso em dor.

― Ele tentou forçá-la? ― Rhaegar ignorou o insulto que Lyanna lhe dirigira e encarou o homem ― Você colocou suas mãos asquerosas em Lady Stark?

O Príncipe agarrou o sujeito pela gola da camisa e o suspendeu até que pudesse examiná-lo na altura dos olhos. Teve vontade de esmurrá-lo até que seu crânio esfarinhasse em suas mãos, e por um breve instante, sentiu medo de si mesmo e do que poderia fazer; mas pensar que aquela criatura repugnante tinha tocado em Lyanna fez uma fúria incomum crescer em seu peito, e seu lado pacifista deu lugar a uma faceta violenta e vingativa.

― Diga a palavra e eu matarei este infeliz agora mesmo, Lady Lyanna. ― Rhaegar falou, enquanto apertava a gola ao redor do pescoço do desconhecido.

A garota hesitou. Tinha ódio e desprezo por aquele sujeito que tentara violá-la da forma mais vil possível. Contudo, não queria ter o peso de uma morte em suas costas.

― Solte-o, Rhaegar.

O Targaryen a encarou, surpreso.

― Não pode estar falando sério... Quer mesmo que eu solte este...

― Já disse. Deixe-o ir. ― a voz de Lyanna era firme.

Depois de alguns momentos que pareceram eternos, o Príncipe afrouxou as mãos, deixando o homem livre. Porém, no último segundo, quando ele se preparava para ir embora, segurou seu pulso com força.

― Agradeça à Senhora por ter salvo sua vida miserável. ― ele disse, sem esconder o nojo que sentia ― Eu o teria matado se ela não tivesse pedido. Lady Lyanna é a futura Rainha deste reino, e se tivesse feito algo contra ela, seu destino teria sido pior do que a morte. Teria conhecido a fúria do dragão.

O sujeito assentiu, visivelmente amedrontado, e correu assim que Rhaegar o soltou. O Príncipe virou-se para Lyanna, e então percebeu a área avermelhada e inchada que se formava na bochecha da jovem. Tentou aproximar-se dela, mas foi repelido.

― Não! Deixe-me em paz! ― Lyanna virou-se e começou a caminhar pela floresta.

― Você não pode me dar as costas! Acabei de salvar sua vida, Senhora Lyanna! ― Rhaegar berrou.

― Salvou minha vida? Você salvou a minha vida? ― ela deu meia volta e encarou, a ponto de explodir ― Se eu não tivesse golpeado aquele sujeito, a essa altura ele teria me tomado à força!

― Senhora Lyanna, eu... ― ele deu alguns passos em direção à ela.

― Você o que, alteza? ― Lyanna o interrompeu, com o tom repleto de escárnio ― Não preciso de um príncipe encantado para me salvar, está ouvido? E muito menos serei Rainha deste reino. Esse papel está reservado a sua esposa, a Princesa Elia, e não pretendo usurpar a posição dela.

Novamente, a garota deu as costas para Rhaegar, a fim de encontrar seu cavalo.

― Sendo assim, voltarei para Porto Real. Não lhe imporei minha presença novamente, Lady Stark. ― o Príncipe falou, e o peso em sua voz era quase palpável.

Lyanna hesitou, e seus pés pararam quase que por vontade própria. Teve que controlar seu impulso para não correr até Rhaegar e jogar-se em seus braços.

― Não vá... Não ainda... ― ela sussurrou, enquanto virou-se para encará-lo.

― Por quê? Dê-me um motivo para que eu não vá... Fui tão maltratado desde que coloquei meus pés aqui que não consigo mais ver razão alguma para continuar no Norte.

― Preciso de sua ajuda. ― Lyanna admitiu.

― Em quê?

Um longo suspiro saiu dos lábios da garota. Havia uma grande possibilidade de Rhaegar achar que estava louca, mas precisava dividir com alguém todas as experiências que tivera, e sabe-se lá o motivo, achou que ele era a pessoa certa para fazer aquilo.

― Tenho tido sonhos... Sonhos e visões... ― explicou com cautela, tentando decifrar qual seria a reação do Príncipe ― Consegui ver coisas, coisas que creio que ainda acontecerão...

― Você viu o futuro? ― os olhos violetas de Rhaegar brilharam ― Viu fatos que ainda estão por vir? Isto é... Maravilhoso!

― Não há nada de maravilhoso nisto, acredite em mim... Vi coisas que daria tudo para não ter visto. ― fechou os olhos e sentiu um nó formar-se em sua garganta ― Meu irmão Brandon irá morrer. Ned será o Senhor de Winterfell e se casará com Catelyn Tully no lugar dele.

Lyanna abriu os olhos e percebeu que sua visão estava embaçada. Não demorou muito para que suas bochechas esquentassem e lágrimas começarem a rolar por elas. Tentou controlar-se, mas o esforço foi em vão; quando deu-se conta, chorava como uma criança, à ponto de até mesmo soluçar.

Deixou levar-se quando Rhaegar a recostou sobre seu peito e a envolveu em seus braços, acariciando sua cabeça enquanto sussurrava palavras para lhe acalmar. Pensou no quão impróprio era deixar ser envolvida daquela forma por um homem casado, enquanto ela própria era noiva. Mas naquele momento, nada importava. Afundou seu rosto no colo do Príncipe e chorou tudo que tinha para chorar, e não tinha vergonha daquilo.

Quando o choro de Lyanna diminuiu, Rhaegar segurou seu rosto de forma gentil e fitou-a. Os olhos da garota estavam inchados e vermelhos, mas aquilo não era capaz de deixá-la menos bela.

― Não fique assim. ― passou o polegar sobre a bochecha da jovem, secando uma de suas lágrimas ― Meu coração se parte ao vê-la triste.

― Ajude-me, por favor. ― Lyanna pediu, e sua voz era fraca ― Preciso entender o que está acontecendo e creio que apenas você pode me auxiliar.

 

***

 

Rhaegar e Lyanna cavalgaram para fora da Mata de Lobos, indo em direção à Winterfell, evitando as áreas mais movimentadas, como a Vila de Inverno, para que não fossem vistos. A garota Stark queria levar o Príncipe para dentro do bosque sagrado que ficava dentro da grande fortaleza, e por isso decidiu guiá-lo até o Portão do Caçador, por onde poderiam entrar no castelo de uma forma mais discreta.

Após uma rápida vistoria, percebeu que a área dos canis estava vazia, e conseguiu passar com o Targaryen, que estava escondido sob um pesado capuz negro, levando-o até o interior do bosque sagrado. Entretanto, diferentemente das outras vezes, decidiu que não iriam para o principal represeiro, mas sim para um menor, que ficava perto dos muros que protegiam Winterfell; assim, o risco de serem pegos por seu pai ou por um de seus irmãos seria consideravelmente menor.

― Posso lhe fazer uma pergunta? ― Lyanna indagou, enquanto posicionavam-se em frente à árvore coração.

― Claro.

― Sabe o que é a canção de gelo e fogo?

O rosto de Rhaegar empalideceu-se e seus olhos arregalaram-se. Aquela reação foi o necessário para responder o questionamento de Lyanna.

― Onde ouviu falar disso?

― Nas minhas visões. ― ela explicou ― Há um velho senhor que se chama Corvo de Três Olhos, que é o responsável pelas coisas que sou capaz de vivenciar. Ele disse algo sobre essa tal canção, mas não entendi direito.

― Lyanna, a canção de gelo e fogo é sobre aquele que salvará o mundo da Longa Noite. ― a voz de Rhaegar mudou, e seu rosto ficou mais sério que o de costume ― O Príncipe Prometido. Por algum tempo, pensei que seria eu a desempenhar este papel, e por isso comecei a me interessar pela arte da guerra; mas então, percebi que a profecia não diz respeito a mim, mas sim a meu filho, Aegon. Ele será o responsável por salvar a humanidade.

― Desculpe-me, mas creio que isto não tenha nada a ver com o pequeno príncipe.

― Por qual motivo acha isso?

― Eu tive outras visões... ― Lyanna tentou lembrar-se com detalhes do que presenciara ― Havia um Rei. Ele utilizava dois estandartes, dos Stark e dos Targaryen, mas não entendi ao certo o motivo para isto. Mas sei que ele é da minha família, filho de meu irmão, Ned. E ele tinha uma filha, uma pequena princesa com os cabelos prateados como os seus, e referiu-se a ela como a filha do gelo e fogo. Talvez a canção seja sobre ela.

― Os símbolos das nossas famílias, juntos? ― Rhaegar pareceu dar-se conta de alguma coisa ― Pode me mostrar o que viu?

― Acho que sim. O Corvo de Três Olhos me disse que eu poderia dividir as visões com outra pessoa, se eu quisesse.

― Então mostre-me, por favor.

Lyanna assentiu e pegou a mão de Rhaegar, colocando-a sobre a sua. Deram alguns passos em direção ao pequeno represeiro, e após tomar uma lufada de ar, a garota tocou a madeira branca esculpida. Instantaneamente, tanto a jovem Senhora Stark, quanto o Príncipe de Pedra do Dragão foram transportados para uma época longe daquela que viviam e para um lugar que estava além do alcance de ambos.


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