Connection

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Dez. Vinte. Trinta. Cinquenta.

Tantas lâminas de tão diferentes formas que seria impossível de se contar. Um mundo encoberto por nuvens que desbravavam o céu tão rápidas quanto o vento. Imutável. Onde tempo e espaço não existiam. Apenas a solidão de um único indivíduo que sobrevivera a tantas batalhas, vira tanta morte, que sua vida não tinha mais significado, apenas ostentava a plena convicção de que seu corpo certamente era feito de espadas.

Desde que invocara Archer, aquelas visões a acompanhava todas as noites durante o sono, assim como a imagem das costas do homem no topo da colina, perdendo-se cada vez mais ao observar o infinito. Borrões de uma realidade desconhecida até então, mas que ela sabia que pertencia a ele.

Um guerreiro que buscara tão somente a justiça, tendo como sua principal arma as próprias mãos, que manejavam tão habilmente o destino de seus alvos. Porém, não tivera a mesma sorte de tantos outros que salvara. Traído e condenado. Decaíra de heroi a mero objeto descartável. A cena da forca que balançava de um lado para o outro tomara forma, como o pêndulo de um relógio marcando os segundos, minutos, conforme a morte se aproximava dele.

Mas naquela noite tudo estava diferente. Tão real. Pôde sentir a aspereza da corda quando esta lhe roçara a pele, o vento que batia em seus cabelos, assim como o calor do sol poente que lançava raios tão luminosos a ponto de cegar. Como se ela mesma fosse a vítima. O medo e ansiedade. A incerteza de não saber se aquelas emoções e sensações partiam dela ou daquele o qual ela ocupava o lugar.

Assim que a amarra pressionou sua garganta, despertou. A respiração irregular, o coração se apertando, enquanto olhava e apalpava ao redor, apenas para afirmar que continuava em sua cama, na mansão, e que a brisa que fazia seus fios negros dançarem provinham da janela que encontrava-se aberta para as estrelas. Ainda perturbada, levantou-se lentamente, utilizando as paredes para melhor se locomover diante de seu desnorteio.

Abrindo a porta do cômodo, deparou-se com o protagonista de seu sonho.

Archer estava recostado contra a parede contrária a do quarto, os braços cruzados sobre o peito largo e bem estruturado. Sempre confiante e austero. Ele a encarava com seus olhos cinzentos, inteligentes, perguntando tudo e nada ao mesmo tempo. Enxergando muito além do que ela poderia dizer. Este sentira a perturbação de sua Mestra, e independente da razão, prontamente se colocara em uma posição favorável para auxilia-la no que quer que fosse necessário, afinal, era esse seu dever.

Rin o encarou com seu olhar cansado. Silenciosa. Ainda não sabia com segurança de qual Espírito Heroico ele se tratava, mas isso era a ultima coisa que importava naquele momento. Sem pensar demais, deixando a razão de lado apenas por aquele instante, caminhou a passos lentos até parar há poucos centímetros dele, não mais vendo a expressão em seu rosto de pele bronzeada.

Archer relaxou a posição, abandonando os braços ao longo do corpo, observando-a atentamente, ainda que tudo que pudesse ver fosse o topo da cabeça da habilidosa maga. Como se aquilo fosse um consentimento mudo, Rin afastou a hesitação que a impedia, enlaçando a cintura de músculos firmes do arqueiro, escondendo o rosto no peito dele enquanto o abraçava.

Rin sentiu o rosto esquentar. A timidez que tanto afetava seu quase perfeito autocontrole tomando forma, certamente tingindo suas bochechas de escarlate. Agradeceu mentalmente pelo corredor estar iluminado tão somente pelo luar. Mas apesar disso, ela não se afastou. Pôde sentir o corpo de Archer tencionar-se sob seu toque, provavelmente em surpresa, ou desconforto – ela esperava que se tratasse do primeiro.

— Rin? – Questionou o heroi a meia voz, impassível, apesar de seus membros denunciarem o contrário.

— O-O que é?

— Você está bem?

Que pergunta mais idiota. É claro que ela não estava bem. Mas não era pelos motivos que ele poderia imaginar. E naquele momento Rin queria fazer o mesmo questionamento ao homem ao qual estava conectada. Ele estava bem? Como poderia estar, afinal?! Raiva, revolta, tristeza. Um turbilhão de sentimentos borbulhavam dentro da garota de olhos cianos diante do simples pensamento da justiça que ele tanto lutara a favor, falhar justamente com quem era o maior merecedor.

— Cale-se, Archer... – Ordenou ela, a voz abafada contra o peitoral dele, os dedos afundando contra o tecido vermelho das vestes que ele utilizava, apertando-o ainda mais contra si – Apenas, cale-se.

Obedecendo-a, ele permaneceu sem emitir um som sequer, consciente de que havia algo errado, mas ignorante aos fatos. Viu-se de mãos atadas, praticamente inútil, já que suas habilidades não possuíam serventia alguma em tal situação, mas aquele definitivamente não era um estado a que admitia se sujeitar. Então, naturalmente ainda que incerto, pousou os próprios braços ao redor dela, mantendo-a ali por quanto tempo ela decidisse ficar.

Archer mal sabia que ela fazia aquilo por ele. Para ele.

Solitário. Tão solitário durante sabe-se lá quanto tempo. E embora ninguém tivesse ido ao auxílio dele quando mais precisou. Mesmo que o mundo houvesse faltado com suas obrigações, ela estava ali agora, e o salvaria com suas próprias forças quantas vezes fossem necessárias.