A menina e o Vento escrita por Saritcha
Notas iniciais do capítulo
Olá queridos coconuts!
Esta é minha segunda one-shot e a primeira a tratar de um tema mais pesado (quero dizer, as paradas estão implícitas no texto).
Boa leitura!
Com os olhos inchados de tanto chorar a menina tremeu ao inclinar a cabeça pela borda do terraço e ver a altura da qual despencaria. A noite estava quente mas ela tremia. Afastou-se vagarosamente da mureta e pensou mais algumas vezes.
Doeria?
Sim.
Demoraria?
Talvez.
Ela teria paz? Esta última questão surgiu em sua mente pela primeira vez em anos. Parecia estranha ali; não combinava com ela. Suspirou. Fechou os olhos e parou de pensar.
Ao voltar a enxergar não raciocinava. Havia dentro de si apenas um desejo animalesco anti-natural: ela queria, não... Precisava morrer. Voltou para a borda do terraço e, com seus braços magros e frágeis, fez força para se erguer.
Sentou na pedra fria nada convidativa e olhou para a rua vazia quinze andares abaixo. Com a visão turva mal distinguiu a calçada mal iluminada do asfalto onde os carros corriam nas madrugadas. Várias vezes eles a acordaram de seus sonhos turbulentos — nas poucas noites em que conseguia dormir — cantando seus pneus para atravessarem uma linha de chegada a alguns quilômetros dali, na pedreira abandonada.
Colocou as duas pernas para fora. A sensação de “nada” abaixo de seus pés a inebriou. Um sorriso inocente cruzou seu rosto machucado e ela ergueu os olhos para o céu. As nuvens cobriam-no como se não quisessem que ela apreciasse a lua e as estrelas uma última vez. Ela não se importou.
Olhou mais uma vez o chão e sentiu um arrepio de excitação. Ela ia pular.
Quando começou a se movimentar para tomar impulso a brisa acariciou seu corpo, fazendo seus cabelos cacheados voarem animadamente. O Vento foi despedir-se dela. Ele, que inúmeras vezes sufocou seus gritos de angústia e dor. Ele que a impediu de clamar por ajuda...
Lembranças invadiram sua mente; lembranças de quando era criança e o Vento carregou pétalas de flores ao seu redor. De quando provocou risos e fez cócegas.
Não... O Vento sempre foi seu amigo. Impediu que ouvissem seus gritos de dor e rissem de sua derrota. Impediu que ouvissem seus pedidos de ajuda pois sabia que seu coração se encheria de esperanças com a possibilidade de se libertar, mas que ela jamais voltaria a se encaixar no mundo fora de sua cela.
Ela chorou mais uma vez. Ele jamais a abandonou. Levou as mãos ao rosto para limpar as lágrimas que faziam suas feridas arderem.
Sentiu-se mais leve, como se o Vento pudesse levá-la dali. De fato, ele podia, mas não o faria. Sabia que não era isso que ela queria.
Adeus, ele sussurrou em seu ouvido. A brisa cessou e seus cachos pararam de balançar. Ele a deixara.
Ela engoliu em seco e sentiu-se pronta. Calma e vagarosamente, tomou seu impulso. E caiu. Na queda, sentiu-se viva como nunca. Sentiu suas piores memórias pesando em seu peito, levando-a até seu destino tão esperado como uma âncora.
Com um baque, seus ossos quebraram contra o asfalto. Seu sangue morno manchou o calçamento. E ela morreu, feliz. Morreu e deixou seu corpo naquela rua escura e suja. Deixou seu corpo e viajou com o Vento.
Apenas sua alma, nas alturas gélidas.
Apenas a menina e o Vento.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Notas finais do capítulo
Bem, é isso. Esperam que tenham gostado :)
Mereço uns reviews?
Beijos e até uma próxima!