Linhas Cruzadas escrita por Cinara Machado


Capítulo 9
Capítulo 9


Notas iniciais do capítulo

Leiam as notas finais ^^

Capítulo 9 - Corrida e (in)consequência./Debate



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Eu olhei em volta, quase me sentindo em casa pela primeira vez desde que havia chegado ao Brasil. Carros, pessoas bebendo, se divertindo...

Andei um pouco, tentando conhecer o lugar e procurando pelo tal Marvel. Eu vi um carro azul quase chamativo e um menino loiro encostado nele, com uma menina ao lado. Fui até ele.

— Marvel?

— E você quem é? - ele me olhou, afastando um pouco a menina.

— Katniss, o Diego disse pra te procurar.

— Ah, ele mandou mensagem falando que você viria.

— Eu quero correr.

— Tem carteira?

— O lugar é legalizado? - rebati, arqueando a sobrancelha.

Ele me olhou por dois segundos, me analisando.

— Menina esperta. - ele sorriu. - Vamos ver se é esperta assim na pista. Me mostra seu carro?

Eu o levei até onde meu carro estava e vi seu olhar de deboche.

— Tá brincando comigo? - ele me encarou.

Eu sabia que o carro da minha mãe não era muito apropriado pra corridas, mas não ia abaixar a cabeça.

— Eu consigo.

— Tem certeza?

— Yeah, eu tenho.

— Você quem sabe então.

— Aqui, - estendi um dinheiro pra ele. - da aposta.

Ele fez que não com a cabeça.

— Não vou pegar seu dinheiro.

— What? Por que?

— Porque você é linda. - ele deu um sorriso de lado.

— Vou beber alguma coisa.

— Eu pego, Diego pediu pra ficar de olho em você.

— Eu tenho mãos e não preciso de babá.

Eu me afastei dele rapidamente. O cara com quem eu comprei a cerveja me ofereceu "algo mais forte" e apesar de querer, eu não aceitei. Estava longe de casa em um local onde eu não conhecia ninguém. Tomei três cervejas e estava terminando a segunda dose de vodca quando o Marvel veio até mim.

— Sua corrida é agora, ainda da tempo de desistir.

— No, eu já disse que consigo.

— Eu sei. - ele sorriu. - Boa sorte.

A sensação de liberdade me atingiu em cheio quando pisei no acelerador, me fazendo sorrir instantaneamente. Correr era uma das poucas coisas que me acalmava, me fazia sentir plena. Diferente do que minha mãe costumava dizer, eu não corria para irritá-la ou qualquer coisa assim. Eu corria porque amava aquilo.

Era uma corrida simples de duas voltas. A pista não era muito larga, mas era mais fácil correr ali do que nas pistas que eu já havia corrido em Londres.
Eu vibrei ao passar pela linha de chegada, sem conseguir controlar meu sorriso. Eu saí do carro e um monte de gente começou a me cumprimentar, eu apenas sorria em agradecimento. Marvel sorriu, se aproximando de mim.

— Eu disse que conseguia.

— Parabéns. - ele sorriu. - Posso te pagar uma bebida pra comemorar?

— Eu pago a minha bebida, mas aceito a companhia.

— Ok. - ele sorriu.

Compramos duas cervejas e ficamos encostados no capô do carro dele conversando.

— Me conta sobre você. - ele pediu.

— No, fala você.

— Hum... meu nome é Marvel, eu tenho vinte e um anos e gosto de corridas.

— Só isso?

— Só. Sua vez agora.

— Não há nada pra contar pra contar sobre mim.

— Eu duvido. - ele riu. - Quantos anos você tem?

— Dezenove.

— Mentira!

— What? Está me chamando de mentirosa?

— Não, só disse que você não tem dezenove anos.

— E por que não?

— Porque você tem cara de menininha.

— Eu posso ter quarenta e feito cirurgia.

— Eu duvido que essa pele perfeita - ele alisou meu rosto. - precise de agulhas.

— Eu esperava algo mais original de você. - disse, começando a rir.

— Desculpe, eu nunca dei em cima de ninguém com cabelo roxo, não sabia o que falar. - ele riu, baixando a cabeça sem graça.

— A sua sorte é que eu gosto dos seus olhos. - eu virei seu rosto pra mim e o beijei.

Vinte minutos depois nós estávamos no banco de trás do carro do Marvel, duas ruas depois de onde aconteciam as corridas.

— Eu preciso ir. - disse, parando de beijá-lo.

— O quê? Não, fica mais um pouco.

— Eu preciso ir, mesmo.

— Sério? Eu posso te levar depois.

— My car está a duas ruas daqui, Marvel.

— Ah é, eu esqueci, é difícil pensar quando você está no meu colo. - eu ri e então saí do colo dele, me sentando ao seu lado. - Eu não disse isso pra você sair daqui.

— I know, mas eu preciso ir.

— Tudo bem, eu entendo.

— Então... não vai me dizer sua idade? - Marvel perguntou, abrindo a porta do meu carro pra mim.

— Nineteen, me beijar te deixou com amnésia?

— Não, - ele riu. - embora seu beijo seja muito bom.

— Então eu tenho nineteen. - sorri. - Good night Marvel.

— Boa noite, linda. Eu espero te ver de novo.

Ele me beijou pela última vez e eu entrei no carro, então ele fechou a porta pra mim.

Entrei em casa tentando não fazer barulho, mas foi em vão. Minha mãe estava na sala me esperando, com o seu usual olhar de reprovação.

— Isso são horas de chegar em casa, Katniss? - ela gritou.

— É melhor que não chegar nunca.

— Onde você estava?

— Em um lugar vey fun. - falei, subindo.

Eu a ouvi gritar meu nome, mas não voltei.

Pela primeira desde que havíamos chegado ao Brasil o tempo estava nublado, então tomei um banho morno e coloquei uma calça escura manchada e um coturno preto, uma regata branca e peguei um casaco xadrez cinca com preto, deixando-o amarrado na cintura. Soltei o cabelo e passei uma maquiagem leve. Quando desci minha mãe ainda estava na sala, ela estava falando ao telefone com alguém e desligou imediatamente ao me ver. Passei direto por ela indo até a cozinha, ouvi seus passos atrás de mim.

— Você roubou meu carro.

— No, eu peguei emprestado, já que o meu não está aqui.

Peguei dois comprimidos para dor de cabeça e tomei.

— Não te criei para ser uma ladra!

— Sue me.

— Um dos maiores motivos que me fez voltar ao Brasil foi querer que você recomeçasse, então eu acho bom você andar na linha, Katniss.

— Você me tirou de perto de todos que eu amo e quer que eu fique bem? Que eu aja como se estivesse feliz? THIS WILL NOT HAPPEN, MOM!

— Lembre-se que você não tem mais o Haymitch para tirá-la de confusão. Aqui não é Londres, Katniss! Haymitch não pode tirá-la da cadeia com apenas algumas ligações.

— Yeah, eu não tenho mais o Haymitch ou qualquer um que eu amava. Bom dia mom, eu tenho aula agora.

Respirei fundo ao trancar o portão e fechei os olhos com força, quando as lembranças da pior noite da minha vida noite me atingiram.

— Está tudo bem, Katniss? - ouvi a voz do seu Jorge e abri os olhos, voltando a realidade.

— Yeah, claro. Tudo bem, obrigada. - sorri. Finnick apareceu.

— Ei! - ele sorriu.

— Hi! - sorri de volta.

— Vamos pro colégio?

— Vamos.

— Calma aí, vou mandar o Peeta descer.

Ele pegou o celular e mandou mensagem. Segundos depois o Peeta apareceu no portão.

— Bom dia! - ele se aproximou com um sorriso leve.

— Bom dia!

Fomos o caminho inteiro conversando, com o Finnick fazendo piada de tudo. No caminho passamos na casa da Delly.

— Oi! - ela me olhou, entrelaçando as mãos com o Peeta.

— Hi!

Ela não gostava de mim, eu sabia disso pela forma como ela me olhava.

— Não vai passar na casa da Glimmer, Finnick?

— Não, ela disse pra mim ir direto hoje porque ela iria se atrasar. - ele deu de ombros e continuou andando comigo.

Nós fomos andando em um distância razoável da Delly e do Peeta, que vinham atrás de nós. Quando chegamos no colégio eu vi o Kauã sentado em uma mesa com a Clove. Me despedi do Finnick e fui até eles, ficamos conversando até o sinal tocar.

Na hora da saída o pessoal foi direto pra minha casa, por conta do reforço. A Delly pediu pra ir junto, porque a matéria era quase a mesma e ela precisava de ajuda. Eu ia dizer que não, mas o Kauã me interrompeu dizendo que sim.

Dessa vez a aula foi mais produtiva, eles estavam entendendo mais e melhor as coisas. E eu estava começando a me divertir ali. Lá pelas 14h00 eu encerrei a aula e levei o pessoal até o portão. Fiquei conversando com o Kauã, Finnick, Peeta e a Delly.

— Como está o Luís? - Finnick questionou.

— Espero que esteja melhor que ontem. - Kauã respondeu. - Ele não foi ao colégio hoje, quando for embora vou passar na casa dele.

— Ele está muito machucado? - Peeta perguntou.

— Bastante.

— Por que fizeram aquilo? - Delly perguntou, enquanto abraçava o Peeta pelo pescoço.

— Temos cara de jornal de fofoca? - respondi.

Finnick riu.

— Ignore a falta de educação e grosseria dela. - Kauã sorriu, tentando amenizar o clima. - Pelo que entendi uns meninos do terceiro ano bateram nele porque ele é homossexual.

— Ah, ele é o tal viado do terceiro ano, né?

— O termo correto é veado e é um animal, Delly. - Kauã respondeu, começando a ficar impaciente. - O Luís é homossexual, são coias bem diferentes. Eu fiquei pensando... Ele disse que a diretora não faria nada, mas e se nós fizéssemos?

— Tipo meter a mão nos idiotas que bateram nele? Pode contar comigo, Kauã! - Finnick se animou.

— Isso não seria má ideia. - ele riu. - Eu estou dizendo falar com a diretora e montarmos uma espécie de debate, uma palestra sobre o assunto, entende? As pessoas poderiam dar suas opiniões e tudo mais. Talvez isso conscientize aqueles caras de alguma forma.

— Eu apoio. E assim não precisaríamos expor o Luís.

— Eu estou dentro, quero ajudar! - Peeta disse.

— Então amanhã no colégio nós falamos com a diretora. - o Kauã sorriu.

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Três dias haviam se passado desde que o Kauã havia dado aquela ideia e havia sido aprovada pela diretora. Era sexta-feira, o dia da palestra/debate sobre homofobia. Não teríamos aula. Coloquei apenas um short e uma regata, peguei uma bolsa e coloquei o necessário. Quando saí de casa o Finnick estava saindo também.

— Vamos juntos?

— No, thanks. Vou passar em outro lugar antes.

— Então nos vemos no colégio.

Encontrei com o Kauã e a Clove e fomos até a casa do Luís buscá-lo para a palestra. A história da briga havia se espalhado e ele tinha se tornado assunto principal no colégio. Ficamos cerca de meia hora para convencê-lo a ir conosco. O Miguel namorado dele, iria junto. Quando chegamos no colégio as pessoas encaram o Luís.

— Sabia que não devia ter vindo. - ele resmungou.

— Não liga, vamos nos sentar. - Kauã disse, tentando acalmá-lo.

Achamos lugares na terceira fila, vi o Finnick do outro lado com o Peeta e suas respectivas namoradas, ele sorriu acenando e eu sorri de volta. Pouco depois a professora deu início. Foram apresentados diversos vídeos, relatos de pessoas homofóbicas e de homossexuais. A palestra em si durou cerca de uma hora e meia, até que chegou a hora do debate.

— Então gente, quem quer falar primeiro? - a diretora incentivou.

Um menino na fila da frente levantou a mão e a coordenadora correu até ele, levando um microfone.

— Eu não tenho nada contra homossexuais, mas acho que ninguém é obrigado a ficar vendo dois homens se beijando em qualquer lugar.

A coordenadora foi até o outro lado, entregando o microfone para uma menina.

— Eu concordo com ele, mas acho que vale lembrar que não é porque são dois homens juntos que torna isso uma espécie de crime. As pessoas veem casais héteros todos os dias por aí e ninguém fala nada.

— Mas é bem melhor uma casal hétero do que um casal de viadinhos. - alguém gritou. Vi o Luís segurar a mão do namorado com força.

— Eu acho que homossexualismo é errado. - uma menina começou a falar, não sabia onde ela estava sentada. - Deus criou o homem para gostar de mulheres e mulheres para gostar de homens, eu sigo a bíblia e todo mundo sabe que lá o homossexualismo é um pecado. Cada um tem sua forma de reagir ao que acredita ser errado, eu não sou a favor da violência, mas também acho que não somos obrigados a conviver com homossexuais, acredito que deveria existir algo que os impedisse de se misturar com os outros.

O Kauã respirou fundo com raiva e se levantou, a coordenadora trouxe o microfone.

— Ninguém é obrigado a nada. Assim como você não é obrigada a conviver com homossexuais ninguém é obrigado a ouvir essas asneiras que você fala. - o pessoal riu. - E como você disse, Deus criou o homem e a mulher, assim como criou o amor e o respeito. Acredito que saiba que é a própria bíblia que nos diz para amar o próximo como a nós mesmos, e se você não sequer respeita ou aceita as escolhas ou orientação sexual de alguém, por favor, me explique como você pode dizer que segue a bíblia.

A menina não respondeu e ele se sentou novamente.

— Eu sou contra a homofobia. - reconheci a voz da Glimmer. - Acho que todos devem respeitar o próximo da mesma forma que gostariam de serem respeitados, mas eu sou contra homossexuais adorarem crianças.

— Eu concordo. - agora era a Delly quem falava. - Na minha opinião uma família é formada por uma homem, uma mulher e uma criança. Esse é o tradicional e correto. Não tenho nada contra casais homossexuais, mas na minha opinião eles não formam famílias.

Eu me irritei com tudo aquilo. Deus, em pleno século XXI ainda existem pessoas com a mente tão fechada. Me levantei e a coordenadora trouxe o microfone.

— Homossexuais não formam família? A limitação intelectual de alguém com uma opinião dessas é tão patética que a torna incapaz de admitir seu próprio preconceito. Um homem, uma mulher e uma criança são uma família. Dois homens e uma criança são uma família. Duas mulheres e uma criança são uma família. Sabe por quê? Porque uma família é constituída de amor, apenas amor. E please, não se esqueçam de que uma criança adotada e amada por um casal gay, é uma criança abandonada por um casal hétero da sua concepção de família tradicional e correta.

Eu entreguei o microfone para a coordenadora e me sentei, antes que a coordenadora saísse o Luís pediu a ela o microfone, Miguel o olhou de forma carinhosa, o incentivando e ele sorriu em respota, apertando a mão do namorado, então ele se levantou.

— Como a maioria das pessoas aqui sabem eu sou homossexual. Eu não nego ou tenho vergonha de quem eu sou. Eu não me importo com as piadas idiotas ou os olhares recriminadores que eu recebo quando saio na rua com meu namorado porque as pessoas que realmente me importam estão ao meu lado, me entendem e me aceitam como eu sou. As marcas que vocês podem ver em mim foram feitas por pessoas que assim como muitos aqui acham que por ser homossexual eu me torno menos importante perante os outros, mas eu não me importo com isso. Eu não me importo porque eu me aceito e me amo dessa forma. Eu poderia fazer um discurso sobre homofobia pra vocês, mas não adiantaria em nada, não faria vocês pensarem nem um pouco. Vocês são egoístas demais para pensarem em algo além de si próprios.

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O debate já havia acabado há cerca de meia hora, o Luís e o Miguel já haviam ido embora. Fiquei na quadra conversando com o Kauã e a Clove, depois o Finnick e o Peeta chegaram com as meninas e ficaram ali, Finnick nos contou sobre uma briga que havia acontecido entre duas meninas do segundo ano no dia anterior.

— Como você consegue ficar sabendo de tudo tão rápido? - o Kauã riu.

— Sou bem informado ué. 

— O que aconteceu com as meninas?

— Tomaram uma suspensão.

— Viu Katniss? Já viu que aqui não é como no outro colégio.. - o Kauã brincou comigo.

— Como assim? - Finnick me olhou.

— Ela foi expulsa de lá por brigar com uma menina. - Kauã respondeu por mim

— Sério? - a Delly me olhou surpresa.

— Yeah.

— Normalmente as pessoas só recebem uma advertência.

— É, mas a Katniss foi expulsa por conta de como a menina ficou. - Kauã disse, e todos os olhares voltaram-se para mim.

— Você machucou tanto a garota ao ponto de ser expulsa? - o Peeta me olhou e por alguns instantes eu posso dizer que seus olhos pareciam decepcionados.

— Sim.

— Por que brigaram? - Finnick me olhou curioso.

"Eu não sei, estava com raiva do mundo e descontei nela."

— Parece que vai chover e eu não quero me molhar! - me levantei pegando minha mochila. - Bye!

Eu ouvi o Kauã chamar meu nome enquanto eu me afastava, mas não voltei ou esperei. Eu precisava ficar sozinha.


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Notas finais do capítulo

Kauã meu amor, ninguém te ensinou a ficar quieto?
Abordei homossexualismo porque acho importante discutirmos o tema. Pleno século XXI e ainda tem gente que acha que ser homossexual é algum tipo de crime... Tenha santa paciência!
Eu realmente odeio ter que repetir isso, mas eu to desanimando de postar. O número de visualizações aumenta a cada dia e isso é incrível, mas eu gosto de saber o que estão achando.
Próximo capítulo tem POV Peeta e um passo gigantesco em Peetniss! Sim, é o primeiro beijo dos dois!
Comentem e eu volto na sexta!



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