Extraterrestre escrita por SobPoesia


Capítulo 25
Blue




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Abri meus olhos e lá estavam eles, os grandes e iluminados azuis olhos da minha mãe. Talvez, fosse a primeira vez em muitos anos que eu estivesse os observando daquela forma, daquela infantil forma que eu os olhava quando era uma criança, quando ainda a achava a mulher mais incrível do mundo, quando as coisas ainda eram mais fáceis.

E, por muito, queria voltar aquele tempo. Eu queria ter menos de 10 anos de novo, correndo pelos corredores ilimitados da nave, tocando suas frias paredes, recebendo atenção de estranhos, desafetos dos familiares, e um carinho lutado da minha estudiosa mãe, que lutava para ser alguém importante.

Blue fez muito por mim, e ainda fazia; merece crédito por isso.

Não nos dávamos bem, nunca dêmos, éramos parecidas demais. Teimosas, cabeças quentes, cheias de uma convicção de mundo e de si, orgulhosas e todas aquelas coisas que se traduziam nas caras fechadas, almoços separados, nenhum pedido de desculpa e segredos.

Segredos que agora, eram demais para que eu pudesse dividir com ela.

Era um desejo infantil, eu sei, mas me permitiria ser infantil por mais alguns segundos, por mais alguns minutos antes de salvar todo o sistema solar da ira da sua própria infeliz criação. Queria contar tudo para minha mãe, queria deitar em seu colo e deixar que ela resolvesse todos os problemas, tirasse as pessoas da minha cabeça, tirasse as naves da minha cabeça, tirasse América da minha cabeça, tirasse a mim da minha cabeça.

Eu não era mais Sky. Aquela Sky, pelo menos. Aquela do início da história, que achava que vivia na utopia perfeita, que achava que seu sistema funcionava, que carregava lendas e estórias no peito, tais que já não eram verdades.

Então, olhando para trás, odiava aquele maldito dia em que conheci América. Terrestre, com seus cabelos ruivos extensos, ela havia roubado de mim, a mim mesma. Ainda que eu não pudesse jogar toda a culpa nela, eu estou me dando alguns momentos de completa e repleta infantilidade ingênua.

Momento que acabou, aqui.

Os cabelos curtos e loiros de minha mãe pairavam sob a minha cabeça, enquanto ela repousava seus lábios sob a minha testa e afagava meu cabelo crespo. Sentiria saudade dela, e essa afirmação vêm de um local maduro.

Havíamos brigado durante toda a minha curta vida, e eu deveria ter a aproveitado mais, mas ela não era a culpada por isso. Mamãe era, como eu havia sido, mais um peão. Ela não merecia que eu fosse embora sem a menor explicação, ela não merecia que a sua única filha fugisse da sua única casa.

Eu não merecia ter de ir embora do único lugar que já conheci e amei.

Podia ter fantasiado sobre a Terra todos aqueles anos, com meus livros de verdade, casa de vidro em um campo aberto de pura natureza; mas aquele era o momento de ir para um mundo novo, que não era nada como nos meus sonhos, mas participava ativamente dos meus maiores pesadelos.

E, pensando em tudo isso, simplesmente a abracei.

Não sei ao certo se vocês entendem o quão absurdo e novo essa ação era, mas posso reafirmar que era, de tão estranha, que quase nos impediu de ir a Terra.

Aquele estúpido abraço de criança assustada.

Foi retribuído, com os quentes braços largos de Blue, que tentou e conseguiu segurar o seu choro de maneira esplêndida, minha mãe era a rainha dos sentimentos fingidos e reprimidos.

Ficamos ali, entrelaçadas em braço por algum tempo considerável, antes que eu julgasse demais e a pedisse um pouco de ar.

Assim que o corpo pálido saiu de cima do meu, tive a visão de outro no final do cômodo. América sorriu, galante, um tão lindo que eu abri meus braços, esperando que ela também quisesse um abraço. E, quem seria a minha terra desconhecida se não desejasse alguma demonstração de afeto inesperada?

Seus cabelos ruivos me sufocaram por pouco, em um abraço apertado com as unhas cravadas em minhas costas. Ela me soltou, ela sorriu, ela limpou o rosto com as costas da sua mão direita.

Caleb apenas assentiu para mim, sorrindo, glorioso. Ele era, talvez, o único super-herói daquele recinto.

—Por quando tempo fiquei apagada? – Tentei me sentar.

—Poucas horas. – assentiu América.

—O que aconteceu comigo? – Suspirei, meu hálito estava horrível.

—Infecção alimentar. – Minha mãe sorriu. – Fizeram uma lavagem no seu estômago, te deram muito soro, logo logo você estará em seu quarto.

—Quão logo? – Meu irmão insistiu, roendo a pele que havia envolta de suas unhas.

Vamos, Caleb, estrague todo o plano.

—No final de hoje, de noite, quando o horário escolar já estiver acabado vamos te levar em uma cadeira para sua cama, você precisa de repouso. – Minha mãe segurou minha mãe, ignorando a todos.

Eu não estava animada para ir embora, para ir para Terra. Queria um pouco mais daquilo, daquele sentimento, daquele cuidado, daquela nave.


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