O presente de Peeta para Prim escrita por IsabelaThorntonDarcyMellark


Capítulo 9
Algo não tão raro assim




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Por Peeta

O dia mal amanhece e eu já estou de pé. Dormi por poucas horas, mas eu não conseguiria relaxar enquanto ainda faltasse tanto a fazer. A manhã passa tranquilamente e é bem produtiva pra mim, meus irmãos e meu pai, todos concentrados no trabalho.

Eu quis que o segundo bolo fosse bem diferente do primeiro e consegui o intento. Fiz uma cobertura de cor amarela bem viva e, em vez de flores desenhadas, modelei pequenas prímulas para adornar todos os andares.

Em meu cronograma, tudo está saindo melhor que o esperado, pois imaginei terminá-lo apenas à tarde e ainda não é meio-dia.

Apesar de tudo parecer tranquilo, minha calma é apenas exterior. Por dentro, espero ansiosamente pelo que esse dia me reserva. Brad também está empolgado com a reunião da tarde com nossos amigos.

Se Prim vier mesmo aqui daqui a pouco, direi a ela que a decoração dos bolos foi feita em sua homenagem. Só não posso dizer a ela que minha maior inspiração foi a sua irmã, a quem eu amo mais e mais a cada descoberta a seu respeito.

As conversas que tive ontem com Prim e meu pai foram algo que vai muito além de trocas de palavras. Tudo o que eles me disseram serviu para que eu entendesse melhor Katniss, seu jeito, sua personalidade e suas escolhas. Compreendi, principalmente, o motivo pelo qual ela assume aquela postura de durona e indiferente. É o seu instinto de sobrevivência que não permite que se apegue às pessoas com muita facilidade.

Também aprendi muito indo à Costura e observando com mais atenção seus habitantes e suas casas.  

Assim como todos ali, Katniss convive com uma grande preocupação diariamente: manter-se a si, à sua mãe e à sua irmã vivas, em meio a tantas dificuldades. Ela é o alicerce de sua casa e se esforça, além de sua responsabilidade, para garantir a subsistência da família. Afinal, ainda é uma menina.

É possível que ela pense que ter sonhos, fazer planos e apaixonar-se por alguém sejam luxos que não pode proporcionar a si mesma. Talvez por isso exista uma muralha impenetrável em seu coração.

As únicas pessoas que eu observei ultrapassarem essa barreira, fazendo-a sorrir genuinamente, foram seu pai, nas poucas vezes em que os vi juntos aqui na cidade, e Prim.

Não sei se Gale consegue arrancar sorrisos dela também, no universo particular dos dois, a floresta… Meu peito se aperta só de imaginar a cena e balanço a cabeça para afastar essa angústia.

Eu sinto ciúmes dele antes mesmo de conhecê-la oficialmente — penso e rio sozinho. Um gesto que foi percebido por meu pai:

— Está tudo bem, Peeta? – questiona ele.

— Sim, tudo em ordem – respondo, mas, antes que ele se afastasse, emendo uma pergunta: — Pai, só uma dúvida. Você negocia com o Gale também, não é?

Ele confirma com a cabeça.

— Em boa parte das vezes, ele está junto com… Você sabe… Katniss – informa meu pai, olhando de soslaio para meus irmãos, para ver se estão prestando atenção em nossa conversa.

— Você acha que eles são mais do que amigos? – Mal consigo disfarçar minha inquietação.

— Acho que sim. A ligação entre eles é muito forte e é mais que uma amizade, com certeza. É uma aliança de sobrevivência. – Ele faz uma pausa, reparando em minha expressão desanimada. — Mas não acho que seja um vínculo num sentido romântico, se é essa a sua preocupação.

Por mais insignificante que possa parecer o sentimento que motivou o meu questionamento, se comparado ao que eles compartilham entre si – uma "aliança de sobrevivência", como definiu meu pai – essa é, de fato, a minha maior preocupação: se há algum romance entre eles.

— Ao menos, nunca presenciei nada que indicasse tal coisa – completa ele e permanece me encarando, parecendo esperar algum comentário meu.

Eu, então, desconverso, muito sem jeito.

— Como está o preparo da massa das tortas?

— A metade delas já está no forno e é preciso liberar os tabuleiros para assar a outra metade. Você quer subir para almoçar enquanto isso? É necessário esperar que elas esfriem mesmo, antes de você começar a sua arte – sugere ele.

— Vocês não estão precisando de ajuda pra mais nada? – indago um pouco mais alto, para que meus irmãos escutem.

— Não. Está tudo sob controle! – Michael responde.

— Então, vou em casa comer… Mas não antes de levar os bolos prontos à vitrine – menciono, satisfeito com o resultado do trabalho.

Assim, dirijo-me à entrada da padaria para deixar as tortas à vista dos transeuntes. Eu voltaria aos fundos apenas para deixar sobre a minha mesa o avental que estou usando, mas avisto Primrose se aproximando do outro lado da rua.

Apresso-me para recebê-la na porta da padaria e vejo que ela está desacompanhada. Sinto novamente uma mistura de alívio e desapontamento por Katniss não estar ao seu lado.

Os olhos preocupados de Prim fitam alguma movimentação no andar de cima da minha casa e, quando ela me vê na porta da padaria, sua expressão se suaviza imediatamente, mas mantém um ar triste.

— Primrose! Estava mesmo esperando a sua chegada! – exclamo e estico a minha mão em sua direção.

— Oi, Peeta! – Ela segura minha mão estendida e logo abaixa o tom de voz. — Vi que sua mãe está no segundo andar. Então, não há problema em eu ficar por aqui um pouco, não é?

— Pra mim, você é sempre bem-vinda – garanto e vejo-a sorrir timidamente.

É uma pena que essa resposta não sirva também para minha mãe — penso.

— Obrigada, Peeta.

— Sua irmã não está com você hoje… Veio sozinha até aqui? – Não consigo segurar a curiosidade.

— Katniss está na floresta – sussurra Prim. — Ela e Gale, o irmão mais velho do Rory, não aguentariam ficar um segundo sequer do lado de fora da cerca, num domingo ensolarado como esse, especialmente às vésperas da Colheita… Minha mãe me trouxe à cidade.

— E onde ela está?

— Ela precisava de alguns suprimentos para preparar os remédios e foi até o mercado tentar negociar com alguns queijos que fiz com leite de cabra. Enquanto ela faz isso, eu vim até aqui.

— Você chegou bem na hora em que terminei de decorar os bolos. Eles já estão na vitrine. Olha ali! – Aponto para a prateleira onde os coloquei.

— Oh! Os dentes-de-leão pintados… e as prímulas! – exclama Primrose, mas sem perder o tom melancólico que eu percebi quando ela chegou. — Ficaram perfeitos! Valeu a pena a sua ida à Campina ontem.

— Gostou da minha homenagem a você?

— Gostei muito! Nem sei dizer qual é o meu preferido. – Prim sorri, mas ainda não abertamente.

É como se algum sentimento ruim a estivesse impedindo de se descontrair.

Mas seu sorriso, apesar de comedido, é sincero, o que me anima a prosseguir:

— Tentei reproduzir um pouquinho da nossa tarde de ontem. Foi muito especial pra mim.

Quando termino de falar, percebo que Prim não consegue mais ocultar sua desolação e está prestes a chorar.

— Na tarde de ontem, o bebê não sobreviveu ao parto, Peeta… Era um menino. Infelizmente, isso é algo não tão raro assim de acontecer, ao menos na Costura – revela Prim, esclarecendo o motivo de seu abatimento.

Fico desnorteado com a notícia que ela acaba de me dar, sem saber o que dizer. As preocupações e os medos que tomavam meus pensamentos segundos atrás parecem ridículos ante a fatalidade que Prim e as pessoas próximas a essa criança vivenciaram.

— Minha irmã talvez dissesse que esse bebê foi poupado de uma vida de sofrimentos.

— Katniss diria isso? Ela não sabe o que aconteceu?

— Acho que não. Ela já estava dormindo quando eu e minha mãe chegamos em casa ontem e saiu muito cedo hoje, ainda era madrugada. Não conversei com ela.

— Pelo visto, você não concorda com o que sua irmã talvez dissesse…

— A questão do sofrimento não deixa de ser verdade. – Ela reflete um pouco. — Mas sempre existe uma chance de ser feliz, não é? – pergunta ela, consternada.

— Ao menos, assim deveria ser, Prim, se essa criança ainda estivesse viva – respondo num fio de voz, pensando numa maneira de ajudar à família que sofreu essa terrível perda.

— Prometi à minha mãe que não ia demorar. Já vou indo, Peeta.

— Espere um pouco! Eu… – Reluto um pouco em falar o que pretendo fazer, pois nem sei se posso cumprir o que vou dizer. — Eu preciso buscar uma coisa.

No entanto, não é necessário buscar nada. Meu pai, com certeza, não está alheio ao que Prim havia me confessado há alguns minutos e já se encontra na porta da padaria, ao meu lado, estendendo a ela uma sacola, de cujo interior exala um cheiro gostoso de pão recém-saído do forno.

— É o mínimo de conforto que podemos oferecer aos pais do menino natimorto – oferece ele, com a voz embargada.

Fico feliz e perplexo com o gesto do meu pai. No entanto, minha maior surpresa vem a seguir. Minha mãe também se aproxima, trazendo um pacote para Primrose.

— E esses cookies são pra você. Pelo remédio para queimaduras – explica ela, pondo na mão livre de Prim o embrulho. — Eu pedi ao Peeta para lhe entregar quando tivesse oportunidade, mas, já que você está aqui, fiz questão de fazer isso. – Minha mãe sai em seguida, sem esperar resposta.

Meu pai continua ao meu lado e nos entreolhamos espantados.

Só mesmo Prim para ajudar minha mãe a mostrar um lado mais enternecido, que eu nunca imaginei presenciar.

— Não sei o que dizer – comenta Prim, confusa, olhando para o que foi colocado em suas mãos. — Só me resta agradecer a sua bondade e garantir que os pães serão entregues à família do bebê, Sr. Mellark. Quanto aos cookies, vou dividir com os irmãozinhos dele.

— O que prova que quem está sendo bondosa aqui é você, menininha! Continue assim – diz meu pai, tocando de leve o nariz de Prim.

— Até breve e obrigada… Muito obrigada! – Ela sorri, sinceramente agradecida.

— Até uma próxima vez, Primrose! – Meu pai se despede.

Continuo sem palavras diante de tudo o que aconteceu aqui. Afago rapidamente os cabelos de Prim e aceno um adeus. Aguardo na porta até não mais poder vê-la, enquanto ela se afasta em direção ao mercado.

Tenho que concordar com meu pai. Prim acabou de nos dar uma lição de generosidade e também de bravura. Uma bravura que difere um pouco da coragem de Katniss, pois Prim mostrou já haver experimentado muitas dores, mas nem assim perdeu a confiança de que pode ser feliz, ainda que as perspectivas não sejam favoráveis.

Ao mesmo tempo, devo reconhecer que é a proteção de Katniss que permite a Prim manter essa visão inocente e cheia de esperança. Até isso ela consegue preservar em sua irmãzinha, mas talvez não nela própria.

Desde que nos conhecemos, Primrose já me ajudou mais do que imagina. Espero que ela possa me auxiliar também a vencer mais esse obstáculo: convencer Katniss de que ela pode ter esperança, sonhar e se apaixonar… Amar e se deixar ser amada. O que ela já é. E muito.

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Notas finais do capítulo

ATENÇÃO! Esta nota da autora contém spoilers do livro "A Esperança" da Suzanne Collins.

Olá, pessoal! Devo confessar que essa história de ser "escritora" está sendo algo muito surpreendente pra mim. Comecei a escrever esse capítulo com uma ideia na cabeça e, conforme fui escrevendo, não saiu nada do que foi planejado.

Pra quem está curtindo a fic, uma boa notícia: ela terminaria na véspera da Colheita, mas resolvi fazer mais um capítulo, com uma passagem de tempo até depois da Rebelião, quando Peeta e Katniss voltam a viver no Distrito 12.

Beijos!

Isabela



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