Acampamento Imortal escrita por Vallabh


Capítulo 12
Capítulo 11




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/693380/chapter/12

Aos poucos todos vão se espalhando pela floresta, estamos correndo feito loucos para chegar primeiro ao labirinto. O Kai está um pouco à minha frente, mas é uma distância alcançável. Enfim encontramos o bendito labirinto, ele é todo feito de plantas, o que me deixa em estado de alerta, meu pai sempre me disse “nunca confie na floresta, ela pode ser traiçoeira”. Têm duas entradas, uma do lado direito e outra do lado esquerdo.

— Direita sempre. — fala o Kai indo em direção à entrada do lado direito.

Entramos no labirinto e prestamos atenção em tudo, qualquer mínimo detalhe pode ser crucial para sair daqui. Estou olhando para frente quando um barulho de galho quebrando chama a minha atenção.

— Kaique!

— Elas estão se movendo. — fala, se referindo as paredes, o caminho pelo qual entramos não existe mais.

— Temos que prestar atenção, deve ter alguma coisa que acione a mudança delas de lugar.

— Sim, fique perto, elas podem se fechar, separando a gente.

Voltamos a caminhar e chegamos em uma divisão da trilha.

— Direita sempre. — digo antes do Kai, mas quando estávamos prestes a pegar o caminho da direita uma criaturinha aparece no final do caminho.

— Tá de sacanagem! — Kai fala, olhando para os lados.

— É uma...

— Erínia, é.

— Elas nunca estão sozinhas. — pego minha adaga e fico de costas para o Kai para estar preparada quando as outras chegarem.

Erínias são divindades femininas do Submundo que personificam a vingança e a raiva das pessoas que morreram prematuramente. Elas vagam na terra para punir as pessoas que fizeram um falso juramento ou dando a retribuição a um homem injustamente assassinado. Geralmente atacam em grupos de três: Tisífone, a personificação do castigo; Megera, a personificação do rancor; Alecto, que é inominável. Suas aparências são completamente diferentes, até hoje só havia as visto  nos livros.

Escuto um grito ensurdecedor vindo da que suponho ser Megera, ela é alta e forte, possui o corpo de uma guerreira e utiliza uma armadura que deixa parte do seu tronco e coxas desnudas. A pele é pálida e os cabelos negros estão presos formando uma espécie de coque nas duas laterais da cabeça, os olhos são tão negros quanto os cabelos, ela porta duas espadas Dadao, são espadas longas, quase do comprimento do meu braço, têm o formato parecido com o de uma foice, a base da lâmina é fina e vai alargando no decorrer do comprimento, fazendo com que a ponta seja quase da largura de um palmo e, para completar o cenário de horror, possui assas parecidas com as de morcegos. Quando ela parte para cima do Kai, ele começa a se defender enquanto eu vigio a área.

Estou de costas quando sinto a presença de uma delas, ela pousa logo atrás de mim me dando tempo apenas para me esquivar e cair para o lado, começo a rolar para os lados quando ela começa a me atacar com a garra que tem em cima da asa. Ela voa para cima de mim, seu corpo se choca contra o meu e caio batendo a cabeça no chão e sinto algo quente escorrer pelo meu ombro, poderia simplesmente esperar a Erínia levantar e terminar de me matar, mas antes que eu consiga pensar em uma forma de escapar ela desaba em cima de mim. Empurro-a de cima de mim e vejo a minha adaga cravada no seu peito, devo ter cravado no seu peito quando me derrubou.

Observo melhor sua aparência e deduzo que essa deve ser Tisífone, ela possui uma beleza estonteante que poderia fazê-la se passar por uma ninfa facilmente. Ela é um pouco menor que Megera, mas possui a mesma pele e cabelos, porem os seus estão presos em um rabo de cavalo alto, ela veste um vestido vermelho longo com fendas nas laterais, não vejo nenhuma arma em suas mãos ou ao seu redor, porem suas unhas têm o formato de garras que me parecem bem letais. Sinto uma imensa vontade de rir quando percebo alguém se aproximando, me levanto e me preparo para enfrentar a última Erínia, mas tudo que eu encontro é um Kaique descabelado com uma expressão de alivio.

— Graças a Zeus! Pensei que tinha morrido! — Passando a mão na minha cabeça e eu sinto uma leve pontada. — Dói?

— Um pouco, eu bati a cabeça no chão quando ela veio pra cima de mim. — explico, apontando para a Erínia morta no chão.

— Tenho uma pomada na bolsa. — Ele fala e procura a sua bolsa no chão, quando ele caminha para pegá-la as paredes começam a se mover e uma parede de plantas surge entre nós dois, nos separando.

— Kai!! — grito, tentando empurrar a parede. — Kaique! — Nada. Ele não responde. — Inferno!

Procuro na minha bolsa e acho minha garrafa térmica com um energético natural, tomo um gole e guardo de volta na bolsa. Ajeito a mochila nas costas e resolvo seguir em frente. Começo a caminhar, as paredes parecem se moverem mais rápido à medida que eu vou entrando mais e mais no labirinto. Mais uma vez o caminho se divide em dois.

— Direita sempre. — Pego o caminho da direita quando vejo algo que tira meu folego. — Ahhhhhhh — grito sem conseguir segurar o pavor.

Vejo um minotauro devorando alguém, mas o que faz meu sangue gelar é a pessoa, a imagem de uma Kelvia pálida e com os olhos distantes me deixa sem reação. O minotauro se assusta com o meu grito e corre para o fim do corredor e a parede se fecha quando ele passa. Caminho para onde o corpo dela está e me abaixo para examina-la. Ela está fria, tem uma ferida grande no seu pescoço que sangra muito, coloco minha mão para tentar estancar o sangramento quando sinto ela tocar minha mão, ela tenta abrir a boca, porém não tem força para falar.

— Shiii, calma. Vai ficar tudo bem, eu vou dar um jeito nisso. — Pego minha bolsa com a outra mão e busco uma blusa reserva e coloco no lugar da minha mão, pressionando a região. — Nós vamos sair daqui, só fica comigo, ok?

Rasgo um pedaço da minha blusa e amarro ao redor do pescoço dela, prendendo a blusa no ferimento. Coloco minhas mãos na grama e chamo pelas ninfas da floresta, mas nada acontece, elas não respondem. Tento mais uma vez, mas novamente nada acontece.

— E-elas n-não vã-vão vir. — Kelvia fala com a voz mais forte do que eu esperava.

Então percebo que ela tem razão, ninguém vai vir nos ajudar, só tem uma forma de sair daqui.

— Então nós vamos até elas. — falo me recuperando e me recusando a ser fraca.

Ajeito meus braços embaixo dos seus braços e joelhos, ajusto seu corpo nos meus braços e me levanto, começo a caminhar pelo único caminho que resta. Já estamos caminhando a mais de duas horas, virando para a direita e esquerda sem saber para onde estamos indo, o primeiro tiro do canhão já foi disparado há cerca de uma hora. Meus braços doem e minhas pernas queimam.

— Luna? — Kelvia me chama com a cabeça escorada no meu ombro.

— Sim?

— Por favor, não deixa nada acontecer com o Bernardo, ele não tem mais ninguém além de mim. — Ela começa a tossir e sinto algo quente molhar meu ombro no mesmo instante que ela começa a soluçar fracamente.

— Você vai proteger ele pessoalmente, Kel, nós vamos conseguir. — respondo tentando imaginar quem é Bernardo, a Kelvia é solteira e mora sozinha na cidade, ela sempre foi muito reclusa.

Ela não fala mais, mas sinto suas lágrimas caindo. Dobro para a esquerda e consigo avistar a sala dos tronos a uns cem metros de onde estamos, sinto um alivio me invadir e tenho vontade de chorar.

— Nós conseguimos, Kel, estamos quase lá, fica comigo.

De repente escuto o barulho de galhos quebrando e olho para trás, o caminho que estamos começou a se fechar e se eu não correr seremos engolidas pelas paredes. Junto todas as minhas forças e começo a correr, os galhos que estão quebrando atiram pequenas estacas de madeira na nossa direção. Estamos a uns vinte metros da entrada da sala quando sinto uma estaca perfurar minha coxa, minha perna cede e acabo caindo de joelhos no chão. Seguro a ponta da estaca e a puxo para fora da minha perna, tudo queima, rasgo um pedaço da minha blusa e amarro na minha coxa. Me ajeito e pego o corpo da Kelvia de volta quando ela segura a minha mão.

— Tudo bem, Luna, pode ir.

— Eu já disse que nós vamos conseguir, não vou te deixar aqui.

Levanto-me e começo a correr novamente, estamos passando na entrada da sala quando uma estaca perfura as costelas da Kelvia, ela arfa de dor e fecha os olhos. Entro na sala e desabo no chão, sem forças, coloco-a no chão e a sacudo levemente.

— Vamos lá, Kel, nós conseguimos. Por favor, não me deixa. — peço e sinto minha visão embaçar.

— Meu filho — Ela faz uma pausa e depois continua com certa dificuldade. — Ele é meu filho. — Ela sorri e fecha os olhos, escorando a cabeça nas minhas pernas.

Tenho vontade de permanecer no chão e chorar até não ter mais forças, mas não posso, não agora. A Kel merece ir pra casa e ter um enterro decente. E agora mais do que tudo eu preciso continuar, existe alguém que só tem a mim agora. Ajeito-me para pegar o corpo dela de volta quando outro par de mãos faz isso antes de mim. Tobias pega o corpo da Kelvia no colo e espera eu me levantar.

— Qual é o dela? — Ele pergunta, se referindo aos tronos.

— Afrodite. — Aponto para o trono.

Ele caminha até lá com ela e coloca o seu corpo sentado no trono, que a transporta de volta para o acampamento e depois volta até mim.

— Precisamos achar o seu. — Ele fala e aponta para os tronos. — Já passaram os dois filhos de Atena, de Hera, um de Poseidon, o filho de Zeus e agora a de Afrodite.

— Kai? — Ele balança a cabeça confirmando que meu amigo está bem. — Como vamos descobrir qual é?

— Vamos ter que recorrer ao método mais precário, você vai sentar em todos até descobrir qual é.

— E se for algum que já foi destruído?

— Então daremos um jeito de sair daqui.

— Por onde eu começo?

Ele aponta para o primeiro e eu começo a sentar de trono em trono, já estamos nisso a mais de cinco minutos quando eu sento em um e ele começa a brilhar, olho assustada e ansiosa para o Tobias e ele sorrir.

— Perséfone. — Ele fala com um sorriso capaz de iluminar o dia. — Até logo, pequena. — Fecho os olhos e espero retornar ao acampamento.

Tento me acostumar com a pouca luz do ambiente e percebo que não estou no acampamento. O trono me mandou para alguma parte da floresta que fica fora da barreira de proteção, pois não consigo sentir nenhuma enérgica de vida da floresta. Começo a procura na minha bolsa uma lanterna, ligo e tento me orientar para saber onde estou, a pouca luz da lua na noite escura dificulta minha tarefa de tenta identificar as constelações, mas consigo achar a constelação da Ursa Menor e identificar a Estrela Polar, junto com o auxílio da lanterna começo a me orientar.

Caminho o mais rápido que posso, tentando ignorar a dor na minha coxa. Quanto mais ando mais longo parece o caminho. Tem alguma coisa errada, confiro mais uma vez a direção que estou andando e a posição da estrela, eu já deveria estar vendo a entrada do acampamento, então olho mais uma vez para as árvores e percebo que essa não é a vegetação da floresta do acampamento, eles não avisaram de nenhuma outra prova depois do labirinto.

Paro um pouco e me encosto em uma arvore, bebo um pouco de água e olho o ferimento na minha coxa, já parou de sangrar, mas não fechou ainda. Minha roupa tem vários rasgos e meus braços e rosto estão cheios de arranhões. Limpo os ferimentos de forma superficial e guardo tudo de volta na bolsa. Pego a lanterna e volto a andar, de repente escuto um barulho atrás de mim, desligo a lanterna e fico parada tentando fazer o mínimo barulho possível. Pode ter sido apenas o vento balançando um galho, mas eu prefiro não arriscar.

O barulho não se repete então resolvo voltar a caminhar, estou prestes a ligar a lanterna quando uma respiração sopra no meu pescoço, o cheiro de enxofre preenche o ambiente, sinto algo molhado pingar no meu ombro, mas só quando o escuto bufar reconheço a criatura. Paraliso no lugar, o Minotauro continua procurando alguma coisa. São criaturas violentas e sanguinárias, mas não enxergam no escuro e não têm um olfato muito bom, por outro lado têm uma audição sensacional.

Ele desiste de procurar e começa a ir para o lado contrário, mesmo assim, não importa o que eu faça, assim que eu começar a andar ele vai escutar e é uma questão de segundos para me alcançar. Se a floresta não estivesse diferente talvez eu tivesse alguma chance, mas agora não faço a mínima ideia de onde estou e nem de como chegar ao acampamento. Tento pensar em alguma forma de fugir do que está prestes a acontecer, mas não encontro nenhuma, então faço o que sei fazer de melhor, enfrento.

Começo a correr sem rumo na escuridão tentando desviar das árvores e me orientar pela direção do vento, mas não consigo me concentrar o suficiente para lembrar das aulas de orientação através da direção dos ventos, merda. Consigo escutar quando ele começa a me perseguir, tombo em alguns galhos no chão, mas continuo correndo. Sinto ele cada vez mais próximo de mim, ele avança no que deveria ser a minha direção, mas bate em uma árvore pelo barulho que fez, aproveito a deixa para mudar de direção e continuar correndo, não escuto mais o barulho dele correndo atrás de mim.

Mesmo assim continuo correndo com todas as minhas forças, de repente escuto ele vindo rápido na minha direção, não tenho tempo de desviar, sou arremessada contra uma árvore e caio no chão. Fico imóvel, tentando me recuperar, me sinto sem ar e minhas costelas doem muito, ele começa a esmagar a terra próxima a mim para me encontrar.

Pego uma lâmina fina e do tamanho do meu antebraço que estava no coldre na minha perna e me preparo, esperando o momento mais oportuno para atacá-lo, quando ele abaixa com o rosto de frente para mim percebo que não terei outra oportunidade melhor. Salto na sua direção, agarrando a sua cabeça e enfiando a lâmina no seu ouvido esquerdo, ele solta um grito grotesco e assustador e consegue me jogar no chão a alguns metros dele. Preparo-me para correr e no momento que tento levantar sinto uma forte pontada nas costelas, me encolho no chão e toco no local da dor e sinto outra pontada, sinto o cheiro de ferro e percebo que, por mais que eu tente, não vou chegar ao acampamento.

Resolvo esperar ele cansar de me caçar e me encolho no chão tentando esquecer as dores. Estou entretida pensando em um ótimo chocolate quente cremoso e sinto um vento muito forte na minha direção e pelo pouco que lembro das aulas de orientação através do vento percebo que já deveria estar a uns cem metros da entrada do acampamento, mas não faz sentido, não consigo enxergar nada de onde estou e essa floresta é completamente diferente da que eu conheço, de repente lembro de um detalhe fundamental, glamour, é usado para disfarçar coisas. De alguma forma tem um glamour me impedindo de ver o acampamento. Não devo estar longe, cem metros no máximo.

Pego uma pedra que estava próxima e lanço o mais forte que posso no sentido contrário, meu predador começa a correr meio desorientado e espero ele estar longe o suficiente para me levantar. O golpe que ele recebeu deve ter prejudicado consideravelmente sua audição, então devo conseguir chegar ao meu destino sem ser notada, começo a caminhar o mais rápido que posso, o que no atual momento é bem devagar, me apoiando nas árvores ao meu redor para me manter em pé.

Estou quase sem forças quando sinto atravessar a barreira do glamour, olho pra frente e vejo as estruturas do torneio, tem uma movimentação estranha na entrada, caminho mais rápido e sinto as minhas forças se esgotando, mas não posso desistir agora.

— Luna! — Olho pra frente e encontro as três pessoas mais importante da minha vida, Thoth, Kai e, por último e bem mais afastado, eu diria que quase escondido, o que tem sido o motivo dos meus sorrisos dos últimos dias, Tobias corre na minha direção e assim que seus braços me encontram me permito desmoronar.

— O que eu perdi? — pergunto, cansada, mas não escuto a sua resposta, pois o canhão dispara os dois tiros finalizando a prova e logo depois eu apago.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Ai que dó da Luna, oh menina pra sofrer T_T

Até o próximo!
XOXO



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Acampamento Imortal" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.