Estacionei minha moto na vaga e retirei o capacete. Enquanto arrumava meu cabelo, tive a leve sensação de estar sendo observada. Olhei para os lados à procura de alguém que estivesse perto, e apenas encontrei alguns alunos conversando entre si. Dei de ombros e desci da moto. Foi quando a morena alta me abordou, sorridente.

— Alexinha da minha vida! — ela falou, meio gritando.

— Aí tem coisa. — falei, estranhando sua animação tão cedo.

— Ah, que isso, amiga. Apenas acordei feliz. — ela falou.

— Feliz demais para meu gosto. — comentei, indo em direção à escola.

— Já que está insistindo tanto, eu falo. — ela disse enroscando seu braço no meu. — A Mary contou para a Hilary, que contou pra Jackie, que me contou que está vindo alguns alunos novos, transferidos direto da Inglaterra. — a morena falou, animada.

— Informação distante. — brinquei.

— Para de ser estraga prazeres, Alexandra. Então, sabe o que isso significa? — ela perguntou.

— Não faço a mínima ideia. — ironizei.

— INGLESES GATINHOS! — Luce gritou, com pulinhos e apontando para a sala do diretor.

Olhei na direção em que a morena apontou e vi cinco garotos saindo de dentro da sala, o diretor apertando a mão de cada um e apontando alguns corredores. Todos com livros nas mãos.

— Ah, eles não são um sonho? — Luce falou, derretida.

No mesmo momento em que a palavra "sonho" saiu da boca da morena, um dos garotos olha em nossa direção.

Ele não era muito alto; magro, porém musculoso; cabelos castanhos e lindos olhos azuis.

Azuis.

Foi como um Dejá Vu. Meu coração acelerou de repente, e tudo o que vinha na minha mente eram os olhos azuis quase como aço, me encarando no sonho. Eram os mesmo olhos.

Ok, eu devia estar ficando louca. Só podia ser isso. Eu tinha que estar louca.

— Alex? Você está aí? — Luce me balançava, tentando chamar minha atenção.

Mas não conseguia prestar atenção em outra coisa que não fosse o garoto do grupo.

Ele desviou o olhar surpreso para seu amigo. Um moreno alto com cabelos cacheados e olhos extremamente verdes. Cochichou algo com ele e saiu do meio de seus amigos.

— ALEXANDRA! — dessa vez, Luce gritou, chamando a atenção de algumas pessoas à nossa volta.

— O que é, Lucinda? — perguntei com raiva.

— Nossa, desculpa. Que bicho te mordeu hoje? Está muito estressadinha pro meu gosto. — ela falou, cruzando os braços em seu peito.

Suspirei, impaciente.

— Eu tive... um sonho. Venho tendo ele desde a semana passada.

— Venha, vamos conversar sobre isso no meu consultório. — ela me puxa até seu armário. — Conte à sua psicóloga pessoal, como é esse sonho? — Não tive como não rir. — O que?

— Nada... não quero falar sobre isso.

— Ah, Alex. Me fala, por favor. — ela pediu fazendo biquinho.

— Só te falo, porque é minha melhor amiga.

— Vai falar ou não?

— Ta, ta. — revirei os olhos. — Eu não consigo me lembrar dos detalhes, só sei que estava tendo uma chuva cintilante e eu fui até a praia para ver de perto. Tinha... outra garota, mas eu não me lembro o nome dela. Estávamos escondidas atrás de uma pedra e, em nossa frente, caiu uma bola de fogo que logo se apagou, revelando um corpo. Não me lembro o que aconteceu depois, só de um par de olhos azuis me encarando e então, eu acordo. — falei.

— Olhos azuis? Hm… que tipo de azul? — a morena perguntou, batendo o dedo indicador no queixo, como se estivesse realmente pensando.

— Isso não importa. Disse que não me lembrava de detalhes. — reclamei, cruzando os braços.

— Isso não é tão detalhe assim. — ela respondeu esticando o “ã” do “tão”.

Olhei para onde os garotos estavam. Eles já tinham ido. Novamente, a sensação de estar sendo observada passou por mim, fazendo-me arrepiar.

— É melhor irmos pra sala. Esquece essa história. — falei a empurrando.

— Mas nem bateu o sinal ainda…

— Não quer ver se tem a sorte de sua primeira aula ser com um “inglês gatinho”? — perguntei, sugestiva. Luce deu um sorriso de orelha a orelha.

— Nos vemos em Química, babe. — ela disse correndo.

Apenas dei risada e entrei na sala.

Aquela era aula de Espanhol e eu não me dava muito bem. E ainda tinha o fato de eu não ter uma dupla, como todos os outros.

Eu realmente não via necessidade em aprender Espanhol. Fala sério, inglês era o idioma padrão para se usar no exterior, qual a utilidade de se aprender Espanhol, se os espanhóis irão falar meu idioma no meu país? Vai entender o ser-humano.

Enquanto escrevia em meu caderno as lições do quadro, o professor chamou a atenção dos alunos. Desviei minha atenção para ele quase que imediatamente.

O Sr. Rodriguez estava em pé à frente de sua mesa, com um garoto ao seu lado. Logo o reconheci. Ele e mais alguns outros meninos estavam no corredor, mais cedo. Ele era um dos transferidos.

— Alunos, esse é Harold Styles. Ele foi transferido para nossa escola direto da Europa. Pena ser inglês, e não espanhol. — ele falou, concluindo com a piada sem humor algum. — Bem, senhorita Miller, conseguiu uma dupla para Espanhol.

Suspirei discretamente, realmente desejando que esse menino fosse bom na matéria.

Ele puxou uma cadeira, ignorando alguns suspiros nada discretos das garotas em volta, e se sentou ao meu lado.

— Então... — ele falou, me observando.

— Então... — devolvi.

Ele me observou por um tempo – ação, essa, que me deixou incomodada – e meneou a cabeça, soltando uma risada nasalada. Não entendi.

— Harry Styles. — ele disse, por fim.

— Alexandra Miller. — respondi, categoricamente.

— Alexandra... — ele repetiu. — Mora na cidade há muito tempo, Alexandra?

— Eu nasci aqui. — respondi. — E você? Se mudou a quanto tempo?

Ele ia responder, mas Sr. Rodriguez gritou meu nome.

— Em espanhol, Alex! Conheça-o em espanhol. — ele falou, voltando sua atenção à folha em sua frente.

Rolei os olhos, o amaldiçoando mentalmente. Algo que fez o garoto rir.

— Aposto que o detesta. — ele comentou, sorrindo.

Não pude deixar de notar as covinhas que se formaram em cada bochecha, quando ele sorriu.

— Argh, lo odío. — falei, com o melhor de Espanhol que eu aprendi. O garoto riu.

— Muy bien, respondendo à sua pergunta, me mudei faz duas semanas. — ele disse, recostando na cadeira.

— Me diz que sabe tudo sobre Espanhol. — pedi, fingindo desespero. Ele sorriu novamente.

— Muito mais do que imagina. — falou, piscando.

Não sei se entendi o que ele quis dizer, mas espero que isso signifique um A em Espanhol.

Como resposta, sorri levemente.

O sinal para o intervalo tocou e saí da sala, acompanhada de uma garota ruiva que sentava ao meu lado em História. Ela falava sobre um garoto novo que sentou atrás dela na outra aula e em como ele era lindo.

Quando finalmente me livrei da garota e sua, desculpe dizer, ladainha, me juntei a Luce na fila para o lanche.

— Então, cat, como foram suas aulas? — ela perguntou, colocando um potinho de salada de frutas em seu prato. — Me diz que teve mais sorte que eu.

— Defina "sorte". — respondi, pegando o mesmo que ela.

— Ingleses gatinhos. — ela disse, soando óbvia. — Três aulas, e nenhuma com eles. Espero ter mais sorte na próxima aula.

— Eu sou a dupla de Espanhol de um deles. — falei.

Luce me olhou espantada e, milésimos de segundos depois, deu pulinhos e gritinhos de animação.

— Qual? Quero detalhes e cada palavra do que conversaram. Sem esconder nada. — ela ordenou, saindo da fila com sua bandeja.

A acompanhei e nos sentamos em nossa mesa costumeira. Coloquei o canudo em minha caixa de suco e, antes de falar, bebi um gole.

— Não foi nada demais. Ele apenas me disse seu nome e que se mudou na semana retrasada. — falei simplesmente.

— Como ele é? Alto, baixo... som de sua voz, cor dos olhos... — a morena à minha frente perguntou, com os olhos brilhantes.

Revirei meus olhos, tentando achar uma resposta que a convencesse de que eu e o garoto das covinhas não trocamos mais de dez palavras. Porém, algo um pouco mais à frente, chamou minha atenção. Era o meu parceiro de Espanhol e o outro menino, o mesmo com os olhos azuis cor-de-aço. Ele parecia impaciente, conversando com o companheiro.

— Sei que a cena que está acompanhando entre os dois novatos é interessantíssima, mas temos companhia, darling. — Luce falou, forçando uma tosse.

Olhei para o lado, confusa. Soltei um suspiro longo, me arrependendo logo em seguida.

— Miller! — a loira exclamou com uma falsa animação.

— Hayley. — a cumprimentei, forçando um sorriso.

Hayley Mitchell. Capitã da equipe de Torcida. A garota que colocou espuma de barbear em meu armário na sexta série. A garota que despejou um balde de tinta sobre mim, no exercício de escalar a corda da aula de Educação Física na oitava série.

— Já pensou em tentar entrar pra equipe de torcida, esse ano? Realmente acho que tem potencial.

A olhei, incrédula.

— Ta, qual é a pegadinha.

— Não tem pegadinha, Alex. Vai tentar esse ano, sim ou não? As inscrições começam semana que vem.

— Então, por que... — não consegui concluir. A voz do garoto da aula de Espanhol ecoou em nosso meio.

— Alexandra. — ele falou, parecendo estar sorrindo. Olhei em sua direção.

— Olá.  — respondi sorrindo.

Ele se sentou à mesa e abriu seu sanduíche. Estávamos todas o olhando.

— Tudo bem eu me sentar aqui? — ele perguntou, percebendo os olhares sobre ele.

— C-claro... sente-se onde quiser. Você é bem-vindo pra tudo. — Luce falou, sorrindo bobo.

Balancei a cabeça, achando engraçado.

Hayley, a qual eu havia esquecido totalmente a presença, se apoiou na mesa empinando seu bumbum para o resto da escola. Sua mini-saia com pregas provavelmente subindo, deixando-a exibir sua calcinha. Ela aproximou-se do rapaz, tentando deixar o decote de seu top à mostra, e deu um sorriso provocante.

— Hayley Mitchell, mas pode me chamar do que quiser. — ela falou, tentando parecer sexy. Talvez tenha conseguido, já que ele estava sorrindo de lado.

Aquela cena me deu náuseas. Olhei para Luce por cima do corpo magricelo da loira. Ela bufava de raiva.

— Harry Styles. Prazer. — ele falou.

— Todo. — ela respondeu, sugestivamente.

Rolei os olhos e me levantei da mesa, levando apenas minha caixa de suco e a salada de frutas. Acenei com a cabeça para Luce me acompanhar, a qual concordou de imediato.

Enquanto nos retirávamos, ouvi Hayley me chamar. Soltei um suspiro impaciente e me virei para ela.

— Sim? — perguntei ao virar.

— Vai entrar pra equipe ou não? — ela perguntou.

— Vou pensar e te respondo. — falei e saí.

Eu não queria entrar pra equipe de torcida, e aposto que ela muito menos. Não sei o que ela estava planejando, mas não ia conseguir me pegar.

— Ai. Meu. Deus. O que é aquilo? Existe mesmo um homem como aquele? Ou será que batizaram a salada com alucinógenos? Meu Deus! — Luce falou, encantada. Dei risada.

— Ele é minha dupla em Espanhol, já que era isso o que queria saber. — falei, indo para os corredores.

Um som de passos rápidos é ouvido. Olhei para trás e vi o menino com cachos correndo até nós.

— Esperem. — ele falou enquanto nos alcançava. — Alexandra, não me deixe sozinho com pessoas que não conheço. — falou, acompanhando nossos passos.

— Você estava gostando. — falei, dando de ombros. Ele deu uma risada fraca. — À propósito, essa é Luce Harper. Minha melhor amiga e parceira em Química.

Luce ficou ao lado do menino e estendeu a mão para ele.

— Prazer. — ela falou, com um sorriso simpático.

— Harry Styles. — ele respondeu, apertando a mão da morena com o mesmo sorriso.

Um som baixo é ouvido por nós. Passo a mão em meu bolso e confiro meu celular. Luce faz o mesmo.

— Não é o meu. — falo, guardando-o novamente.

— Nem o meu. — ela diz, olhando para Harry.

O mesmo retira seu celular do bolso e suspira.

— Preciso ir. Nos vemos depois? — ele perguntou, mexendo em seus cachos.

Assenti com um sorriso fraco e ele se foi.

O sinal para o fim do intervalo tocou. Minha aula era com Luce, então nos dirigimos à nossa sala. Mas, no meio do caminho, ela resolve ir ao banheiro. Fiquei esperando-a no corredor.

Enquanto esperava, ouvi algumas vozes no outro corredor. Aproximei-me lentamente do lugar de onde vinham as vozes. Não reconheci nenhuma.

— Foi ideia sua vir pra cá. — um garoto disse.

— Não, foi ideia do Louis. E também, Ninguém ia adivinhar que a encontraríamos aqui. — outro falou.

— E onde ele está? Precisamos ir pra sala. — um garoto, que parecia o de cachos, falou.

Novamente, a sensação de que alguém está me observando passa por mim. Respiro fundo e, antes que eu pudesse soltar o ar, uma mão tapa minha boca. Sinto o desespero tomar conta de mim e meu coração bater aceleradamente.

— Shhh... — uma voz sussurra em meu ouvido. — Nunca te disseram que é falta de educação ouvir a conversa dos outros?

Minha respiração estava rápida e profunda, denunciando meu medo.

— Não precisa ficar com medo, Alex. Não vou te matar. — ele falou. Era um garoto. Tudo o que consegui pensar era em como ele sabia meu nome. — Acalme-se. Só vou te soltar se ficar calma.

Meu corpo estava perigosamente colado ao seu. Minhas costas batiam em seu peitoral. Fechei meus olhos e tentei controlar minha respiração, a fim de me acalmar.

Ele foi me soltando aos poucos. Soltei um suspiro de alívio ao me ver livre do aperto daquele corpo estranho.

Virei-me para ver quem havia feito aquilo, mas não tinha ninguém. Isso me deixou novamente assustada. Sem contar o fato de que um completo desconhecido sabia meu nome. Precisava falar isso para Luce.

Luce.

Eu havia esquecido totalmente dela e da aula. Com certeza eu devia estar atrasadíssima.

Então acho melhor correr, ouvi minha consciência falar. Mas pareceu tão real, como se eu realmente tivesse ouvido alguém falar isso próximo a mim. E não se pareceu em nada com minha voz. Ok, eu estou definitivamente enlouquecendo.