Dança da Extinção escrita por yumesangai


Capítulo 2
No topo do universo existe uma única pessoa e não é Deus.


Notas iniciais do capítulo

Trigger: #baekyeol #Sehun



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Sabe o que mata seres humanos?

Talvez você pense logo no vírus, nessas criaturas errantes em decomposição cujo único instinto é se alimentar de carne humana, fresca.

Mas se 80% da destruição humana é resultado desse novo ciclo evolutivo ou degenerativo... 15% é obra do próprio homem.

Do seu instinto individualista de sobreviver.

De que sua vida vale mais do que qualquer uma.  Como se todos não estivessem desesperadamente tentando encontrar um lugar seguro, paz, ter uma rotina que não seja correr e se esconder.

Mas pessoas vivas matam pessoas vivas.

Por quê?

Por mais comida. Por um abrigo melhor. Por segurança. Por preservação. 

Algumas pessoas ainda têm fé na humanidade.

― Chanyeol, você pode ser racional?

Baekhyun estava cansado, eles haviam se deslocado por mais de um dia em busca de remédios, por uma farmácia que ainda tivesse medicamentos. Por algum lugar com simples comprimidos para febre.

― Baek, me desculpe, mas eu não pedi para você vir comigo.

Chanyeol estava começando a ficar irritado, mas mesmo quando estava para perder a paciência ele era educado, o que só fazia Baekhyun querer gritar.

― Não, mas... – Era uma verdade, mas para onde Chanyeol fosse Baekhyun o seguiria. Ainda mais num mundo onde criaturas errantes vagavam e devoravam seres humanos. – Você precisa de alguém para proteger a sua retaguarda e se você achar um lugar, mas estiver cheio daquelas coisas?

― Eu vou pensar num plano, eu sempre tenho um plano.

― Ok, mas... Eu não quero ser o insensível nem nada, mas você está arriscando a sua vida por uma cartela de compridos para uma garota cega e que está doente. Eu simplesmente não entendo.

― Baek, todas as vidas são importantes.

Mas você é a única que me importa. Ele queria dizer, mas ele não diria, porque seria apenas egoísta e Chanyeol era tudo menos egoísta.

Era o cara mais altruísta e talvez o mais tolo.

Algumas pessoas são boas demais para esse mundo.

#OH SEHUN

 

Existe um momento em que achar comida não é tão fácil e seu corpo está cansado, você está cansado, fisicamente, emocionalmente de todas as formas possíveis. E ainda assim você encontra criaturas errantes, muito possivelmente com mais fome do que você, com um estoque de energia aparentemente infinito e muito provavelmente com uma fome infinita.

Os seus movimentos estão mais lentos e a mochila fica mais pesada, seus pés estão doloridos e a falta de sono começa a afetar suas decisões, você poderia cair no meio da rua a qualquer momento. Sehun tropeça em alguns escombros e cai sentado, ele tenta se levantar, mas seu corpo não obedece, seus olhos pesam.

Essa seria uma forma patética de morrer.

Você vai ser o último homem na terra.

Ele abre os olhos, de longe ele vê Luhan.

― Você me prometeu não prometeu Hun?

Sehun fecha os olhos. Só por alguns minutos, ele só precisava de alguns minutos.

― Hun.— Luhan não falava com ele daquele jeito, não com aquele tom. Luhan era sempre gentil, ele era sempre carinhoso.

Sehun se ajeitou melhor contra a parede. O sono vinha fácil, era tudo que ele precisava.

Ele adormeceu, um mundo sem sonhos.

― Acho que ele está morto.

― Não, ele está respirando.

― Talvez esteja morrendo.

― Ele pode ter só desmaiado, veja como está magro.

Dedos percorreram por seus cabelos, mas era diferente. Era uma sensação diferente, um toque diferente. Sehun acordou sobressaltado.

― Hey, hey, tudo bem.

 Dois rostos. Pálidos, porém vivos, não em putrefação. Sehun piscou algumas vezes tentando adaptar a visão.

Ergueu os braços num sinal de defesa.

Não pareciam ser muito mais velhos do que ele, mas eram dois, um garoto de cabelos negros com um sorriso bondoso, lembrava dele e um outro, cabelos castanhos, menor, braços cruzados, rosto sério, desconfiado.

― Qual o seu nome? - O do sorriso simpático perguntou.

― Sehun. - Sobrenomes não eram importantes, não mais. Também não importava se eles eram mais velhos, todos eram sobreviventes.

― Chanyeol. - Apontou para si mesmo. - Baekhyun. - Apontou para o outro que apenas assentiu.

―  Ok.

― Você está bem?

― Foi mordido? - Baekyun perguntou dando um passo à frente.

Sehun se colocou de pé, obrigando Chanyeol a repetir o movimento, ele era alto.

― Não.

― Levante a camisa.

Sehun ergueu a sobrancelha. Me obrigue. Mas não achou sensato vocalizar.

―  Baek. - Chanyeol franziu o cenho.

― O que? Eu só quero ter certeza.

― Nós temos um acampamento, mais ou menos, você pode vir conosco, temos um pouco de comida e melhores lugares para dormir.

― Não, obrigado. - Sehun ajeitou a mochila.

― Você está sozinho? Pode trazer seus amigos. – Insistiu.

― Eu não tenho amigos.

― Não com essa atitude. - Baekyun murmurou.

― Comida, você tem? – O tom soou preocupado, mas por que um estranho estaria preocupado com ele? Seres humanos precisam sobreviver e agora com o mundo com menos recursos talvez começassem a matar por qualquer coisa.

Sehun estreitou os olhos e num movimento rápido tirou a faca do bolso. Baekhyun imediatamente empurrou Chanyeol para o lado e sacou uma arma.

Isso era injusto.

― Nós não queremos te roubar, não precisávamos ter te acordado pra isso.

Sehun o encarou. Chanyeol parecia exasperado, não era pra ser desse jeito.

― Ok. - Sehun guardou a faca de forma relutante.

Baekhyun continuou com a arma erguida, provavelmente porque o olhar de Sehun era ferino, ele ainda poderia avançar mesmo com a arma apontada, poderia testar se havia ou não munição. Talvez não tivesse, mas talvez era um risco que ele não estava disposto a correr, mas os dois estranhos não precisavam saber disso.

Chanyeol teve que colocar a mão sobre a dele o fazendo guardar a arma. Ele queria provar algo.

Os dois queriam.

Sehun o entendia, um estava se preparando para esse mundo, desconfiado e mais propenso a fazer o que deve ser feito. O outro... talvez um bom líder, uma pessoa sensata, um recrutador. Ele precisava de alguém como o outro garoto, um destemido. Sehun teria gostado deles se não tivesse os próprios demônios para carregar.

― Você não precisa vir com a gente.

― Obviamente.

― Mas não é seguro ficar vagando sozinho.

―  Grupos também não são seguros.

― Experiência própria?

― Não estou aqui para abrir meu coração.

― Eu respeito isso. - Chanyeol pareceu se dar por convencido de que não conseguia trazer o garoto para o abrigo, mas era triste.

Ele estava sozinho, ele era jovem e fora encontrado caído nos escombros de uma casa. Qualquer um poderia tê-lo alcançado. Qualquer coisa.

― Obrigado por me acordarem. - Se limitou a dizer antes de se afastar.

― Espera. Nós encontramos algo, acho que você deveria ficar com alguns.

Ele colocou a mão na mochila, Sehun recuou um passo desconfiado, Baekhyun o encarava a mão se voltando para as costas, obviamente onde a arma estava.

Eram barras de proteína.

Sehun quase salivou em cima delas.

― Elas são boas, deixaram só as de banana que não são as melhores, mas substituem uma refeição, é claro que se você não tiver comido nada não vai ter o mesmo efeito, mas se você conseguir comer algo antes, elas vão ajudar bastante.

― Você disse que tem um acampamento, não tem mais pessoas que precisam disso lá?

Sehun não era um cara altruísta, ele não deixaria de lado comida por outras pessoas, não nesse mundo, mas talvez fosse culpa desse garoto educado, de alguém que ainda enraizava uma personalidade sincera.

Um protetor.

― Sim, mas você vai ficar vagando, significa que você precisa mais do que a gente.

Uma raridade.

― Você é estranho. - Sehun aceitou. Chanyeol entregou cinco. Era muito.

― Você não deveria dizer 'obrigado'? - Baekhyun estava de braços cruzados, as sobrancelhas franzidas.

― Obrigado, mas eu não tenho nada para oferecer.

― Não precisa.

― Um conselho? Pare de ser gentil.

― Nunca. - Respondeu com um sorriso.

Sehun girou os olhos, deu uma última olhada na direção de Baekhyun e assentiu em sua direção, o garoto respondeu e os dois estranhos deram as costas seguindo pela porta de entrada. Sehun sentou na varanda, comeu uma barrinha e seguiu no sentido contrário.

Talvez no mundo quando ainda era mundo eles poderiam ter sido amigos, Luhan iria gostar de Chanyeol e Sehun se daria bem com o outro desconfiado.

Sehun decidiu seguir pela estrada, não era muito comum encontrar pessoas e tinha certeza que não daria a mesma sorte novamente, não com pessoas boas. Essas já estavam quase em extinção.

 

*****

― Você acha que ele teria vindo com a gente?

― Não, talvez...

― Acho que foi um erro não ter insistido.

― Agora não importa.

― Vamos nos esforçar mais da próxima vez.

― Hn.

Não era como se Baekhyun não se importasse com os outros, mas ele não conseguia entender a proteção que Chanyeol oferecia, para todos, para aqueles que visivelmente não iriam sobreviver nesse mundo, para aqueles que não eram capazes ou tinham medo demais de lutar.

A casa em que eles estavam agora não poderia continuar sendo um abrigo, já não havia mais nada próximo nas lojas, eles tiveram que viajar por mais de um dia para encontrar duas caixas fechadas de barras de proteína e nenhum remédio.

Eles estavam com uma família com duas crianças, um casal de idosos, uma garota cega, atualmente com febre e um senhor numa cadeira de rodas.

Baekhyun sabia que eles estavam indo de encontro a uma via sem saída, todas aquelas pessoas, mas não ele e Chanyeol, eles conseguiriam escalar as paredes e seguir para o próximo desafio.

― Yeol, nós precisamos de um rumo.

― Eu sei.

― Eu quero ir embora.

Seus dedos se entrelaçaram e eles dormiram assim, um ao lado do outro. Um ao outro, era tudo que eles tinham naquele mundo. E era tudo que Baekhyun precisava.

Havia algo crucial que eles ainda não tinham entendido. E só descobriram muito tarde, mas dizem que todo aprendizado é válido, mas se tratando do fim do mundo, todo aprendizado traz consequências.

Baekhyun e Chanyeol acordaram com gritos, não eram gritos próximos, eram gritos de dentro da casa. Eles acordaram no meio da madrugada, a casa não tinha energia, a vela já havia apagado.

― O que diabos está acontecendo? – Baekhyun se colocou de pé e tirou a arma de trás do travesseiro.

― Não saia daqui. – Chanyeol o empurrou para o lado, para de volta na cama enquanto se levantava.

Ele conseguiu acender uma outra vela.

Baekhyun o agarrou pelo pulso.

― Você não vai a lugar nenhum sem mim.

Mas eles não tinham tempo para isso. Não tinham tempo para analisar um ao outro, quando o inferno abre as portas, instinto tem que vir primeiro. Menos humanidade e mais sobrevivência.

Alguém se chocou contra a porta do quarto deles e a pessoa caiu de costas no chão enquanto duas crianças. Duas ex-crianças devoraram suas entranhas. O homem gritou, tombou a cabeça para trás, seus olhos se prenderam nos dois que no susto acabaram subindo em cima da cama.

Aquele homem, aquele pai de família que estava agonizando no chão. Que estava morrendo diante deles, esticou a mão na direção deles, como se eles pudessem fazer alguma coisa.

Baekhyun poderia jurar que estava surdo, ele não ouvia gritos ou os grunhidos que aquelas duas emitiam ou qualquer outra coisa que estivesse acontecendo no andar de baixo.

― Vamos!

Chanyeol o puxou pelo braço, eles passaram correndo ao lado das duas, uma decidiu continuar se ocupando com o banquete aberto, mas a outra se virou batendo os dentes na direção deles.

Eles desceram as escadas, algumas velas ainda estavam acessas na sala e eles conseguiram ver que não havia sobrado ninguém.

E todas aquelas ex-pessoas se ergueram e começaram a caminhar na direção deles. A menina cega estava com o maxilar pintado de sangue, a mãe tinha o braço esquerdo pendido de lado, mordido, escorrendo sangue.

O cheiro era nojento.

O senhor na cadeira de rodas estava caído no chão, metade do seu rosto estava aberto.

Em pânico Baekhyun atirou na mãe, depois na criança que descia as escadas e quase fechou a mão podre no braço de Chanyeol, depois na garota cega.

Eles correram para fora. Baekhyun tropeçou no meio fio e caiu de costas no asfalto. Chanyeol usou um sacho que estava caído na grama para acertar alguns errantes que surgiram, provavelmente atraídos com o som dos disparos.

As mãos de Chanyeol tremiam, o sacho já era pesado naturalmente, mas agora parecia ainda mais.

― Nós precisamos pegar as coisas.

Ao se virar viu Baekhyun agachado no chão vomitando.

― Eu vou pegar nossas mochilas.  – Constatou recuperando o fôlego.

― N-não, eu vou com você.

― Eu já volto. – Ele não esperou por uma resposta. Apertou o sacho mais firmemente contra as mãos e entrou.

Baekhyun se encolheu numa bola e chorou. Ele nem sabia que estava segurando as lágrimas, seu corpo simplesmente tremia e as lágrimas salgadas caíam pesadamente.

Ele não era tão forte quanto achava.

Nesse mundo, ele havia jurado que protegeria Chanyeol com a própria vida, era tudo ele tinha. Mas quando viu aquelas meninas, todas aquelas pessoas, ele conhecia elas, não tão bem, não como Chanyeol, mas...

O garoto. Sehun. Aquele garoto sustentava um olhar sério o tempo todo, o olhar de alguém que havia passado por isso tudo e se erguido.

Baekhyun se colocou de pé.

Aquele olhar era de quem havia perdido algo. Uma chama. Uma parte preciosa. Uma metade.

Ele não perderia ninguém. Não ele.

Eram eles contra o mundo.


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