First Page. escrita por Liids River


Capítulo 1
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Notas iniciais do capítulo

OLÁ INTERNET
gente,eu to com essa one aqui na minha cabeça desde que eu terminei e eu posso afirmar com toda a certeza de que ela não acabou.

vamos lá,essa aqui é pra você que leu minha one de quinta,amo vc
eu consegui adiantar essas duas e se tudo der certo já já tem mais uma ♥
obrigada aos meus xuxuzins que comentaram na última,já quase todos eles e já irei responder ♥

sobre essa aqui : eu amei cada pedacin.
Jornalismo é uma das minhas paixões e eu estou pensando seriamente em fazer esse curso de faculdade. Vamos ver.
Eu peço perdão por qualquer erro,mas eu não corrigi ainda 3



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Só me faltava um cachorro mijar no meu pé. Literalmente,mijar : levantar a perninha e vir fazer xixi. Era – provavelmente – o pior dia de todos os mundos e todas as galáxias. Começou errado quando eu acordei. Primeiro que assim que eu levantei , eu dei de cara com o meu cachorro comendo metade do meu sapato.

Eu quis me enterrar.

Tudo bem,eu posso conviver com isso. Mas como sobremesa,ele comeu a meia.

Ok,talvez seja um ensinamento : não deixar a meia dentro do sapato. É,vamos procurar um lado bom nas coisas.

Até aí,tudo bem.

Mas quando eu fui tomar café e me dei conta de que a única coisa no armário era um pacote de granola pela metade,eu quis novamente me enterrar novamente. Eu tinha desistido de ser saudável tinham dois meses e esse pacote de granola ia sempre ficar pela metade dentro do armário.

Eu suspirei e continuei caminhando , esperando que mais alguma coisa desse errada. A minha filosofia de vida sempre foi baseada na lei de Murphy : se tem possibilidade de dar errado....vai dar errado. Nem que a possibilidade seja mínima. Nem que a probabilidade seja de 0,00001%.

Vai.Dar.Errado.

Nunca fui bom em probabilidade no colégio. Muito menos precisei disso na minha faculdade,mas eu posso afirmar que vai dar errado.

“Mas-“ vai dar errado.

“Você é muito pess-“ vai dar errado.

“Ei!Deix-“ 

Eu terei que pintar um faixa gigantesca em neon dizendo que vai dar erado se há probabilidade de dar,ou vocês entenderam?

Eu peço perdão. É que meu cachorro comeu meu sapato,minha meia e infelizmente não comeu a granola no armário. Devia ter servido isso pra ele.Pelo menos eu estaria livre da decepção de só ter isso no armário.

Eu sou um infeliz jornalista. Tenho uma coluna pequena no jornal da cidade onde eu escrevo umas besteiras e as pessoas leem. A maioria só desce logo para as tirinhas e para as cruzadas no fim da página. Eu sei,é deprimente.

Não que eu não goste do que faço – muito pelo contrário. É tudo resumido à isso : escrever.

Mas eu precisava de inspirações.... e mal sabia eu,pobre infeliz da granola,que isso estava por vir.

Era uma tarde de sexta-feira extremamente chuvosa e fria. Parecia noite. Era o meu tipo de dia favorito,se não fosse pela chuva

Se você é como eu,provavelmente já passou por isso. Ajeitei meus óculos de armação quadrada na cara e suspirei. É terrível quando chove,ou você anda com algum tipo de para-brisas para óculos – paninho – ou você sobre com os pingos na lente até cair de cara na rua. Naquela tarde,quando eu saí do trabalho,tinha certeza absoluta de que alguma coisa ia dar errada.

E deu. Quer dizer,mais ou menos.

Como hoje era dia de rodízio do meu carro,eu tive que vir de transporte público para o prédio da Gallifrey Jornal. Não que isso seja um problema,de maneira alguma.

Mas eu havia me esquecido do quão lotado,fedido e frio trem da cidade. Lotado porque bem... é trasnporte público. Se você quiser espaço,você anda de carro.

Touché.

Fedido porque...olha,somos todos trabalhadores. Talvez eu me movimente menos que alguns dos meus colegas de transporte público,certo? Mas amigos....Rexona,não te abandona.

Esse relato não patrocinado  por nenhum companhia de desodorantes. Já deixo avisado.

E frio porque,bem... não importa. Esteja à 30 graus lá fora ou  à – 23 graus. O arcondicionado do transporte público sempre vai estar no máximo.

Então depois de quase uma guerra,tentando encontrar onde me encostar naquele cubículo lotado,fedido e frio eu pude suspirar e me xingar por ter escolhido um carro com final de rodízio em plena sexta-feira.

Esforcei-me um pouco para pegar meu celular um tanto obsoleto do bolso e apertar o play na minha playlist de volta para casa.Se tinha algo que me acalmava mais do que escrever,isso era a minha playlist.

Como jornalista,eu devo acrescentar sobre o quão observador eu sou. Era engraçado o jeito como as pessoas conversavam no trem lotado. Eu cheguei a ver uma garota abaixar-se para conversar com um rapaz por baixo do braço de um cara que estava entre eles.

As pessoas são engraçadas. Todas elas em geral.

Quando a anterior à minha chegou,o vagão esvaziou-se quase que por completo. Tirei um dos meus fones e suspirei,pedindo a seja lá qual Deus protegesse a minha cabeça dos pingos grossos da chuva lá fora e não me desse uma gripe nesse final de semana. Pela janela do trem,eu pude ver que a chuva já não passava de uma pequena garoa.

Quase sorri. Quase.

Quando a minha estação chegou,e eu passei pela catraca,os pingos engrossaram. O triplo do que chovia antes,chovia agora.

Os táxis? Parece que todos eles foram abduzidos,porque não havia nenhum ali.

— Inferno – murmurei com raiva. Passei minha mochila para frente do corpo,procurando pela caixinha dos meus óculos,para pelo menos guarda-los.

Não havia trazido comigo hoje.

—In-fer-no. – resmunguei ainda mais irritado. Procurei pelo meu guarda chuva,mas era em vão. Eu não andava com aquela porcaria,até porque era uma luta para abri-lo. O mínimo que eu podia fazer,era colocar os manuscritos dentro da minha pasta ainda na bolsa para que eu não os perdesse para a chuva.

Abaixando-me na estação vazia,peguei os papéis e coloquei-os dentro da minha outra bolsa : a do notebook.

Nesse exato momento,uma rapaz de no mínimo seus....17 anos? Passou correndo por mim e levando minha bolsa de notebook com os manuscritos.

—Ei! – gritei para o moleque que corria pela chuva em direção ao outro lado da avenida. Eu ameacei correr atrás dele,porém o sinal verde mudou para vermelho no exato momento.

O rapaz mostrou o dedo do meio,com a minha bolsa de notebook nos braços e saiu correndo para longe,se perdendo dentro a chuva torrencial que caía.

Lado bom? Eu não havia trazido meu notebook comigo hoje. Ele estava a salvo em casa.

Lado ruim? Os manuscritos estavam dentro da bolsa.

Eu me joguei no chão da estação suspirando.

E você ainda vem me falar de otimismo? Por favor,se você acredita nisso....se retire. Ou fique e me faça mudar de ideia.

Senti alguma coisa molhada caindo em cima de mim e me dei conta de que havia me sentado embaixo de uma goteira. E os pingos caiam bem em cima das lentes dos meus óculos.

—Inferno – suspirei,tirando aquela porcaria do rosto.

—Dia ruim? – ouvi uma voz doce acima de mim.

Levantei a cabeça e tive certeza de que o que eu via,era um anjo. Uma personificação de uma Deusa.

Ela tinha os cabelos loiros e cacheados. Parecia o cabelo de um anjo. Os olhos cinzentos como o céu de hoje,a boca avermelhada,talvez estivesse realçada com um batom ou essas coisas,mas não importava. Ela tinha um sorriso engraçado no rosto,e parecia muito interessada nos meus óculos. Ela tinha uma mochila nas costas e um guarda chuvas na mãos. Ela parecia pequena,mas eu estava sentado então eu não sei dizer ao certo. As bochechas coradas eram fofas,porém tudo indicava de que eu havia perdido os sentidos e estava vendo coisas.

— Século ruim – respondi fazendo careta e tentando respirar direito.

Ela deu um risinho e se abaixou à minha frente. Os olhos curiosos em mim,as mãos pequenas pegaram os meus óculos do chão e ela puxou a camiseta para for do moletom,limpando as lentes para mim.

Agora eu tenho certeza de que é uma miragem.

—Não precisa faz-

—Tudo bem –ela deu de ombros – Eu sei como isso é ruim,mas talvez você deva sair debaixo dessa goteira. – ela sorriu olhando-me rapidamente,e se levantando com meus óculos nas mãos ainda.

Aceitei sua sugestão. Vai saber,as miragens as vezes podem nos ajudar,certo?

Puxei minha única mochila para frente do corpo e suspirei,limpando as mãos nos meus jeans.

Olhei-a novamente.

Definitivamente personificação de algum Deus.

Ela não era tão baixinha. Devia ser uns 6 ou 10 centimetros mais baixa que eu. O sorrisinho de lado não deixando seu rosto enquanto terminava de limpar meus óculos.

— Você está sempre sorrindo? –soltei sem querer,logo sentindo meu rosto esquentar.

Seu sorrisinho se abriu um pouco mais.

—Você está sempre tão aborrecido? – soltou,estendendo o óculos de volta para mim.

Parei para pensar,sentindo minha boca se abrir.

Eu estava...surpreso?

Ela não era a primeira pessoa a dizer aquelas palavras para mim. Sally – minha mãe – ia gostar dela. Mamãe também achava que eu era... carrancudo. Não era sim,veja bem.... leia novamente tudo até aqui.

Eu lá tenho motivos pra sorrir?

Abaixei a cabeça,contendo uma resposta mal-educada para aquele anjo. Se ela era enviada dos Deuses,eu não queria aborrecê-los. Se sem aborrecê-los eu já perdi todo o meu trabalho da próxima semana,imagine aborrecendo-os.

— Não me amole – suspirei,colocando meus óculos ainda um pouco embaçados na cara. A garota sorriu de lado e entrelaçou os dedos em frente ao corpo,curiosa.

— “Não me amole” – repetiu,rindo – Expressão de...1889? – revirei os olhos. Outro ponto em comum que ela tinha com a minha mãe então. Expressões não deveriam ser passageiras. – Você é de que século?

— Você é bem intrometida.

—Você é velhinho –ela fez beicinho e sorriu. Até ela notaria que éramos da mesmo idade. – Você tá sabendo da novidade? O titanic afundou! –ela continuou brincando.

Revirei os olhos e não contive um sorriso.

Eu sei,nem eu acredito que estou sorrindo.

— Você tem dentes então.

—Fica quietinha – mandei,sentindo meu rosto corar.

A garota sorriu um pouco mais e virou-se para a avenida. Ela tinha um semblante animado e eu me perguntei de onde ela vinha com a mochila nas costas. Parecia ter por volta dos seus...20? 23 anos,talvez.

Apesar de ter essa mesma idade,eu me senti velho ao seu lado.

Talvez sorrir nos faça parecer mais jovem.

Vou treinar isso.

— Você está indo para casa? – perguntou baixinho.

—Estava.

—Dá tempo de tomar um café? –ela pigarreou,e eu desviei os olhos para o seu rosto,agora,também avermelhado. Ela era linda mesmo.

Eu estava sem o meu trabalho. Eu deveria ir o quanto antes para casa,fazer meus esboços para a semana. Esse era um motivo para dizer que não.Eu morava sozinho em um apartamento um tanto grande. Eu nem quero imaginar o quão empoeirado ele deve estar. Deveria ir para casa logo e começar a limpá-lo. Outra razão para um “não”. Deveria ir para casa e ver se a ração do cachorro ainda estava no potinho ou se ele havia vomitado a minha meia.

Eu conseguia achar um zilhão de motivos para dizer-lhe que não,não tinha tempo para um café.

Mas por alguma razão...

—Sim.

... eu disse que sim.

Com a minha sorte,eu deveria ter dito que não. Quem me garantia que ela não estava me levando para um beco escuro? Quem me garantia que ela não era uma mafiosa? Ou pior,uma traficante.

Suas bochechas rosas? Nah. Ela podia muito bem se fingir.

Mas por alguma razão,eu confiei em ir tomar um café com a estranha que eu nem mesmo sabia o nome. O que de pior ia acontecer? Ela ia levar minhas roupas?

Puff.

Do jeito que eu sou sortudo,talvez ela leve mesmo.

O sininho da porta chamou a minha atenção assim que entramos. A garota entrou como se fosse a sua casa e sentou-se na primeira mesinha vazia. O lugar estava quentinho e eu podia sentir os pingos de chuva secando em minha blusa. Tinham poucas pessoas no lugar mas era aconchegante.Tinham duas garçonetes entregando os pedidos e a televisão estava ligada em um filme qualquer. Não era importante.

A menina mostrou-me o lugar em sua frente e sorriu.

Sentei-me desconfiado,observando suas mãos estendidas para os meus óculos de novo. Tirei,entregando-lhe.

As paredes azuis recheadas de quadros. A janela do nosso lado,dava uma vista das pessoas encostadas nas paredes,esperando a chuva parar. Os cabelos dela agora estava cheio de pinguinhos da chuva. A lusa mais escura.

Largou a bolsa no chão e limpava novamente os meus óculos.

— Você é míope –ela riu de lado,colocando os óculos no rosto.

— “Quase cego”,você quer dizer. – passei a mão no cabelo para tirá-lo da testa. 

— Também sofro com isso –ela mordeu os lábios – Eu ando com a caixinha-

—Esqueci a minha – suspirei,colocando as mãos nos olhos. Odiava ficar sem óculos. Eu sempre me sentia mais narigudo e feioso. Levantei uma das mãos para quem quer que visse e me servisse ali.

O que queria mesmo era alguma coisa com álcool. Mas eu me contentaria com café.

— Gosto daqui– ela murmurou.

—Hn? -  reclamei.

—Eu –ela apontou para si mesma.Ainda usava meus óculos e sorria.

As bochechas dela devem doer ou ela se acostumou com o sorriso constante.

— Você – concordei. –

—Isso – ela sorriu de lado.

— Legal – procurei a garçonete com os olhos,evitando parecer mais retardado do que deveria.

Eu tinha tanto trabalho à fazer. Tinha conseguido duas colunas no jornal para segunda,mas... eu não tinha o trabalho ainda. Quer dizer,não mais.Uma moça usando um vestidinho vermelho e um avental por cima veio até nós. Ela estava pensativa agora,a cabeça inclinada, os olhos fixos em mim. Parecia uma médica.

Talvez ela seja. Não sei.

—O que deseja? – perguntou a moça. Os cabelos presos em um coque.

—Café –suspirei. – O mais forte que tiver.

Ela anotou em seu bloquinho, mastigando seu chiclete de forma irritante. Virou-se para a menina e levantou as sobrancelhas. Virei-me para a garota também. Ela ainda me olhava fixamente e isso estava começando a ficar constrangedor.

— Hn? – murmurei,desviando o ohar dela,para as minhas mãos.

—Café – ela sussurrou.

Eu senti quando a presença da garçonete sumiu.

Ela era muito bonita.

A moça,não a garçonete. Eu nem reparei na garçonete.

Ela ainda estava com os meus óculos no rosto e a cabeça apoiada nas mãos. Ainda tinha o olhar curioso mas não disse e nem perguntou mais nada.  Os cabelos quase secos,as mãos parcialmente escondidas dentro da manga grande do moletom.

Eu ainda estou esperando que ela pegue a minha carteira e vá embora.

—Você... – pigarrei. – Trabalha com o que?

— Eu faço faculdade – ela sorriu. – Arquitetura Estou estagiando,mas... é complicado.

—Ah sim –  murmurei,ainda olhando-a. Seus olhos de uma cor que eu nunca havia visto antes.

—Meu pai é meu chefe,então – ela balançou a cabeça e deu de ombros – Ele nunca me diz quando estou errando.

—Que péssimo – sussurrei,entrelaçando os dedos. Não tinha muito o que conversar com ela. O quão ridículo era aquilo? Ela me viu sentado igual um pateta no chão da estação,embaixo de uma goteira depois de ter sido roubado.

Pelo menos o ladrãozinho vai ter o que ler.

Podem ver que um lado da minha consciência ainda procura o lado bom das coisas.

Ela olhava para as pessoas no café. Os pés agora apoiados no banco. Parecia tão mais jovem e bela do que deveria. Um cara da mesa ao lado não parava de olhar para seus cabelos e suas mãos.Eu não conseguia nem desviar os olhos dela,mas o olhar do cara era tão intenso que eu quis vomitar.

Ela era mesmo muito bonita.

Provavelmente seu sexto sentido avisou que o cara encarava ela,pois seus olhos saíram de mim e ela encontrou com o cara da mesa. Ele sorriu e ela abaixou a cabça,envergonhada.

Bufei sem nem perceber.

— Perseu – murmurei com petulância.

Não me chama pra tomar café e fica sorrindo pra outras pessoas. Que falta de educação.

Ela inclinou a cabeça e sorriu de volta para mim.

Melhor assim.

Eu quis me socar. Que diabos eu estava pensado? São seus dentes branquinhos,ela pode exibi-los para quem quiser.

— Como o herói – ela sussurrou. – É um nome bonito.

—É... – sorri sem graça – Estou bem longe de ser como o herói. – balancei a cabeça.

Perseu,o Herói.

Estava mais para : Perseu, o idiota.

A garçonete voltou com os nosso pedidos. Minha xicara parecia tão apetitosa e o biscoitinho ao lado,fez com que meu estomago roncasse. Eu nem me lembro de ter almoçado,mas estava com uma fome tremenda.

Ela deixou as coisas na mesa e saiu piscando para nós.

— Você é muito negativo sobre as coisas,Perseu – ela murmurou,mordendo seu pãozinho.

Eu quase engasguei tomando meu café.

Seria hipocrisia minha ficar bravo com alguém que só percebeu o óbvio? Então me chame de hipócrita.

— É mesmo? – sorri,sarcástico,desviando meus olhos para a televisão ligada – E você me conhece a enormes cinco minutos para fazer o meu perfil pessoal,não é mesmo? – voltei-me para o seu rosto.

Seu sorriso vacilou um pouquinho e fez com que eu me sentisse mal,mesmo estando – tecnicamente –certo.

—Não quis ofender você – ela murmurou,tirando o cabelo da testa. Meus óculos ainda seu rosto,deixava-lhe ainda mais adorável.

— Não o fez. – respondi,tomando um gole do meu café.

Bebida dos Deuses.

Se você não é adepto ao café,você não sabe o que está perdendo.

A menina continuou mordendo seu pãozinho. Parecia com tanta fome quanto eu. Fiquei tentado a chama-la para almoçar mas...

....quais as chances?

—Você trabalha com o que? –ela perguntou com a boca coberta de migalhas.

Eu ri de lado e estendi um guardanapo para ela. Seu rosto ficou vermelho mas ela resistiu ao meu olhar e sorriu.

— Eu.. – suspirei – ...sou jornalista.

—E você gosta?

—É claro – inclinei a cabeça confuso com sua pergunta.

—Mas...? – ela incentivou.

—Não deve ser tão legal quanto ser arquiteto – brinquei,mexendo meu café com a colherzinha. Não que eu tivesse vergonha da minha coluna fracassada no Gallifrey Jornal,mas definitivamente não era feliz escrevendo o que escrevia.

—Eu aposto que é – ela sussurrou,olhando-me fixamente. Suas pupilas grandes e a vermelhidão no rosto faziam parecer que ela não deveria tomar tanto café. – Você escreve. Eu não teria criatividade para isso.

—Não é bem assim... – sussurrei de volta. Por que estávamos falando baixo?

—Não seja tão negativo.

—É fácil falar – devolvi,revirando os olhos.

Ela sorriu,revirando os olhos junto comigo. Se fosse uma competição,ela teria ganhado.

Ela não era só bonita. Era linda.

E um tanto irritante.

—Você é teimoso – ela jogou,terminando seu café.

—E você é irritante – respondi,também terminando meu café. Sustentei seu olhar um tanto confuso.

— Talvez eu seja mesmo – ela sorriu,tirando meus óculos e colocando-o em minha mão estendida na mesa. – Mas você é muito negativo. Isso não faz bem.

—Você nem me conhece – respondi dando de ombros.

Por que a opinião de uma estranha me importa tanto então?

Ela continuou me encarando. Seu sorriso foi sumindo aos poucos e antes a visão do anjo – que ela supostamente era – foi se tornando em outra coisa. A boca reta,as bochechas não-levantadas. As sobrancelhas perfeitas no rosto perfeito. Era isso que ela representava então. Ela era perfeita demais.

— Eu tenho que ir pra casa – sussurrei olhando-a ainda. Ela pisocu,parecendo sair de um transe tão grande quanto o meu. Balançou a cabeça,levantando-se e egando a mochila.

Tivemos uma breve discussão para ver quem pagava os sete dólares dos cafés.

Ela acabou pagando porque eu não tinha trocado.

E tudo bem.

Quando passamos pela porta e o sininho tocou de novo,eu acordei. Estava frio,escuro,mas não chovia mais. Eu deveria me oferecer para leva-la até a sua casa ou...?

— Eu vou pegar um táxi – ela sussurrou,escondendo a cabeça de baixo da touca do moletom grande. Os olhos cinzentos atentos aos meus e o sorrisinho de lado quase imperceptível.

Deve ser ótimo ter toda essa positividade.

—Certo – sussurrei,também escondendo minha cabeça embaixo da minha touca do moletom. Apertei a alça da mochila firme e suspirei. – Obrigado pelo café.

—Sempre que precisar – ela sussurrou de volta.

O que diabos isso quer dizer?

Encarei seus olhos novamente. Era como se essa.... menina,pudesse ver tudo. Eu me sentia exposto e não há nada mais desconfortável que isso.

—Tchau – sussurrei,acenando-lhe com a mão esquerda.

Ela acenou de volta,mas não se moveu.

Momento constrangedor quando nós nos despedimos mas ninguém vai embora. Seus olhos atentos ainda em mim.De repente,ela levantou os braços e me abraçou.

Só quando repousei minha cabeça no meu travesseiro,jogado no sofá,assistindo à aquela série boba,foi que me dei conta de que não sabia o nome da moça. E pior ainda,foi quando já deitado em minha cama,me surpreendi com meu próprio pensamento,de que não havia sido um sonho e de eu tinha mesmo ido tomar um café com uma desconhecida.

O piro não foi me dar conta disso.

Foi me dar conta de que o meu dia tinha sido salvo por uma estranha.

E como eu queria conversar com ela novamente.

O final de semana passou,e eu fiquei contente em perceber que havia conseguido limpar o meu apartamento e material para uma semana inteira de trabalho. Estava me sentindo inspirado depois da minha experiência com a garota estranha.

Havia escrito seis crônicas em três horas.

Ok,talvez a palavra “inspirado” seja pouco.

Ela não saía da minha cabeça.

Seus olhos,seus cabelos,suas mãos,seus movimentos.

E seu maldito sorriso. Aquele sorriso irritante e perfeito.

Seu jeito petulante também.

Segunda-feira,quando meu chefe aceitou minha proposta de reforma na coluna,eu tive certeza de que a sorte existia. Talvez ela estivesse ao meu lado naquele dia. Quando ele terminou de ler três,das seis crônicas escritas e me parabenizou convidando-me para almoçar com ele e com os chefes do setor,eu tive que controlar a minha ansiedade e apertar-lhe a mão como um rapaz de 23 anos normal.

Mas por dentro eu estava dando pulinhos cavalgando em cima de um unicórnio vermelho e rosa.

Poda ser só coincidência. Podia,e talvez fosse.

Mas eu queria vê-la novamente.

Não que eu acredite nas coisas positivas agora,mas... eu precisava.

Precisava pelo menos ver seu sorrisinho de lado novamente.

E saber seu nome.

A minha sorte não foi tão grande quando peguei o trem naquela tarde/noite. Eu estava em busca da garota novamente,precisava começar a procura-la onde eu a encontrei pela primeira vez. Apesar de ter gostado da conversa com os chefes dos setores,nosso almoço se estendeu até as três da tarde e  meu trabalho se atrasou por conta disso.

Seria muita,muita sorte encontra-la no trem esse horário.

Dito e feito.

Talvez eu esteja mesmo com muita sorte.

Eu vi sua cabeleira loira no final do vão. Ela conversava timidamente com uma garota da mesma idade que a nossa.  Ela usava um vestidinho preto e rendado. Usava um coturno e um sobretudo por cima.

Ela era tão linda que eu me sentia na quinta série de novo: com medo de falar até mesmo “Olá”.

A colega dela desceu na estação que geralmente era lotada e ela ficou espremida entre dois caras altos. Parecia tão pequena e indefesa.Queria ir até ela e tirá-la do meio deles,mas o meu caminho até seu espaço,era curto,porém as pessoas ainda estavam entre a gente.

Nossa estação era a próxima.

Como bom observador – e cagado – eu vi quando os dois caras apontaram para ela e sorriram.

Boa coisa não era. Eu posso afirmar.

Ela mexia no fone de ouvido destraída e olhava pela porta,pensativa. Parecia uma boneca perdida no trem. Quando as portas se abriram,eu olhei fixamente para os caras e suspirei.

Que droga.

Saindo da estação ela não corria risco nenhum,certo? Quero dizer,sai bastante gente. Geralmente,muita gente vai para qualquer que seja o lado. Observei quando metade da galera que havia saído do trem veio para a direita comigo,menos três pessoas que iam para a esquerda da avenida : A moça e os dois caras.

Que droga dupla.

Eu deveria ter deixado a menina,certo? Eu nem a conheço! Ela pode se cuidar.

Eles foram se afastando,andando pela avenida quase vazia – se fosse pelo movimento de carro.

Ela ia ficar bem,certo?

Só reparei que havia parado de andar quando alguém esbarrou em mim e resmungou :

— Olha pra frente,cara.

Eles continuavam se afastando. Tudo bem,a rua era iluminada. Eu estava sendo fazendo um pré-conceito dos caras? Estava.

Mas eu jamais ia me perdoar se acontecesse algo aquela menina estranha.

Comecei a caminhar em direção à eles.

Que droga tripla.

Ela caminhava calmamente até a segundo virada da esquerda. Mais duas ruas e estava na minha rua. A do meu apartamento. Eu geralmente tomava o outro caminho porque era mais fácil. Os dois rapazes foram chegando ainda mais perto dela e eu sabia que havia tomado a decisão certa.

Mesmo que eu nem saiba seu nome.

— Hn – respirei fundo,correndo em sua direção – Lucy!

Os três se viraram pra mim no mesmo instante.

Por que Lucy? Porque eu não tenho criatividade repentina para nomes.

Ela me olhava confusa por alguns instantes. Os caras pararam de andar e começaram uma conversa entre si. Passei por eles acenando com a cabeça,porém eles apenas olhavam para....hn,Lucy?

— Ei,achei que não te veria novamente,Lucy! – falei alto para que eles escutassem. Ela me olhava confusa e irritada.

— Meu nome não é Lucy! – bateu-me no peito – Você nem perguntou o meu nome.

—Shiu – passei o braço ao redor dos seus ombros – Fica quieta.

— Por que você tá me seguindo? –reclamou,cruzando os braços.

— Fica quieta – sussurrei,olhando por cima do ombro.

Os dois caras continuavam nos olhando. Quero dizer,olhavam para a menina nos meus braços. Pareciam irritados e nervosos. Comecei a puxar aquela estranha em direção a minha rua.

O que diabos você está fazendo,seu miserável?

Shiu,confia em mim.

Vai dar errado.

Não vai,shiu.

A minha cabeça é um lugar confuso. Sinto pena de vocês que tentarem entender.

— O que você está fazendo? –ela reclamou,tentando me parar.

—Olha discretamente para trás. – dito e feito. Ela deu um giro de 360 graus nada discreto – Esse é o melhor que você consegue fazer?! – reclamei,entrelaçando meus dedos nos seus.

— Se você quer pegar na minha mãe,só diga – brincou – Não precisa arranjar desculpinhas.

—Eles estavam seguindo você – puxei-a novamente para debaixo dos meus braços. Era engraçado porque ela se encaixava perfeitamente ali. Como uma pecinha de lego. – A menos que você diga que está tudo bem e eu posso seguir o meu caminho.

Ela não precisa saber que o meu caminho é o mesmo que o dela.

E nem que ela disse eu a deixaria ali.Quem eu estou tentando enganar?

Ela estremeceu um pouco e passou um dos braços pelas minhas costas.

—Eu pensei que não veria você de novo – sussurrou.

Olhei para trás : os caras ficaram lá,mas eu não deixei de abraçá-la mais forte.

— É uma cidade pequena – pigarreei,apertando sua mão – Eu estava por perto,não ia deixar você-

—Eu sei – ela me interrompeu sorrindo – Obrigada,Perseu.

Andamos por mais um tempo pelo caminho da minha casa e eu pude sentir seus ombros mais leves. Ela sabia que estava sendo seguida.

— Que bom que você apareceu – murmurou ainda baixinho – Eles estavam comentando...coisas desde que desci do trem. – suspirou,apertando minha blusa atrás – Eu já estava pronta pra lutar aikido.

—Tá tudo bem – murmurei , mais para me acalmar do que à ela.

A menina estava pronta para lutar aikido.

Eu podia sentir minhas mãos se fecharem em punho. Sabia das noticias de garotas que haviam sido sequestradas – e até pior. Não imaginava... Lucy (?),em uma dessas.

Preferia não imaginar.

—Você luta aikido? –perguntei, beijando-lhe os cabelos.

Tinha cheiro de chiclete.

Não ouse me julgar.

—Não – ela inclinou a cabeça para o meu ombro e sorriu de lado.

— E como você...? – perguntei,olhando em seus olhos cinzentos. – Como pretendia...?

Ela deu de ombros e riu mais alto.

Não tive como não sorrir.

Ela era tão positiva.

— Annabeth – ela sussurrou na porta do seu prédio. Já se passava das dez,e eu tinha que levantar cedo pela manhã. Mas hoje,quando chegamos à sua porta – que não era longe da minha rua – a conversa fluiu mais leve. Mais normal. Mais alegre. – Se você me chamar de Lucy de novo,eu quebro a sua mão.

Parecia um gatinho fofo ameaçando,mas não comentei nada.

Naquela noite,ela me deu um beijo na bochecha.

Pra mim...um beijo de boa sorte.

 Na terça-feira da outra semana,eu recebi uma mensagem : Você tem uma página inteira. Faça valer a pena.

Talvez esse fato tenha se dado pela minha escrita – que só evoluía a cada dia. Eu tinha uma página – provavelmente uma das últimas – mas eu tinha. Uma página inteira. Eu tinha uma página inteira.

“Faça valer a pena”

Não consegui conter o meu sorriso quando entrei no prédio. Não consegui conter minha vontade de sair abraçando todos os meus colegas de trabalho. Na ultima semana,as vendas dos jornais aumentaram.

Eu tenho certeza que isso não se dá pela minha escrita. Ninguém lê as ultimas páginas,e é lá que costuma ficava minha coluna. Mas de alguma forma,meu chefe ligou isso com as crônicas que eu lhe apresentava.

Ele concordava em coloca-las com a condição de ter uma continuação gradativa a cada dia. Dito e feito.Era como escrever um livro por dia. Às vezes,eu tinha que me controlar e cortar o “capitulo” em dois. Pelo jeito,meu chefe também gostava de ler.

Sorri feliz,tanto pela conquista da página inteira,tanto por ter tomado um café da manhã ótimo : havia me livrado do pacote de granola.

Estava sempre me lembrando de não deixar as meias no sapato : sherl  (meu cachorro) sempre voltava decepcionado depois de ir checa-los.

Naquela tarde enquanto esperava o trem,me peguei procurando aquela cabeleira loira. Nos falávamos constantemente agora. Saíamos às segundas para tomar café. Eu estava cada vez mais íntimo do transporte público.

Mais intimo de Annabeth.

E eu nunca me senti tão positivo quanto à isso.

Subi no meu vagão – cheio como de costume – e esperei pela próxima estação – onde ela geralmente subia. Fiquei tentado a pegar meu celular e mandar-lhe uma mensagem.

Sim,nós trocamos números e tudo.

Eu me sentia uma garotinho de novo. Estava dando tudo tão certo.

Encostei-me na janela espelhada e procurei seu cabelo por ela. Como de costume,ela estava parada bem em frente a minha porta. Hoje,ela vestia uma calça jeans preta,rasgada e uma camiseta de série. Ainda parecia uma boneca perdida.

Ela me viu dentro do vagão e acenou.

Não consegui conter – mais uma vez – um sorriso.

Quando as portas se abriram,eles esparavam pacientemente para entrar enquanto as pessoas desciam. Eu queria abraça-la e contar-lhe da minha conquista da página inteira.

Provavelmente uma das últimas,mas....shiu. É uma ótima notícia.

Quando ela entrou e veio na minha direção,senti meu sorriso se desfazer. Não por ela estar vindo na minha direção ou algo assim.Tinha uma coisa pendurada em sua mão. Uma coisa entrelaçada em seus dedos. Demorei um tempinho para raciocinar e associar aquilo à mão de outro ser humano.

Ela estava de mãos dadas com...um rapaz. Alto,loiro e de olhos verdes. Ele tinha uma cicatriz no rosto e um sorrisinho sacana para cima de mim.

Mas o que diabos?

—Ei! – ela estalou os dedos em meu rosto – Acorda,menino!

Desviei os olhos da mão do garoto e olhei em seus olhos. Cinzentos como todos os dias lá fora.

Cinzentos como o meu humor agora.

—Oi – murmurei,pigarreando.

Ela inclinou a cabeça e olhou para o garoto ao seu lado. Sorriu para ele e murmurou :

— Esse é o Luke – ele fez uma reverencia engraçada e revirou os olhos para ela – Esse é o Percy,Luke.

— Olá – o rapaz murmurou olhando-me fixamente nos olhos.

“Olá”.

Essa era nova...eu nunca tinha sentido vontade de matar alguém só por causa de um cumprimento.

—E aí.

Momento constrangedor.

Mais e mais pessoas começaram a entrar no vagão. Era uma das estações mais lotas da história dos trens. Annabeth se acomodou ao meu lado e sua mão começou a procurar pela minha,porém eu fingi ter que coçar a nuca.

Piolhos,vocês sabem...

Annabeth olhou-me magoada e suspirou.

Isso mesmo. Eu sou um rapaz difícil.

Um silêncio entre nós dois se instalou e tirou até as coisas da mala. Se tem algo que eu sei fazer,além de ser um tremendo pessimista,isso é ficar em silêncio. E ela continuava a conversar com seu amigo,então não foi grande coisa para ela também. Guardei a minha grandiosa – agora não tão grandiosa – novidade para mim mesmo,num potinho das decepções e suspirei.

Nem era uma grande grande conquista assim.

O tempo foi passando e o sol se pondo. Eu queria estar em qualquer lugar,menos naquele vagão lotado,vendo o sol se pôr pela aquela janela suja.

Em algum momento, como se fosse possível,o trem lotou ainda mais. Annabeth agora estava de frente para mim,uma das mãos na janela atrás de mim. Os cabelos brilhavam por conta do sol e os olhos pareciam quase azuis de tão limpos que estavam.Se ela soubesse como consegue me atormentar só com um olhar. Observei enquanto ela continuava a conversar sobre a faculdade com seu...amigo. Ela desviava os olhos às vezes e sorria para mim,mas eu não conseguia parar de agir feito um adolescente teimoso. Não sorria de volta.Alguma força fez com que meu braço passasse ao redor da sua cintura e puxasse seu corpo pequeno ainda mais para perto do meu. Seu amigo me olhou torto e ela suspirou assutada,porém logo retomou sua conversa. Eu sentia meu rosto quente,mas estava mais tranquilo de alguma forma.

Quando chegamos na estação de seu amiguinho,ele se despediu com um aceno – que eu ignorei. Mais pessoas subiram,mais pessoas desceram. Ela recostou a cabeça em meu ombro e suspirou mais uma vez.

Abracei seu corpo com os dois braços na sua cintura e cheirei seu cabelo – chiclete.

Algumas pessoas nos olhavam,mas não importava.

—Eu tenho uma notícia – sussurrei em seu ouvido.

—Eu também – ela levantou a cabeça,apoiando o cotovelo em meu ombro,sorriu de lado. Ela estava à centímetros do meu rosto e ... ela era linda mesmo,hun? – Você primeiro.

O cabelo loiro dela estava bagunçado agora,mas não deixava de parecer ainda mais com os cabelos de algum anjo. Ou personificação de Deusa.

— Eu consegui uma página inteira – sussurrei,colocando uma mecha do seu cabelo atrás d a orelha. – Provavelmente é uma das ultimas,sabe? Aquelas que ninguém vai ler,mas eu estou estranhamente positivo em relação à ela,sabe?? Acho que... não sei – sussurrei inseguro.

Seu sorriso se abriu e ela só faltou dar pulinhos alegres dentro do vagão lotado.

—Eu vou ler! – Annabeth murmurou – EU vou! Vai ser lindo! E meus parabéns,Percy! – beijou-me na bochecha e sorriu ainda mais – Meu menino conseguiu uma página inteira! – ela falou mais alto para que o vagão inteiro ouvisse.

Algumas pessoas olhavam para ela e ria. A maioria ignorava.

—Annabeth! – reclamei,fazendo careta – Deixa de ser exagerada,menina!

— Gallifrey Jornal,comprem todos! – ela gritou mais uma vez,contente. – Eu quero que você fique mais contente,Percy! – ela pegou minha mão e entrelaçou nossos dedos.

No mesmo instante lembrei dos seus dedos na mão do seu amiguinho. Consegui sentir a minha própria careta.

—Sua notícia seria...? –perguntei um tanto receoso.

Ela sorriu de lado,travessa. Colocou outra mecha atrás da orelha,e mexe nos meus cabelos da nuca.

Ela era tão doce.

— Ele é gay – sussurrou,beijando-me na bochecha.

Ela inclinou a cabeça de lado e piscou um olho para mim.

Mas uma vez,me senti um bocó.

E mais uma vez,não contive um sorriso.

Bloqueio criativo.

Tudo podia acontecer,menos aquilo. Tudo.

 A minha página saía na segunda-feira e eu não tinha ideia do que escrever. Não era nada comparado à um livro,não era mesmo. Se fosse um livro,eu não teria pressa. Não teria que ter mentido para quase todo mundo.

Era sextafeira e u estava em casa. Eu não riria conseguir olhar para o meu chefe e dizer que tinha tudo pronto.

Enrão eu fiz isso por telefone,mesmo sendo um grande mentira.

Quando Annabeth me ligou às dez da manhã,eu não atendi. Precisava me concentrar e pensar em alguma coisa ou ia acabar explodindo uma das melhores oportunidades que já havia recebido.

Mas é uma das ultimas páginas.

É uma página inteira.

Eu estava sentado em frente ao meu notebook,desejando ter uma luz,mas não vinha nada. Já havia acabado com três folhas de caderno,fazendo esboços e mais esboços. Introduções grandes demais,ou sem sentido. Eu cheguei a fazer uma continuação,mas não era boa o suficiente. Como que uma personagem regredia da felicidade extrema ao fundo do poço? Eu não podia publicar aquilo.

Sherl se sentou ao meu lado e encarou-me. Os olhos negros e o pele igualmente escuro. Eu acariciei sua cabeça e sorri.

Se eu pudesse,escrevia sobre animais.

Mas mudar uma coluna – quissá um página inteira – de uma crônica para fatos sobre animais,era algo fora de cogitação.

Meu celular vibrou novamente em meu bolso e eu não pude mais ignorá-la.

Eu precisa saber se você está tendo uma crise,se está me ignorando de verdade ou se morreu. Se não for a terceira opção,eu juro que te mato quando te ver.

Preciso saber se você está bem,ok?” -  AC.

Já era quase duas horas d atarde. Eu precisava do material para segunda. Se havia alguém que podia me ajudar,esse alguém era Annabeth.

“Oi “ - PJ.

 “Eu vou matar você quando te ver” - AC.

Sorri,por mais que estivesse sobre pressão. Ela tinha esse efeito sobre mim.

“Está tudo bem. Não fui ao trabalho hoje,então tome cuidado ao sair do trem. Talvez você deva usar suas técnicas de aikido.” - PJ

“ O que houve?” - AC

“Nada” - PJ.

“Estou à caminho. Faça pelo menos um café. E coloque água para o cachorro,Percy.” – AC.

A minha intenção não era fazer com que ela perdesse o dia também,mas eu estava contente que ela viria. Poucas coisas eram certas depois que eu a via : a minha inspiração voltava. E era disso que eu precisava.

 Você está agindo feito um boboca apaixonado. E você sabe que o amor é fadado ao fracasso.

Ei,escuta : fala isso pro Percy do inicio do relato,talvez ele desista.

Continuei jogado no chão da sala depois de fazer o café,com a minha página aberta,minhas canetas espalhadas no chão e meus cadernos jogados em cima de Sherl. Sentia as minhas costas doerem por estar jogado no chão encostado no sofá,mas ainda assim não conseguia me levantar.

Eu começava com “Enquanto isso...” mas não estava bom.

Eu tentava com “ Eram tantas as ...” mas não estava dando certo.

—Não tá funcionando –resmunguei para sherl,ao meu lado – Minha cabeça parece que parou. Não tá funcionado.

— A porta se abriu de repente e uma Annabeth muito irritada entrou. Ela vestia um shorts e uma camiseta azul,grande demais para ela.

— Eu vou matar você. – ela resmungou,jogando a mochila no chão e indo até a cozinha.

— Eu acho que não é pra mim. – resmunguei,tirando os óculos e colocando as mãos nos olhos – Vou devolver a página para as cruzadinhas e tirinhas idiotas.

Ouvi seus passos,mas não tirei a cabeça das mãos. Ouvi as patinhas de Sherl no chão e ela sussurrando algumas coisinhas para ele. Ela se abaixou na minha frente e cutucou o meu joelho.

—Se você fizer isso,eu vou quebrar as suas mãos – murmurou.

Levantei a cabeça,olhando-a. Como ela conseguiu manter o bom humor em situações assim?

—Eu tenho você – ela respondeu à minha pergunta silenciosa. As vezes,parecia que tinhamos essa ligação mental. Balancei a cabeça,dizendo que não e ela balançou dizendo que sim.

—É diferente – sussurrei. – Eu não consigo.

—Você consegue sim! – ela riu de lado. – Você tem à mim.

—Não é assim – murmurei,colocando meus óculos de volta. As pupilas de Annabeth estavam enormes e al sorriu mais – Eu não sei o que escrever.

— Onde as personagens estão,Percy? –ela perguntou,sentando-se de frente para mim. As pernas estavam geladas e eu me assustei.

—Tá tudo bem? –perguntei,passando minhas mãos pelas suas pernas. – Tá gelada.

—Tá frio lá fora,só isso –ela espirou baixinho – Vamos,onde estão as personagens?

—Não,espera ai – levantei-me,puxando-a comigo. – Você tá querendo ficar resfriada? 

Ela me olhou confusa e revirou os olhos.

—Foi só uma garoinha fina! – sorriu. – Vamos,temos que ver o que você pode escrever....

Bufei,fazendo-a se virar para mim.

— E como você pretende me ajudar nisso? – cruzei os braços. – Meus personagens estão parados aqui – apontei com o indicado para a minha própria cabeça – Eu não acho que vou conse-

—Se você disser que não vai conseguir,eu vou chutar suas partes baixas – ela levantou o indicador – Estou falando sério.

Olhei em seus olhos cinzentos. O nariz estava avermelhado,a boca também. As bochechas pálidas e a testa franzida.

Ela era tão linda que eu tive vontade de dizer isso em voz alta.

— Você é linda – sussurrei.

Que as coisas não fiquem estranhas...

Que as coisas não fiquem estranhas...

Que as coisas não fiquem estranhas...

— Você faz com que eu me sinta linda.- ela sorriu de lado – Você não percebe? Estou conseguindo fazer com que você acredite mais em si mesmo,Percy! – ela riu de lado e se aproximou,tirando meus óculos,colocando em si mesma – Eu digo que você vai escrever a melhor página do mundo e que vai ser colocada em primeiro lugar. – ela se aproximou passando os braços pequenos ao redor do meu pescoço. Seus cabelos cheiravam à chiclete e seus lábios pareciam bem mais convidativos agora.

— Você...você acha? –perguntei,pigarreando.

—Acho – ela sorriu.

Ela parecia radiante. Contente a mais feliz que eu.

Mas ela sempre parece mais feliz que eu.

—Você está sempre sorridente assim? –perguntei,colocando minhas mãos ao redor da sua cintura.

—...

—...

—.... Desde que eu vi você jogado no chão da estação – ela sorriu e aproximou seus lábios dos meus,beijando-me. Era macio e reconfortante. Como sorvete de chocolate. Como um elogio pelo o que eu era e não pelo o que eu tinha.Até porque eu não tinha nada.

Ela quem me deu as coisas.

Confiança,positivismo e o melhor :

Ela me deu a história.

A história da primeira página.


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Notas finais do capítulo

Só pra deixar um pouco mais claro : Percy tinha inspiração quando ele via a Annabeth. Não que ele só conseguisse escrever quando ele a via,mas saiam muito melhor os seus relatos quando ela estava por perto.
É basicamente o que ocorre comigo : eu escrevo um zilhão de coisas,mas quando eu posto aqui,eu me sinto muito melhor.
amo vocês!

(algumas coisas desse relato são reais)
tipo o trem de sp lotado
bj.