Capítulo 90 - Toda jornada começa com um primeiro passo

 Mesmo vendo que o destino de sua viagem era perigoso, Thiago ainda estava firme em sua decisão. Como prova de amor, ele aceitou o desafio do pai de Mariana de buscar a rara Flor dos Ventos Uivantes na montanha mais alta da cidade. Mesmo Mariana não exigindo a necessidade disso, Thiago via que era seu dever cumprir com essa missão.

- Vou falar de novo - repetia a loirinha - Você não precisa fazer isso só porque meu pai te desafiou

- Não é questão só do seu pai agora, Mariana - fala Thiago, agora arrumando sua mochila para o desafio - É meu dever como homem!

- Oooh...que fofo! - diz Renata, observando a conversa dos dois - Ele é o namorado que qualquer garota queria ter, não é, Mari?

- Fofo? Se suicidar é fofo? - fala Mariana - Você tem ideia do perigo que é ir para aqueles lados, Thiago?

- Relaxe. Eu já fui escoteiro, Mari - responde ele, ainda arrumando as mochilas - Posso sobreviver na floresta

- Foi escoteiro? - Fabíola também estava participando da conversa - Disso eu não sabia

- Foi. Aos sete anos de idade e desistiu porque achou perigoso demais - responde Mariana.

- E me arrependo até hoje! - fala o rapaz - Poderia ter melhorado mais minhas habilidades...mas ainda dou conta de subir uma montanha. Pelo site tinha uma trilha lá, não tinha?

- Sim - fala Fabíola, enquanto tirava o esmalte das unhas, sem se preocupar muito com a situação - Não é uma montanha que você precise subir usando cordas, mas mesmo assim...se você escorregar numa pedrinha de lá..já era

- E tem animais selvagens lá, não tem? - lembra Renata.

- É. Tome cuidado com os ursos

- E desde quando tem urso por aqui? - pergunta Mariana.

- Ursos? Sério? - Thiago arregala os olhos.

- Não tem? - fala Fabíola - Fala aí, Renata...não teve aquela vez que fugiram uns do circo...estão procurando eles até hoje

- É...e dizem que foi justo naquela região.

 Thiago engole seco, mas Mariana não cai na delas.

- Vocês...parem de mentir assim! Vão deixar ele ainda com mais medo do que já está!

- Quem disse que estou com medo? - bronqueia Thiago - Nunca me senti tão corajoso!

- Olha! Uma barata! - grita Fabíola. Claro que era brincadeira, mas o garoto não percebe isso de cara.

- Onde?! - Thiago se agarra em Mariana que o arremessa na cama com um golpe de judô extremamente rápido.

- Nunca se sentiu tão corajoso, é?

- É que esses bichos me dão asco...não medo...é diferente! - reclama o garoto.

 Fabíola e Renata riem. Mariana rezava para Thiago realmente desistir de tudo aquilo e voltar chorando assim que visse que sua missão não tinha sentido nenhum. Por que não podiam resolver tudo conversando? Às vezes Mariana tinha a impressão de estar em um seriado de comédia...bom, pondo isso de lado, o Tenente José Carlos, vulgo Zeca, se aproxima da porta do quarto de Thiago junto com tio Joaquim, parabenizando o rapaz por sua decisão.

- Não imaginei que fosse tão corajoso - fala o tenente - Talvez deva mudar meus conceitos sobre você

- Obrigado, senhor! - Thiago bate continência - Irei trazer a Flor dos Ventos Uivantes, custe o que custar! Isso provará o quanto eu amo a sua filha!

Mariana bufava, inconformada. Era dificil ser a única que pensava ali. Já seu Joaquim começa a reparar na sujeira do quarto, dá umas voltinhas e comenta.

- Vou mandar a dona Joana fazer uma faxina caprichada no seu quarto

- Hã? Por quê? - pergunta o rapaz, inocentemente.

- Quando você morrer vou precisar liberar o quarto para outros hóspedes. A vida continua, rapaz

- Obrigado pela confiança

- Thiago... - chama Renata.

- O que foi?

- Se você não voltar...posso ficar com aquele seu CD do Queen?

- Como é que é?

- E eu posso ficar com o seu do Legião Urbana? - pergunta Fabíola

- Ora...confiem um pouco em mim! Eu não sou um inútil completo!

- Boa sorte, garoto! - tenente Zeca coloca a mão no ombro dele - Você é mesmo um homem!

Thiago sorri. O tenente também. Mas seria bom a conversa parar ali...

- Só que...

- Sim. O que é, tenente?

- Você sabe que realmente as chances de voltar vivo são baixas, não é?

- Não posso voltar atrás! - grita ele.

 E foi isso. Na manhã seguinte, Thiago parte em sua jornada. Perderia um dia de aula e trabalho, mas era pelo seu futuro com Mariana. Todos na pensão ainda duvidavam que ele continuaria com isso.

- Pra que isso, pai?! - bronqueava Mariana, depois que Thiago saiu após se despedir dela naquela manhã - Ele levou a sério!

- Levou - fala o tenente, enquanto tomava um gole de café, na sala de estar da pensão - Mas isso já mostra que ele realmente te ama

- Então o senhor acredita nisso?

- Sim. Sempre acreditei. Desde a primeira vez que vi a relação de vocês, sabia que poderiam dar certo. E Thiago é um ótimo rapaz. Você não poderia ter escolhido um companheiro melhor!

- Então...então...por que diabos deixou ele sair numa missão rídicula dessas?

- Ora, filha. Eu não podia bancar o sogro molenga. Além disso, conhecendo Thiago como você conhece, acha mesmo que ele iria até o fim? Daqui a alguns minutos ele volta com alguma desculpa...provavelmente assim que chegar lá e ver que o negócio é bravo mesmo. Daí todo mundo cai na garagalhada e acaba bem de novo

- Espero que seja isso mesmo que aconteça...porque o tonto tá acreditando mesmo que precisa fazer isso!

- Relaxa, filhota! Relaxa! - diz o tenente, voltando para cozinha e dando tapinhas no ombro de Mariana. No entanto, as coisas não sairiam exatamente como ele disse. E vemos isso assim que Thiago chega no ponto de ônibus para a região montanhosa da cidade.

"Err...será que não é melhor deixar essa missão para outro dia?", pensa Thiago, "Quer dizer...hoje tinha uma aula importante e...o pai dela vai nos visitar mais vezes, não vai?". Em resumo, a covardia dele apareceu antes do que se imaginava e ele já estava prestes a dar meia-volta e voltar pra casa, quando ouve uma voz conhecida.

- Oi, Thiago!

 Ele até demora para se voltar, mas era ela mesmo. Como assim?

- Stephany! O que você tá fazendo aqui?

- Bom dia para você também..

 Era Stephany. Com o uniforme da escola e acompanhada de um outro menino...o nome dele não era Rodolfo ou algo assim?

- Err...olá - cumprimenta Rodolfo, timidamente.

- Oi - fala Thiago, mas logo se voltando para a pestinha de novo - Você não devia estar na escola? Tá matando aula?

- Pois é, mas quem pode se concentrar nos estudos com um amigo tão querido envolvido numa missão tão perigosa? Thiago! Você não pode ir para lá sozinho! Precisa de ajuda!

- Aquilo não é lugar para criança! É perigoso demais! - bronqueia o rapaz.

- Perigosa? Como assim, Stephany? Você não me disse nada.. - diz Rodolfo, mas Stephany o belisca - Auu!!!

- Deixa de ser frouxo! - reclama a menina - Você quis vir, não quis?

- Como assim? Stephany! Você obrigou seu amigo a vir com você?

- Na verdade..foi uma história complicada - diz a menina, lembrando do que ocorrera.

* Flashback da Stephany *

- Stephany? - pergunta Rodolfo, ao ver a garota indo para a direção oposta à escola - Por que está voltando? Não tem aula hoje?

- Ah...você é da minha sala

- S-Sim..sou - ele gagueja, encabulado. Rodolfo tinha uma quedinha por Stephany.

- Hmm....quer vir comigo fazer uma coisa legal?

- Hã? Matar aula? Mas isso é...

- Só hoje. A gente precisa fazer isso pelo menos uma vez na vida para se sentir mais feliz

- Feliz... - repete o garoto, ainda meio inseguro - Mas...

- Vai. Só hoje

- Tá bom...mas o que..

- Legal. Vambora - ela puxa o moleque e sai correndo até onde Thiago estava.

* Fim do flashback *

- Que mau exemplo! - retruca Thiago -  Aposto que só fez isso para o pobre do Rodolfo não te dedurar na escola, não é?

- Claro que não...eu só quero ir com você para ajudar

- Sem essa! - ele já tirava o celular do bolso - Vou ligar agora para o tio Joaquim para...

- Sério, Thiago? Então acho que não vai mais querer aquilo... - diz a menina, com voz dengosa.

- Aquilo? Como assim aquilo?

Stephany sorri maliciosamente e tira uma foto da mochila. Rodolfo fica ainda mais vermelho.

- Aaaah! O que é isso?! - se espanta Thiago.

- Isso mesmo. Uma foto da Mariana saindo do banho, do jeitinho que veio ao mundo...então você descobriu que a janela do banheiro tem um ângulo bom, né? Seu tarado!

-Ora, sua...dá isso aqui! - ele pega a foto, picando-a toda - Isso aconteceu numa fase cruel da minha vida...quando a Mariana ainda nem era minha namorada e...

-Sério? Ela ia gostar ainda menos se soubesse que você já fazia essas coisas pervertidas antes de começarem a namorar.

- Stephany..sua... - Thiago estava bravo, mas a baixinha continuava.

- Mas você podia ter ficado com aquela, era só uma cópia das várias que eu tirei. A original ainda está na gaveta do seu quarto, guardadinha...e só com as suas impressões digitais, é claro! Sempre faço questão de ser profissional

- Sua mau caráter de olho junto...pare de mexer nas minhas coisas! - reclama Thiago.

- Hihi...é só me levar junto que guardo esse segredo até a morte

- Ora... - Thiago olha para as duas crianças diante dele e acaba suspirando. Fazer o quê? 

- E então? - Stephany aguardava uma resposta.

- Tá bom. Vocês querem vir? Então venham! É...venham! - ele se vira e os dois o seguem, embora Rodolfo ainda estivesse receoso, mas Stephany queria viver a aventura mesmo.

"Heh! Essas crianças...pensam que vai ser moleza. Quando chegarem lá e virem que o negócio é de gente grande mesmo vão implorar para voltar pra casa. Faço questão de pagar o ônibus de volta deles", pensa Thiago, achando que nenhum dos dois estava levando a sério. Será mesmo?