Lá estava eu, sem saber em qual parte de Nova York eu estava. Sinceramente, eu nem prestara muita atenção na noite anterior enquanto Chloé e eu estávamos indo para a fraternidade. O tempo estava esquisito, cinzento e nada parecido com os dias de verão que tivemos a estação inteira.
Quando estou próxima de virar a esquina, ouço uma voz gritar meu nome. É uma voz masculina e conhecida.
Viro para trás e vejo Matt correndo até mim. Ele ainda está sem camisa e vestindo a cueca samba-canção azul escuro. Quero correr dali, correr para ele não me alcançar, mas estou física e emocionalmente exausta para brincar de pega-pega e sei que, de qualquer forma, ele me alcançaria já que eu nunca fui uma boa atleta.
Fico parada, esperando ele se aproximar o suficiente para que possa despejar suas asneiras e ofensas em cima de mim. Matt chega ao meu lado e para com as mãos na cintura e respirando pela boca que está aberta.
Não digo nada, pois não há nada para dizer. Fico em silêncio olhando para a cara dele, enquanto o vento quase frio atinge meu corpo.
–Olha, você deveria saber levar as coisas na brincadeira, sabia?
Permaneci em silêncio. Os olhos verdes de Matt analisavam meu rosto.
–Eu entendo que você é toda certinha e tal mas, você não pode achar que é algo particular com você. Foi só uma brincadeira na noite passada.
–Você me drogou. - falei. - E depois, aquele louco daquele amigo de vocês - eu não queria pronunciar o nome de Jacob - me enfiou dentro daquele carro e começou a apostar corrida com você. E eu estava bêbada e drogada. Passando mal. - respiro fundo e sorrio com amargura. - Mas tem razão, eu sou errada em não levar nada disso na brincadeira. As pessoas deveriam levar numa boa o fato de outras drogarem ela contra sua vontade. - digo ironicamente.
–Olha, eu normalmente não faria isso, mas como o Kyle veio todo esquentadinho pra cima de mim ontem, vou pedir desculpas. Desculpa! Não vou mais mecher com você.
Cruzo os braços na frente do meu corpo. Tento não pensar na parte do o Kyle veio todo esquentadinho pra cima de mim.
–Estou falando sério. A louca da Chloé me bateu e tudo. Que porra! Nem brincar mais não se pode. - ele revira os olhos e torna a olhar para mim. - Então bonequinha, desculpa,tudo bem? Mas quer um conselho? Se afasta. Já deu pra ver que você não curte as mesmas coisas que nós, que o Kyle. Então, se afasta.
Franzo o cenho, mas não digo nada. Dou as costas para Matt e quando me afasto alguns passos dele, ouço-o dizer com a voz baixa.
–Melhor assim.
***
Não me incomodei em pegar um táxi, mesmo que eu tivesse passado por uma rua cheia deles, parados esperando por alguém. Eu estava atordoada demais com toda aquela história.
Aquela situação com o Matt fora esquisita e um tanto inusitada. Eu não esperava de jeito nenhum que ele viesse me pedir desculpas e muito menos dizer para eu me afastar. Eu já sabia que a primeira parte, fora Kyle que havia falado para ele me falar. Mas e a segunda parte? Aquilo foi como um tapa na cara e eu odiava admitir isso. Não que eu gostasse daquela gente. Matt tinha razão. Eu não gostava das mesmas coisas que eles. Não gostava de me drogar, ficar bêbada, apostar corridas de carros - nem mesmo nos video-games- não era o que eu gostava de fazer. Não era esse tipo de diversão que eu estava acostumada.
Eu sempre achara que eu não saía para festas no colegial porque meus pais não permitiam, entretanto, depois da noite que passara, eu estava vendo que não era mesmo o tipo de coisa que eu curtia. Para mim, diversão era ficar em casa assistindo um filme ou um seriado velho como Friends ou Dawson's Creek., me empanturrar de chocolate e comer um pote de sorvete sozinha. Além disso, ir a peças teatrais, ainda mais quando se eram musicais. Isso era divertido!
Apesar de eu ter essa certeza para mim, por todo o caminho, fiquei pensando se a chata da história toda não era eu. Era eu a chata por não querer ficar louca de droga e bebida? Era eu que não sabia o que era diversão? A culpa era mesmo dos meus pais por sempre terem me prendido e me criado caseira demais?
Depois de muito andar, vi a Starbucks convidativa na esquina e decidi entrar para comer alguma coisa. Vi meu reflexo no vidro fumê da loja. Eu estava horrível. Meu cabelo estava bagunçado e parecia que eu não dormia há dias.
Quando empurrei a portinha de vidro, o cheiro de café me invadiu. Era um cheiro calmante pra mim. Para minha sorte não tinha muitas pessoas e todas conversavam baixinho entre si.
Me dirigi até o balcão e pedi para o menino do lado de dentro dele um machiatto com caramelo extra e um muffin de chocolate. Enquanto o rapaz preparava meu café, eu olhava a vitrine de vidro cheia de coisas gostosas. Fechei a cara para o brownie de chocolate - esse obviamente não continha substâncias ilícitas- e então senti meu celular vibrar no bolso. Era uma mensagem de Chloé.
Alice, eu sinto muito por tudo o que aconteceu ontem à noite. Não vi a hora que você saiu e só vi quando Matt voltou da rua. Achei melhor não ir atrás de você. Espero que você esteja bem. Eu já estou indo embora também. O clima aqui está uma merda e por incrível que pareça, acho que Kyle vai acabar brigando com o Matt.
Franzo o cenho quando leio as últimas nove palavras. Continuo a ler.
Mas enfim, só quero pedir desculpas. Dessa vez eu não fiquei bêbada, mas te coloquei na cama com a ajuda do Kyle. Espero que você não esteja brava comigo. Já estou indo embora daqui.
Beijos, C.
Suspiro e digito uma resposta rápida e simples.
Estou chegando em casa. Dá uma passadinha aqui. Não estou a fim de ficar sozinha.
Coloco o celular de volta no bolso da calça e quando levanto a cabeça, o rapaz já está com o café e o muffin estendidos para mim. Eu os pego e saio.
***
Estou sentada no sofá, terminando de tomar meu copo médio de café. O muffin já se foi e estou olhando pela grande janela de vidro ao lado do sofá. Não há nenhum vestígio de sol. Nem escondido por entre as nuvens densas ele não está. Muito pelo o contrário. As nuvens estão escuras e está perceptível que vai cair uma tempestade.
Ouço uma campainha discreta e logo depois uma batida igualmente discreta na porta amarela. Me levanto do sofá com o copo de Starbucks na mão e vou até a porta. Quando a abro, vejo o cabelo loiro de Chloé preso num coque alto. Ela está vestida com as roupas da noite anterior: short de couro, coturno e sua jaqueta.
Ela sorri para mim, um sorriso ansioso e eu abro a porta mais ainda para ela entrar.
Chloé entra e olha ao redor, assobia e olha para mim.
–Que apartamento lindo! Eu deveria ter juntado dinheiro também, ao invés de comprar garrafas de bebidas e esconder no fundo do guarda-roupa. - ela ri.
Eu dou uma risadinha também.
–Você quer comer alguma coisa? - pergunto.
–Ah, só um suco está bom. - ela dá de ombros e se senta no sofá.
Faço que sim com a cabeça e vou em direção a geladeira. Pego a garrafa de suco de laranja e um copo. Encho-o e levo até Chloé. Ela sorri para mim e vira o corpo de lado, sobrando as pernas e deixando apenas os pés para fora do sofá. Sento-me de frente para ela, de costas para a janela grande.
–Você esta bem? - ela perguntou. - Olha eu sinto muito. Eu sei que você não gosta muito dessas coisas, mas Kyle tinha me falado que não ia ter nada demais, nada além do pessoal bebendo e fumando. - ela dá de ombros.
Suspiro e balanço a cabeça negativamente.
–Olha, eu estou bem. Não se preocupa.
–Não, eu me preocupo sim. Eu gosto muito de você, Alice. E não quero acabar nossa amizade por você pensar que eu sou uma louca maconheira.
Dou risada das suas últimas duas palavras.
–Não penso isso de você. Está tudo bem, é sério.
Ela sorri e suspira.
–Eu estava louca para sair de lá. Depois que você foi embora o Jacob chegou. Foi um horror! O Kyle quase avançou nele de novo! - ela balança a cabeça fitando o nada, como se não acreditasse no que tinha presenciado. - Se Matt não tivesse entrado na discussão, o Kyle tinha acabado com ele de novo. E ele bem que merecia! - Chloé torce a boca.
–Por que Kyle partiu pra cima dele de novo? - pergunto como quem não quer nada.
–Porque ele está muito puto com o que Jacob fez ontem com você! Acho que você não chegou a ver a cara do Jacob ontem depois que Kyle bateu nele. Ele saiu de lá e levaram ele pro hospital! A cara dele está toda inchada e cheia de hematomas. - ela suspira. - Eu achei que o Kyle ia matar ele, credo!
Lembro-me da mão de Kyle na garrafa de café, estava um pouco inchada e vermelha.
–Olha, talvez você não entenda o porquê Kyle bateu tanto no Jacob, mas não é uma coisa que eu possa te contar, entende? Talvez outro dia. - ela dá de ombros. - Mas por que você saiu correndo daquele jeito? O Kyle foi falar alguma coisa para você?
Olho para Chloé. Não sei muito bem se devo dizer que seu primo me beijou e eu tive um acesso de fúria e lhe bati.
Suspiro alto e um pouco receosa, conto o motivo. Quando termino, Chloé está boquiaberta e sorrindo um pouco.
–Ah meu Deus, eu não acredito que ele te beijou!
– Nem eu. - falo e faço uma careta.
Chloé ri.
–Ah meu Deus! Fala sério, você não gostou nem um pouco? - ela estreita os olhos.
Aquela pergunta me desarma.
–O quê? Não! Claro que não. Você está louca? Por que eu iria gostar? - balanço a cabeça negativamente com precisão. - Além do mais, ouvi muito bem o que ele e aquela Lara estavam fazendo ontem.
Chloé dá risada com o copo de suco já vazio.
–Acho que todos em um raio de um quilômetro escutaram.
Reviro os olhos.
–Mas Lara é uma vagabunda! - ela diz. - Kyle pega ela de vez em quando só para satisfazer as vontades porque ela é uma puta. A maioria dos meninos já transou com ela.
Sinto repulsa e nojo daquela garota e é muito visível na minha cara, pois Chloé assente e diz:
–É, eu sei. É uma nojenta. Mas você não deveria de preocupar com ela.
Franzo o cenho.
–Não estou preocupada. Só não gostei dela e não gostei do seu primo vir me beijar depois do que ele fez na noite passada, como se eu não tivesse ouvido.
Chloé sorri.
–Por que você está tão brava com Kyle, afinal? Ele quase matou o Jacob por ter te embebedado e ter te enfiado naquele carro, não te desrespeitou nem nada. Ele te defendeu e fez Matt ir se desculpar. Por que está tão brava com ele?
Fiquei em silêncio pensando em sua pergunta. Por que eu estava tão brava com Kyle? Porque ele era desagradável assim como seus amigos? Ele era mesmo como seus amigos ou eu o julgava mal? Eu estava brava porque ele havia me beijado? Estava brava porque ele havia me "rejeitado" ao falar de mim para Matt em seu apartamento? Ou por que eu o achava atraente com aqueles olhos verdes, piercing preto na sobrancelha e aquele cabelo tingido de vermelho?
Chloé olhava para mim, tentando esconder um sorrisinho. Eu apenas dei de ombros.
–Eu juro, nunca vi ele tão bravo. Todo mundo ficou olhando para ele assustado depois que Jacob saiu pra ir para o hospital. - Chloé comentou.