Azul escrita por OmegaKim


Capítulo 10
Epilogo - Azul


Notas iniciais do capítulo

Oi gente. Trago para vcs o tão esperado epilogo.
Quem narra esse último pedaço é o Noah.
Boa leitura.



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Epilogo – Azul

A ideia tinha sido do meu avô. Foi ele quem escrevera cartas pra mim, foi quem me contou sobre a sua casa em Chicago, foi quem me encorajou a fazer isso. Então eu fiz. Simplesmente deixei as pessoas que amava para trás e me libertei.

Durante muito tempo minha família tinha se metido na minha vida. Depois do que aconteceu entre eu e Erika, tudo que eles puderam fazer era me superproteger. Ficavam regrando meus passos, sempre na minha cola e sempre me sufocando. Entendo que todos só queriam cuidar de mim e confesso que apreciei essa atenção toda durante um tempo, mas quando a adolescência veio tudo que pude fazer foi nutrir um pouco de raiva disso tudo.

Por que não podia dormir na casa de Daniel e Derek? Por que não podia visitar todos os sites no computador de casa? Eram pequenas regrinhas que começaram a me irritar de tal maneira, que a única solução que meu pai viu naquela época foi me isolar em um colégio interno. A parte boa desse ato foi conhecer Kate e ter minha família um pouco longe. Naquele lugar tinha aprendido algumas coisas sobre a vida, como por exemplo como dá um soco e o como fumar um cigarro corretamente.

A vida nunca foi exatamente boa pra mim, apesar nunca ter me faltado alimento ou roupas limpas. Mas eu sempre tive a sensação de que havia alguma coisa de errado comigo, sempre tinha estado atrás de alguma coisa que não podia ter. E quando tive aquela conversa com Erika, antes que ela cometesse suicídio, descobri o que havia de errado comigo: faltava-me amor. Não estou me referindo às pessoas que me amavam, como minha família e meus amigos, estou me referindo, para meu desespero, à mim mesmo. Nunca tinha sido muito capaz de retribuir tudo aquilo que me davam e por muito tempo tinha me perguntado se essa era a minha maldição.

No entanto, eu bati o carro ao sair daquela festa idiota e acabei parando em uma cidadezinha ridícula do interior chamada Dickson, onde por acaso acabei conhecendo um garoto com os olhos azuis mais bonitos que já vi. E ele bem podia ser muito bonito, mas tinha o nariz em pé e era muito cheio de si. Batemos de frente algumas vezes ou talvez muitas, e de tanto bater de frente acabamos nos esbarrando, boca com boca e pele com pele. Eu ainda não sabia naquela época, mas as coisas só ficariam mais bagunçadas depois que começamos a nos envolver. Grande parte da bagunça causada por mim, admito que estraguei tudo quando entrei naquele trem e fui para longe dele assim como ele estragou tudo tentando consertar o seu passado e o erro dos outros.

Acho que no fim merecemos isso tudo. Ele merece estar onde está e eu mereço estar onde estou. Mas esse merecer não apaga a vontade de estar no mesmo lugar que ele, não destrói o sentimento, na verdade, não contribui muito para que eu deixe de ama-lo. E é por ter esse sentimento todo ainda dentro do meu peito que acatei o plano do meu avô. Fugi daquela clínica psiquiátrica, escrevi uma carta à Will explicando o que ia fazer e pedindo que ele me esperasse enquanto eu construía um futuro para nós dois.

Já se passaram dez anos desde que fiz isso. É bastante tempo para alguém como eu. É bastante tempo para alguém como Will. E com certeza deve ser bastante tempo para as pessoas como meus amigos e Maya. Mas eu sei que estão todos bem.

Tinha trocado telefonemas clandestinos com Kate durante algum tempo para saber sobre Los Angeles, assim como tinha trocado cartas com Will para saber como andava a sua vida atrás das grades. Minha amiga tinha me encorajado a ligar para Maya e dizer que estou bem, mas nunca consegui reunir muita coragem para isso. Tinha tentado algumas vezes, tinha discado o seu número e ligado e ficado do outro lado da linha escutando o seu “alô” sem poder dizer nada em resposta, tamanha a vergonha. Mas ninguém pode dizer que não tentei, assim como tinha tentado ligar para Bianca ou Daniel ou Derek ou até mesmo, meu pai em Dickson. Contudo, escrever eu havia conseguido.

Então, quando percebi que era incapaz de escutar as suas vozes sem morrer um pouco por dentro, comecei a escrever cartas. E as mandava a cada um, durante o natal ou ano-novo, como algum tipo de presente. Dez anos, dez cartas para cada um. Eu sei que não é muito, mas o meu psiquiatra havia dito que isso já era um grande progresso e estava orgulhoso, o que meio que me deixava orgulhoso também. Um pouco ao menos.

Mas foi no aniversário de trinta e cinco anos de minha irmã que tinha finalmente reunido coragem suficiente para ligar para si. Havia acabado de tomar alguns goles de vodca achando que assim teria alguma coragem para falar e eliminar o tremor nas minhas mãos quando disquei o seu número. Maya tinha gritado no telefone quando contei que era eu no outro lado da linha e eu podia sentir a sua euforia. Descobri nesse dia que tinha uma sobrinha de sete anos chamada Lily e um sobrinho de três chamado Jacob, assim como minha irmã riu ao descobri o que eu fazia da vida. Estava retomando o contato com ela aos poucos, trazendo de volta a nossa familiaridade.

Nesse ano, todos eles vem passar o natal em minha casa em Chicago. Vai ser esquisito ter tantas pessoas em casa, conhecidas ou não. Kate já estava com três filhos e minha irmã já tinha dois. O que me deixava ansioso ao extremo e me roubava horas de sono, quando eu pensava em cinco crianças em minha casa correndo pelos corredores e deixando tudo uma bagunça. Nunca tive nada contra crianças, mas eu também não era muito fã delas, o que era uma ironia e tanto quando meu trabalho envolvia crianças.Mas estava disposto a tentar ser um tio legal.

Contudo, antes que eles chegassem, mais ou menos daqui duas semanas, eu precisava resolver uma última coisa.

A carta tinha chegado no começo de dezembro, num envelope simples e amassado pela viagem. A letra era delicada e as palavras diretas e curtas. Tinha adiantado minhas férias do trabalho –lecionava numa escola, imagine só— e corrido até o aeroporto mais próximo, em direção a Los Angeles mais precisamente, Santa Mônica.

Nunca tinha pensando muito em como isso aconteceria. Sempre tinha imaginado que estaria presente quando Will saísse da prisão ou que em um dia ensolarado, o encontraria sentado no meu sofá me esperando depois de um dia cansativo no trabalho. Nunca tinha me imaginado sair às pressas de Chicago para correr direto para uma praia em LA. E muito menos que terminaríamos assim, quer dizer, que nos encontraríamos assim, em uma lanchonete no centro da cidade como se esse fosse um encontro bobo de adolescentes, como se ainda fossemos adolescentes bobos.

— Como tem passado? – ele me pergunta, os raios de sol transpassando pelo vidro da janela e caindo direto nos seus cabelos os deixando muito dourados.

Ainda usa a mesma armação de óculos, ainda tem a pintinha muito pequenininha no canto da boca e ainda tem os olhos azuis mais bonitos que já vi.

— Tenho sentido a sua falta. – acabo falando e coloco minha mão sobre a sua na mesa.

Ele aperta meus dedos, levanta minha mão e beija meus dedos e é como nos velhos tempos, ainda somos adolescentes em Dickson tentando fugir de nós mesmos.

— Vamos sair daqui. – peço.

Will entende meu pedido. Ele entende que precisamos sair daqui, da presença dessas pessoas, para respirar um pouco, juntos. Ele entende a minha necessidade de ficar a sós com ele. E é por ele entender isso, que terminamos no quarto de hotel onde ele está hospedado, é por ele ter a mesma necessidade que a minha que espalhamos a nossas roupas pelo chão daquele cômodo, tocamos um o corpo do outro, misturamos nossas respirações e sincronizamos nossas vozes em pedidos sussurrados como se fosse algum tipo de pecado pedir qualquer coisa do outro. Havia tanta saudade estampada em cada parte dos toques e beijos que lhe dediquei que me recriminei mais tarde, pensando no quão desesperado eu deveria parecer na sua presença. Mas acabei rindo da minha insegurança quando Will retribuiu tudo na mesma intensidade.

— Você é bem idiota, sabia? – sussurrou depois que terminamos o nosso ato de saudade.

Ergui uma sobrancelha e levantei o rosto do seu peito para fita-lo.

— Esse não é o tipo de coisa que alguém quer escutar depois de uma transa, sabia? – rebati, o que o fez apenas sorrir em resposta. – Mas você tem razão de qualquer forma. – acabo dizendo e volto a deitar o rosto sobre o seu peito.

Will desliza os dedos por meu cabelo e me dá silêncio em vez de dizer qualquer coisa, percebo que ele só está me dando espaço para que eu fale alguma coisa. Mas não digo nada, estou realmente cheio de explicar meus motivos. Já fiz tanto isso, que quando me preparo para dizer mais uma vez percebo o quanto tudo foi um ato idiota da minha parte. Fugir. Mas foi esse ato idiota que salvou minha sanidade e me fez recuperar minha identidade, me dou conta. Tenho argumentos para me defender, mas não o faço. Deixo aquilo pairar pelo ar do seu quarto de hotel enquanto fecho os olhos e aprecio os seus dedos deslizando pelos meus cabelos, as unhas passando de leve pelo couro cabeludo. Quero guardar esse momento, esses poucos segundos de total paz, sem que os fantasmas venham para perturbar mais uma noite de sono. Procuro a sua mão livre e entrelaço seus dedos nos meus.

— Quer passar o natal comigo? – pergunto.

— Só eu e você?

— Na verdade, não. Esse ano Maya, meus sobrinhos e meus amigos vão passar comigo em Chicago.

— Chicago. – diz devagar como se tentando saborear o nome. – Gosta mesmo de Chicago?

— Gosto. – respondo. – É um bom lugar.

Não estou olhando para si, ainda estou com a cabeça deitada em seu peito, escutando seu batimento cardíaco de olhos fechados.

— Você pode levar o Alex. – digo quando ele fica em silêncio de novo.

— Alex?

— É o seu irmão, não é?

— Na verdade, não. – conta. – Apenas amigos de infância.

E dessa vez sou eu que fico em silêncio. Parecemos dois estranhos, me dou conta. Solto a sua mão e me levanto, me sento ao lado do seu corpo deitado. Olho em volta. É um quarto de hotel bonito, tem a decoração bonita. Gostei do papel de parede com flores douradas e dos quadros de paisagens nas paredes. É um lugar caro.

— Noah? – Will chama, viro meu rosto na sua direção. – Tudo bem?

— Quando nos tornamos estranhos um pro outro? – pergunto em vez de responder.

— Não somos estranhos.

— Então como explica isso? – aponto para nós dois.

Will se põe sentado também sobre a cama.

— Não achou que depois de dez anos as coisas estariam como antes, não é? – rebate. – As pessoas mudam, Noah. Eu mudei e você também.

— Então é isso que está dizendo, que não nos conhecemos mais?

Mas ele fica calado. Me encara com os olhos grandes muito azuis e não diz nada e é então quando entendo o que está acontecendo. Eu mordo a parte interna da minha bochecha em desespero com a verdade recém-descoberta. Somos estranhos agora.

Me viro, saio da cama, procuro minhas roupas no chão e começo a vesti-las.

— O que está fazendo? – pergunta.

— O que você acha? – solto irritado com toda essa situação. – Estou indo embora. – me apresso em fechar o zíper da minha calça e colocar minha camisa.

— Noah.

— O que? Não espera que eu fique aqui, não é? - ele está sentado na beira da cama, acabou de colocar uma cueca e agora está colocando seus jeans. – Olha pra gente. Tudo que sobrou foi um grande nada.

— E essa é a sua solução? Ir embora? – dispara ao mesmo tempo que fica de pé, o peito nu e apenas usando jeans, o cabelo bagunçado e está sem os óculos. – Vai embora do mesmo jeito que fez a dez anos?

— Então a culpa é minha? É isso que está dizendo? – acho que estou um pouco alterado, a raiva subindo rápido demais para a cabeça.

— Sim, é isso que estou dizendo. A culpa é sua!

E aí está. A confirmação de uma verdade que eu nunca quis acreditar. Tinha realmente acreditado durante esse tempo todo que tinha não só me libertado, mas libertado as pessoas que amava também. Tinha acreditado fielmente que tudo ficaria bem, que eles entenderiam... Mas isso foi tudo uma mentira. Consigo ver isso agora. Consigo ver o quão covarde eu sou, porque quando as coisas ficam difíceis é isso que eu faço: eu vou embora. Eu me escondo. Eu deixo as pessoas para trás com a mentira de que vai ser melhor assim.

Will me encara. Está com os olhos num tom de azul selvagem, nem ele acredita no que acabou de dizer. Mas acho que guardou essa frase durante tanto tempo, que quando a oportunidade apareceu, ela simplesmente saiu sem que ele sequer pensasse sobre.

— Não pode simplesmente jogar a culpa toda sobre mim assim como se eu tivesse feito tudo.

— Ah, meu Deus! – joga os braços para cima em total descrença, que serve apenas para me deixar com mais raiva.

— Quem de nós dois matou alguém, hein?! Você tem a mesma parcela de culpa que eu! – e acho que estou gritando.

Há uma mistura de frustração e raiva em mim. Eu sei o que é isso, são os meus instintos de defesa agindo. Confesso que sempre fui um pouco irritável demais e por isso sempre tive uma tendência a brigar por aí quando era provocado e acho que é por isso que ainda estou aqui.

Will dá um passo na minha direção e eu cerro meus punhos, estou pronto para briga e tenho total consciência da expressão nada boa no meu rosto. Mas quando fito o rosto do loiro, percebo que toquei em um ponto fraco, contudo sei que ele mereceu, porque quem começou com isso foi ele.

— Mas eu permaneci. Durante aqueles malditos anos naquela prisão, eu esperei você! – rebate, as palavras me acertando como socos.

— O que queria que eu fizesse?! – grito

— Queria que ficasse! – grita no mesmo tom.

Viro de costas para si, respiro fundo.

Não quero me descontrolar ali. Lembro que tomei meus remédios hoje e que estou quase que cem por cento protegido de ter um surto, mas mesmo assim não confio muito em mim. Então respiro fundo, fecho os olhos e passo a mão no cabelo e só então percebo que minhas mãos estão tremendo.

— Você foi preso e eu surtei. – me escutei dizer, com a voz mais branda. – Minha família me prendeu em uma clínica psiquiátrica e todos os dias eu tinha que tomar tantos tipos de remédios, que comecei a me perder. Eu esqueci a data do meu aniversário, Will. – contei e mordi o lábio, mas ele não viu porque eu estava de costas para si. – Passei três anos lá até que consegui armar uma fuga. Não dava para permanecer ali, sendo sugado por aquelas paredes e sendo entupidos com remédios. Eu... eu achei que se estivesse longe dali podia lembrar que tipo de pessoa eu costumava ser, achei que podia consertar as coisas com você se estivesse longe. Mas só estraguei tudo.

A raiva virou tristeza, que doeu no meu peito. Estava admitindo a minha total culpa no nosso fim patético. Mordi a parte interna da minha bochecha para impedir que o choro viesse. Olhei para o chão e procurei os meus sapatos, os calcei rápido sob o olhar de William. Ele não disse palavra alguma diante do meu relato, apenas manteve os olhos em mim como se eu fosse um animal exótico. Eu tampouco falei mais alguma coisa, apenas coloquei meus sapatos e fui embora dali. Peguei o primeiro voou para Chicago ainda com o cheiro dele no meu corpo e o gosto do seu beijo na minha boca. Passei algum tempo trancafiado em meu quarto pensando nos meus erros, dormia e acordava sem realmente querer. Tomava remédios para dormir mais. Perdi peso e fiquei nessa rotina até o dia em que Maya chegaria.

Me forcei a levantar cedo para arrumar a casa para a chegada de tantas pessoas. E mesmo que tenha demorado mais que o necessário em cada cômodo da casa, acabei terminando tudo a tempo. No fim da tarde fui espera-los no aeroporto e já no meio da noite voltei para casa acompanhado de uma irmã eufórica, cinco crianças animadas demais, dois maridos gêmeos meio emburrados com falta de atenção das esposas e duas amigas cheias de perguntas sobre minha vida.

— Vai dormir. – empurrei Bianca para o seu quarto enquanto ela ria.

Todos já tinham ido para suas camas. As crianças tinham sido as primeiras a cair nos braços de Morfeu e logo os adultos estavam seguindo o mesmo exemplo, menos Bianca que estava me perseguindo pela casa me fazendo perguntas sobre minha vida amorosa.

Fechei a porta do seu quarto ainda escutando sua risada e acabei soltando uma risadinha também, mas acabei saindo dali. Fui até a sala para apagar as luzes e estava pensando em ir na cozinha pegar um copo de água para tomar com um remédio, mas não sabia se queria mesmo tomar aquele remédio para dormir hoje. Estava me sentindo meio confiante em poder dormir sem aquilo, foi nisso que pensei quando deitei em minha cama e peguei no sono.

O dia seguinte passa rápido assim como a semana inteira e o natal chega mais rápido do que eu esperava. Trocamos presentes na sala de estar, rindo das coisas que dizíamos na hora do amigo oculto enquanto as crianças comiam os brigadeiros que fiz para a ceia. É nessa hora que sinto aquele sentimento de novo, o de completude de como se só ali, as coisas fizessem sentido. E fazem. Senti falta dessas pessoas e vou sentir falta delas, quando voltarem para as suas vidas em Los Angeles e me deixarem na minha, em Chicago.

As coisas saem do controle no ano-novo quando uma nevasca caí impedindo que as pessoas saiam de casa. As crianças ficam agitadas demais por ficarem muito tempo em um lugar só e os adultos começam a perder a paciência rápido, mas tento driblar o mau humor com filmes e brincadeiras inventadas que arrancam risadas de todos, mas é à noite – depois que as crianças dormem – que nos sentamos no chão da sala e trocamos experiências. Conto a eles como foi fazer a faculdade, como terminei os estudos e como gosto do que faço. Maya ri mais um pouco, incrédula, com a minha escolha de profissão ao passo que Bianca apenas diz “Professor Noah, é isso?”apenas para que todos riam, até mesmo eu. E na medida que a noite avança, o assunto fica mais melancólico e Kate confessa sobre os meus telefonemas, diz como nunca perdemos o contato. Maya fica chateada com o meu descaso com si e Bianca se limita a assenti, como que dizendo “Ela já era sua amiga quando te conheci”, o que é uma verdade mas não significa que amo uma mais que a outra. O que eu sei sobre as duas que fez com que Kate ganhasse notícias minhas, foi o fato de que Kate sempre foi mais compreensiva, eu sabia que a morena nunca me julgaria.

Entramos em uma discussão sussurrada que termina com Maya se trancando no quarto e Bianca chorando. E acabo terminando a noite junto de Daniel e Derek. Trocamos algumas palavras simples, eles me perguntam sobre Will mas mudo de assunto.

Acabamos passando a festa de ano-novo em um clima estranho, como se não nos conhecêssemos. Mas Derek acaba nos dando uma bronca que faz com que todos voltem ao normal.

No dia da despedida, eu os deixo no aeroporto. Dou um abraço em todos e digo a Lily que lhe enviarei livros durante o ano e ela sorri pra mim. Maya me abraça e fala que dessa vez espera que eu ligue em vez de uma mandar uma carta por ano. Bianca chora ao me abraçar e diz que vem me visitar nas férias de verão, quando ela consegue um tempo no hospital onde trabalha como enfermeira. Kate fala que tenho que me alimentar direito porque estou muito magrelo para um professor e acabo rindo quando ela coloca um donouts na minha mão e me faz come-lo ali mesmo. Daniel e Derek querem que eu vá para o jogo do Los Angeles Lakers no próximo mês e eu prometo arranjar um horário para a nossa noite dos homens. Eu os vejo ir embora, dou-lhes tchau e prometo a mim mesmo que vou visita-los sempre que puder.

E é assim que janeiro começa: com uma despedida. Não só em relação aos meus amigos, mas sim a Will. Digo adeus à ele um pouquinho a cada dia.

O inverno de dezembro vai embora e dá lugar ao belo sol de verão do novo ano. Volto a minha rotina de professor e paciente. As visitas ao consultório médico se tornam normais, do jeito que sempre foram. A turma que peguei esse ano são de adolescentes agitados, que testam constantemente a minha paciência mas acabam arrancando boas risadas de mim. São bons garotos no fim das contas. E é durante uma de nossas aulas que a surpresa acontece.

— Vocês precisam pensar, - estou dizendo de costas para turma enquanto escrevo no quadro. –sentir e ser o problema – eles riem as minhas costas por causa do meu tom descontraído. – Agora me digam, o que se está pedindo aqui? – fico de frente para eles.

Encaro cada um, mas ninguém responde.

— Vamos lá pessoal! Não é difícil. O que matemática, é? – pergunto e alguns riem, mas todos respondem:

— Legal.

— Isso. Matemática é legal. Então...

— Professor. – a garota loira na primeira fileira, que ainda não decorei o nome, chama, me interrompendo. – Tem alguém na porta. – olho para a porta e deixo o pincel que estava segurando cair de tanta surpresa, me abaixo e o pego, coloco sobre minha mesa.

— Um minuto, crianças. – digo.

— Não somos crianças. – um garoto do fundo diz fazendo todos rirem, inclusive eu.

— Tudo bem, senhores. Eu já volto. – e quando começo a me afastar em direção a porta, viro para eles. – Tentem resolver o problema. – e só então saio da sala.

Me afasto da porta, encosto minhas costas na parede fria e encaro a pessoa a minha frente. Meu coração está aos saltos e por uma fração de segundos penso que vou desmaiar, mas não acontece. O que acontece é Will se aproximando de mim, chegando perto demais e me beijando. Eu deixo, aceito os seus lábios sobre os meus, mais porque estou surpreso demais com a sua visita repentina do que por estar com saudade disso.

— O que faz aqui? – pergunto quando ele se afasta.

— Feliz ano-novo pra você também. – diz ignorando minha pergunta.

— Will. – reclamo quando ele se aproxima de novo, para um novo beijo.

— Não consegui chegar à tempo para o natal nem o ano-novo. – e se aproxima de novo, me beija.

— Eu... eu não entendo. – sussurro contra os seus lábios e só então percebo que meus braços estão em volta de si, sou eu que o estou mantendo tão perto.

É como se o meu corpo estivesse pensando por si mesmo.

— Voltei pra você, Docinho. — tenta responder à minha confusão, desliza os lábios por minha bochecha me fazendo fechar os olhos e suspirar.

Percebo ali, que passei esses meses apenas me enganando em relação a ter superado Will. Não tem como superar alguém como ele, que chega do nada e abala qualquer murro que eu já tenha construído a minha volta. Quero empurra-lo e dizer que esses anos sem ele não foram fáceis e que esses últimos meses eu tinha convivido com a certeza que tínhamos terminado e que eu tinha um encontro hoje à noite com um cara bacana, e que só a sua presença e essas palavras vão me fazer inventar uma desculpa qualquer e dispensar um cara interessante. Mas eu não o empurro, na verdade me contento em esconder meu rosto na curva do seu pescoço e inspirar o seu cheiro.

Talvez tenhamos perdido muito tempo, talvez tenhamos estragado tudo durante esse tempo longe um do outro, talvez não haja mais chances para nós dois, talvez tenhamos mudado tanto ao ponto de não nos reconhecermos mais um no outro, mas eu sei que ainda vamos tentar. Vamos olhar um pro outro e tentar. Afinal, ainda somos jovens, ainda temos tempo. Vamos nos esforçar para nos conhecermos de novo, para trazer aquele sentimento todo de volta...

Levanto meu rosto para fita-lo e encontro os seus olhos, estão muito azuis na luz do corredor da escola. Encontro a promessa no azul dos seus olhos. “Vamos tentar”, ele está pedindo e eu estou acatando. Vamos tentar, concordo. Will me oferece um sorriso e eu me aproximo para beija-lo e quando nos separamos de novo digo que preciso voltar para a sala de aula, ele me dá mais um beijo e então se despede.

Quando volto para a sala, estão todos eufóricos. Fora dos lugares e tentando fazer a lição que deixei no quadro, me encho de orgulho deles. Bato palmas e peço silêncio e ordem, e quando voltam aos seus lugares, a garota loira da primeira fileira pergunta quem era o homem que veio me ver e quando digo que era um conhecido, uma outra garota do fundo da sala grita que ele é meu namorado porque nos viu aos beijos no corredor da sala. E no auge dos meus trinta anos, eu sinto minhas bochechas corarem enquanto meus alunos riem, olho para o lado, para o mundo do outro lado da janela da sala de aula.

É verão e tudo está banhado pelo sol e o céu está mais azul que do que já vi, a vida explodindo do outro lado daquela janela e acabo sorrindo, porque dentro de mim e nessa sala de aula a vida está explodindo também. E pela primeira vez em muito tempo está tudo bem.

Ou como diria a avó de Bianca: está tudo azul.


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Notas finais do capítulo

Primeiros os agradecimentos e depois as explicações, ok?
Então, eu quero agradecer a todos que acompanharam até aqui, os que comentaram e os que só leram mesmo. Obrigada. De verdade. Essa foi e ainda é uma fic muito importante pra mim, foi o meu primeiro romance yaoi e o primeiro romance em si, no sentido original.
Agora as explicações: eu sei que muita gente se decepcionou com último capitulo e acreditou fielmente que eu os separaria e não posso mentir que cogitei essa hipótese, porque eu cogitei assim como cogitei em Novembro kkkk. Eu sou uma pessoa má, admito. Mas eu não escrevi isso, apesar de ter pensado bastante. Mas o que eu quero dizer mesmo é que em Azul, eu não estou tratando de Noah e Will como casal, do jeito que fiz em Novembro, estou tratando de Noah e Will como pessoas, pessoas com problemas. É por isso que não há realmente tanta interação entre eles do jeito que havia em Novembro. Aqui, em Azul, há apenas eles dois tentando consertar suas vidas meio que se apoiando um no outro. Só que, como o Noah veio perceber no fim da fic, eles não estavam se apoiando um no outro, eles estavam se escondendo um no outro e por isso tiveram esse destino. Não que seja errado se apoiar em alguém, mas o que não dá pra fazer é querer se esconder dos seus problemas do modo como Noah estava fazendo ou como no caso de Will, querer esconder o problema em si. É preciso enfrentar os seus problemas, acho que essa é a grande mensagem da fic em si.
Espero que as coisas estejam mais claras agora e para aqueles que acham que ficou incompleta desse jeito, acho que vc pode imaginar as partes que faltam... eu deixei assim de propósito.
Foi maravilhoso ter vcs aqui.Espero que nos encontremos em um futuro próximo e... é isso.
Bjs e até...
ps: que fique tudo azul com vcs. :))



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