Huntress escrita por Katsumi Liqueur


Capítulo 1
Huntress




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/6852/chapter/1

-Imitando as palavras de uma sábia donzela, eu, humilde bardo, explico... Isso é uma história sobre histórias. Não é a respeito de aventuras e coragem, de lutas e vitórias. É, apenas, um pequeno relato de tristeza e solidão. Uma vez me disseram que vocês, nobres e poderosos da platéia, estão aqui para mostrar que podem estar... Que sua atenção é desviada facilmente, por isso, não devo me prolongar explicando. Devo começar a trabalhar, que minha diferente maneira atraia a atenção da alheia platéia! Embora, creia eu, a história seja fascinante por si mesma...

“Era uma vez um mundo chamado Zepyr. Ele possuía um sol, mas sua noite não tinha estrelas. Também existia nele uma lua temperamental, que raramente aparecia. As suas noites eram mergulhadas numa treva mais densa que o medo que tinham dela, porém não duraram muito tempo. Uma bela mulher de incontáveis anos e de eterna primavera acordara nesse lugar tão temido. E sua beleza e juventude não eram malignas, não fizera pacto com nenhum tipo de ser asqueroso para consegui-las... Como todas as outras pessoas que acordavam nesse lugar, seu corpo continuava intacto, todos os anos não se manifestando em sua postura.

Entretanto... Seu olhar era tão cansado e solitário. Ela mantinha sempre um sorriso triste, enquanto negava, com uma voz melíflua e em um suave meneio com a cabeça, vários homens que se aproximavam dela. Sussurrando, fracamente, que estava esperando por algo... Ela tampouco imaginava o que poderia ser. Uma pessoa para acabar com sua eterna solidão, ou a Morte... No seu caso, fazendo igual coisa.

Fora ela que trouxera uma luz para as noites daquele mundo. Usando seu conhecimento e poder para nutrir as mais variadas flores com uma luz forte e brilhante. Conforme a luz solar se exauria, as flores iam despertando e resplandeciam. Tornando seguros os mais longos caminhos, não só fornecendo uma luz duradoura e certa, como afastando criaturas com seus odores almiscarados. Os anos passaram-se e o brilho atenuava-se. Diversas estações vivendo em lugares inabitados, afastada para não mais sofrer com a presença daqueles que não eram os seus.

Morava numa casa construída pela sua Arte, enfeitada com a mais pura e branca de suas flores. Passando os dias em eternas meditações, esperando, ainda, algo acontecer. Não que tenha demorado pouco, todavia ela sentiu uma presença parecida com a sua. Enfim..., pensou, sorrindo como há tempos não fazia. Liberou seu poder demonstrando existir naquele lugar alguém mais com semelhante presença. A espera foi curta, mas não menos dolorosa.

Claro que o recém chegado notou qual era o poder que sustentava aquelas flores, intrigando-se a respeito do motivo que levara alguém tão poderoso a fazer algo tão simplório e gentil. Por fim, chegou, assustando-se com tão ermo local. Não entendo, falava sua voz mesquinha, seu poder é assombroso e ela vive reclusa? Quando deveria ser tratada como Deusa, pois essas tolas criaturas temem o que a noite esconde. E, tanto eu, como ela, sabemos que só há coisas para se aproveitar.

Suas palavras, como a mais contundente arma, perfuraram o coração da bondosa mulher, lembrava-se de tanta indiferença? Seu mundo, em suas lembranças, sempre fora acolhedor e cálido... E, agora, o único representante de lá, trazia em seu coração um sentimento que ela temia tentar desvendar. Sabia, entretanto, que seu sumiço, deveria ter afetado algo...

Trágicos caminhos, que Ele infere, sem poder interferir. Mudaria Ele, sabendo o que aconteceria? Não, Ele era o Destino, Ele sabia, Ele não intervinha. Mesmo que isso destruísse seu próprio mundo, ou, no mínimo, aquela que o tornara mais agradável.

Infelizmente, ele a reconheceu... Trancando sujas motivações dentro de sua alma, a Rainha que por muito tempo foi lembrada. A poderosa que desaparecera, mencionada em tantas preces, tantos pedidos para entender o que acontecera! Poderia alguém tão amada, ser transformada em objeto de intenso ou frio ódio? O que o povo teme de seus governantes é o abandono, ela fizera isso, mesmo não tendo culpa...

Os dias transcorreram tranqüilos. Felizes para ela, objetos de pesquisa para ele. Como toda pessoa ansiosa por poder, sua insistência, para aprender o que ela poderia oferecer, era inesgotável. Saberia ela o que estava fazendo? Teria sido inútil a tentativa dele de ocultar suas intenções se, todo esse tempo, ela estivesse planejando os acontecimentos?

Ela fora a mais poderosa, achar que poderia ser enganada... Por outro lado, a tristeza poderia tê-la feito não querer ver todo o drama que aconteceria. Enfim, ela ensinou tudo o que sabia, sobre seu mundo, sobre Zepyr, sobre seus poderes e as fraquezas de seu próprio povo. Porque, todo o tempo, ela estava esperando ansiosamente pelo momento de demonstrar o quanto aprendera! Sufocara o grito em seu peito, calara seu orgulho e fingira ser normal. Agora, poderia, no mínimo, demonstrar o quanto sabia...

Ele esperou, claro que esperaria!, o momento propício para tomar o seu lugar. Afundando um punhal em seu seio nu, durante o sono sereno. Seus olhos abriram-se, fitando com uma tristeza culpada. Ela segurou seu braço, mantendo o punhal em seu corpo. De sua boca, saíram palavras que ela não lhe ensinara. Amarga, seca, com a bondade esvaindo-se através do sangue, uma raiva frígida no olhar, entoava uma magia proibida.

Seu sangue alcançou suas adoradas flores, maculando sua cor. Acha mesmo, vil criatura, que eu deixaria este mundo livre para tuas vontades individualistas? Eu irei, mas tu irás comigo! Eu poderia destroçar teu frágil corpo, entenda... Porém, eu abandonaria aqueles que me acolheram e ensinaram. Com esse sangue, com esse poder, com essa voz e com esse desejo... Eu imprimo nessas flores minha eterna vontade, enquanto não nos despertarem, elas continuarão tendo seus desígnios. Oh, entretanto, você, minha bela flor... Apenas em você, eu serei lembrada... Para sempre suas pétalas carregarão meu sangue, você será banida como eu fui, porém sobreviverá. E quem te desvendar, conseguirá entender o por quê desse sacrifício?

Ele, atemorizado, não conseguia livrar-se da mão que o prendia, da garra que o segurava. Sabia o significado daquelas palavras! Estar preso, tendo o poder sugado, misturando-se ao dela, capaz de sentir, mas não de se libertar. E, a mais terrível das coisas, estar subjugado junto aquele que possui em seu coração um rancor direcionado apenas a você, os sentimentos num único turbilhão, afogando-se na raiva que era obrigado a sentir por si mesmo.

E isso continuaria, ele notara ao ler seus pensamentos. Deveriam ficar vivos até o poder deles ser consumido pela flora local. Mas ela era tão poderosa, que por si só agüentaria décadas. Ele fora uma ferramenta para prolongar o tempo.

“Por que se sacrificar por tão pouco?” Essa foi à última pergunta dele, enquanto tinha consciência da sua existência. Ela foi marcada eternamente em cada pétala, tingida a dor e ódio...”

- Vocês devem saber que história é essa. Falo sobre a nossa sublime e linda flor, Huntress. Suas belas pétalas pintadas de carmim, esperando por uma resposta a sua pergunta silenciosa. “Você entende, entende, entende... Entende o motivo de meu sacrifício?” A voz enfraquece, morrendo... Pobre flor... Ela, que conheceu os mais belos lugares, foi banida... As pessoas temendo sua cor medonha, embora encantadora, desviaram seu olhar, destruíram seus canteiros... Carregando uma maldição e uma pergunta, tal qual a esfinge terrestre... “Decifra-me, ou te devoro”...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Huntress" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.