Acapella escrita por Nayou Hoshino


Capítulo 7
Apaziguando a Destruição com Selvageria




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— … Em resumo, ela não passa de uma bela duma P*TA! — ele gritou, chutando o resto de um vaso de cerâmica para longe.

— Destruir tudo não vai adiantar, sabe disso, né? — disse, mas ergui as mãos me rendendo e lhe lançando um olhar de “ não está mais aqui quem falou” assim que ele me olhou com seu olhar mortal.

— Ela se aproveitou de mim! Pegou nossas músicas e contatos e saiu com toda a glória! — ele passou a mão pelos cabelos com força, arrancando alguns fios. — Aposto que ela deu para alguém da gravadora, claro. Só assim para terem aceitado ela tão rápido...

Deixei que ele colocasse sua raiva pra fora, pelo menos só estava gritando, não quebrando mais nada. Castiel sempre fora explosivo, mas agora tinha mesmo razão para estar com raiva. Nem mesmo eu acreditava que aquela garota animada e amigável com quem ele saía a alguns meses tinha sido capaz de deixá-lo pra trás. Ela também tinha pego algumas de minhas músicas, mas comparado ao que tinha pego de Castiel... Isso não era nada. Ele realmente estava apaixonado por ela, dava pra perceber no modo como ele falava. Talvez fosse a primeira vez que o tenha visto assim desde que nos conhecemos.

— Preciso beber. — ele falou por fim, olhando para o nada.

— Sei muito bem onde isso vai dar. — Cruzei os braços, encarando-o impaciente enquanto me lembrava da última vez que tive de cuidar dele de ressaca, Leigh não gostou muito de ver o casaco que fez pra mim com tanto carinho coberto de vômito.

— Fique aí se quiser, mas eu vou beber! — Ele passou a mão na carteira que estava sobe a TV e saiu andando, me dando as costas.

Se eu fosse um pouco menos vitoriano ou não fosse um bom amigo, teria deixado ele ir sozinho. Mas não poderia me perdoar se ele bebesse demais e se metesse em problemas graças ao seu pavio curto. Então o acompanhei até o portão, onde ele me encarou antes de trancar o mesmo e deu-me um sorriso travesso, balançando a cabeça enquanto achava graça de algo. Me pergunto do que seria? Olhei para o céu enquanto caminhávamos rua abaixo, os tons alaranjados iam se tornando mais escuros a cada minuto, indicando o anoitecer.

— Já pensou que pode acabar encontrando a Debrah por lá? — soltei, recebendo seu olhar meio raivoso e confuso. — Pode acontecer, já que foi onde se conheceram.

— Se ela for esperta, já deve estar bem longe. Sabe que se eu a encontrar na minha frente vou enchê-la de porrada.

Eu ergui uma sobrancelha pra ele, repreendendo por suas palavras nada vitorianas, e ele só abanou a mão indicando que não falava sério, mas não acreditei muito nisso. Então por favor Debrah, fique longe, não quero que meu amigo acabe na cadeia.

O bar que Castiel mais frequentava era até que bem frequentado e classudo , parecia com uma casa de festas, mas tinha uma luz fraca e música ao vivo, raras eram as vezes em que algo saía do controle ali. Entramos e ele se apossou de um banco no balcão do bar, tratei de ficar em pé ao seu lado. Poucos minutos depois um rapaz corpulento veio até nós com seu sorriso amigável de sempre.

— Vejam se não é nossa dupla dnâmica. Já faz um tempo que não os vejo juntos por aqui... O que vai ser? — Ele nos encarou e logo piscou. — Uma cerveja pra você e... para o vitoriano aqui, um copo d'agua, certo?

— Exatamente Tim. — eu e Castiel dissemos juntos, com a diferença de que eu dei um sorriso simpático no fim.

Enquanto o barman pegava nossos pedidos eu olhei em volta, a essa hora o lugar ainda estava meio vazio, então não estava tão “emocionante” como de costume. Tim me trouxe uma pequena garrafa de água e trouxe uma latinha para Castiel, que a abriu com violência e deu uma golada intensa em seguida. Eu e Tim nos olhamos, era meio deprimente e assustador assistir àquilo....

— O que houve? — ele se aproximou de mim e perguntou num tom baixo.

— Namorada. Longa história... — respondi igualmente baixo, sentindo o olhar do ruivo pesar sobre mim.

— Parem de cochichar. É irritante e patético... — Castiel resmungou, virando a latinha goela abaixo. — Mais uma.

— Claro... — Tim recolheu a latinha levemente amassada das mãos dele e foi até o refrigerador pegar outra.

— Você deveria tentar afogar as mágoas de um jeito mais criativo e menos... destrutivo. — sugeri, apoiando o braço no balcão e jogando meu peso ali. — Só pra variar.

— Não quer ser uma estrela do rock? Então. É assim que funciona. — ele deu uma risada estranha, como se arranhasse sua garganta.

Dei de ombros e puxei meu bloco de anotações para tornar esse tempo aqui tão produtivo quanto fosse possível. Procurei uma folha que tivesse espaço para escrever algo, o bloco estava praticamente completo, já estava na hora de comprar um novo, mas sempre me esquecia... Será que não tinha algum perdido em casa? Dificilmente...

Castiel talvez não quisesse mais ensaiar. Ou fosse incapaz disso se afogasse demais as mágoas com suas bebidas. De qualquer forma, talvez não fosse tão urgente escrever algo, embora a vontade fosse mais forte que eu. Me estiquei e peguei alguns guardanapos detrás do balcão, Tim os usava para proteger as superficies de madeira de clientes descuidados e seus copos e latinhas, algo que sempre achei um desperdicio de papel, mas né... Quem era eu pra dizer para um barman como servir bebidas e cuidar de seu patrimônio ao mesmo tempo? Sou apenas um vitoriano do século 21.

Apertei o botão da caneta algumas vezes impaciente, estava um pouco bloqueado por conta de minha preocupação com o ruivo. Uma música sobre uma víbora sugadora de felicidade talvez não seja boa ideia, minha cabeça e a guitarra nova de Castiel agradeceriam se eu guardasse essa ideia para mim. É. Fica para uma próxima.

— Se for escrever algo, ande logo. Essa caneta está me irritando. — Ele apenas virou um pouco a cabeça para me olhar, logo voltando a encarar a parede coberta de prateleiras com as mais diversas bebidas.

— Desculpe, estou com um bloqueio... — resmunguei, colocando a caneta sobre a pequena pilha de guardanapos na minha frente.

Fez-se um silêncio entre nós, até que Tim retornou com outra latinha e logo voltou a se afastar para atender outros clientes. Castiel abriu a lata um pouco mais cuidadosamente e deu uma golada curta, soltando o ar pela boca em seguida.

— Uma diaba enfeitiçou meu coração, agora eu não sou nada. Nada além de destruição. — ele falou baixo.

— O que? — me aproximei um pouco, sem entender.

— Anota aí! — ele deu mais uma golada na cerveja — Vamos mostrar para aquela vadia como se faz uma música.

Dei uma risada sem perceber, anotando rapidamente aqueles versos em um dos guardanapos e olhando para ele, esperando por mais. Quando Castiel queria, o que era raro, ele era um poço sem fim de letras destrutivas ou agressivas, o que era o contrapeso ideal para as minhas letras quentes e às vezes melancólicas.

— Sua língua de serpente, amaldiçoa tudo que é bom. Diabrah, Diabrah... — ele soltou num suspiro, dando uma golada mais intensa.

— Diabrah? — eu ergui uma sobrancelha pra ele. — Não é explicito demais?

— Que se foda. Nos nossos shows vai ter até um pedestal pra ela quando formos tocar essa música.... — ele olhou para mim, com um sorriso psicótico no rosto — Só pra tacarmos fogo, claro.

— Ok, depois vemos se mudamos isso. Pode continuar. — o repreendi com um simples gesto com a minha cabeça.

— Me solta! Eu sei aonde é a saída! — ouvimos uma voz berrar bem atrás de nós, o que me fez virar pra trás.

Observei enquanto um dos seguranças puxava uma garota pelo braço. Ela estava visivelmente embriagada e irritada, enquanto se debatia para se soltar seus cabelos ruivos agitavam-se na frente de seus olhos, fazendo com que suas mechas alaranjadas e amareladas se misturassem formando uma ilusão de ótica e fazendo parecer que estava em chamas. O segurança finalmente a soltou quando estavam a alguns passos da saída, permitindo a garota se recompor antes de xingar algo e sair do lugar batendo a porta com força. Castiel não pareceu se abalar com a cena, sequer tinha se virado para ver o que estava acontecendo... Ou estava concentrado ou realmente já tinha se acostumado a ambientes caóticos.

Senti meu celular vibrar e o peguei do bolso, era Debrah. Essa não. O que ela poderia querer comigo depois do que havia feito ao Castiel? Fiquei encarando o aparelho enquanto pensava se deveria ou não atender enquanto ele vibrava cada vez mais na minha mão.

— Alô? — disse impaciente.

— Avise que eu vou processar ele. — ela bufou

— O que?

— Castiel. Ele fez um escândalo e eu sou uma pessoa pública agora, vou processá-lo por danos à minha imagem. — ela repetiu impaciente.

— Você está brincando, certo? — dei uma risada e vi Castiel olhar pra mim curioso

— Claro que não. Se quisesse uma imagem negativa na mídia eu teria me lançado com ele, não feito um escândalo. — ela riu do outro lado.

Desliguei o celular sem dizer mais nada, enfiando-o de volta no bolso com raiva. Ela ainda se achava no direito de dizer tais coisas? Mesmo após enganar Castiel e se aproveitar de nós ela ainda queria mais? Tinha sorte de ainda ter uma imagem, fisicamente falando. Se ela fosse um homem não tinha sobrado nem os ossos para contar a história... Sério! Eu já presenciei uma briga entre Castiel e um rapaz que derrubou sua guitarra enquanto ele se mudava. O cara tinha sorte por ainda andar por aí só com um nariz meio torto.

Ele puxou algo do bolso de sua jaqueta, logo vi um maço de cigarros surgir no meio de suas mãos. Estendi a mão, tocando seu braço e chamando sua atenção.

— Relaxe, eu vou parar. Só fumo quando sinto vontade de socar a cara de alguém. — ele disse calmamente, como se fosse a coisa mais natural do mundo.

— O que é sempre. — dei uma risada.

— Qual é, mereço um por não ter dado com o taco de baseball na cara daquela diaba. — Ele riu, se levantando e colocando algumas notas no balcão sob a latinha quase vazia.

O acompanhei até o lado de fora carregando minha garrafa de água junto, quase não tinha tocado na água. Assim que saímos, demos de cara com a garota que tinha sido posto pra fora, ela estava escorada no muro e mantendo o peso em uma das pernas enquanto a outra se apoiava na parede. Aproveitei para olhá-la com mais atenção, seu estilo parecia com o de Castiel, meio revoltado e desleixado, ela nos encarou, soltando um bafo de fumaça na nossa direção.

Castiel a encarou de cima a baixo e parou ao seu lado, pegando um cigarro, colocando entre os lábios e o acendendo. Fiquei de pé na frente dos dois os analisando, pareciam um espelho um do outro. Até os cabelos combinavam! Claro, só faltava Castiel fazer algumas mechas e deixar o mesmo crescer.

— Tem alguma coisa na minha cara? — ela resmungou pra mim, com a voz firme.

— A-ah... Não, desculpe... — disse sem jeito, desviando o olhar e passando a mão nos cabelos. Sempre acontecia de eu me distrair enquanto encarava coisas, mas se o humor desta garota fosse como o de Castiel eu poderia acabar com uma de suas botas empalada.

— Fica aí só me encarando, se quer falar algo fale logo. — ela bufou, dando um sorriso perverso — … Tarado.

— O quê?! — a encarei assustado — N-não! Não é nada disso!

Castiel deu uma gargalhada, soltando a fumaça do cigarro para o lado oposto ao que estávamos. A garota me chama de tarado e ele ri? Sério? Isso é o oposto do que ele deveria fazer, desse jeito a garota vai achar que tem razão... Olhei para o lado e ela estava rindo também, provavelmente achando graça do meu pânico. Apertei as têmporas e neguei com a cabeça, não era possível que esses dois tivessem saído de lugares diferentes.

— Eu vou indo. Esse lugar já deu pra mim. — ela jogou o cigarro no chão e o esmagou com sua bota com tanta força que eu cheguei a sentir um pouco de pena do objeto. Pobrezinho, foi destroçado...

— Que garota raivosa... — Castiel disse num sorriso, soprando um pouco da fumaça na direção dela.

— Não faz ideia querido. — ela bufou, se afastando do muro e olhando para o ruivo com um sorriso selvagem, dando-lhe dois tapinhas no rosto antes de se afastar com passos firmes rua abaixo.

Esperei ela sair e soltei um assovio impressionado. Essa garota era como um Castiel com seios, só que um pouco mais ousada. A combinação dos dois seria explosiva, poderia incorporar isso em uma letra? Certamente... Um badboy e uma garota selvagem, seria quente e destrutiva. Sabia que estava com meu olhar determinado quando o ruivo me encarou com um sorriso e jogou seu cigarro longe.

— Depois dessa inspiração, vamos ensaiar velhote. — ele disse animado e decidido, fazendo juz à nossa ligação mental.

— Vamos lá. — lhe estendi a mão e ele deu um tapa, batendo nossos antebraços com confiança.

— A partir de agora, nossas músicas são tudo ou nada. É a vera.

Conseguia ver a chama de determinação em seu olhar. Sabia o que ele queria. Nosso sonho tinha ido de “ter uma banda de sucesso” para “ter uma banda de sucesso que destrua e esmague a Debrah para lhe ensinar uma lição sem que eu tenha que socá-la”. Contanto que nosso sonho o mantivesse longe da violência e da cadeia, eu apoiaria. Éramos parceiros pra toda vida, apesar da diferença entre vitorianismo e destruição.


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