Roda do Tempo escrita por Seto Scorpyos


Capítulo 4
Capítulo 4




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Harry aparatou quase no segundo em que a grande barreira veio abaixo. Usando todo o seu poder, segurou a enorme quantidade de terra, pedra e árvores.

— Tire as pessoas, rápido. – ordenou para um homem perto, que apenas assentiu e saiu correndo.

O brilho azul que envolveu todo o desabamento faiscou e Harry mordeu o lábio, concentrando-se em manter firme o peso enorme. Os braços, erguidos e levemente flexionados, estavam tensionados no esforço de manter tudo unido dentro da rede mágica, exatamente acima da cabeça do auror. Os olhos verdes varreram o lugar logo abaixo na colina. A pequena aldeia estava semi destruída e fogo e fumaça podiam ser vistos. Aurores estavam guiando as pessoas para longe do lugar, mas o mago notou com desgosto e um pouco de desespero algumas parar para vê-lo. O bruxo com quem falou antes praticamente as expulsou e levantou uma barreira de pedras no elevado, observando a distância.

No vale, bolas de luzes indicavam que a aldeia estava vazia. O outro homem se aproximou.

— Vamos fazer um escudo protetor e então você encerra o feitiço. – disse, olhando a enorme carga acima dos dois.

— Saia daqui. – o auror disse, já sentindo o limite das forças.

— Não sem você, chefe.

Sem se importar com o olhar fulminante, o outro bruxo puxou a varinha e fez um círculo no chão, que se ergueu uns dez centímetros como um tubo e então, estendeu a mão.

— Pronto?

Harry considerou ignorar a situação, mas respirou fundo e se preparou para largar. Encerrou o feitiço e segurou com força a mão do outro, que o puxou para a segurança. No meio da avalanche de terra e todo o resto, os dois foram jogados de um lado para outro e um contra o outro dentro do tubo de magia, perdendo a referência de chão e céu na escuridão. Sem a menor cerimônia, o outro bruxo abraçou Harry com força e deu aos dois mais estabilidade.

— Harry, está bem? – o bruxo perguntou quando por fim pararam, ainda no escuro do meio da terra.

O auror estava em cima do colega, que o ajeitou preocupado – Harry?

— Estou um pouco zonzo... me dá um minuto... – a resposta veio baixa e lenta.

— Ok. Não vou a lugar nenhum. – O outro respondeu, ajeitando ambos – A propósito, sou Arkyn, significa “eterno filho dos reis” em norueguês.

— Noruega. – Harry murmurou, apertando os olhos para tentar parar a sensação horrível - Durmstrang e dragões.

— Exatamente. – sentindo o outro pesar sobre si, alarmou-se – Harry, preciso que respire fundo e alinhe sua magia... preciso que tente ficar acordado...

— Quanto ar ainda temos? – o mago descansou a cabeça na curva do pescoço do outro.

— Estamos bem.

— Que bom...

Harry pesou mais e Arkyn tentou não se desesperar. Segurando o mago com um braço, usou o outro para tatear abaixo e do lado para tentar encontrar a varinha, perdida nas muitas voltas. Acabou encontrando a de Harry, ainda dentro do bolso do casaco. Com esforço a puxou para fora e encostou-a no chão, onde devia estar a proteção.

Wingardium leviosa, Penna Onus— murmurou, concentrando-se.

A luz verde piscou e jorrou abaixo deles, fazendo o tubo se elevar lentamente. Arkyn respirou fundo, torcendo para que a montanha de terra não fosse um obstáculo. Manteve a subida devagar, estremecendo levemente ao ouvir a terra se mover acima, dos lados e embaixo deles.

Só quando a claridade começou a aparecer é que ele notou que estava prendendo a respiração. O tubo se elevou do monte de terra e pairou, antes de começar a descer depois do feitiço mudado. Arkyn não conseguiu medir a distância e ambos caíram pesadamente no chão, depois da magia se encerrar. Harry rolou para longe do outro, que girou sobre si mesmo, um pouco desorientado.

— Harry!

Mas antes que pudesse encontrar o mago, foram cercados pelos outros aurores, que gritavam e falavam ao mesmo tempo.

— Está bem, já chega! – ele gritou, erguendo-se. Olhou em volta e viu Harry ainda desmaiado, ao lado de dois outros magos.

Com duas passadas gigantes, o norueguês se aproximou e se abaixou, preocupado. Colocou os dedos no pescoço de Harry e então, murmurou alguma coisa baixinho. A luz azul da varinha percorreu o corpo do outro e explodiu em luzes brancas.

— Conseguiram tirar todo mundo? – perguntou, erguendo-se e conjurando uma maca.

Quando não obteve resposta, ergueu a cabeça e olhou em volta. Os bruxos estavam olhando para ele, simplesmente parados. O olhar do mago se tornou duro.

— Conseguiram tirar todo mundo? – voltou a perguntar, mais alto e mais seco que antes.

— Sim. Estão depois da proteção ao lado. – um dos que estavam mais perto respondeu, indicando um lugar depois das árvores.

— Bom. Leve um grupo e ajude a remover os feridos e peça ajuda ao ministério para a reconstrução. – virou-se para outro auror, parado um pouco mais longe – Você e você – indicou outros dois – Verifiquem no alto da montanha se existem pistas ou algo que nos explique esse acontecimento. Cheque tudo, desde pedras lascadas ou vestígios de feitiços.

— Quem nomeou você chefe? – um auror loiro perguntou, um pouco arrogante.

— A falta momentânea do chefe dos aurores, que desmaiou depois de nos salvar. – respondeu, seco – Além do mais, se tiver uma linha de ação mais precisa, por favor, contribua.

O silêncio caiu entre os homens e logo, os magos designados se afastaram para cumprir as ordens. Arkyn e Janus colocaram Harry com cuidado sobre a maca, que levitaram para fora da terra ainda fofa. Um mendibruxo se aproximou quando chegaram ao acampamento improvisado.

— Ele só está exausto depois do feitiço de contenção. – Arkyn explicou, mais calmo – Accio, varinha. – disse, apontando a varinha de Harry para a montanha de terra revolvida.

A varinha dele demorou a sair debaixo daquela coisa toda, mas veio rápido até a mão do auror, que respirou, aliviado.

— Que bom que não quebrou. – comemorou, baixo, mas então, franziu a testa – Como você caiu fora do círculo?

— Conversar com a varinha é um mau sinal...

A voz levemente enrouquecida fez o auror virar a cabeça e sorrir. Harry estendeu o braço e mesmo na dúvida, Arkyn se levantou e o apoiou a fazer o mesmo.

— Sua varinha. – disse, estendendo-a – Tive que usar a sua, a minha ficou para ver o tempo passar e acabou perdendo o ônibus.

Harry franziu a testa e balançou levemente a cabeça.

— Acho que bati a cabeça com mais força do que pensei... – murmurou, perdido.

— Você não bateu a cabeça, eu é que sou meio louco e...

Parou ao ver o mago guardar a varinha no mesmo bolso e varrer o lugar com o olhar.

— Temos muitos feridos... – encarou o outro auror – Louco ou não, temos trabalho. – antes que Arkyn descesse, segurou levemente seu braço – Obrigado por minha vida.

— Que nada, chefe! Fico com crédito com a gerência. – o outro respondeu, com um sorriso maroto.

O mago o seguiu balançando a cabeça. Logo, as brincadeiras ficaram para trás. Harry tirou o pequeno estojo encantado de poções do bolso e ajudou como pôde os feridos. Concentrado, não notou os olhares espantados diante da vasta quantidade de poções e feitiços de cura que foram ministrados sem varinha. Arkyn, ao lado dele, também estranhou e mais ainda ao reconhecer alguns feitiços de Durmstrang, mas não disse nada.

Equipes de ajuda chegaram e Harry subiu novamente a colina e encarou a aldeia destruída. A noite já estava caindo e pontos escuros dificultaram a identificação de casas e lojas.

— Não encontramos nada, Potter. – um auror se aproximou, respirando pesadamente – Parece que foi só um deslizamento de terra mesmo... um acidente.

— Um deslizamento de terra não teria provocado os incêndios na vila. – o moreno respondeu, seco.

— Mas não há o menor vestígio de... – um mais novo, com barba enorme, começou e parou.

Unindo as mãos, Harry invocou a magia e ao separá-las, uma névoa rosada se formou. O mago abriu os braços lentamente e a névoa se espalhou e desceu a colina, cada vez mais esparsa. Já estava escuro e o brilho nas pontas das varinhas era a única claridade, como tochas, mas mesmo assim viram quando a névoa começou a explodir em pequenos pontos brancos, abaixo na vila e ao lado, onde o deslizamento começou.

— É um feitiço identificador de magia recente. – Harry explicou, para ninguém.

— Partidários de Voldemort? – Arkyn perguntou, preocupado.

— Depois de tantos anos, acho que não. – o mago respondeu, abaixando-se. Os olhos verdes faiscaram – Não foi usada magia das trevas, e isso é o que mais está me preocupando.

— Se não é magia negra, pode ter sido qualquer um. – um loiro suspirou, cansado – Droga!

— Estamos vendo os resultados, mas temos que nos concentrar nas motivações. – Harry se ergueu e respirou fundo – Tem alguma coisa muito errada aqui.

— Eles não conseguiram destruir a vila totalmente. – Janus ofereceu, confuso.

— Porque fomos chamados?

A pergunta de Harry pegou todos de surpresa. Arkyn franziu a testa.

— Não entendi. – disse, encarando o moreno.

— Somos aurores e não socorristas. – Harry virou-se e encarou o grupo – Eu recebi o pedido de reforço de Janus.

— E eu, um pedido do Dekell. – o citado explicou, confuso – Ele disse que estava patrulhando por aqui e viu alguns suspeitos no alto da colina.

Harry olhou em volta.

— Onde está Dekell? – perguntou, gelado.

O bruxo não foi encontrado e o chefe dos aurores passou a mão pelo cabelo bagunçado.

— Espero que ele não tenha armado isso... – murmurou, cortante. Virou-se para os outros aurores – Tek, você e Andreas façam uma varredura por aqui e chequem se não há sinais de Dekell. Perguntem sobre ele para alguns dos aldeões. Assim que tiverem as informações, reportem. Não quero que fiquem aqui mais do que necessário e se tiverem um pista, avisem.

— Não é para investigar? – o auror loiro perguntou, surpreso.

— Isso aqui pareceu uma armadilha que não deu muito certo, então não vou arriscar nada até saber com o que estamos lidando. As equipes ainda estão aqui e há moradores também, então, se misturem e se mantenham atentos. Nada de bancar o herói.

— Isso é um privilégio seu, não é? – um auror mais afastado se pronunciou, azedo.

Harry o encarou e então, um brilho prata atravessou os olhos verdes.

— Sempre quis que houvesse alguém além de mim, mas fora falar, o que todos fizeram e muito... poucos foram os que encontrei dispostos a agir. Você é Mordred, não é? – sem esperar uma resposta, elevou uma sobrancelha – Se está disposto a pagar o preço, nada impede que seja um herói também, mas tente não ser um herói tapado, como eu fui.

O auror se virou e desceu a colina com passos largos e decididos e depois de um minuto, os outros fizeram o mesmo. Mordred ficou parado observando o mago parar e falar com algumas pessoas e então, aparatar.

 

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Gina encarou os dois bruxos sentados no sofá com a expressão carregada. Lupin notou que ela pareceu mais gorda, e a roupa estava preocupantemente parecida com a da mãe, sentada ao lado dela. O senhor Arthur estava na cadeira, do outro lado.

— Eu não aceito isso, Lupin! O dinheiro dele é meu! – a bruxa disse, a voz um pouco estridente.

— Espere um pouco, Gina, também não é assim... – o pai dela tentou, balançando a cabeça.

— Eu perdi meu marido e tenho três crianças para criar. Quero tudo! – ela rebateu, firme.

— Seu pai tem razão. – Remus estava cansado e ergueu uma mão quando ela ameaçou falar de novo – Não é bem assim. Tiago já é maior de idade e Alvo este ano completa a idade, só fica Lílian e mesmo assim, já é adolescente. Se você não aceitar esse acordo, Harry disse que vai pedir a arbitragem de um juiz e tenho certeza que não será bom para você.

— Ainda mais com tudo o que gastou do dinheiro do Harry... – Sirius acrescentou, sombrio – Essa casa, toda a mobília... foi muito dinheiro gasto, Gina.

Ela o fulminou com o olhar.

— Meu marido me traiu publicamente. Arrastou meu nome na lama e dinheiro não vai pagar isso, mas pelo menos, posso puni-lo de algum jeito. Eu não aceito!

Resoluta, ela rasgou a folha e cruzou os braços, comprimindo os lábios numa linha fina.

— Bem... – Lupin se levantou – Vou dizer a ele então.

Gina e Molly trocaram um olhar surpreso. Arthur se levantou e Sirius também. Os homens se dirigiram para a porta e a mais velha se levantou, a testa franzida.

— Não tem mais nada a dizer, Remus? Simplesmente vai embora? – perguntou, seca.

O professor se virou já na porta e encarou a bruxa.

— Gina disse não. Agora é com Harry e o juiz. – balançou a cabeça com um suspiro – Estou cansado disso tudo, Molly.

Sem esperar por uma réplica, o lobo saiu e Sirius olhou as duas mulheres.

— Não é uma boa decisão, Gina. Vocês já tem muito... – tentou, olhando de uma para outra.

— Não tenho meu marido. – ela respondeu, ainda sentada.

— Se é assim...

O animago saiu atrás do companheiro e o senhor Weasley os acompanhou até lá fora.  Molly se virou e olhou a filha, a expressão carregada.

— Pode ser que tenham razão. Depois das coisas nos jornais, pode ser que o juiz até decida que você tem que devolver dinheiro para ele...

Gina se levantou e ajeitou o cabelo, comprido e um pouco bagunçado.

— Eu não vou facilitar a vida dele, mãe. Ele me deixou e me trocou por aquele... aquele... – havia mais que raiva na voz da bruxa, que se calou, pálida.

Molly observou a filha longamente e então, Arthur entrou de volta, olhando as duas mulheres.

— Harry vai mesmo pedir um juiz? – Molly perguntou – Quero dizer, ele realmente pode fazer isso?

— Claro que pode. – ele respondeu, atravessando a sala a fim de voltar para seu laboratório – Ainda mais agora que está demonstrando controle e poder. Não existe razão para Lupin continuar como guardião financeiro dele.

— E a bebida? – Gina se levantou e olhou o pai, já no limite para a cozinha – Ele se tornou um alcoólatra! Alguém tem que cuidar dele!

Arthur se virou e encarou a filha com austeridade e Gina se encolheu.

— Bem, Gina... não foi fácil para nenhum de nós o que aconteceu. Foi uma surpresa desagradável e lamentável, mas aconteceu e nada vai mudar... – diante do olhar dela, balançou a cabeça – Harry não vai voltar para você, filha. Deve tentar aceitar isso e o quanto antes, será melhor para todo mundo.

Sem esperar nenhum comentário, ele deixou a sala e Gina engoliu seco, os olhos vermelhos.

— Ele vai se arrepender de ter me deixado, mãe... Eu e meus filhos o faremos pagar pelo que nos fez.

Molly a observou sair da sala, cambaleando ligeiramente, a expressão congestionada e os olhos arregalados e vermelhos. Mágoa, raiva e algo mais forte estavam estampados na face dela.

 

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Harry puxou o jovem segundos antes da carruagem passar desgovernada. O rapaz se virou e então, ao vê-lo, sua expressão se fechou em desprezo e nojo.

— Tire suas mãos imundas de mim! – apesar de não ter gritado, várias pessoas ouviram a explosão.

Antes que o auror tivesse qualquer reação, uma mulher o empurrou violentamente para o lado, ofegante.

— Como ousa colocar suas mãos no meu filho, aberração? – o tom dela passou de raivoso a estridente até o fim da frase.

O auror encarou-os, imponentes nas roupas caras feitas à mão, apesar das expressões iradas tirar muito da aristocracia dos dois.

— Isso é que ganha por salvar um Malfoy, Harry. Devia ter deixado o cego idiota ter dado aquele passo. – Arkyn comentou, irônico – Mas pelo menos, o povo está tendo um belo espetáculo da realeza agindo como reles mortais... – cruzou os braços, encarando os dois – Se bem que faz tempo que eu não via alguém tão mal educado...

Astoria empalideceu e rapidamente virou a cabeça para o lado, constatando a verdade e arregalou os olhos quando viu uma câmera do outro lado da rua.

— Vamos, Scorpius! – ela ordenou, agarrando o braço do filho.

— O garoto faz juz ao nome: pica e envenena a mão que o salvou. – um senhor disse em alto e bom som, arrancando murmúrios de concordância.

Os dois desceram a rua praticamente correndo e Arkyn pegou o braço de Harry, ainda sem ação.

— Vem, vamos beber. – chamou, guiando-o entre as pessoas.

Harry estacou. – Eu não bebo mais. – afirmou, sério – Mas aceito um suco de abóbora bem gelado.

Sem esperar, passou pelo outro e virou a esquina. Arkyn balançou a cabeça e o seguiu, sorrindo.

 

****

Scorpyus viu o pai sair da carruagem da janela de seu quarto. Os Malfoy eram uma das poucas famílias que ainda utilizavam tal meio de transporte, mais por opulência do que por praticidade. Mas não foi o brasão nem os cavalos que chamaram a atenção do jovem, mas a postura do pai.

— Porcaria! – murmurou, irritado – Já não chega os jornais e agora papai...

Virou-se para o quarto e encarou a porta, preocupado e por pouco não saiu correndo por ela. Respirou fundo e se sentou na poltrona, disposto a esperar.

Na sala, Draco simplesmente colocou o jornal aberto na mesinha que estava defronte a mulher sentada rigidamente na ponta do enorme sofá todo decorado artisticamente. Sentando-se na poltrona de frente, o homem encarou a mulher e elevou uma sobrancelha.

— Esta é a edição especial de hoje à tarde. – começou, sem cumprimentos – Eu estava no Ministério quando a recebi.

— Olá, Draco. – ela se recompôs e aprumou os ombros – Quer um chá?

Com a cabeça, indicou uma pequena bandeja colocada ali não muito tempo antes. O sonserino sorriu, irônico.

— Já passa de sete da noite, querida. Eu ainda nem deveria estar aqui e com certeza, não quero chá. – o tom dele se tornou seco – Quero saber por que em vez de agradecer ao homem que salvou a vida do nosso filho, você, Astoria Malfoy, agiu pior do que uma lavadeira em plena rua cheia de testemunhas?

Ela engoliu seco e desviou o olhar.

— Eu não percebi o que tinha acontecido, até Scorpius me contar, já na carruagem. – explicou, baixo.

— Que inclusive é a mesma que quase passou por cima dele? – Draco a encarou, contendo a irritação visível – Me esclareça.

Recostou-se à poltrona, os olhos azuis gelados cravados na esposa.

— Alguns garotos estavam brincando com fogos... daqueles dos gêmeos e... – ela passou a mão pela testa, afastando fios invisíveis – Assustaram os cavalos... Sims conseguiu subir na carruagem, mas demorou a controlar... – ela parou e respirou fundo – Eu não pensei ao ver Potter ao lado do nosso filho.

O loiro a encarou por longos minutos e então se ergueu, ela levantou os olhos, assustada pelo movimento brusco. Ao vê-lo se dirigir ao pórtico exterior, se ergueu e deu alguns passos.

— Draco?

Ele se virou e voltou alguns passos.

— Nunca, nem mesmo durante o escândalo que sua tia provocou, expus você ou Scorpius. Tratei de colocá-los longe o mais que eu pude, e fiquei aqui, a seu lado. – a voz dele soou dura e cortante – Achei que tinha demonstrado o melhor jeito de se lidar com uma situação desastrosa, mas depois de hoje, duvido de sua capacidade de aprender.

Ela empalideceu, recuando como se tivesse levado um tapa.

— Nenhuma mulher deveria ser obrigada a passar pelo que eu passei... – conseguiu reagir, magoada.

— Concordo. Mas antes de me casar esclareci pontos importantes... e lembro que você aceitou mesmo assim. – ele voltou mais passos e Astoria recuou – Se você não tivesse sido tola diante da sua tia, nada teria acontecido – quando ela abriu a boca para rebater, Draco ergueu uma mão – E não, querida, eu não acredito que você não sabia o que ela ia fazer. Então, de qualquer lado que eu olhe, você foi a culpada.

Astoria engoliu seco e baixou os olhos, o rosto avermelhando-se aos poucos. Draco encarou a esposa com desdém.

— Acho que já é hora de Scorpius completar o treinamento com o senhor Anton. – o loiro se virou e se encaminhou para a escadaria.

— Vai tirar meu filho de mim? – a voz dela soou assustada.

— Todos os Malfoy tem um mesmo caminho a percorrer, querida. – ele não se virou e começou a subir as escadas.

Astoria ficou parada observando o marido virar o corredor, indo para sua ala pessoal. Ali, ele se tornava inatingível, mesmo para ela. Depois de alguns minutos, ela voltou para o sofá e encarou o jornal como se fosse um inseto peçonhento.

— Mamãe?... - Scorpius se aproximou, cuidadoso – Ouvi você e papai conversando...

— Pensei que ouvir atrás das portas era um vício que você não adquiriu. – ela respondeu, fechando o jornal e puxando a bandeja para cima a fim de tirá-lo da vista.

— Desculpe, mas eu queria saber como ele ia reagir... – o jovem se aproximou e sentou-se onde antes estava o pai – Ele não pareceu tão bravo.

A mulher ergueu a cabeça e encarou o filho com seriedade.

— Você não entendeu nada. - diante do olhar surpreso dele, ela balançou a cabeça – Não, filho, ele está muito irritado com tudo. Comigo principalmente. Eu não agi como o decoro e a aristocracia dizem que devo agir... – Astoria mordeu o lábio, nervosa – Temo que sua ida para o senhor Anton não seja apenas para o término do treinamento...

O rapaz se inclinou para frente, observando a mãe se servir de chá com as mãos trêmulas.

— Eu não quero ter que cuidar das propriedades da família, mamãe... – reclamou, inconformado – Quero trabalhar no ministério, como o papai.

— Seu pai não trabalha lá. Apenas fica a maior parte do tempo, mais para saber como as coisas estão e todo o resto... – ela se recostou e tomou um pouco do chá – Ele não permitirá que você o desobedeça. Além do mais, antes de tudo acontecer, ele disse que quando você terminasse o treinamento, iríamos começar a preparar seu casamento.

Scorpius arregalou os olhos e abriu a boca, espantado. – Mas eu sou muito jovem para me casar!

— Não tanto assim e os nobres sempre se casam cedo. – ela rebateu, mais calma – Mas devo confessar que sempre temi esse momento. Você se casando vou ficar sozinha...

— Eu não quero isso. Não quero me casar... – ele hesitou e se levantou, agitado – Quero dizer, até quero, mas não agora. E como assim sozinha? Papai está aqui!

Astoria ergueu o rosto e o filho devolveu o olhar.

— Seu pai nunca foi meu, Scorpius. Nosso casamento não passou de um acordo de negócios e por muito tempo, eu quis que mudasse. Me apaixonei pelo jeito frio e distante dele, mas agora, hoje, eu posso dizer que nada do que fiz adiantou. – respirou fundo e inclinou aristocraticamente a cabeça - Sim, eu ficarei sozinha depois que se casar.

— Papai não vai deixar você por ele nunca. – o jovem afirmou, sério – Quando precisou escolher, ele nos escolheu. – abaixou-se e segurou as mãos frias da mãe – Ele é um Malfoy e nunca vai poder se afastar disso por mais que queira.

— Ás vezes penso se não seria melhor que não fôssemos Malfoy... então poderíamos viver nossas vidas sem pensar no que os outros iriam dizer... Nesse ponto eu invejo Potter – o sorriso veio triste – Deve ser bom não se importar.

Scorpius se levantou e encarou a mãe.

— Ele não considerou a família, os filhos. – a voz do jovem se tornou dura – Foi egoísta e bem feito para ele! Perdeu tudo!

Astoria deixou a xícara sobre a mesinha e se levantou, alisando a saia.

— Será mesmo que ele perdeu? – perguntou, encarando o filho – Perdeu ou se libertou?

Sem esperar resposta, ela deixou a sala em silêncio.

 

*****

Remus observou o companheiro e notou o olhar ávido pelas notícias. Apesar da postura descompromissada, sabia que ele estava agitado.

— Porque não vai até ele? – perguntou, tomando o chá calmamente - Pelo jeito, ele conseguiu superar a bebida e pelos jornais, dá para ver que o tempo afastado foi muito bom para ele. Magia poderosa sem varinha e poções... acho que...

— Isso não apaga o que ele fez. – a resposta gelada interrompeu o professor, que ergueu uma sobrancelha.

— E o que ele fez? – perguntou suavemente.

O outro abriu a boca para responder, mas não o fez e se levantou de repente, fazendo a cadeira quase cair. Segurando-a, Sirius encarou o companheiro pesadamente.

— Remus, já falamos sobre isso e eu não vou brigar de novo. – afirmou.

— Nem eu quero brigar, mas você tem que reconhecer que ele não está fazendo o que você disse que ele ia. – Remus se levantou e pegou as xícaras, colocando-as na pia.

Sirius cruzou os braços, balançando a cabeça.

— Isso não o isenta...

Parou ao ver o outro se virar e erguer uma mão.

— Não, Sirius! Não começa a dizer que ele foi culpado por ter se apaixonado pelo Malfoy! Reconheço que foi uma opção ruim, mas eu e você somos prova de que não dá para decidir pelo coração. Quando ele escolhe alguém, só dá para fazer duas coisas: tentar ser feliz ou fugir para o outro lado da terra e viver com a marca pelo resto dos dias. – Sirius abriu a boca para responder, mas Remus não deixou – Ele estava infeliz! Triste e sozinho! O tempo todo!

— Ele tinha uma boa esposa e filhos! – o outro rebateu, erguendo a voz – Tinha uma reputação e um nome, que arrastou na lama!

O professor respirou fundo e passou a mão pelo cabelo.

— Eu não acredito que ouvi isso de você. – impediu a aproximação do companheiro e o encarou, desanimado – De todas as pessoas... Nunca de você.

Quanto tentou passar e sair da cozinha, teve o braço segurado.

— Aluado... eu disse que não queria brigar... – Sirius murmurou, cansado.

— Quem gritou na minha cara que nome e reputação valem mais do que a felicidade foi você. – olhou o outro nos olhos – Gina é uma boa esposa e uma ótima mãe, mas e como mulher? Como amante do Harry? Desculpe... – soltou o braço – Mas o que eu vi foi uma garota que se preocupa mais com a casa e com os filhos, em ser e parecer uma boa esposa, do que com o que o homem dela está precisando. – afastou-se, ainda encarando Sirius – Vocês dois o vêem como um herói, o chefe dos Aurores do Ministério da Magia...

— É isso o que ele é. – o outro rebateu, baixo.

— Pensei que ele fosse uma pessoa, antes de tudo. Uma que nunca foi feliz ou teve uma casa... que dormia em um armário embaixo das escadas e que foi jogado de um lado para outro... que passou necessidade de tudo o que alguém pode precisar e que carregou nos ombros o peso de ser o escolhido.... – a voz do professor baixou – Ele tem direito a felicidade mais do que qualquer um de nós, mas pelo jeito, se quiser fazer parte de todo o resto, vai ter que viver o papel para sempre.

— Remus...

— Harry não é um bom ator, Sirius. Ele nunca ia conseguir usar uma máscara para sempre.

O professor saiu da cozinha e o Sirius caiu pesadamente na cadeira. Ficou encarando as mãos e depois, olhou o jornal. Harry, totalmente diferente, estava em uma foto grande, ao lado de alguns aurores. A ação heróica no ataque à vila e depois o salvamento do filho do Malfoy alimentaram os jornais a semana toda. Pela primeira vez em meses, o mago era novamente herói e vítima, no caso com Astoria Malfoy. O incidente com a família do amante deu assunto para vários dias, mas desta vez, a mulher e o rapaz foram duramente criticados.

Com suspiro, Sirius se levantou e foi atrás do companheiro. Encontrou-o no canto da sala, corrigindo as lições dos alunos.

— Só queria que nada disso tivesse acontecido e ele ainda estivesse conosco, como antes. – o animago murmurou, encarando o companheiro.

— Agora, olhando para trás, posso dizer que eu também queria, mas não daquele jeito sem perspectiva, Sirius. Ele merece mais do que Gina estava dando.

O moreno baixou a cabeça e suspirou. – Ela se transformou numa cópia da mãe... largou o emprego... talvez isso tenha contribuído, não sei...

Lupin encarou o topo da cabeça do outro e suspirou também.

— Não sei o que aconteceu entre eles, mas não podemos ignorar que ele estava um pouco deprimido... e então veio uma fase boa, em que ele estava rindo e disposto.

— Acha que foi enquanto estavam se relacionando? – Sirius perguntou, curioso.

— Talvez... mas se lembra que ela frequentemente o repreendia dizendo que não era comportamento de um membro do ministério e chefe dos aurores? Eu a ouvi dizer isso e não foram poucas vezes.

— Eu também ouvi... e concordei com ela algumas vezes...

Sirius se jogou sobre o sofá e jogou um braço sobre o rosto.

— Isso é cansativo.

— Imagina para ele. E agora com uma nova ação na justiça e tudo... – Lupin encarou os trabalhos, pousando a caneta – Acho que ela devia deixar todos nós descansarmos um pouco...


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