Angel escrita por Amy Baskervilly


Capítulo 1
Mein!




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A manhã na casa mais italiana do bairro grego amanheceu próxima do normal, Matteo corria pelas escadas com o irmão mais novo e a imensa cadela malhada da família enquanto o pai se arrumava e a mãe ria, fazendo o café. Dali, o gêmeo mais novo, Miguel, era o único que estava faltando na agitação. 

—-Mani...? Cadê o Miguel? -- A Chef disse, servindo os pratos e percebendo que a voz melodiosa e doce do filho estava ausente.  

—-Ué? Ele não estava com os meninos? -- Reparou melhor que Matteo e Oliver parraram com a correria, prestando atenção na conversa, logo largado as colheres de qualquer jeito na mesa posta, saindo apressados para buscar o irmão do meio.  

Miguel estava deitado, coberto até o pescoço com um grosso cobertor, seus lábios tremendo levemente, e a respiração alterada. Assim que sentiu a movimentação na cama se forçou abrir os olhos.  

—-Mat? -- A voz fraca sussurrou, docemente até.  

—-O que você tem Miguel? -- O gêmeo de cabelos negros juntou-se ao outro nas cobertas, encostando sua testa na do de cabelos claros. Estava quente. -- Você está com febre. -- Alarmou-se, chamando o pequeno Oliver com a mão. -- Não está Olly? 

O caçula colocou as mãos pequenas no pescoço do outro, logo ocupando o espaço entre os gêmeos. -- Está quente... Você está doente Guiel? -- Gracejou apesar dos seus onze anos. 

—- Estou me sentindo dolorido e quente, Ollie...  -- Sussurrou, afagando as bochechas de ambos.  

—-Vou chamar a mamãe. -- O mais velho logo se prontificou. 

—- Não. -- Sorriu se sentando na cama, não sem um pouco de dificuldade. -- Aula, lembra? Temos essa última aula de revisão antes da prova. -- Levantou-se um tanto cambaleante, caminhando para o banheiro do quarto e entrando na ducha depois de se despir com pressa. -- Estou muito atrasado? -- perguntou se secando com pressa e os cabelos quase loiros agitados em todas as direções.  

—-Se você se trocar rápido e descer ‘pro’ café em mais de dez minutos, então sim. -- O mais velho recitou, puxando o irmão já de uniforme para comerem com os pais. Era uma imposição dos mesmos que todos se sentassem a mesa pelo menos duas vezes ao dia, e nem mesmo “tio” Mascará da Morte fugia disso.  

E sob os olhares dos irmãos, Miguel comeu calmamente sem alarmar os pais, sabia que eles tinham trabalho e uma ida ao hospital era o significado de uma quebra monumental na rotina deles.  

Ele não gostava de quebrar rotinas tão bem construídas ao longo dos anos. 

Foi para aula com o irmão, cumprimentou as meninas, filhas de um amigo de seu pai, que haviam crescido consigo e com os irmãos. Recebeu um beijo de uma, um soco de outra e um segredo sussurrado do irmão mais novo, de olhos bicolores e cachos loiros angelicais e macios.  

A aula passou devagar, praticamente se arrastando, e, logo no intervalo, o mestiço grego-brasileiro-italiano estava completamente quente e com calafrios.  

—-Miguel? Tudo bem? – Um menino pequeno, companhia constante desde muito novo e também filho do amigo de seu pai, Aspros, aproximou-se e se sentou ao seu lado. Seu rosto de criança ainda não tinha começado a mudar e isso lhe dava um ar um tanto mais inocente, encantador.  

—-Acho que estou com febre... – Disse procurando conforto ao deitar a cabeça no ombro do menino. -- Ettore... Cadê os outros? 

—-Eu estava te procurando. Você está bem longe de qualquer pessoa sabia? – Sorriu largamente, puxando-o para se  deitar em seu colo para ficar mais confortável. -- Está tão ruim assim?  

—- Você fica muito bonito nessa luz... Parece até um anjo...  

—-É...  Você realmente está mal. -- Revirou os olhos, acariciando os cabelos do melhor amigo mais velho.  

—-Não pode cuidar de mim? -- Pediu manhoso, tendo certeza que o garoto atenderia seu desejo. 

—-Eu vou fazer melhor. -- E digitou um número estranho ao mais velho. -- Padrinho? Sim... Bem. Não. É o Miguel. Ele não está passando bem, então você poderia vir pegá-lo? -- O doente assentiu aéreo, sem perceber que o padrinho do amigo era na verdade seu pai. -- Estou perto da quadra com ele, nas árvores. Ele veio se sentar aqui como sempre e ficou amoitado. O intervalo até já acabou. Quinze minutos? Sem problema. Não saio daqui.  Obrigado! -- Desligou.  

Miguel começou a fechar os olhos, cada vez menos desperto, sentiu os lábios do mais novo em sua testa e por fim se entregou ao mundo dos sonhos.  

  

******** 

 

—-Você é um péssimo pai! -- Asmita ralhou chegando ao hospital para acompanhar o sobrinho mais novo que não havia desgrudado do amigo doente. -- E ainda arrasta o meu sobrinho para o hospital! 

—-Como se eu quisesse trazer o anjo do Ettore pra cá! Já tentou desgrudar esses meninos?! -- Manigold rebateu, vendo o menino correr para abraçar o tio. -- Eu comprei um lanche natural pra ele, antes que você reclame.  

—-Bom mesmo! -- Beijou a testa do loirinho, vendo-o voltar seus olhos policromados a um setor além deles.  -- O que foi Ettore? 

—-Pintura! -- Os olhinhos aumentaram de tamanho, brilhando convidativos. -- Me leva lá? Por favor! Por favor! Por favor! Por favor! 

—-Está bem! -- Riu do menino, logo vendo o irmão ali de plantão. -- Olha só quem temos aqui, Tore! O Shakya!  

—-O que fazem aqui? Você está bem pequeno? -- Aproximou-se, se esquecendo das mãos meladas de tinta e acariciando o rosto macio e jovem. -- Ai! Esqueci disso! 

—-Tio Shaka! Quero ajudar! Deixa...? Eu prometo, não vou me sujar e faço o que o senhor disser!  

—-Mesmo? -- Olhou seriamente o irmão que sorria. – Tudo bem pequeno, essa ala é a dos bebês. Normalmente, essa parede estranha é a primeira coisa que esses pequenos veem. Então pedi uma autorização do hospital para pintá-la, e algumas outras também, com as crianças daqui. 

—-Me dá essa parede?  

—-Você dá conta sozinho? E ainda mais com esse estrago? -- A parede estava metade branca e metade pintada de um vermelho vivo com marcas das mãos pequenas de algumas crianças.  

—-Você me dá? Quanto tempo eu tenho? -- Um sorriso doce se abriu nos lábios pequenos. 

—- O almoço e a tarde são suas. -- O Neurologista indiano não acreditava que ele conseguiria, mas estava disposto a vê-lo tentar.  

—- Ótimo! -- Correu até onde estava sentado e buscou a mochila, tirando um estojo imenso com dezenas de pincéis de tamanhos diversos dele.  

Começou a pincelar de forma aleatória, sendo observado pelos dois indianos e pelo italiano até que este pode ver o filho que havia sido levado para fazer exames rotineiros.  

A tarde se passou, e o número de pessoas ao redor do pequeno pintor chegava a duas dezenas. Estavam admirados, encantados. Como um menino tão pequeno pintava tão bem?  

Ao final da tarde, com a pintura em três tons terminada, ele foi ovacionado pelas pessoas que ali trabalhavam ou permaneciam por causa de um doente. Seus pais, orgulhosos, tiveram que leva-lo a força para casa, senão ele permaneceria ali até que o amigo tivesse alta - coisa que aconteceria apenas pela manhã. 

Miguel tinha recebido uma serie de medicamentos, tudo porque uma alergia, que nunca antes tinha se manifestado, resolveu atacar. Sua mãe, preocupadíssima permaneceu consigo toda a noite, e pela manhã, com a alta, esperava o marido.  

—- Evye, ele está bem. -- Shion lhe acalmava docemente vendo o garoto vestido olhar para os lados, calado. -- O que foi Miguel? Algum problema? -- O médico tibetano, que não era especializado em pediatria, perguntou pronto para encaminhá-lo novamente para o quarto.  

Os olhos azuis profundos estavam fixos. Arregalados. Brilhando.  

—-Isso... -- Caminhou até a parede oposta à transparente do berçário e mirou a aquarela na parede, pura e linda. 

Seu rosto no corpo de um anjo, revestido de luz, profundidade, flores e beleza. Sabia de que mãos aquilo havia tinha saído. 

Anjo. 

E para Miguel sua imagem não fazia jus ao anjo que o havia desenhado.  

 

 


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Notas finais do capítulo

Agradecimentos especiais:



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