Meus saltos faziam eco ao adentrar o local quase vazio.

A Verdant durante o dia, parecia um lugar completamente diferente da barulheira e mistura de corpos suados e dançantes da última (e única!) vez que estive aqui.

— Com licença, o senhor Queen está por aqui? — perguntei à garota loira e baixinha que enxugava e empilhava alguns copos na prateleira. Ela se virou para mim e seus olhos azuis arregalaram-se um pouco.

— Oh, meu Deus, você é ela!

— Oi?

— Você é a Felicity, não é? Tommy não cala a boca de tanto falar de você. — Senti o calor em minhas bochechas apenas em imaginar meu nome sendo assunto por aqui. E se tratando de Tommy, eu sabia bem qual era a temática da conversa.

— Tommy não cala a boca de jeito nenhum, vamos combinar.

— Ei, ei! — O moreno chegou protestando. — Um complô de loiras contra mim? Podíamos fazer isso de jeito divertido, mas vocês preferem o jeito chato! — Rolei olhos. Ele era impossível!

— Em seus sonhos, Merlyn. Sou Sara. — A baixinha me estendeu a mão e apertei de volta. Seu rosto me era estranhamente familiar, mas não conseguia lembrar de onde.

— Felicity Smoak. Mas por algum motivo, você já sabia disso. — Ergui uma sobrancelha na direção de Tommy, que apenas deu de ombros.

— Vai se foder, Ollie! — Todos nos viramos na direção da escada, onde uma garota magrinha, de cabelos curtos e castanhos descia a escada correndo. — Se meu pai e minha mãe não se importam, não vou tomar lições do maior irresponsável da história!

Ali estava outro rostinho que constantemente estampava tabloides: Thea Queen. Tão festeira quanto o irmão, a menina, que agora já devia ter uns vinte anos, não economizava quando o assunto era chamar a atenção da mídia e dos pais, sempre envolvida em acidentes de carros, excesso de bebida e drogas. Eu sabia que apesar de tudo na empresa, ela era a maior preocupação do meu chefe, talvez querendo evitar que sua irmãzinha seguisse nos mesmos caminhos que ele já esteve.

— Speedy!

Oliver apareceu no começo da escada, e prendi minha respiração. Ele ainda tinha efeitos sobre mim, mas eu já estava trabalhando nisso. Pisquei repetidas vezes, ordenando aos meus pulmões que funcionassem direito, enquanto ele descia os degraus como um maldito modelo de passarela, massageando as têmporas, gesto que eu sabia indicar preocupação.

— Mais um capítulo da constante briga Queen. — Sara comentou voltando sua atenção ao trabalho com os copos.

— Olha, Ollie, quem veio de ver. — Finalmente ele me notou ali, então abriu um pequeno sorriso, até seu rosto voltar à feição preocupada logo em seguida.

— Eu não vim te ver. Ok, na verdade eu vim, mas não te ver te ver. Preciso da sua assinatura nesses documentos — me expliquei. Hoje ele tinha tirado o dia para resolver com Tommy os problemas da boate, e eu a vareta tínhamos ficado tomando conta do escritório. Oliver indicou com a cabeça para uma das mesas e eu o acompanhei com a pasta firme em minhas mãos.

— Algum problema na empresa? — O loiro questionou não muito atento aos papéis que assinava.

— Você não vai ler?

— Não preciso, confio em você — ele respondeu como se eu tivesse falado algum absurdo, quando quem estava falando absurdos ali era ele.

— Ah, ok. É... — Ajustei meus óculos em um gesto nervoso. — Está tudo bem por lá, só foi essa coisa urgente.

Era verdade. As coisas estavam estranhamente calmas na última semana. Depois da correria e loucura dos primeiros meses, parecia que finalmente estávamos pegando o jeito da coisa da administração de grandes empresas e podíamos respirar um pouco aliviados.

— Fico feliz.

— E por aqui, tudo certo?

— Eh, mais ou menos. Com a Verdant sim, mas acredito que você conheceu minha irmãzinha.

— Só por dois segundos, ela é rápida. Posso ajudar em algo?

— Acho que não. — Oliver fechou a pasta terminando de assinar o que era preciso. — Ela está usando o fundo fiduciário sem o mínimo controle, não escolheu um emprego, uma faculdade. Eu sou um péssimo irmão por me preocupar?

— Você seria um péssimo irmão se não se preocupasse. — Afaguei seu antebraço à mostra pelas mangas da camisa dobrada. — Mas ela vai ficar bem, você ficou.

— Esse é o ponto, eu não sou ninguém para julgá-la, ou sequer aconselhá-la, já que quatro meses atrás eu era pior que ela. Tommy cuidava disso aqui sozinho, eu nem colocava os pés na empresa e meu dinheiro era todo gasto em bobagens. Não sou um bom exemplo.

— Agora você é. E nada melhor do que alguém que esteve bem fundo para trazê-la de volta. — Pisquei para ele.

— Obrigado, Felicity.

— Sempre que precisar, somos amigos pra isso. — Oliver soltou um suspiro chateado fitando algum ponto vazio atrás de mim. Estranho. — Eu já vou. Deixar Laurel sozinha muito tempo pode não ser seguro — comentei, e ele riu.

— Você está de carro? Diggle está por perto, posso pedir para ele te levar.

— Não precisa, vou almoçar com Ray antes de voltar pra CQ.

— Ah. — Seu sorriso desfez-se.

Minha relação com Ray era ótima. Ele era engraçado, gentil, inteligente, criativo, e podíamos conversar por horas sobre qualquer assunto, sem falar que beijava muito bem. Não tinha acontecido nenhum pedido de namoro ou coisa do tipo, mas já estávamos saindo há duas semanas e caminhávamos nessa direção. Ray era o lado não complicado da minha vida, meu príncipe da Disney particular.

Oliver parecia estar lidando bem com o fato de que eu estava saindo com o oponente. Ele ainda fazia essa cara de quem tinha comido algo estragado sempre que o nome do moreno era citado acidentalmente em uma conversa, mas nenhum grito mais tinha sido dado sobre o assunto. Na verdade, esse era um tema proibido no escritório.

— Eu e Sara acabamos de ter uma ideia maravilhosa! — Tommy chegou até nós friccionando as mãos em um gesto entusiasmado, sendo seguido pela garota.

— Eu não vou mais atrapalhar vocês. A gente se vê. — Já ia saindo quando o moreno segurou meu braço.

— Nada disso, a ideia também inclui você, loirinha. — Pendi a cabeça para o lado, o olhando curiosa. — Vamos fazer uma megafesta! — Minha careta pareceu ser espelhada no rosto de Oliver.

— Qual é, não façam essa cara! — Sara criticou nossa reação. — Vai ser incrível!

— Eu não sou uma pessoa de festas, pessoal. Ele sabe. — Apontei com o polegar para Oliver.

— E eu estou aqui quase todas as noites. É festa o bastante para mim. — Ah, então é para cá que ele tem vindo?

— Você está trabalhando, não vale. Quanto tempo não faz que você não tem uma boa foda? Um ménage? Um oral que seja...

— Ok, já chega, Tommy! — Oliver reclamou o calando.

— Respeite as vaginas presentes, por favor. — Sara pediu brincalhona, enquanto eu corava. Não preciso ouvir essas coisas, não preciso mesmo! — Mas é sério. Vocês dois e minha irmã tem trabalhado demais, e... — Espera aí...

— Ei, ei. Você é Lance? Sara Lance, a náufraga? A menina que colocou o chifre mais memorável da história de Star City? — Praticamente gritei. — E agora trabalha para o cara com quem você traiu sua irmã, e com o cara que perdeu as chances com a crush por causa da mesma traição em questão? Não me espanta Laurel ter abominado a ideia de vir aqui hoje no meu lugar. — Opa, boca... Adivinhem quem está descontrolada?

Oliver fechou os olhos negando discretamente com a cabeça enquanto Tommy olhava para os lados procurando não sei o quê. Sara gargalhava. E muito.

— Não contaram a ela, garotos? — A loirinha consegui falar depois de um tempo, enxugando uma lágrima que desceu do canto do olho.

— Não, eles não contaram. Tommy falou de tudo, menos disso, e o senhor Queen não é muito de falar — justifiquei.

— Mas enfim, voltando ao assunto da festa. Vocês precisam se divertir mais. Relaxe, Ollie, eu e Tommy organizaremos tudo.

— Eu realmente...

— É comercial, Oliver! — Tommy o cortou. — Você comentou que precisávamos promover a Verdant, então para que melhor que uma festa? Cuido da lista de convidados, com pessoas influentes de Star, pode ser na sua casa, nesse fim de semana. Felicity relaxa, Oliver faz sexo e eu faço dinheiro. Todo mundo sai ganhando.

— Ah, então já está tudo decidido?

— Sim, é só aparecer. Você também, Felicity.

— Vou ver com Ray — dei a primeira desculpa que me veio à cabeça.

— Quem é Ray? — Sara perguntou curiosa.

— O namorado dela. — Oliver comentou em tom seco. — Eu te levo até lá fora, Felicity — ele propôs cortando o assunto, apoiando gentilmente a mão em minhas costas e me guiando até a saída.

— Mas, Tommy, você me disse que eles...

— Shiu. Estou trabalhando nisso. — Eu queria enfiar minha cabeça em um buraco ouvindo os sussurros nada discretos dos dois.

— Você não precisa ir para a festa se não quiser. — Oliver abriu a porta do motorista para mim quando chegamos ao meu carro. — Eu sou obrigado a lidar com aqueles dois filhos da puta, você não.

— Ah não, eles são ótimos.

— Pra você que não tem que conviver diariamente, são mesmo.

— Você reclama demais. — Entrei e liguei o carro. — E tenha paciência com sua irmã, leve ela para a festa, eu converso com ela.

— Quer dizer que você vai? — Oliver soou quase esperançoso.

— Veremos.

~

— Solta, Barry. — Tirei a mão dele da própria camiseta, que meu irmão repuxava sem parar. — ‘Tá bom assim.

— Não, está pequena — ele reclamou. Ok, talvez eu devesse ter comprado um ou dois números maiores ou tivesse deixado ele ir buscar outra em casa, mas já estávamos bem atrasados.

— Não, está ótima — menti. — Não pareça tão virgem, porque eu sei bem que você não é faz um tempo.

— Ok, senhora-mulçumana-estou-numa-festa-na-piscina-vestida-dos-pés-à-cabeça — ele brincou. Na ocasião, eu usava um short jeans, e uma blusinha solta por cima do biquíni.

— Exagerado!

— Graças a Deus! — Oliver-sem-camisa correu até mim. Lembra de respirar, viu, Felicity, isso é meio que necessário para continuar vivendo. Sorria e faça a indiferente. Abri uma tentativa de falso sorriso indiferente. — Tommy exagerou dessa vez. Ele disse que ia fazer a festa para melhorar a propaganda da Verdant, mas convidou um monte de gente que nunca vi na vida!

— Ahn? — murmurei abobada, enquanto Oliver ainda falava. Senhor, ver aquele peitoral de perto era ainda mais perturbador. E aquelas tatuagens? Jesus!

— Fel, ele fez uma pergunta. — Barry me beliscou e me forcei a olhar para os olhos de Oliver. Péssima escolha, estavam ainda mais lindos ao ar livre e com aquela luz do pôr-do-sol.

— Yeah, escutei. Mas pode repetir, assim, só pra repetir mesmo, senhor Queen?

— Ei, nada de senhor Queen por aqui também! Não estamos trabalhando, e você é uma das únicas pessoas que conheço hoje. — Assenti concordando. — Perguntei sobre Ray.

— Ele viajou o fim de semana pra Coast City. Não pôde adiar.

— Nossa, que pena.

— Você não está achando ruim — acusei diante de sua cara de pau e do sorriso que se formou em seus lábios.

— Tem razão, só quis parecer legal. — Ele piscou para mim. Não pisque para mim assim, moço, não estrague meu juízo, por favor! — Que bom que conseguiu vir, Barry.

— Agora que sabe que sou irmão da Fel, você já gosta de mim? Posso conhecer o departamento de ciência e tecnologia então?

— Cala a boca, Bar — grunhi entredentes. — Desculpa ele, senh... Oliver!

— Ei, Speedy. — Oliver riu aprovando como o modo como o chamei, e chamou a irmã que desfilava por ali só de biquíni. — Quero que conheça uns amigos. Essa é a Felicity e o irmão dela, Barr...

— Oi, eu sou o Barry. — Meu irmão babão estendeu a mão para Thea, interrompendo Oliver.

— Barry, uh? — A Queenzinha o mediu de cima a baixo, dando um meio sorriso. — Vem, vou te mostrar o lugar. — E saiu arrastando ele para longe.

— Ei, meu... meu irmão. — Terminei uma frase de um jeito quase choroso, o que apenas fez Oliver rir de mim. — Não ria, sua irmã vai desencaminhar o meu!

— Ele vai ficar bem, desde que mantenha as mãos bem longe dela. — O loiro murmurou em falso tom de ameaça, ainda olhando para o local que eles tinham ido.

— Deixa de ser chato, Oliver! — Dei um tapa em seu braço.

— Achei você! — Tommy chegou até nós animado. Minha nossa, ser gato demais e ter tatuagens sexys é requisito nessa amizade, porque... Meu Deus, o que era aquele apanhador de sonhos na parte interna do braço de Tommy?! — Hey, Felicity.

— Oi, Thomas — cumprimentei engolindo minha própria baba.

— Thomas? Ninguém me chama assim, loirinha. — Apenas balancei a cabeça como uma foca, ainda rindo como uma drogada. — Vou roubar Oliver dois minutos, preciso apresentar algumas pessoas para ele.

— Me deixa quieto, cara — o loiro pediu.

— Não, são... Hm... Negócios. — Os garotos trocaram um olhar malicioso que eu sabia bem o significado. Estavam falando de mulher. — Ele volta rápido. Ou não tão rápido. — Rolei olhos procurando um lugar para sentar.

Agora quem não conhecia ninguém por ali era eu. Olhei ao redor e franzi o nariz quando a única pessoa conhecida que encontrei foi a Vareta. Por sorte (ou não) tinha um lugar vazio próximo a ela. Coloquei meus óculos escuros e fui até lá. Joguei minha bolsa no chão, deitando na cadeira reclinável.

— Tommy e Ollie já deram festas melhores — ela comentou impassível sem se importar em olhar para o lado.

— A festa até que está boazinha, o problema mesmo são as pessoas.

— Sinta-se à vontade para ir embora, nerd.

— Digo o mesmo.

E continuamos, as duas, deitadas sem falar mais nada. Analisando as farpas que eram lançadas meses atrás, ou até mesmo anos atrás, estamos até civilizadas.

A noite chegou e nada de Oliver ou Barry. Laurel encontrou algumas amigas e logo arrumou o que fazer, e mais uma vez estava eu, deslocada em uma festa lotada com dezenas de pessoas em trajes de banho bebendo ou dançando na piscina.

É, já deu. Hora de ir. Zerei Candy Crush.

Me levantei colocando a bolsa no ombro e já olhando em volta em busca do traíra do meu irmão, quando senti braços fortes me puxarem para si pela cintura e um perfume bem conhecido inundou meu olfato.