Na sala de aula cheia de anjos e demônios, Yosafire não conseguia esconder sua completa preguiça. Para ela, a aula nunca esteve tão entediante. Porém sabia as consequências se acabasse por dormir em uma das aulas da Sr. Greif, e sinceramente não queria nem pensar.

Estava um tanto curvada e os cotovelos apoiavam-se em cima da mesa, caderno aberto em uma das longas tarefas costumeiras de sua professora. Não entendia direito qualquer questão, chegava a ser frustrante. Olhou para os lados, todos pareciam fazer o exercício. Começava a perder suas esperanças quanto à tarefa. Porém um breve pensamento a fez mudar de ideia. Rasgou um pedaço de papel de seu caderno, pegou uma caneta e começou a escrever.

“E aí, Froze! Como vai a tarefa?”

Dobrou o bilhete e quando Sra. Greif não prestava atenção, jogou o bilhete para Froze.

A anjo que se encontrava concentrada no que fazia se exaltou um pouco quando o bilhete aterrissou em seu destino, ou na carteira da garota. Não precisou pensar muito para saber que a única pessoa que teria a coragem, ou idiotice, de jogar um bilhete em plena aula da Sra. Greif seria Yosafire. Além do sorriso nada discreto que  a demônio exibia em seu rosto, como uma criança que apronta sem que os adultos percebam suas travessuras.

Pensou em simplesmente ignorar o bilhete, mas descartou essa ideia pensando que talvez, tratando de sua amiga, mandaria ainda mais outros para que esse não fosse ignorado. Desdobrou o bilhete se deparando com a mensagem. Claro que não queria participar daquela brincadeira, já sabendo muito bem das consequências caso fosse descoberta. Suspirando pesadamente e contra sua vontade, preparou uma resposta para a demônio. E com a mesma cautela, jogou o bilhete discretamente na carteira de Yosafire.

A mesma ficou animada quando viu o pedaço de papel dobrado pousar perto de seu caderno. Não tardou muito para abri-lo e se deparar com a mensagem da amiga Anjo.

“Bem mais produtiva antes de ser interrompida. Se quer as respostas, saiba que eu não vou te dar.”

Yosafire fez uma expressão como se quisesse dizer um 'eu sabia’ silencioso. Apesar disso, escreveu uma nova resposta. Novamente jogou-o para Froze que ficou surpresa ao pensar que já havia dado um ponto final na conversa.

“Ok, estou bem quanto a isso. Então pelo menos me ensina como fazer! Vamos, por favor? ;-;”

Uma carinha de choro fora adicionada no final da frase. Sério mesmo Yosafire? Pensou com uma gota na testa. Pensou um pouco e escreveu uma nova resposta. Em seguida jogou para a demônio.

“A Sra. Greif pode te ensinar.”

Yosafire ficou contrariada com a resposta. Com certeza ela me mataria se eu perguntasse pra ela! Pensou a demônio um tanto desesperada. Começou a escrever uma resposta nova, ficou completamente tensa quando ouviu algo que parecia ser um tapa, seguido do tremor em sua carteira. Virou o olhar lentamente para se deparar com a mão de sua professora em sua carteira.

Não ousou levantar a visão para encarar o olhar o dela, já imaginando o quão assassino ele estaria agora.

— Bilhetinhos durante minha aula, Yosafire? - todos os presentes escutavam temerosos, ouvindo o estranho calmo tom de voz que Sra. Greif usava nesse momento.

Ela estava furiosa.

— É-é… B-b-bem… Quer d-dizer… - Yosafire tentou falar algo, mas nenhuma frase queria se formular em sua mente inebriada pelo medo.

No final, ninguém conseguiu falar nada. Nem uma simples voz ou som se propagava, parecia até que eles prendiam a respiração. Por fim, um sussurro:

— Me… - Parecia escolher se era melhor permanecer em silêncio ou simplesmente falar. - Me desculpe professora.

— Terei que pedir para você se retirar, Yosafire. - Falou Greif friamente.

Silenciosamente Yosafire começou a se levantar, nunca se sentindo tão tensa como neste momento. Inesperadamente, uma outra voz se manifestou:

— Sra. Greif. A culpa foi minha, fui eu que respondi os bilhetes em vez de simplesmente acabar com isso.

Yosafire não acreditou que Froze fizera aquilo. Por que não continuou quieta? Por que quis assumir a culpa? Ela não queria que sua amiga se envolvesse em mais problemas por conta dela. Respirou fundo e lhe mostrou um sorriso alegre.

— Tá tudo bem, Froze! A culpa realmente foi minha, não precisa fazer isso. - Falou normalmente, mesmo que estivesse com medo naquela hora.

— Mas, Yosaf… - Sussurrou Froze querendo se impor a decisão de sua amiga.

Antes que qualquer um fizesse algum movimento, Yosafire sentiu uma espécie de impulso em seu corpo. Poderia dizer até que era a mesma sensação que sentiu da casa de Dialo e Chelan. Se moveu para frente em passos apressados, deixando a maioria presente confusa, em especial Froze. Foi em direção a porta e quase que roboticamente abriu a mesma. Yosafire tinha certeza que iria seguir em frente se não tivesse esbarrado diretamente em Lowrie. Pareceu ter voltado a si mesma quando isso ocorreu.

— Professor Lowrie? - A pergunta de Yosafire não soou como se estivesse surpresa por ver seu professor ali, mas sim como se estivesse atordoada. Froze conseguiu notar isso.

— Oh, se não é a Yosafire! - Cumprimentou sua aluna com um sorriso convidativo no rosto. - A onde ia com tanta pressa?

— Chegou na hora certa Lowrie. Estava prestes a aplicar um castigo nesse garota. - Falou Sra. Greif se aproximando do colega de trabalho.

— Creio que você deverá adiar seu castigo Greif, independentemente do que ela tenha feito. - Falou Lowrie com algum nervosismo em sua voz.

— Me dê um bom motivo para fazer isso. - Falou a outra professora cruzando os braços.

Quando Lowrie percebeu a ainda presença de Yosafire entre os dois, pediu educadamente para que entrasse novamente em sua sala. A demônio pensou em contestar mesmo que não houvessem motivos para tal ato.

Seguiu o pedido de seu professor, quando Sra. Greif andou para fora da sala, fechou a porta. Não demorou nem dois minutos para que suas amigas chegassem a bombardeando de perguntas, sendo a mais perguntada entre elas: “O que foi aquilo?!”

— Eu não sei dizer se isso foi corajoso ou apenas sem noção. - Falou Dialo sendo seguida por Chelan.

— O que você tinha na cabeça, Yosafire?! - Perguntou Macarona em tom de preocupação.

— Eu tava dormindo. - Comentou Rawberry inconscientemente sem que nenhuma das garotas ficasse verdadeiramente surpresas com isso.

Por que você saiu daquele jeito? Pareceu que você nem era a mesma. - Perguntou Froze. Todas pareceram notar naquele momento seu estranho comportamento, até mesmo a própria demônio.

— E-Eu não sei… Foi algo como um impulso, como se eu tivesse que fazer aquilo… - Yosafire não tinha certeza do que havia acontecido com ela, mesmo assim respondeu a anjo.

— Isso é… Estranho. - Falou a anjo para si mesma. - Além de que, por que o professor Lowrie veio até aqui?

Não demorou nem meio minuto depois que Froze fez essa pergunta para que Sra. Greif voltasse a adentrar a sala. Todos os presentes que se encontravam em pé comentando com seus colegas o que poderia ter acontecido voltaram aos seus respectivos lugares. Poderia ter sido impressão, mas pareceu que Sra. Greif olhara um tanto tensa para a janela, como se conferisse algo, mas logo voltou para sua normal postura.

— Certo. – Ela fez uma breve pausa. – De acordo com as informações que Lowrie me deu, houve alguns problemas e agora o local fora desta escola não é mais seguro.

Só bastou que dissesse isso e um silêncio completamente tenso se instalou no local. Ninguém ousou dizer palavra alguma, a invasão de Ivlis foi o suficiente para que muitos ficassem no mínimo inseguros a respeito de qualquer coisa do tipo. A voz de Macarona interrompeu o silêncio timidamente:

— Então, o que nós vamos fazer?  - Perguntou a anjo.

                - Vocês – Começou Sra. Greif dando ênfase nesta palavra. – vão permanecer aqui. Um professor substituto virá para vigia-los, eu fui encarregada da vigilância e defesa do prédio com Lowrie e alguns outros professores. – Deu uma breve pausa. – Não quero confusão, mantenham a calma e sigam todas as instruções que os professores lhe passarem.

Mesmo em seu costumeiro tom autoritário, a voz de Greif continha um pouco de preocupação, não muito usado pela mesma. Não queria perder nem um sequer aluno, muito menos os vê-los feridos ou abalados emocionalmente. Considerou sorte que da última vez, ninguém fora realmente morto, no máximo com alguns graves ferimentos.

Pareceu que de certa forma, conseguiu passar alguma segurança para seus alunos, isso a deixou satisfeita. Começou a pensar que não haveriam problemas maiores por ali. Então observou a demônio de cabelos verdes que agia estranhamente.

                - Yosafire, você está bem? – Perguntou.

A verdade é que Yosafire não se sentia nada bem. Agarrava o tecido que cobria seus braços, um de cada lado, fortemente. Sentia como se estivesse contendo uma força de vontade que a própria não sabia de onde vinha. Viera com mais intensidade dessa vez e a mesma sentia que acabaria por ceder. O pequeno corpo começara a tremer, Froze começou a se preocupar ainda mais.

— Yosaf? – Chamou pela amiga sem resposta.

Quando a anjo ergueu sua mão para encostar ombro da demônio, a mesma se levantou brutalmente sem que ninguém entendesse suas ações. Correu rapidamente pela saída mais direta para sair daquele lugar. Os sons dos cacos de vidro da janela ressoaram pela sala de aula.

Froze gritou pelo nome de Yosafire, correu em direção a janela apenas para ver a demônio de cabelos esverdeados planando em suas asas para uma queda pacifica no chão, começando a correr em direção a algumas árvores do local assim desaparecendo de sua vista. Olhou para Sra. Greif como se pedisse permissão, no mesmo ritmo que se sentia nervosa com o que poderia ter acontecido.

— Sra. Greif. – A chamou, o tom calmo se tornando mais desesperado.

— Pode ir. Encontre Yosafire o mais rápido possível e a traga de volta. Tenha cuidado. – Foram as últimas palavras pronunciadas para Froze antes que a mesma assentisse e pulasse também pela janela.

Planou em suas asas assim como Yosafire, porém adicionou um leve pulsar nelas para que chegasse mais rápido em encontro com o chão. Logo começou a correr na mesma direção que a de cabelos esverdeados quando a viu pela última vez. Yosafire, o que aconteceu com você? Pensava enquanto adentrava a densa floresta, a procura por sua amiga demônio.