Fria como pedra escrita por Gabriela Cavalcante


Capítulo 1
No chão


Notas iniciais do capítulo

Essa é minha primeira Song fic, então espero que gostem.
Os capítulos não vão ser longos



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Stone cold / Fria como pedra

Stone cold / Fria como pedra

You see me standing / Você me vê em pé

But I’m dying on the floor / Mas eu estou morrendo no chão

 

Frio.

O vento entrando pelas minhas veias.

Eu sei que isso não estava realmente acontecendo, mas era o que parecia. E era terrível.

Havia lembranças de um tempo no qual meu coração não parecia esfarelado, destroçado, como se a qualquer momento ele fosse sumir. E eu ainda não estava preparada para enfrentar a perda do meu coração. Eu o queria ali, comigo. E queria ele também. Mas não era fácil assim.

Saía fumaça da boca dele ao mesmo tempo em que as palavras, com suas sílabas simples, perfeitas, e sem nenhuma ambiguidade, atravessavam o oxigênio que estava entre nós. Era a primeira vez em anos que estávamos tão distantes, emocional e fisicamente.

— Não está mais dando certo entre nós – disse, sério, sem expressão, sem pena, sem preparo.

Era tão difícil amar incondicionalmente. Era raro. De outro planeta. Mas não era nada incomum que alguém partisse sua alma e te fizesse desconfiar de que os casais felizes, na verdade, eram atores da vida real.

Eu amava incondicionalmente. Eu amei incondicionalmente. Eu vivi, chorei, e passei tantos dias com insônia de madrugada pensando no que fiz de errado. No fundo, fiz tudo de errado. Deixei amigos por causa dele. Deixei tardes alegres com minha família para estar com ele. Irritei meus pais, meu irmão, meus avós. Tudo para estar com ele, porque eu o preferia a tudo no mundo. Mas não era assim na hora de receber essa dedicação de volta. As palavras duras eram facas afiadas me arranhando o estômago. E eu estava quase tombando.

— Por quê? – perguntei.

— As coisas não são mais como antes – ele explicou, e eu tentei lembrar o gosto do café descendo pela minha garganta para me aquecer. No fim, tudo o que me aquecia eram lembranças mesmo. – Nós não somos mais os mesmos.

Nós éramos os mesmos. Havíamos nos conhecido há dois anos, perto daquele lugar, onde o amor não fora à primeira vista, mas às primeiras vistas. Ele viera falar comigo depois de nos olharmos durante semanas, toda vez que estávamos na mesma parada, esperando por ônibus diferentes. Eu ia para a faculdade, ele, para o estágio. Não estávamos nem em épocas distintas da vida.

— Somos sim - afirmei, convicta, sem titubear, demonstrando mais desespero do que pretendia.

Senti uma lágrima gelada descer pela minha bochecha. Lágrima, outra lâmina me cortando, para somar aos arranhões.

— Não somos. Você não é mais a mesma, e nem eu. Nós mudamos durante esse tempo, Liz. A vida mudou e nos levou para caminhos diferentes.

— Mas o que aconteceu?

Eu estava em pé, minhas pernas perfeitamente firmes. Era essa a visão que ele tinha de mim. Mas, por dentro, eu estava morrendo, deitada no chão, esperando a dor passar. Eu quero que a dor passe. Quero ficar bem. Por que ele não quer ficar bem comigo?

Lembrei da minha mãe dizendo que ele não era bom pra mim. Lembrei do meu pai reclamando que eu não parava em casa. Lembrei do meu irmão chorando porque perdi a formatura dele. E, naquele momento, senti meu coração formigar. Doía, e não era suportável.

Ele olhou para o lado. Parecia não saber como continuar. Parecia não querer continuar. Os olhos dele não paravam em mim, as sobrancelhas estavam unidas, em dúvida. O pé balançava, a testa suava mesmo com todo aquele frio, ele estava procurando a coragem. Teria que terminar. Ele queria terminar. Eu via em sua postura a certeza de que ele não esperava mais me ver depois daquele dia. Os olhos aflitos, a respiração rápida, inconstante, as mãos nos bolsos. E eu só queria poder tomar outro café.

— Eu conheci outra pessoa, Liz - disse, e aquelas palavras por pouco não foram levadas pelo vento.

Além dos arranhões no meu estômago e as lâminas frias descendo pelo rosto, agora havia outra coisa me machucando. Cacos de vidro estavam incrustados dentro de mim como diamantes brutos numa pedra, e eu tinha certeza que, se eu me mexesse, eles me cortariam e eu sentiria mais dor. Eu tinha que ficar parada.

Não me movi um centímetro. Esperei a frase adentrar meus ouvidos, minhas entranhas, ser digerida. Esperei um milagre, mas não ia acontecer. Eu me sentia numa bola de neve. Quanto mais eu falasse, mais pioraria a situação.

— Mas eu te amo – eu disse, e me arrependi segundos depois. Ele não me amava. Não era pra eu ter dito isso.

— Eu também te amo. Mas não posso mais ficar com você.

Mechas de cabelo voavam na frente dos meus olhos e eu não conseguia vê-lo direito. Ainda assim, não me mexi.

Ele rompeu a barreira que existia entre a gente. Atravessou o obstáculo, diminuiu a distância. Quanto mais ele se aproximava, mais eu sentia o coração palpitar dentro do meu peito. E mais lâminas se formavam e escorriam até o meu queixo.

Quando senti o abraço dele me esquentar, já era tarde. Não havia mais nada que eu pudesse fazer. A presença de outras pessoas andando por aquela praça me fazia querer desmaiar, mas eu não podia me mover de modo algum, senão os cacos de vidro me machucariam.

Minha visão ficou cinza quando ele saiu. Me desejou boa sorte, disse que eu encontraria a pessoa certa. Ele não se lembrava? A pessoa certa pra mim era ele. A única pessoa que eu amei irracionalmente. Eu o queria de volta, queria que ele me aquecesse naquele vento frio, me abraçasse com carinho, como há muito não fazia, e me deixasse pensar que ia ficar tudo bem de novo.

Isso não aconteceu. Ele não olhou para trás depois de se afastar. Então era isso. Um afastamento. E eu ali, em pé no meio da praça, congelando com tantas coisas que podiam me machucar.

Frio.

O vento entrando pelas minhas veias.

Enfim, eu tive que me mexer. Os cacos de vidro me perfuraram e arderam, eram pontudos e doloridos.

Eu só aguentaria tudo aquilo se virasse uma pedra. Uma pedra fria como aquele inverno.


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Notas finais do capítulo

Oi, tudo bem? Leu até o final, deixe um review pra eu saber o que você achou! Beijos ♥



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